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Art. 29, II, da Lei 8.213/91:as ações revisionais individuais e o efeito da ação civil pública nº 0002320–59.2012.4.03.6183/SP

Análise da prescrição, decadência e demais questões polêmicas

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Agenda 26/08/2015 às 23:28

5) A PRESCRIÇÃO

O PRIMEIRO MARCO INTERRUPTIVO E AS 3 TESES:A PORTARIA, O DECRETO E O MEMORANDO

A Administração Previdenciária reconheceu o direito de revisão pleiteado nestes autos por meio da edição do Memorando-Circular Conjunto nº 21/DIRBEN/PFEINSS, datado de 15.04.2010 , cuja leitura revela se tratar de ato extrajudicial inequívoco que importou em reconhecimento do direito pelo devedor, subsumindo-se à hipótese de interrupção da prescrição prevista no artigo 202, VI, do Código Civil.

Pela pertinência, transcreve-se lapidar julgado proferido pela 1ª Turma Recursal do Paraná (autos 2010.70.50.0080340, rel. José Antônio Savaris, j. 09.02.2011), que aborda os efeitos da edição do referido ato administrativo:

Dos trechos do memorando acima transcritos, extraem-se as seguintes informações, as quais são imprescindíveis para a análise do presente caso concreto: (1) houve o reconhecimento, por parte da autarquia, da incorreção do cálculo dos benefícios concedidos após 29.11.1999; (2) os benefícios já atingidos pela decadência não serão revisados; (3) o reconhecimento do direito do segurado não abrangeu parcelas prescritas.[…] Nesse sentido é a jurisprudência do STJ que esclarece que “o ato da Administração que reconhece o direito do interessado acarreta a interrupção do prazo prescricional quinquenal; acaso consumada a prescrição, importa em sua renúncia”. […] Partindo dessa premissa, tem-se que ao editar o Memorando-Circular Conjunto nº 21/DIRBEN/PFEINSS, o INSS reconheceu o direito à aplicação da regra do artigo 29, II, da Lei 8213/1991 aos benefícios por incapacidade e pensão deles decorrentes concedidos aos segurados após 29/11/1999, garantindo a revisão de tais benefícios, respeitando-se no então a prescrição quinquenal.

Trata-se portanto de reconhecimento, ainda que extrajudicial, do direito do segurado. Todavia, em relação à prescrição, não há que se falar em renúncia, o que atrairia a aplicação da regra do artigo 191 do Código Civil, pois, como visto, a renúncia apenas ocorre em relação às parcelas prescritas. Como houve a manifestação expressa de que o reconhecimento do direito do segurado se limita às parcelas não prescritas, é caso típico da aplicação da regra do artigo 202, VI, do CPC, que determina a interrupção da prescrição. Assim, o Memorando-Circular Conjunto nº 21/DIRBEN/PFEINSS, por implicar reconhecimento do direito do segurado, é causa interruptiva da prescrição.

No caso de ações contra a Fazenda Pública, a regra de interrupção da prescrição estabelecida pelo artigo 202 do Código Civil deve ser analisada em conjunto com Decreto 20.910/32, que em seu artigo 9º prevê que “a prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do ultimo ato ou termo do respectivo processo.”Ainda, em se tratando de revisão de benefício previdenciário, há que se atentar para a disposição contida na Súmula 85 do STJ que estabelece que “nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.” […]

Assim, para os benefícios que ainda estavam ativos no qüinqüênio que antecedeu ao memorando (em 15.04.2005, inclusive) tem-se as seguintes situações:

1) No caso do segurado que ingressar com a ação judicial até 15.10.2012 (dois anos e meio contados do ato que reconheceu o direito do segurado), são devidas as parcelas que venceram no qüinqüênio que antecedeu a edição do Memorando-Circular Conjunto nº 21/DIRBEN/PFEINSS. Portanto, são devidas as parcelas vencidas desde 15.04.2005;

2) No caso do segurado que ingressar com a ação judicial após 16.10.2012, aplica-se a regra objeto da Súmula 85 do STJ, de maneira que a prescrição atinge as parcelas vencidas no período que antecedeu ao qüinqüênio anterior ao ajuizamento da ação.

Não bastasse o que foi dito, deve-se rechaçar, sob pena de incompletude, as outras duas teses existentes acerca da interrupção da prescrição da revisão do “art. 29, inc. II” em momentos anteriores ao da edição do referido memorando.

Refere-se à tese (1) que preconiza a interrupção da decadência por força do Decreto nº 6.939/2009, de 18/08/2009, que revogou o § 20 do art. 32 e alterou o § 4º do art. 188-A do Regulamento da Previdência Social — RPS, corrigindo a ilegalidade da redação anterior do Decreto e ajustando-o segundo os ditames da Lei de Benefícios, bem como (2) à tese que defende a interrupção da prescrição a partir do Parecer CONJUR/MPS nº 248/2008, de 23/07/2008, que reconheceu a ilegalidade da redação do § 20 do art. 32 e do § 4º do art. 188-A do Decreto nº 3.048/99, em razão de sua incompatibilidade com o art. 29 da Lei nº 8.213/91.

