INTRODUÇÃO
O presente artigo objetiva abordar de forma sintética a Culpabilidade em suas diversas acepções, apresentando os posicionamentos doutrinários e, ao final, concluindo com o posicionamento ao qual nos filiamos, sem a pretensão de esgotarmos o assunto.
OS TRÊS ENFOQUES DA CULPABILIDADE
Primordialmente, devemos analisar a culpabilidade enquanto elemento do crime.
Segundo a clássica doutrina e amplamente majoritária[1], a qual parte de uma visão tripartida do conceito analítico do delito, a culpabilidade é elemento do crime, constituindo o terceiro substrato do delito, sendo o crime definido como fato típico, ilícito (ou antijurídico) e culpável, posição a qual nos filiamos. Nesse sentido, esclarece Hans Welzel:
A tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade são três elementos que convertem uma ação em um delito. A culpabilidade – a responsabilidade pessoal por um fato antijurídico – pressupõe a antijuridicidade do fato, do mesmo modo que a antijuridicidade, por sua vez, tem de estar concretizada em tipos legais. A tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade estão relacionadas logicamente de tal modo que cada elemento posterior do delito pressupõe o anterior.[2]
Divergindo do posicionamento supra, há renomados doutrinadores[3] que entendem que o crime é um fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade mero pressuposto para a aplicação da pena.
Os adeptos desta teoria fundamentam tal raciocínio através de análise puramente literal do Código Penal, uma vez que, ao se referir a causas exculpantes, o Diploma Repressivo utiliza expressões ligadas à aplicação da pena, a exemplo do artigo 26, que, abordando a inimputabilidade, inicia seu texto dizendo que é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento; o mesmo termo é utilizado na segunda parte do artigo 21.
De qualquer forma, o primeiro enfoque do termo "Culpabilidade" refere-se - para os adeptos de um conceito tripartido do crime - ao terceiro elemento do crime, no qual possui como elementos de sua estrutura a imputabilidade, a exigibilidade de conduta diversa e o potencial conhecimento sobre a ilicitude do fato.
Não obstante, o estudo da culpabilidade não se limita à análise do conceito analítico do delito. Há de se reconhecer a culpabilidade como fundamento da pena, ou, nas palavras de Rogério Greco, “culpabilidade como princípio medidor da pena”[4].
Nesse contexto, uma vez concluído pela existência de um fato típico, ilícito e culpável, deverá o julgador, logo em seguida, quando da prolação da sentença, observar as regras do critério trifásico da pena previstas pelo artigo 68 do Código Penal.
Logo na primeira etapa, quando da aferição da pena base, o magistrado deverá analisar todas as condições elencadas pelo artigo 59 do Código Penal e, dentre elas, a culpabilidade. Vale citar o mencionado artigo, in verbis:
Fixação da pena
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime
Por derradeiro, importante mencionar a culpabilidade como princípio impedidor da responsabilidade sem culpa (responsabilidade penal objetiva), que, segundo Nilo Batista:
O princípio da culpabilidade impõe a subjetividade da responsabilidade penal. Não cabe, em direito penal, uma responsabilidade objetiva, derivada tão-só de uma associação causal entre a conduta e um resultado de lesão ou perigo para um bem jurídico.[5]
Tal princípio tem por finalidade precípua afastar a responsabilidade penal objetiva, tão rechaçada e já sem espaço em nosso atual ordenamento jurídico.
CONCLUSÃO
Mesmo posicionando-se ao lado dos defensores de um conceito tripartido do delito, não há como negar ser a culpabilidade um pressuposto da pena. Considerando que não há pena sem crime, tem-se como pressuposto da pena não só a culpabilidade como também a tipicidade e a ilicitude.
Portanto, conforme acima exposto, podemos analisar culpabilidade enquanto elemento do crime, pressuposto da pena e princípio norteador da teoria da pena e do Direito Penal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
WELZEL, Hans. Derecho penal alemán. Tradução de Juan Bustos Ramirez e Sergio Pereira. Rio de Janeiro: F. Briguiet, 1987.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Especial Vol. II. Niterói: Impetus, 2012.
BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 1996.
Notas
[1] A exemplo de Rogério Greco, Juarez Tavares, Eugênio Raul Zaffaroni, entre outros.
[2] WELZEL, Hans. Derecho penal alemán, p. 57.
[3] Como defensores da teoria tripartida do delito, destacam-se Damásio de Jesus, Ariel Dotti, Mirabete e Delmanto.
[4] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, p. 90.
[5] BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro, p. 104.