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A Convenção nº 132 da OIT e seus efeitos no ordenamento jurídico brasileiro

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Agenda 29/10/2003 às 00:00

RESUMO

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) é uma agência multilateral especializada ligada à Organização das Nações Unidas (ONU) em busca da promoção de melhorias nas condições de trabalho no mundo. Estabelece obrigações para os Estados Membros que ratificam suas convenções internacionais do trabalho. Esses instrumentos internacionais versam acerca da proteção do trabalho humano.

Dentre as inúmeras convenções internacionais do trabalho adotadas pela Conferência Internacional do Trabalho, merece realce a norma internacional que aborda o instituto das férias anuais remuneradas. O interessante volta-se, dessa forma, para a análise da Convenção n. 132 da OIT. Esse texto convencional foi devidamente incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro, através do Decreto n. 3.197, de 06 de outubro de 1999, adquirindo o status de lei ordinária. Em determinados aspectos - que serão analisados pormenorizadamente no decorrer do presente artigo - a Convenção n. 132 da OIT revelou-se mais benéfica aos trabalhadores. Sendo assim, a norma internacional da mesma hierarquia e posterior à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), é possível afirmar que o texto convencional promoveu significativas alterações na legislação pátria, embora ainda exista resistência em sua aplicação pelos operadores do Direito de certos estados brasileiros.

PALAVRAS-CHAVE: Férias Anuais Remuneradas; Convenção n. 132 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1. AS NORMAS INTERNACIONAIS E O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO; 2. A CONVENÇÃO N. 132 DA OIT E A CLT; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


INTRODUÇÃO

A Convenção n. 132 da OIT foi concluída em 24 de junho de 1970, em Genebra, e sua vigência internacional ocorreu em 30 de junho de 1973. No Brasil, foi aprovada pelo Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo n. 47, de 23 de setembro de 1981. O Governo Federal depositou o Instrumento de Ratificação do aludido tratado internacional em 23 de setembro de 1998, passando a vigorar a partir de 23 de setembro de 1999. O Decreto de Promulgação n. 3.197, de 05 de outubro de 1999, gerou sua eficácia no território nacional (artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil).

Com a incorporação da norma internacional ao ordenamento jurídico brasileiro, por corolário lógico, surgiram algumas alterações no Capítulo IV da CLT. O novo instrumento estabeleceu, por exemplo, que o empregado terá direito a férias proporcionais, após seis meses no serviço, no momento da cessação do contrato de trabalho, independentemente do motivo da rescisão contratual; que as ausências ao trabalho por motivos alheios à vontade do empregado deverão ser contadas como dias de serviço; que os feriados oficiais ou costumeiros não serão computados no período de gozo; que o fracionamento das férias poderá ser autorizado pela lei nacional, desde que um dos períodos não seja inferior a duas semanas; entre outros direitos.

Nesse contexto, o presente artigo tem como objetivo geral a verificação das diversas modificações ocorridas no instituto das férias anuais remuneradas em decorrência da vigência da Convenção n. 132 da OIT no plano interno.

Para desenvolver o estudo, dividiu-se o trabalho em duas etapas. Procurou-se analisar, inicialmente, o procedimento de incorporação de uma norma internacional ao sistema jurídico pátrio e, em seguida, as alterações efetivadas no Capítulo IV da CLT advindas do texto convencional. Buscou-se, também, demonstrar a efetividade do tratado em questão no âmbito jurisdicional, através de determinados julgados encontrados nos Tribunais Regionais do Trabalho e na Corte Trabalhista Superior.


1. AS NORMAS INTERNACIONAIS E O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Os principais instrumentos de ação da OIT são as recomendações internacionais do trabalho e as convenções internacionais do trabalho. Essas normas distinguem-se no que concerne aos efeitos jurídicos gerados. As recomendações internacionais do trabalho possuem um apelo formal de menor intensidade e, por conseguinte, não obrigam os Estados Membros. As convenções internacionais do trabalho, diversamente, destinam-se a constituir regras gerais e obrigatórias para os Estados Membros que as incorporam ao direito interno.

Classificam-se as convenções internacionais do trabalho em tratados multilaterais, abertos e de caráter normativo. Multilaterais, porque podem ter um número ilimitado de partes; abertas, porque podem ser ratificadas, sem restrição de prazo, por qualquer dos Estados-Membros, ainda que determinadas nações não integrassem a OIT quando da aprovação do tratado; de caráter normativo, porque contêm normas cujo destino é a incorporação ao direito interno dos países que manifestaram sua adesão ao respectivo tratado [1].