Quanto a tese (1), muito embora o Decreto nº 6.939/2009 tenha corrigido a ilegalidade anteriormente existente no Decreto 3.048/99, nada dispôs acerca do reconhecimento do direito à revisão dos benefícios concedidos antes de sua vigência.

Não há, pois, que se falar em interrupção/renúncia à prescrição em razão do referido decreto.

Quanto à tese (2), ressalto que o fato de a Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS ter expedido a Nota Técnica nº 70/2009/PFEINSS/CGMBEN/DIVCONT, manifestando-se no sentido de que a alteração do regulamento deveria repercutir também para os benefícios com data de início anterior à publicação do Decreto nº 6.939/2009, não importa na interrupção da prescrição, pois a nota, por si só, não pode produzir (e não produziu) qualquer efeito sobre os benefícios.

Ademais, a teor do art. 42 da Lei Complementar nº 73/1993, os pareceres das Consultorias Jurídicas somente obrigam os órgãos autônomos e entidades vinculadas quando aprovados pelo Ministro de Estado, pelo Secretário-Geral e pelos titulares das demais Secretarias da Presidência da República.

Por essa razão, o Parecer CONJUR/MPS nº 248/2008 também não importou no reconhecimento do direito ora postulado, não tendo o condão de interromper a prescrição.

Com efeito, apenas com o Memorando-Circular Conjunto nº 21/DIRBEN/ PFEINSS, de 15/04/2010, é que foi determinada a revisão administrativa dos benefícios, configurando reconhecimento extrajudicial do direito do segurado. A partir dessa data, portanto, interrompe-se o prazo prescricional, por força, como visto, do disposto no artigo 202, VI, do Código Civil.

Mas não é só.

A SEGUNDA INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO: A CITAÇÃO NA ACP

É que embora o julgado supracitado tenha abordado com maestria a questão da interrupção da prescrição à luz do Memorando, posteriormente a tal julgado (mais precisamente em 09/05/2012) o Ministério Público Federal ajuizou a já citada Ação Civil Pública nº 0002320–59.2012.403.6183/SP, com objeto idêntico ao da presente ação.

Assim, a citação promovida pelo legitimado extraordinário (Ministério Público Federal), em sede de ação civil pública, também teve o condão de interromper a prescrição em favor dos substituídos, retroagindo à data de ajuizamento daquela ação (art. 219, §1º do CPC), uma vez que se deixa de imputar aos segurados a condição de inertes ou negligentes; ao revés, exercitaram suas pretensões, ainda que por meio de terceiro (MPF), o qual postulou direito alheio em nome próprio, com arrimo em previsão expressa de Lei (artigo 82 do Código de Defesa do Consumidor).

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Relembre-se ainda que nos termos do artigo 203 do CC, a prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado, operando-se por meio do despacho do juiz que determina a citação (artigo 202, I, do CC c/c o artigo 219 do CPC). Nesse sentido:

No que tange ao termo inicial da prescrição quinquenal, entendo que o ajuizamento de Ação Civil Pública pelo Ministério Público Federal em defesa dos segurados da Previdência Social implica interrupção da prescrição, porquanto efetivada a citação válida do réu naqueles autos, retroagindo a contagem à data da propositura da ação (CPC, art. 219, caput e § 1º). Registro, ainda, que o novo Código Civil estabelece que a prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado (art. 203). (TRF4, 6ª Turma, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2006.72.09.000926–2/SC, j. em. 28/04/2010)

PROCESSO COLETIVO. CITAÇÃO. EFEITO INTERRUPTIVO DA PRESCRIÇÃO. EXTINÇÃO RESOLUÇÃO DO MÉRITO. AÇÕES INDIVIDUAIS DOS SUBSTITUÍDOS. A citação realizada em processo coletivo interrompe a prescrição para as ações individuais dos substituídosainda que venha ele a ser julgado extinto sem resolução do mérito. (TRF4, 5ª Turma, Apelação/Reexame Necessário 2007.70.01.005360–5/PR, j. em. 29.07.2008)

Ademais, em que pese os artigos 202, caput, do CC e 8º do Decreto 20.910/32 preconizarem que a prescrição só será interrompida uma única vez , tenho que, por uma questão de interpretação lógica do sistema, tais disposições incidem apenas sobre as causas interruptivas extrajudiciais, sob pena de se concluir que o lapso prescricional pode se consumar no curso do processo judicial, pela demora da máquina judiciária, mesmo diante de nenhuma inércia ou negligência do titular da pretensão, que já moveu a ação pertinente. Pela pertinência, transcrevo a lição doutrinária:

