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A responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica nos crimes contra o meio ambiente: exame dos institutos materiais e processuais

Agenda 13/11/2015 às 12:05

Este artigo discute, de forma breve, alguns pontos importantes envolvendo o tema da responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica.

A responsabilidade penal da pessoa jurídica tem como comando de criminalização o disposto no art. 225, §3º da CF/88. Por sua vez, a Lei 9.605/98 em seu artigo 3º regulamentou o assunto.

Quem argumenta pela não responsabilidade penal da pessoa jurídica, alega resumidamente que a pessoa jurídica não tem vontade, por isso, não pode cometer nenhum tipo de ato ilícito. Por essa ótica, quem comete o crime  não é o ente, mas sim os sócios ou diretores. Filiam-se a essa corrente, penalistas de renome como Nelson Hungria, Julio Fabrini Mirabete e Rene Ariel Doti.

Os que defendem a responsabilização penal da pessoa jurídica adotam um critério jurídico-normativo, ou seja, as pessoas jurídicas podem ser responsabilizadas porque a Constituição e a Lei 9.605/98 autorizam. Juristas como Paulo Leme Afonso de Machado, Edis Milarés, Vladimir Passos, dentre outros,  defendem essa corrente.

Entendemos que a corrente que defende a responsabilização penal da pessoa jurídica em delitos ambientais é a melhor, pois está fundada em um preceito constitucional, nos termos do art. 225, §3º da CF/88.

As penas da pessoa jurídica possuem regramento próprio distinto das pessoas jurídicas e estão previstas no art. 21 da Lei 9.605/98. Os arts. 22, 23 e 24 da lei também trazem a previsão de alguns institutos penais, por isso, entendemos ser necessário a transcrição dos mesmos:

Art. 21. As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:

I - multa;

II - restritivas de direitos;

III - prestação de serviços à comunidade.

Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:

I - suspensão parcial ou total de atividades;

II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;

III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.

§ 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente.

§ 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar.

§ 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos.

Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em:

I - custeio de programas e de projetos ambientais;

II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas;

III - manutenção de espaços públicos;

IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.

Art. 24. A pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido nesta Lei terá decretada sua liquidação forçada, seu patrimônio será considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional.

Feita a análise dos institutos de direito material, passemos a analisar alguns aspectos processuais.

Durante muito tempo a jurisprudência do STJ, entendeu que o Ministério Público ao oferecer a denúncia para abertura do processo penal deveria incluir no pólo passivo além da pessoa jurídica, também os sócios. A dupla imputação seria obrigatória.

Nesse sentido:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE QUALIFICAR-SE A PESSOA JURÍDICA COMO PACIENTE NO WRIT. SISTEMA OU TEORIA DA DUPLA IMPUTAÇÃO. DENÚNCIA. INÉPCIA NÃO VERIFICADA. I - A orientação jurisprudencial desta Corte firmou-se no sentido de não se admitir a utilização do remédio heróico em favor de pessoa jurídica (Precedentes). II - Admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício, uma vez que "não se pode compreender a responsabilização do ente moral dissociada da atuação de uma pessoa física, que age com elemento subjetivo próprio" cf. Resp nº 564960/SC, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ de 13/06/2005 (Precedentes). III - A denúncia, a teor do que prescreve o art. 41 do CPP, encontra-se formalmente apta a sustentar a acusação formulada contra o paciente, porquanto descrita sua participação nos fatos em apuração, não decorrendo a imputação, de outro lado, pelo simples fato de ser gerente da pessoa jurídica ré.Ordem parcialmente conhecida e, nesta parte, denegada.(HC 93.867/GO, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 08/04/2008, DJe 12/05/2008).

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Desse modo, a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de exigir a dupla imputação em crimes ambientais para o recebimento da denúncia, sob pena de inépcia da inicial.

Entretanto, o STF, em recente decisão de lavra da min. Rosa Weber, entende que não é necessário a dupla imputação para o oferecimento de denúncias em crimes ambientais.

A ementa da decisão em tela ficou assim:

EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PENAL. CRIME AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. CONDICIONAMENTO DA AÇÃO PENAL À IDENTIFICAÇÃO E À PERSECUÇÃO CONCOMITANTE DA PESSOA FÍSICA QUE NÃO ENCONTRA AMPARO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação. 2. As organizações corporativas complexas da atualidade se caracterizam pela descentralização e distribuição de atribuições e responsabilidades, sendo inerentes, a esta realidade, as dificuldades para imputar o fato ilícito a uma pessoa concreta. 3. Condicionar a aplicação do art. 225, §3º, da Carta Política a uma concreta imputação também a pessoa física implica indevida restrição da norma constitucional, expressa a intenção do constituinte originário não apenas de ampliar o alcance das sanções penais, mas também de evitar a impunidade pelos crimes ambientais frente às imensas dificuldades de individualização dos responsáveis internamente às corporações, além de reforçar a tutela do bem jurídico ambiental. 4. A identificação dos setores e agentes internos da empresa determinantes da produção do fato ilícito tem relevância e deve ser buscada no caso concreto como forma de esclarecer se esses indivíduos ou órgãos atuaram ou deliberaram no exercício regular de suas atribuições internas à sociedade, e ainda para verificar se a atuação se deu no interesse ou em benefício da entidade coletiva. Tal esclarecimento, relevante para fins de imputar determinado delito à pessoa jurídica, não se confunde, todavia, com subordinar a responsabilização da pessoa jurídica à responsabilização conjunta e cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual. 5. Recurso Extraordinário parcialmente conhecido e, na parte conhecida, provido.

(RE 548181, Relator(a):  Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014)

Portanto, na presente decisão houve um novo rumo no que tange a esse aspecto processual. Agora, não é necessário mais o Promotor de Justiça entrar com a ação penal simultaneamente contra a pessoa jurídica e os sócios, mas poderá ingressar somente contra a pessoa jurídica, pois segundo o entendimento da ministra, o comando de criminalização do art. 225, § 3º da CF/88 não acolheu a dupla imputação.

Entendemos que a responsabilidade penal da pessoa jurídica é um importante instrumento de proteção ao meio ambiente, que é um direito fundamental de grande importância para as presentes e futuras gerações.

REFERÊNCIAS

Sobre o autor
Márcio de Almeida Farias

Mestre em Direitos Fundamentais pela Universidade da Amazônia. Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Estácio de Sá. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Pará. Promotor de Justiça no Ministério Público do Estado do Pará.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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