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Da aposentadoria especial dos professores e as funções do magistério

Agenda 19/09/2003 às 00:00

Após a promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, controvérsias afloraram acerca da aposentadoria do professor e natureza da locução prevista nos parágrafos 5º, do artigo 40, e 8º, do artigo 201, os quais prevêem a redução de cinco anos nos critérios de idade e tempo de contribuição.

Após a promulgação da Emenda Constitucional nº 20, em 15 de dezembro de 1998, questionamentos e controvérsias afloraram acerca da aposentadoria do professor e natureza da locução prevista nos parágrafos 5º, do artigo 40, e 8º, do artigo 201, na qual prevêem a redução de cinco nos critérios de idade e tempo de contribuição, para os ocupantes do quadro do magistério.

A abordagem desse trabalho visa demonstrar que a aposentadoria especial dos professores é de natureza constitucional, cabendo a legislação infraconstitucional apenas regular a matéria sem descaracterizá-la, o direito ao cômputo especial de período anteriormente laborado como professor, e que tal previsão é dirigida a todos os ocupantes do quadro do magistério.

A Aposentadoria Especial do magistério foi estabelecida pela Emenda Constitucional n. 18, de 30 de junho de 1981, que acrescentou o inciso XX do artigo 165 daquela Constituição Federal. [1]

O benefício foi mantido por ocasião da promulgação da Constituição Federal em 05 de outubro de 1988, bem como pela Emenda Constitucional n. 20 de 15 de dezembro de 1998, tanto aos servidores públicos, quanto aos segurados do Regime Geral de Previdência.

A previsão quanto à Aposentadoria Especial dos professores decorre atualmente, como se demonstrou, de preceito constitucional. Porém, a idéia primária do benefício especial veio ao mundo jurídico pátrio com a Lei Orgânica da Previdência Social, em 26 de agosto de 1960.

O conteúdo histórico do benefício especial, no âmbito infraconstitucional nos é trazido pelo Prof. Sergio Pardal Freudenthal, em seu livro Aposentadoria Especial, que assim destaca:

"A Aposentadoria Especial – assim denominada desde o seu surgimento, na Lei Orgânica da Previdência Social, n. 3.807, de 26 de agosto de 1960 – é modalidade de aposentadoria por tempo de serviço, diminuído para 15, 20 ou 25 anos em razão das condições de trabalho insalubres, periculosas ou penosas a que estiver submetido o trabalhador". [2]

Observa-se, portanto que na legislação infraconstitucional, a aposentadoria especial estava prevista desde 1960. Por ocasião desta legislação, a especialidade da função do professor estava exposta na regulamentação da Lei, junto ao Anexo ao Decreto 53.831 de 1964, no item 2.1.4.

Assim, primeiramente a previsão era infraconstitucional e a partir de 1981, em função da Emenda 18 passou a ser de natureza constitucional.

Atualmente a legislação infraconstitucional que trata da aposentadoria especial, não vislumbra mais a hipótese de deferimento do benefício apenas em razão da atividade exercida, como o fazia até 28 de abril de 1995, mas sim face aos agentes agressivos a que esteja exposto o segurado.

Na hipótese de que o segurado vínculado ao INSS houver laborado como professor até 28 de abril de 1995 seu tempo de magistério deverá ser contabilizado na forma especial, pois tal previsão estava elencada na legislação anterior à Lei 9.032/95 que dentre tantas alterações retirou o direito das atividades especiais restando apenas o direito em função da exposição à agentes agressivos à saúde e integridade física.

Em julgamento proferido pelo E. Superior Tribunal de Justiça no dia 05 de dezembro de 2002, no Recurso Especial 385.945-RS de lavra do Min. Jorge Scartezzini, assegurou o direito ao cálculo enquanto especial de segurado que atuou como professor anteriormente à edição da Lei 9.032/95:

"PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL – APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO – ATIVIDADE DE MAGISTÉRIO – CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM – POSSIBILIDADE – LEI 9.032/95 – ART.70 DO DECRETO 3.048/99".

A aposentadoria especial em razão da atividade desapareceu do ordenamento jurídica em abril de 1995, no entanto quanto à aposentadoria especial dos professores, ainda que ausente na legislação ordinária, tal direito extrai-se da análise da própria Constituição Federal.

Quanto ao benefício em si, o Prof. Sérgio Pinto Martins, assim leciona acerca da natureza jurídica da Aposentadoria Especial:

Pode ser conceituada a aposentadoria especial como o benefício decorrente do trabalho realizado em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado, de acordo com a previsão da lei. Trata-se de um benefício de natureza extraordinária, tendo por objetivo compensar o trabalho do segurado que presta serviços em condições adversas à sua saúde ou que desempenha atividades com riscos superiores aos normais.

