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Testamento: os efeitos jurídicos da abertura extrajudicial

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Agenda 03/11/2015 às 16:45

4. DO TESTAMENTO CERRADO

4.1 - Definição, conceito e elementos constitutivos

O testamento cerrado contém este nome visto que visa garantir o sigilo da vontade do testador. Em regra, esta modalidade de testamento é escolhida por quem deseja manter as suas disposições de ultima vontade em segredo. Possui formalidades mais amplas, fato que atribui maior segurança ao ato. Na modalidade cerrada, o testamento apenas poderá ser elaborado e subscrito pelo testador, através instrumento particular, de cunho pessoal e sigiloso[28].

Registra-se que o testamento cerrado não é modalidade de testamento público, vez que o disponente não declara a sua vontade expressamente ao tabelião, pois o tabelião apenas valida o ato[29]. Na modalidade cerrada de testamento, o tabelião só tem conhecimento do conteúdo do testamento caso o testador escolha o tabelião para que o mesmo lavre o instrumento, vedando-o e lacrando-o no final. Ou seja, o tabelião se limita apenas a declarar a autenticidade do testamento.

O testamento cerrado só ingressará no mundo após a aprovação do tabelião. Enquanto não houver o auto de aprovação, o testamento cerrado não pode ser considerado um ato jurídico perfeito. Temos que a segurança da modalidade de testamento cerrado é inferior se comparada ao testamento público, tudo em razão do sigilo de seu conteúdo. Assim, acaso o testamento cerrado venha a ser extraviado, o termo de aprovação lavrado pelo notário não será suficiente para exarar uma certidão do seu conteúdo, diferentemente do que ocorro com o testamento público[30]. Ou seja, o tabelião apenas poderá garantir a autenticidade do testamento cerrado no caso do seu extravio, contudo, não poderá declarar nada em relação ao seu conteúdo.[31].

É imposto pela legislação, mais especificamente pelo Código Civil em seu artigo 1.872, que o testamento cerrado só poderá ser realizado por aquele que saiba ler [32]. O impedimento legal imposto às pessoas que não enxergam para expressão de ultima vontade mediante testamento cerrado visa tão somente protege-los de eventuais fraudes.

Porém, é possível que aquele que não enxerga, mas consegue escrever utilizando da linguagem em braile, tenha a sua expressão de vontade tida como válida e eficaz[33]. A legislação não impede que aquele que não saiba ler possa se valer do testamento cerrado, vez que poderá ouvir o que foi escrito por uma pessoa de sua confiança, autenticando secundariamente a origem do seu testamento mediante o auto de aprovação notarial[34].

Não existem formalidades legais exigidas para que o testador possa utilizar-se do testamento cerrado, formalidades estas que não dizem respeito ao conteúdo ou forma. O testamento cerrado, a partir do advento do Código Civil de 2002, pode ser reproduzido de forma mecânica ou eletrônica. Dispensa-se a forma manuscrita por parte do testador, porém este deverá numerar e autenticar todas as folhas que forem reproduzidas ou impressas seja com a sua assinatura ou sua rubrica[35].

Acaso o testamento seja feito a rogo deverá conter obrigatoriamente a assinatura de quem o escreveu. Não existe a obrigatoriedade de se conter data, vez que autenticação conterá a data, sendo esta data considerada para verificar a competência do tabelionado de notas, bem como a capacidade do testador, ou até mesmo a anterioridade de outro testamento. O testamento cerrado pode ser apresentado em idioma nacional ou estrangeiro, desde que a língua estrangeira seja familiar ao testador e, na ocasião da abertura do testamento, a tradução será realizada[36].

Deverá o testador realizar a entrega do seu testamento ao tabelião, declarando na ocasião que aquele é o seu testamento, requerendo a sua aprovação, devendo a referida entrega ser realizada na presença de duas testemunhas. Registra-se que o ato de entrega é personalíssimo, não sendo possível a realização da entrega ocorrer mediante procurador ou mesmo mandatário. O tabelião deverá confeccionar o instrumento de aprovação no final do testamento. O termo de aprovação tem três partes: primeira é a introdução que qualifica as partes, localidade e a data, segunda é a confirmação que recebeu o testamento para a autenticidade deste e, por fim, a terceira, que é o encerramento com leitura e a assinatura do instrumento.

