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A reestruturação da segurança pública:

projetos e discussões para consecução

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Agenda 11/10/2015 às 13:02

3 O EFETIVO E AS ATRIBUIÇÕES DAS POLÍCIAS NACIONAIS

Neste capítulo apresentaremos diagnóstico do efetivo e breve resumo das atribuições das instituições de segurança pública brasileiras, subsidiados por dados da Pesquisa de Informações Básicas Estaduais (Estadic), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2014.26

No Brasil, os órgãos competentes para exercer diretamente a segurança pública e o controle social estão elencados nos incisos do Art. 144 da Constituição: I- Polícia Federal; II- Polícia Rodoviária Federal; III- Polícia Ferroviária Federal (de competência da União, subordinadas ao Ministério da Justiça); IV- Polícias Civis; V- Polícias Militares e Corpos De Bombeiros Militares (de competência dos Estados, subordinadas aos Governadores).

Ao contrário do que ocorre em países de primeiro mundo, onde as polícias civil e militar são apenas uma, o Brasil ainda adota essa divisão primitiva e encarrega cada uma apenas de "meio ciclo" de polícia.

As forças armadas, que são um conjunto das organizações de combate e defesa do Brasil, também entrarão na pauta.

3. 1 Polícias Militares Estaduais

A Polícia Militar é uma polícia administrativa e preventiva, considerada como auxiliar e reserva do Exército. Realiza o patrulhamento ostensivo nas ruas e atua no front contra grandes tumultos e manifestações. É responsável também pelo serviço de bombeiro e de fiscalização das rodovias estaduais.

Segundo o IBGE,  o efetivo de policiais militares no território nacional era de 425.248 mil em 2014. No mesmo ano a Polícia Militar do Estado de São Paulo contava com 89.478 integrantes (21% do contingente nacional). Importante ressaltar que São Paulo possui o maior número de habitantes do país (cerca de 44.396.484 habitantes, equivalente à Argentina), o que perfaz 21,7% da nação.

Em números simples, São Paulo possui 1 policial para cada 488 pessoas. Neste rank o Distrito Federal ganha destaque com 1 policial para cada 194, o maior indicador observado entre as Unidades da Federação. Apesar disso, em 2012 o Distrito Federal registrou taxa de homicídios equivalente a 38,9/100 mil habitantes (igual a media da região nordeste), enquanto São Paulo: 15,1.(Anexo 02)

 Por outro lado, as menores incidências de policiais militares por habitantes foram encontradas na Região Sul e no Estado do Maranhão: 1 para cada 583 e 1 para cada 881, respectivamente, e o resultado pode ser auferido no capítulo anterior.

Fortes são os incentivos à desmilitarização da polícia militar. Em 25/05/2012 o Conselho de Direitos Humanos da ONU enviou ao Brasil um documento com 170 propostas, incluindo o tema acima, que foi o único a ser rejeitado integralmente. Entre as escusas está o fato de que a mutação violaria a Constituição Federal, que prevê a existências das duas polícias. 37

3. 2 Polícias Civis Estaduais

A Polícia Civil tem função de Polícia Judiciária, vez que sua principal atividade é recolher provas e dados para o Poder Judiciário, relativas ao Inquérito Policial. Suas atividades são em síntese muito mais burocráticas do que investigativas.

Na mesma pesquisa do IBGE, a Polícia Civil contava com 117.642 integrantes, sendo 32.278 do quadro paulista (27,4%).

Não existe recomendação específica para o número de policiais por habitantes, apesar de muitos invocarem a falsa sugestão da ONU de 1 policial a cada 250 habitantes. Isso se dá porque os contextos e níveis de violência variam de acordo com a comunidade, município, estado, país e região.

3. 3 Polícias Federal e Rodoviária Federal

As Polícias Federal e Rodoviária Federal são subordinadas ao Ministério da Justiça e atuam no combate ao crime organizado, sobretudo aqueles ligados às fronteiras nacionais: tráfico de drogas, contrabando de armas e mercadorias, tráfico de seres humanos, exploração sexual de crianças e trabalho escravo, bem como crimes políticos e eleitorais. 28 Suas atribuições completas estão elencadas no Art. 144, §1º CF.