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(...) Defere-se a aposentadoria especial quando o segurado tenha laborado e atividades sujeitas a condições especiais que prejudiquem sua saúde e integridade física, como nas atividades penosas, insalubres ou perigosas. [3]

O que caracteriza a especialidade do benefício aos professores, é a penosidade do exercício de todas as funções do magistério, qualquer que seja tal função. O trabalho penoso, explica o Prof. Sergio Pardal Freudenthal, "é aquele que causa desgaste, tanto físico quanto psicológico, acima do que se entende por normal". [4]

Outro ponto que se mostra bastante árduo é saber qual o alcance da norma constitucional, para esclarecer o que seria "funções do magistério".

Entendemos que nas funções do magistério estão incluídas todas aquelas desempenhadas por professores e especialistas em educação nas atividades de ensino. Não podemos esquecer que a atividade de docência exige um suporte técnico na direção, na supervisão, na orientação, ou mesma na docência estritamente desempenhada.

As funções de especialistas em educação pressupõem o preenchimento de diversos requisitos, entre eles o de ser professor, além do exercício desta função por um período mínimo de tempo.

O especialista em educação que após anos de docência, cursos e concursos alcançou a função de especialista é previamente um professor, ou seja, é condição sine qua non do especialista em educação, ser professor.

Sob este mesmo diapasão, o Supremo Tribunal Federal, por ocasião da ADIN 122-1/600-DF, o então Ministro Marco Aurélio, hoje presidente da Egrégia Corte Constitucional, assim expôs:

Sob minha ótica, pelo menos, temos uma explicitação do que se entende como funções de magistério. Temos uma definição precisa da expressão ‘funções do magistério’ ao se indicar que também aqueles especialistas em assuntos educacionais estão protegidos, pela norma constitucional relativa à aposentadoria, com um menor tempo de serviço.

Senhor Presidente, o dia-a-dia, até mesmo da vida gregária, revela que especialistas em assuntos educacionais são professores, muito embora deslocados para atividades que não limitam à dação de aulas, ao magistério stricto sensu. [5]

O que se vislumbra na leitura no voto do Ministro Marco Aurélio, é que o especialista em educação é previamente um professor, que através dos anos, cursos e concursos realizados alcançou a função de especialista.

O conceito constitucional de "funções do magistério", não é de forma alguma um conceito indeterminado, ou mesmo vago, mas sim determinado.

Conceito indeterminado é aquele que necessita de determinação para a sua aplicação, e vago aquele "cujo referencial na realidade fática não se encontra com tanta facilidade". [6]

O conceito constitucional quanto ao benefício especial é sem dúvida determinado, ou seja, todo o professor que exerça função do magistério, entendidas, por exemplo, a de docência, direção, supervisão, orientação não perde o direito à aposentadoria especial.

Neste sentido é o entendimento firmado pela Profª Maria Sylvia Zanella di Pietro:

Tem-se que entender que a Constituição, ao referir-se ao Professor, quis abranger não só o que ocupa o cargo ou a função de professor e exerce especificadamente a docência em sala de aula, mas também as Professor que, em sua vida funcional, vai ascendendo aos postos mais elevados da carreira do magistério para, com sua experiência, exercer atribuições mais complexas de apoio à docência, muitas vezes em contato direto e constante com os alunos. [7]

O benefício apenas aos professores seria a própria inversão da ordem lógica e jurídica das normas, pois é incoerente que a professora necessite de apenas 25 anos de serviço para se beneficiar da aposentadoria especial, ao passo que o Especialista de Educação, que nada mais é do que um professor com um plus, aposente-se apenas com 30 anos.

Tal exegese constitucional é a mais adequada ao tema, vez que se o legislador pretendesse outra interpretação da norma, retiraria do texto a expressão "funções do magistério", e colocaria possivelmente "dentro de sala de aula".

Na previsão constitucional, quanto ao benefício da aposentadoria especial, não há separação entre especialista em educação e professor, a norma quis abranger e valorizar o professor por toda a sua vida profissional. Quanto à não distinção legal, assim expõe o Prof. Carlos Maximiliano:

Quando o texto menciona o gênero, presumem-se incluídas as espécies respectivas; faz-se referência ao masculino, abrange o feminino; quando regula o todo, compreendem-se também as partes. Aplica-se a regra geral aos casos especiais, se a lei não determina evidentemente o contrário.