Cumpre registrar que as convenções internacionais do trabalho tratam acerca da proteção do trabalho humano, tanto em países desenvolvidos quanto em países em desenvolvimento. Posteriormente à elaboração dos textos convencionais no decorrer da Conferência Internacional do Trabalho, todos os Estados Membros são cientificados sobre o inteiro teor dessas normas, para a possibilidade de ratificação. Essa ratificação consiste no estabelecimento no plano internacional do consentimento dos Estados em obrigar-se pelas convenções internacionais do trabalho.

Estabelece o artigo 19, em seu § 5º, alínea "a", da Constituição da OIT, a obrigação de submissão das normas internacionais laborais à autoridade competente, no prazo de doze meses, a contar do encerramento da sessão da Conferência Internacional do Trabalho, prorrogável por mais seis meses. A OIT afirma que o prazo possui a finalidade das autoridades competentes, quanto à convenção a transformarem em lei ou tomarem medidas de outra natureza [2].

No ordenamento jurídico brasileiro, incumbe ao Congresso Nacional resolver, em caráter definitivo, acerca da aprovação ou não das convenções advindas da OIT. Nesse sentido, o artigo 49, em seu inciso I, da Constituição Federal, estabelece: "É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional". A necessidade de "referendo do Congresso Nacional" está prevista no artigo 84, em seu inciso VIII, da Carta Magna, nos seguintes termos: "Compete privativamente ao Presidente da República: [...] VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional".

Antônio Paulo Cachapuz Medeiros assevera a existência de um nexo entre os dispositivos em tela. Consoante o mesmo, há que se considerar que os artigos fazem parte do mesmo título da Constituição Federal e, ainda, que o preceito contido no artigo 49, em seu inciso I, da Lei Maior, confere competência ao Congresso para resolver sobre tratados internacionais, dando ênfase aos que acarretem encargos, gravames, ônus financeiros, para o patrimônio nacional [3].

Somente após a aprovação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, através de Decreto Legislativo, compete ao Presidente da República promover a ratificação das convenções internacionais do trabalho, enviando o respectivo instrumento ao Diretor-Geral da OIT, que fará a devida comunicação ao Secretário Geral da ONU para fins de registro. Essa ratificação é um ato de direito internacional. Com o escopo da garantia da executoriedade dos textos convencionais no âmbito interno, é expedido um Decreto de Promulgação pelo Governo Federal, indicando o Decreto Legislativo que aprovou determinada norma internacional laboral, a data do registro de sua ratificação e o dia em que a mesma começará a produzir efeitos. Salienta-se, nessa esteira, que o Decreto de Promulgação visa à divulgação das normas internacionais que se incorporam à legislação interna no território nacional, uma vez que é devidamente publicado no Diário Oficial da União. Verifica-se, assim sendo, que a incorporação dos tratados internacionais à ordem jurídica brasileira é um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de vontade do Poder Legislativo e do Poder Executivo.

Referentemente à ratificação, importa assinalar que os efeitos jurídicos desse ato internacional decorrem da organização jurídico-constitucional adotada pelos diversos países. A discussão concentra-se na prevalência da concepção monista ou da concepção dualista em relação às ordens jurídicas. A doutrina monista defende que a norma ratificada incorporaria automaticamente à legislação interna do país, tão logo vigente externamente, independentemente da prática de atos internos. A doutrina dualista, por sua vez, sustenta que a ratificação de um tratado internacional consistiria apenas na responsabilidade perante a seara internacional, exigindo-se a edição de leis próprias no direito interno.

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Constata-se a existência de controvérsia quanto à ordem jurídica adotada no Brasil. Tudo indica a adoção da doutrina monista, em virtude da qual as convenções internacionais do trabalho ratificadas complementam, alteram ou revogam o direito interno, desde que em vigência no plano internacional e se tratem de normas self-executing. Essa é a opinião de Arnaldo Sussekind. Assegura o autor que as convenções auto-aplicáveis "não requerem regulamentação complementar para serem aplicadas pelos Estados que as ratificam" [4].

Mister ressaltar a posição hierárquica das convenções internacionais do trabalho face ao direito interno. Sabe-se que a Constituição Federal Brasileira silenciou acerca do status dos tratados internacionais. Convém interpretar analogicamente, dessa forma, dispositivos constantes na Carta Magna relacionados à hierarquia dos textos convencionais. O artigo 102, em seu inciso III, alínea "b", reza que compete ao Supremo Tribunal Federal, em grau de recurso extraordinário, julgar as causas decididas em única ou última instância, para declarar a inconstitucionalidade de tratado, demonstrando que o mesmo fica hierarquicamente abaixo da Constituição Federal. O artigo 105, em seu inciso III, alínea "a", determina que compete ao Superior Tribunal de Justiça julgar, em grau de recurso especial, as decisões que contrariem tratado, ou negar-lhes vigência, indicando a equivalência entre os tratados e as leis ordinárias.