“Segundo o texto legal, a interrupção da prescrição só poderá ocorrer uma vez, e essa inovação diante do que dispunha o Código anterior, mas que já constava no Decreto n. 20.910/32 (art. 8º) objetiva “não se eternizarem as interrupções de prescrição (MOREIRA ALVES, José Carlos. A Parte Geral do Projeto de Código Civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 1986, p. 154). Uma dificuldade, porém, necessita ser contornada, pois interrompida a prescrição por um dos modos previstos nos incisos II a VI, seria inconcebível entender que, voltando a correr, na conformidade do parágrafo único, não mais fosse detida com o despacho ordenatório da citação (inciso I), levando, eventualmente, à sua consumação no curso do processo, ainda que a parte nele fosse diligente. Assim, é compreensível que a interrupção por uma só vez diz respeito, às causas dispostas nos incisos de II a VI, de modo que, em qualquer hipótese, fica ressalvada a interrupção fundada no inciso I.”

(DUARTE, Nestor. Código Civil Comentado. Doutrina e Jurisprudência.Coordenador Ministro Cezar Peluso. 3ª Edição. Barueri, SP: Manole, 2009. p. 156).

Posto isso, a ACP interrompeu novamente a prescrição, e isso antes de transcorridos dois anos e meio da interrupção anterior promovida pelo memorando, pelo que ambas se comunicam sem solução de continuidade, permitindo a cobrança de todas as parcelas eventualmente devidas no quinquênio que antecedeu a primeira interrupção; note-se ainda que a mencionada ACP transitou em julgado em 05.09.2012, sendo este o marco a partir do qual a prescrição volta a correr, por dois anos e meio (art. 202, parágrafo único do CC e Súmula 383 do STF), desaguando no dia 05.03.2015 .

Assim, em suma:

1) Para ações individuais ajuizadas antes de 05.03.2015 , afigura-se possível a cobrança das parcelas vencidas desde 15.04.2005 (5 anos contados retroativamente da primeira interrupção promovida pelo Memorando, datado de 15.04.2010), já que a ação civil pública interrompeu pela segunda vez o fluxo do prazo prescricional antes de transcorridos dois anos e meio contados da data da primeira interrupção.

2) Para ações individuais ajuizadas após 05/03/2015 (dois anos e meio após a interrupção promovida pela ACP), aplica-se a regra normal da prescrição (cinco anos contados retroativamente ao ajuizamento), não sendo possível aproveitar nenhuma das interrupções (memorando e ACP).


6) O CÁLCULO DO BENEFÍCIO APÓS A REVISÃO: O EQUÍVOCO DO INSS QUE FAVORECE OS SEGURADOS

Por fim, registro uma última observação com relação à revisão em questão.

Por razões que fogem à minha compreensão (suponho se tratar de mero equívoco de sistema), o INSS, ao proceder administrativamente as revisões do art. 29, inc. II da Lei 8.213/91, labora em equívoco matemático que acaba favorecendo indevidamente os segurados do RGPS.

O lapso ocorre quando o percentual legalmente previsto para descarte dos salários (20%) não resulta em número inteiro, implicando em arredondamento.

No exemplo de um segurado com, digamos, apenas 7 salários-de-contribuição no PBC, o descarte de 20% resultaria na desconsideração de "1,4" piores salários-de-contribuição. Como evidentemente não existe "0,4" salário-de-contribuição, deve-se proceder a um arredondamento.

Em casos como o do exemplo, o INSS arredonda o número em questão para cima, resultando, no exemplo dado, no descarte de 2 dos 7 salários-de-contribuição.

Ocorre que, ao assim proceder, o INSS, no exemplo, descartou 28,57% dos piores salários-de-contribuição (resultado da divisão de 2 por 7).

Assim, a média, no exemplo, foi feita com apenas 71,42% dos salários-de-contribuição.

Trata-se, a nosso ver, de nítido descumprimento da previsão legal do art. 29, inc. II da LBPS, que preconiza uma média com 80% dos maiores salários, não sendo possível que a média seja feita com montante inferior do PBC.

A fim de espancar quaisquer dúvidas, confira que a redação do art. 3º da Lei 9.876/99 (mesma lei que conferiu a redação atual ao art. 29) expressamente prevê a utilização de "média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994".

Assim, temos consignado expressamente em nossas decisões que o arredondamento dos 20% deve se dar sempre para baixo; no exemplo dado, isso implicaria em descartar apenas 1 dos 7 salários-de-contribuição, respeitando o mínimo de 80% do PBC.

Por fim, por razões matemáticas, consideramos a revisão improcedente para quaisquer segurados cujos PBCs contenham menos do que 5 salários-de-contribuição, já que, nesses casos, os 20% menores não atingem sequer um salário inteiro.

Sobre o autor
Felipe Raul Borges Benali

Juiz Federal do Tribunal Regional Federal da 3ª Região - TRF3

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