A Instituição tem recebido notoriedade pela imprensa desde a deflagração  da operação "Lava Jato" em 2014, considerada como a maior investigação de corrupção na história do País, na qual apura esquema bilionário de desvio e lavagem de dinheiro envolvendo a Estatal Petrobrás.29

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Segundo o Anuário, a Polícia Federal contava em 2014 com 11.276 componentes contra 10.042 da Rodoviária Federal, perfazendo um total de 21.318. Se contabilizarmos os integrantes do chamado “Plano Especial”, temos um total de 24.235.30

3. 4 As Forças Armadas do Brasil

As Forças Armadas do Brasil são compostas por: Exército, Marinha e Aeronáutica e são subordinadas ao Ministério da Defesa. Têm por finalidade garantir a defesa do Estado, a lei e a ordem. O número de militares na ativa em 2014 era de 327.000 (a 17ª maior tropa do mundo). 31

 Segundo levantamento do International Institute for Strategic Studies, publicado em 24/04/2015 na revista "Exame", em matéria intitulada: “Brasil gasta mais com as Forças Armadas do que Israel” 32, os gastos do Ministério da Defesa em 2014 totalizaram 74,4 bilhões de reais e a previsão para 2015 é de 81,5 bilhões. Quando o assunto é despesas, o Brasil ocupa o 11º lugar em um rank de 171 países.

Levando em conta que o país não possui ameaças externas, este efetivo que representa 76,8% do total de policiais militares, 277,9% dos policiais civis e 1.349% dos policiais federais e rodoviários federais está empenhado em atividades abstratas, como a que será tratada no próximo subtópico.

3. 4.1 A Missão da ONU para Estabilização no Haiti

 Os soldados brasileiros estão no Haiti desde 2004 liderando a Missão de Estabilização das Nações Unidas, que deve perdurar até 2016.

Com interesse em obter uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU (pretensão improvável), as tropas brasileiras ignoram a insatisfação dos haitianos, que por duas vezes aprovaram resoluções em seu Senado exigindo o fim da ocupação.

Em entrevista à Revista Fórum, em 24/03/2014, o senador haitiano Jean Charles Moise, declarou que "Quando um país mantém tropas em outro, sem que este o queira, estamos diante de uma ocupação. Não existe outra maneira de chamar.” Na ocasião, Moise, que faz oposição ao governo de Michel Martelly, fez um pedido: "O que posso dizer aos brasileiros é que suas tropas não podem nos ajudar lá. Queremos a ajuda dos brasileiros, por isso pedimos que o Brasil substitua seus tanques de guerra por tratores agrícolas".33

Não bastasse isso, o Brasil enviou também ao Haiti 18  policiais militares para integrarem o quadro da missão, oriundos de vários estados da federação tais como Alagoas e Ceará, que ostentam índice de crescimento bem elevado na taxa de homicídios. 34,35


4 A SEGURANÇA PÚBLICA NO EXTERIOR

Neste capítulo consideraremos a segurança pública através da organização das polícias em países de primeiro mundo, tais como Estados Unidos e Dinamarca. Importante ressaltar que embora seja a parte mais visível na execução do controle social, a polícia é apenas parte do complexo sistema de segurança pública de um país.

Não entraremos no mérito da recorrente questão de contraste salarial dos servidores ou de aparelhamento das policias estrangeiras com as nacionais. Já é de domínio público que o Brasil paga mal seus policiais e não aparelha suas as instituições de segurança como deveria. Antes, iremos afrontar as políticas organizacionais, que são a estrutura básica para os assuntos acima.

4. 1 A Polícia Norte-Americana

Os Estados Unidos da América adotam o princípio político de "controle local", dotando os municípios e condados de independência e autoridade para gerenciar sua polícia. A quantidade de Instituições chega a assustar: são mais de 17.000 (1.600 agências policiais federais, 12.300 departamentos de polícia municipal e de condado e 3.100 xerifados).

Entre os prós do sistema está a ausência da rivalidade que ocorre no Brasil (em detrimento da Nação) entre as polícias ostensivas (polícias militares) e as polícias judiciárias (polícias civis). Todas as polícias norte-americanas fazem o chamado "ciclo completo" (prevenção e repressão).