Na ocasião da morte do testador, o testamento só poderá ser aberto pelo magistrado na presença de quem o apresentou, bem como do escrivão. É de grande importância verificar a integridade da cédula testamentária. Após a abertura é realizada a leitura do auto de aprovação, sendo lavrado termo circunstanciado no qual deverá conter a informação de que o testamento foi entregue ao magistrado. Após, sendo apurada a inexistência de eventuais vícios, é realizada a ouvida do Ministério Público. Após tais formalidades, o magistrado determina o cumprimento do testamento[37].

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5. DA ABERTURA EXTRAJUDICIAL DO TESTAMENTO

5.1 – Da revogação do testamento cerrado.

O testamento cerrado poderá ser revogado ou mesmo receber cláusulas adicionais, desde que seja realizado outro ato negocial, devendo ser observada a mesma forma do anterior ou ainda qualquer outra forma. No que tange à revogação do testamento cerrado, o artigo 1.972 do Código Civil, normatiza que quando o testador, ou alguém com o seu consentimento, vier dilacerar ou violar o instrumento de última vontade, o testamento será considerado como revogado[38].

Vejamos o que estabelece o artigo 1.972 do Código Civil:

“Art. 1.972. O testamento cerrado que o testador abrir ou dilacerar, ou for aberto ou dilacerado com seu consentimento, haver-se-á como revogado.”.

Porém, caso o testador tenha dilacerado ou aberto o testamento de forma acidental, há entendimento doutrinário no sentido de ser considerado como vigente o testamento, vez que a revogação apenas seria operada se a ação fosse intencional[39].

5.2 – Da responsabilidade do tabelião – Lei nº 8.935/1994.

Com relação à disposição testamentária, nota-se que o Código Civil é omisso quanto à responsabilidade dos tabeliães em razão de possíveis falhas ou omissões, isso em relação aos testamentos que eventualmente tenha oficiado.

No entanto, o artigo 22 da Lei nº 8.935/1994 – Lei dos Notários e dos Registros Públicos prevê de forma genérica a responsabilidade dos notários e oficiais de registro, tudo em relação aos eventuais danos causados a terceiros, em razão de conduta sua ou de seus prepostos. Ademais, o artigo 23 da referida lei, assevera que a responsabilidade civil do tabelião independerá da responsabilidade criminal.

5.3 – Do aproveitamento do negócio jurídico como testamento particular.

Diante da morte do testador, o testamento deverá ser apresentado à justiça, visando reproduzir os efeitos jurídicos que foram objeto da última expressão de vontade do testador.  Deverá o juiz proceder com a abertura do testamento na ocasião da sua apresentação, determinando ao escrivão que se proceda com a leitura do mesmo, sendo necessária a presença daquele que levou o testamento a juízo. Assim, recomenda-se que o juiz designe audiência especial, realizando a devida intimação ao menos do inventariante, bem como do Ministério Público[40].

Na ocasião da abertura do testamento é lavrado um ato, que deverá ser assinado por aquele que apresentou o testamento em juízo e rubricado pelo magistrado que presidiu a audiência. O Ministério Público é instado a se manifestar, em não havendo qualquer vício que enseje em nulidade ou aduza a falsidade do testamento, o magistrado determina o registro, arquivamento e cumprimento do testamento. Registra-se que o procedimento citado no parágrafo anterior não veda a propositura de eventual ação de invalidade, que pode ser movida por interessados que suscitem eventuais vícios intrínsecos ou extrínsecos. Ou seja, vícios de conteúdo e de forma[41].

Porém, o Código Civil não prevê a hipótese do testamento não atender aos requisitos extrínsecos, requisito extremamente necessário à modalidade do testamento cerrado. Porém, nesse sentido, o Código Civil satisfez às exigências legais no que tange ao testamento particular, aproveitando, por oportuno, o negócio jurídico correspondente.

Faz-se necessário destacar que o silêncio do legislador quanto ao instituto do testamento cerrado, não deve ser entendido como uma vedação legal, vez que o próprio Código Civil, em seu artigo 170, abarca a teoria da conversão substancial do negócio jurídico, teoria amplamente aplica aos institutos de Direito Privado.