Ubi lex non distinguit nec nos distinguire debemus: ‘Onde a lei não distingue, não pode o intérprete distinguir’. [8]

Tal distinção também não ocorre no âmbito coletivo, todos os professores, estando dentro da sala de aula, ou esteja nas funções de especialista de educação, estão todos subordinados ao Sindicato dos Professores, inexiste Sindicato dos Especialistas.

Todos os direitos adquiridos através de dissídio ou acordo coletivo abrange todos os integrantes da categoria, estejam eles nas funções de professor estritamente considerado ou como especialista de educação, razão pela qual é incabível a distinção no que tange ao direito à aposentadoria especial prevista constitucionalmente.

Sob a ótica social, a previsão quanto à aposentadoria especial apenas aos professores, excluindo aí os especialistas em educação, traria desestímulo ou mesmo cerceio ao acesso a cargos mais elevados, de maior responsabilidade e complexidade, como bem aponta a Prof ª Maria Sylvia Zanella di Pietro:

Se a expressão ‘professor’ merecer interpretação restritiva significando apenas o docente, o especialista de educação estará definitivamente privado do direito à aposentadoria especial e a conseqüência será negativa para as escolas. Os docentes, certamente, não terão interesse em prestar concurso público para a direção ou supervisão.

Se a expressão ‘efetivo exercício das funções de magistério’ for interpretada como o exclusivo trabalho em sala de aula, o caos será geral.

A Constituição Federal em seu art. 206, V [9]prevê a valorização do profissional do ensino, de forma que a aposentadoria apenas aos professores stricto sensu contrairia o previsto na norma constitucional.

Recentemente apreciando a referida tese, o Egrégio Supremo Tribunal Federal se manifestou quanto ao direito da aposentadoria especial aos integrantes do quadro do magistério, incluindo os especialistas em educação e orientadora educacional:

APOSENTADORIA – PROFESSORES – ORIENTADORA EDUCACIONAL – TEMPO DE SERVIÇO. O preceito constitucional regedor da aposentadoria dos professores contenta-se com o efetivo exercício em função do magistério, não impondo como requisito atividade em sala de aula. Assim, descabe ter como infringido o preceito da alínea ‘b’ do inciso III do art. 40 da CF no que, presente a qualificação de professora, reconheceu-se o direito à aposentadoria especial à prestadora de serviço há vinte e cinco anos nas funções de especialista em educação e orientadora educacional. (STF – RE 196.707-2 – DF – 2ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio – DJU 03.08.2000).

Assim, o direito à aposentadoria especial dos professores surgiu no direito pátrio a partir da legislação infra-constitucional passando a fazer parte da Carta Magna a partir de 1981 com a Emenda nº 18. Da mesma forma o período laborado até 28/04/1995 como integrante dos quadros do magistério deve ser contabilizado enquanto especial para fins de aposentadoria.

Por fim a expressão "funções do magistério" abrange não só os professores que exerçam atividades de docência dentro da sala de aula, mas todas as outras atividades relacionadas ao magistério e que lhe sirvam de suporte técnico e pedagógico, vez que tais atividades são exclusivas dos profissionais do ensino, portanto com pleno direito ao benefício da aposentadoria especial previsto na Constituição Federal.


Notas

01. "Art. 165. XX – a aposentadoria para professor após 30 anos e, para a professora, após 25 anos de efetivo exercício em funções do magistério, com salário integral".

02. SERGIO PARDAL FREUDENTHAL. Aposentadoria Especial, 1ª edição, Ltr, São Paulo, 2000, p. 13.

03. SERGIO PINTO MARTINS. Direito da Seguridade Social, 9ª edição, Atlas, São Paulo, 1998, p. 323.

04. SERGIO PARDAL FREUDENTHAL. Aposentadoria Especial, 1ª edição, Ltr, São Paulo, 2000, p. 38.

05. JSTF, LEX 168/16

06. TEREZA ARRUDA ALVIM WAMBIER. Distinção entre questão de fato e questão de direito para fins de cabimento de recurso especial, Revista de Processo, São Paulo: RT, nº 92, out/dez., 1998, p. 54.

07. MARIA SILVIA ZANELLA DI PIETRO. Aposentadoria especial, Revista de Previdência Social, São Paulo: Ltr, nº 240, nov., 2000, p.1052.

08. CARLOS MAXIMILIANO. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 14ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 1994, p. 246.

09. "Art. 206 CF/88 – O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

V – valorização dos profissionais de ensino, garantidos na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos"

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOURA, Demis Ricardo G.. Da aposentadoria especial dos professores e as funções do magistério. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 78, 19 set. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4277. Acesso em: 22 nov. 2024.

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