Dentre os contras do sistema provido por múltiplos setores policiais está o fato de que a segurança pública se torna complexa e dispendiosa, o que difere de modelos existentes em outros países do mundo, nos quais existe uma única polícia (Grécia, Japão, Suécia, etc).

A política local de segurança pública resulta em corrupção e falta de efetividade operacional das organizações policiais. Tendo isso em mente, foram criadas as polícias estaduais, que coordenam sua atuação com as polícias locais. 49 dos 50 Estados Americanos possuem polícia estadual.36

4. 2 A Polícia da Dinamarca

Escolhemos a Dinamarca como fonte de comparação porque este é um dos países mais pacíficos do mundo.41 Sua polícia é una, de caráter civil, que executa tanto a prevenção quanto a repressão em âmbito nacional, no extremo oposto do sistema norte-americano. Em 2007 foi alvo de reforma e passou de 54 distritos policiais para apenas 12, tornando-se ainda mais enxuta. É administrada diretamente pelo Estado, sendo subordinada ao Ministro da Justiça.38

Segundo informações da Eurostat39, que apresenta estatísticas sobre criminalidade e a justiça penal na União Européia (UE), os crimes violentos na Dinamarca tiveram elevação de 23% entre 2007 e 2012. O número de Roubos mais que duplicou neste período. Todavia, essa elevação não representa muita diferença, já que o país registra índices baixíssimos de ocorrências destes tipos.

Se compararmos as estatísticas de homicídio entre a Dinamarca (5.484.723 milhões de habitantes) e alguns estados brasileiros que possuem população análoga, tais como o Goiás (6.610.681),  Santa Catarina (6.819.190) e Maranhão (6.904.241), a diferença é gigantesca. Enquanto naquele país as ocorrências de homicídio registrados pela polícia entre 2002-2012 raramente ultrapassaram a casa de 100, nestes estados as ocorrências em 2012 chegaram a: 2.725 (Goiás), 816 (Santa Catarina) e 1.749 (Maranhão).39,40 (Anexo 04)


5 A REESTRUTURAÇÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA

O que se busca com a reestruturação da segurança pública é a inclusão da União na política de segurança que atualmente é administrada e financiada unicamente pelos estados. É uma excelente iniciativa do governo federal que tenta deixar de lado a velha inércia em questões de segurança.

Neste item faremos uma análise sistemática dos dados apontados nos capítulos anteriores com a intenção de fornecer subsídios à reestruturação. Iremos apresentar os principais projetos e sistemas que tramitam paralelamente com vistas à esta mesma finalidade.

5. 1 A Universidade de Segurança Pública e Desenvolvimento Social

A proposta de criação da Universidade de Segurança Pública e Desenvolvimento Social partiu do ex-ministro presidente do STF Cezar Peluzo em 2011, e deve ser encarada com seriedade por parte dos governos. Somente com um estudo aprofundado no tema obteremos políticas de segurança efetivas, que é o primeiro passo no caminho de contenção da criminalidade e da paz.

 A instituição atuará na formação de um novo tipo de profissional, um gestor público capaz de trabalhar nas diversas áreas da administração envolvidas na manutenção da ordem pública. Também poderá atuar na formação e capacitação de profissionais de entidades privadas, comunitárias ou não-governamentais relacionadas direta ou indiretamente com o tema da segurança e do desenvolvimento social.48

5. 2 Os Centros Integrados de Comando e Controle

Os Centros Integrados de Comando e Controle foram implantados durante o mundial de futebol de 2014 no Brasil e reuniram temporariamente, em um mesmo espaço nas cidades-sede, diversas instituições de segurança e outras como: Agência Brasileira de Inteligência (ABIN);  Corpo de Bombeiros;  Defesa Civil Estadual; Defesa Civil Municipal; Polícia Federal (PF) ; Polícia Rodoviária Federal (PRF); Guarda Municipal(GM); Polícia Civil (PC); Polícia Militar (PM); Polícia Científica; SAMU; Ministério das Relações Exteriores (MRE);  Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP);  ANVISA;  ANATEL;  ANAC; INFRAERO;  Receita Federal do Brasil (RFB); Ministério da Defesa; etc.

Os resultados foram positivos. Os contratempos foram decididos de maneira eficiente, ágil e efetiva, nos âmbitos operacional e tático e o tempo de resposta no atendimento à urgência e emergência foi reduzido.