Vejamos o que bem assevera o artigo 170:

“Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.”.

No que tange ao testamento cerrado, os requisitos relativos ao termo de aprovação visam tão somente trazer a garantia da autenticidade do negócio jurídico, bem como de trazer a definição de sua data. Em decorrência disso, eventual irregularidade irá comprometer a garantia jurídica, inviabilizando a validade do testamento. Porém, acaso o ato reúna os elementos essências ao testamento privado, o valor da segurança jurídica do ato ensejará no aproveitamento da declaração de última vontade. Registra-se que não estamos falando de uma conversão do negócio jurídico nulo, vez que o negócio jurídico nulo não produz qualquer efeito, ressalvando os casos de putatividade[42].

5.4 – Da possibilidade da abertura extrajudicial do testamento com o consentimento dos herdeiros

O Código Civil prevê em seu artigo 1.972, a hipótese do testador ou uma terceira pessoa sem sua autorização, promover a abertura do testamento cerrado ou inutilizá-lo materialmente. O Código Civil prevê, por consequência, a absoluta presunção de revogação. A revogação abarca diversas possibilidades, entre as quais, a simples abertura do testamento cerrado, ou mesmo destruição do testamento por qualquer processo físico ou químico ou ainda lançando-o ao mar ou em uma floresta[43].

A proposta de estudo do tema em destaque, a abertura extrajudicial do testamento com o consentimento de todos os herdeiros, esbarra nas hipóteses legais que implicam na revogação do testamento, seja ele publico ou particular. A rigor, como bem determina a lei, a simples abertura do testamento cerrado, implica em sua revogação.

O testamento é ato solene de deve ser protegido evitando qualquer tipo de violação. O legislador visou tão somente tutelar o valor da segurança jurídica. Assim, o beneficiário de um testamento que venha a ser destruído, poderá requerer em juízo, que seja aberta a sucessão, devendo provar que a intenção do testador era beneficiá-lo, e que a destruição do testamento se deu por motivos alheios a vontade do testador. Registra-se que aquele que destrói, oculta ou suprime, qualquer tipo de documento, seja ele público ou privado, visando benefício pessoal ou de terceiro, ou ainda o prejuízo alheio, deverá incorrer nas penas do artigo 305 do Código Penal[44].

Quanto ao rompimento do testamento, necessário dizer que o rompimento é a desconstituição de testamento válido, em razão de hipóteses previstas no Código Civil. A revogação não deriva diretamente da vontade do testador. Porém, o testador pode contribuir para o evento do rompimento do testamento, a exemplo, adotando um filho após emissão de expressão de ultima vontade. Para que o rompimento seja descaracterizado, não se faz necessário que o testador a parcela legítima dos seus herdeiros necessários, vez que a tutela de tais herdeiros será realizada com a dedução das disposições testamentárias[45].

Ademias convém salientar, lastreado no entendimento da legislação brasileira vigente, que se torna inviável homologar judicialmente a partilha efetuada extrajudicialmente, isto quando for necessária a abertura de inventário judicial, em razão da existência de disposição de última vontade, ou seja, em razão da existência de testamento.

O Código de Processo Civil, em seu artigo 982, dispõe que havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.

Da leitura do artigo supra transcrito, é possível chegar a duas conclusões. A primeira, é que em havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial. Já a segunda, em havendo testamento, e efetuado o registro, o inventário será judicial, mas a partilha de bens poderá ser feita por instrumento público e deverá ser homologada judicialmente.

Sobre o autor
Cícero Mendes

Advogado e Consultor Jurídico. Possui graduação em Direito pela Faculdade Marista do Recife e Pós-graduação em nível de especialização em Direito de Família e Sucessões pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Possui experiência nos ramos de Direito Público e Direito Privado, com atuação lato sensu em Direito Civil e expertise em Direito de Família e Sucessões. Servidor Público Estadual.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE JÚNIOR, Cícero Mendes. Testamento: os efeitos jurídicos da abertura extrajudicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4507, 3 nov. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/43916. Acesso em: 24 nov. 2024.

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