Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

A privacidade do trabalhador no meio informático

Exibindo página 2 de 2

4. Compromisso com a proteção do trabalhador (conclusões de Antônio Silveira)

A utilização da Internet pelo empregado pode ser regulamentada pelo empregador, desde que este não viole os predicados da dignidade humana, consubstanciados na proteção aos direitos fundamentais, mormente a privacidade das comunicações.

O funcionário deve se conscientizar que os equipamentos de informática são propriedade do empregador, sendo o seu uso restrito aos assuntos da empresa.

Todavia, a subordinação do empregado e o poder de comando do empregador não podem servir de amparo para ações que desrespeitem o direito à privacidade e o sigilo das comunicações.

Neste sentido, é inadmissível a interceptação de mensagens eletrônicas dos empregados no âmbito da empresa, com intuito de verificar o seu conteúdo, mesmo quando há o propósito de se evitar atos ilícitos. Faz-se necessário ordem judicial para que o e-mail possa ser lido, sob pena de violação da regra constitucional insculpida no art. 5º, inciso XII, da Carta Política.

Por fim, não se pode olvidar que a dignidade humana constitui uma das finalidades do próprio Direito do Trabalho. Assim, o jurista deve manter o compromisso com a defesa dos direitos humanos, direcionando a exegese do texto legal e das situações passíveis de enquadramento jurídico no sentido de dar máxima proteção aos direitos fundamentais, rechaçando condutas que ameacem esses direitos, através de uma interpretação restritiva.


5. Processo de Adaptação (conclusões de Mário Paiva)

Em matéria de relações trabalhistas temos passado por grandes mudanças. Essas transformações estão dentro de um âmbito mais amplo: o direito na internet. Estamos assistindo ao nascimento do Direito das novas tecnologias. Uma espécie de ciência autônoma do direito que atinge e influi em todos os ramos do Direito.

Estamos em um impasse objetivo, uma vez que os protagonistas das relações trabalhistas, tanto os sindicatos como empresários, estão acostumados a um sistema de organização de trabalho próprio do fordismo, da grande empresa, do trabalho em cadeia, o que não corresponde mais ao modelo hoje visto em uma empresa moderna e competitiva.

A revolução tecnológica tem sido tão avassaladora que tem transformado completamente o cenário da organização do trabalho. Agora a indústria flexibiliza os turnos de trabalho, descentraliza a empresa operando através de sujeitos infinitamente mais pequenos e dispersos no território.

Estamos vivenciando um dilema pois nosso especialistas e legisladores estão arraigados a velhos institutos tradicionais e os sindicatos amarrados a peias retrógradas e limitados em seu poderio são inibidos a praticar mudança e inserir cláusulas em convenções, estatuindo o modus operandi das maquinas eletrônicas. Seria portanto, impraticável, nesse momento, a reprodução da atividade sindical feita nas grandes empresas, onde todos trabalhavam nos moldes de grandes cadeias, em concentrações massivas de trabalhadores.

Possuímos um ordenamento jurídico inapto a conjuntura tecnológica e econômica. Tal situação traz uma série de malefícios para o contrato de emprego e as relações de trabalho como um todo, pois sem esta adaptação a realidade tecnológica e a organização do trabalho estamos contribuindo para o retrocesso da economia à medida em que criamos desestímulos legais para a implantação da tecnologia por gerar conflitos de difícil solução.

Para não sermos ameaçados com a extinção ou lesão de direitos fundamentais, por exemplo, devemos nos posicionar claramente com os fatos advindos do caso concreto estabelecendo diretrizes gerais que não beneficiem apenas umas das partes. Por isso, somos favoráveis a interpretações e decisões baseadas no equilíbrio de direitos que permitam resguardar o direito do empregador de dirigir a empresa tendo acesso de forma razoável ao e-mail’s dispostos e a liberdade de comunicação do empregado através do uso social do e-mail.

Cabe por fim a nós alertar a todos que passamos por uma revolução cibernética que atinge em cheio as relações de trabalho e que portanto devem ser estudadas e solucionados os conflitos provenientes dessas transformações, munindo os atores sociais de arcabouços jurídicos e legais aptos para lidar com esses tipos de relações, com vistas a criar um equilíbrio social entre os empregadores e empregados no trato das questões envolvendo as relações entre o direito do trabalho e a informática.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Referências bibliográficas

BARCELLOS, Ana Paula. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. São Paulo: Renovar, 2002.

BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. 5ª ed., São Paulo: Forense Universitária, 2001.

COSTA JÚNIOR, Paulo José. O direito de estar só – tutela penal da intimidade. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995.

DINIZ, Carlos Francisco Sica. Enciclopédia Saraiva de Direito, n 61, São Paulo: Saraiva, 1977, pp. 170. a 176.

FARIAS, Edilsom Pereira. Colisão de Direitosa Honra, a Intimidade, a Vida Privada e a Imagem versus a Liberdade de Expressão e Informação. 2ª ed., Porto Alegre: Fabris Editor, 2000.

FINATI, Claudio Roberto. A relação de trabalho na era da informática. Síntese Trabalhista, São Paulo, n. 136, p. 17-23, out 2000.

GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 2000.

JENNINGS, Charles. Privacidade.com. São Paulo: Futura, 2000.

LEDUR, José Felipe. A Realização do Direito do Trabalho. Porto Alegre: Sérgio Fabris Editor, 1998.

LIMBERBGER, Têmis. A Informática e a Proteção à Intimidade. Revista Direito do Constitucional e Internacional, n. 33, São Paulo: RT, p. 111-124.

PAIVA, Mário Antônio Lobato de. E-mail e invasão de privacidade. Acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/3137/e-mail-e-invasao-de-privacidade>. Acesso em: 04 mar. 2003.

_________________________. Comentários à jurisprudência: justa causa. E-mail. Prova produzida por meio ilícito. Não ocorrência. 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho do Distrito Federal. Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 59, out. 2002. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/3337/comentarios-a-jurisprudencia-justa-causa-e-mail-prova-produzida-por-meio-ilicito>. Acesso em: 06 mar. 2003.

_________________________. O monitoramento do correio eletrônico no ambiente de trabalho. Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/3486/o-monitoramento-do-correio-eletronico-no-ambiente-de-trabalho>. Acesso em: 06 mar. 2003.

MARANHÃO, Délio; CARVALHO, Luiz Inácio B. Direito do Trabalho. 17ª ed., Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1993.

SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995.

VICENTE, Nilza Maria; JACYNTHO AVILA, Patrícia Helena. Direito à intimidade nas relações de trabalho. Síntese Trabalhista, São Paulo, n. 143, p. 15-18, maio 2001.

WIENER, Norbert. Cibernética e sociedade. Trad.: José Paulo Paes. São Paulo: Editora Cultrix, 1954.


Notas

1 Wiener, Norbert. Cibernética e sociedade. Trad.: José Paulo Paes. São Paulo: Editora Cultrix, 1954.

2 Privacidade fora de controle? Revista Infoexame. São Paulo, ano 17, n. 199, p. 98.

3 Apud BARCELLOS, Ana Paula. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. São Paulo: Renovar, 2002 [prefácio].

4 Ob. cit. p. 147.

5 LEDUR, José Felipe. A Realização do Direito do Trabalho. Porto Alegre: Sérgio Fabris Editor, 1998, p. 95.

6 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 221.

7 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 720.

8 Encicloplédia Saraiva de direito, n. 61/171.

9 Ob. cit. p. 26.

10 Ob. cit. p. 416.

Sobre os autores
Antônio Silveira Neto

juiz de Direito, professor da Universidade Estadual da Paraíba

Mario Antonio Lobato de Paiva

Sou advogado há mais de 20 anos e trabalho com uma equipe de 10 advogados aptos a prestar serviços jurídicos em todas as áreas do Direito em Belém, Brasília e Portugal. Advogado militante em Belém, foi Conselheiro e Presidente da Comissão em Direito da Informática da OAB/PA, Ex-Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Pará, especialista em Direito da Informática; Assessor da OMDI- Organização Mundial de Direito e Informática; Membro do IBDI- Instituto Brasileiro de Direito da Informática; Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico -IBDE ; Colaborador de várias revistas e jornais da área jurídica nacionais e estrangeiros tendo mais de 400 (quatrocentos) artigos publicados; autor e co-autor de livros jurídicos; palestrante a nível nacional e internacional. Site: www.mariopaiva.adv.br email: mariopaiva@mariopaiva.adv.br

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVEIRA NETO, Antônio; PAIVA, Mario Antonio Lobato. A privacidade do trabalhador no meio informático. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 93, 3 out. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4292. Acesso em: 24 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!