O sucesso de um projeto que até algum tempo atrás parecia utópico fez com que o governo voltasse sua atenção ao recorrente problema da segurança dos estados membros. Diversas foram as ideias e possibilidades que advieram com os Centros, e muitas outras que voltaram à tona. Entre estas estão os programas de unificação e integração.

5. 3 O Programa Nacional de Segurança Pública e Cidadania

Instituído pela Lei nº 11.530/07, o Programa Nacional de Segurança Pública e Cidadania (Pronasci) marca uma iniciativa inédita no enfrentamento à criminalidade no país. É executado pela União por meio da articulação dos órgãos federais, em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal e Municípios e com a participação das famílias e da comunidade, mediante programas, projetos e ações de assistência técnica e financeira e mobilização social, visando à melhoria da segurança pública.

Entre os principais eixos do Pronasci destacam-se a valorização dos profissionais de segurança pública; a reestruturação do sistema penitenciário; o combate à corrupção policial e o envolvimento da comunidade na prevenção da violência.45

Entre os marcos do programa está a previsão de criação do Sistema Ùnico de Segurança Pública (SUSP), sob gestão do Ministério da Justiça, a fim de articular as ações federais, estaduais e municipais na área da segurança pública e da Justiça Criminal, hoje totalmente dispersas, além de promover um intercâmbio de conhecimentos técnicos e científicos entre estas. Encontra-se esboçado no Projeto de Lei nº 3734/2012, que aguarda parecer do relator na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado (CSPCCO).46

5. 4 O Projeto de Emenda à Constituição nº 33/2014

O Projeto de Emenda à Constituição (PEC) nº 33/2014, de autoria do senador Ricardo Ferraço, que já está aprovada, 47 prevê o abarcamento da Segurança Pública no rol do Artigo 23 CF, tornando-a matéria de competência comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e no Art. 24, que possibilitam União, Estados e Distrito Federal legislarem concorrentemente sobre esta.

É o início de uma série de consequências jurídicas e de fato que irão advir. Em reportagem do G1 no início do ano o Ministro da Justiça Eduardo Cardozo afirmou que o governo federal pretende traçar "diretrizes" para atuação das forças policiais em todo o país, através de um processo de integração permanente. A previsão é que até o final de 2015 estejam prontas as estruturas para o funcionamento das operações integradas. 3

5. 5 A Municipalização da Polícia

Além de estender a segurança pública à competência da União,  o Projeto 33/14 também o faz em relação aos municípios. Se aprovada, podemos dizer que haverá uma municipalização da polícia e as guardas municipais devem ganhar corpo no combate efetivo aos crimes nas cidades. A municipalização difere do controle local praticado nos Estados Unidos, onde existem polícias municipais.

Em entrevista à Gazeta do Povo, o coordenador do Centro de Estudos da Violência da UFPR, Pedro Bodê, acredita que a municipalização pode reforçar problemas já existentes no sistema de segurança pública. “Será outra polícia de ciclo incompleto”, disse. O ciclo completo de polícia (a mesma polícia previne, reprime e investiga), proposto nas PECs 51/2013 e 423/2014, é a principal bandeira em comum entre especialistas e classes policiais. Além disso, o especialista lembra que outro risco é transformar a guarda municipal em uma miniatura da Polícia Militar. Seria o risco do avanço da cultura militar.42

O Estatuto Geral das Guardas Municipais foi instituído em 2014, por meio da Lei n. 13.022. Versa sobre a criação de Guardas Municipais, coloca limites a seu efetivo, traça diretrizes para sua capacitação, amplia suas competências e traz regras para o controle dessas instituições. O percentual de municípios com Guarda Municipal no Brasil, que era de 14,1%, em 2006, passou para 17,8%, em 2012, e 19,4%, em 2014. Um dos fatores que podem ter contribuído para este resultado é a sua presença como um dos requisitos para os municípios acessarem recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. 43

Sobre o autor
Tiago Lessi

Agente Policial - Polícia Civil do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LESSI, Tiago. A reestruturação da segurança pública:: projetos e discussões para consecução. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4484, 11 out. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/43365. Acesso em: 22 dez. 2024.

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