O Recurso Extraordinário n.º 80.004-SE [5] consagrou o entendimento de que entre tratados internacionais e leis internas brasileiras, de caráter ordinário, existe relação de igualdade normativa e de que essas normas internacionais, portanto, submetem-se à regra lex posterior derogat priori. Mantendo essa linha, o Supremo Tribunal Federal pronunciou recentemente:

[...] os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias, havendo, em conseqüência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa [6].

Embora as convenções internacionais do trabalho derroguem a legislação anterior em contrário, segundo o princípio contido no 2º, em seu § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil, as mesmas não podem ser invocadas com o escopo de excluir medidas mais vantajosas imperantes no país. O artigo 19, em seu § 8º, da Constituição da OIT, declara que a adoção de uma convenção não importa na alteração ou revogação de qualquer lei, costume ou acordo que garanta aos trabalhadores condições mais favoráveis.

Prevalece no campo do Direito Internacional do Trabalho, pois, o princípio da norma mais favorável ao trabalhador. Em decorrência do referido princípio, surgiram as teorias do conglobamento e da acumulação. Pela primeira teoria, diante de normas diversas, haveria de ser analisada qual delas seria a mais benéfica ao empregado, tomando por parâmetro a totalidade de seu conteúdo. Pela segunda teoria, ao revés, o hermeneuta poderia somar as vantagens dos instrumentos jurídicos em conflito, ou seja, se valer de um artigo de um sistema legal concomitantemente a outro mais favorável do sistema jurídico diverso. Nesse estudo, adotou-se a teoria da acumulação, aplicando-se os dispositivos mais favoráveis tanto do texto convencional quanto da norma celetista.

Demonstrados os aspectos diversos relativos ao procedimento de incorporação de uma norma internacional ao direito brasileiro, mostra-se fundamental a análise da convenção internacional do trabalho que trata sobre as férias anuais remuneradas. Serão sintetizadas, adiante, as principais modificações ocorridas no Capítulo IV da CLT em decorrência da vigência da Convenção n. 132 da OIT no plano interno.


2. A CONVENÇÃO N. 132 DA OIT E A CLT

A Convenção n. 132 da OIT, consoante exposto anteriormente, diz respeito ao instituto das férias anuais remuneradas, buscando a garantia do valor qualidade de vida do ser humano inserido na cadeia produtiva. O texto convencional sub examen determinou mecanismos de proteção mais amplos à saúde dos trabalhadores. Com a aprovação do Decreto n. 3.197, de 05 de outubro de 1999, tornou-se imprescindível o cumprimento dessa norma internacional devidamente inserida no ordenamento jurídico pátrio.

Discorrendo sobre a incorporação da Convenção n. 132 da OIT ao direito brasileiro, ensina Osmair Couto:

"[...] A Convenção nº 132 da OIT reviu a Convenção nº 56 e foi concluída em junho de 1970, vigendo no âmbito internacional a partir de 30 de junho de 1973. O Congresso Nacional aprovou-a pelo Decreto Legislativo nº 47, em 23 de setembro de 1981, foi ratificada pelo Brasil em 1997, tendo sido depositado o instrumento de ratificação junto ao Diretor da RIT em 23.09.1998.

Foi promulgada pelo Decreto Presidencial nº 3.197 de 1999, publicado no dia 05 de outubro do mesmo ano, que circulou em 06.10.1999, satisfazendo o iter procedimental constitucionalmente exigido para a incorporação da norma internacional (art. 49, I e 84, IV e VIII da CR/88), passando, a partir de então, a produzir efeitos na ordem jurídica interna, uma vez que as normas internacionais internalizadas ao nosso ordenamento jurídico adquirem status de lei ordinária" [7].

Possui a Convenção n. 132 da OIT dois objetivos básicos: 1º - proteger a saúde do trabalhador e permitir-lhe recuperar a energia física que tinha investido no trabalho durante o ano; 2º - forma de retribuir o aumento de produtividade, dando mais tempo de ócio aos trabalhadores [8].

O texto convencional em questão é composto de 23 (vinte e três artigos). Logo em seu início, estabelece que a norma internacional é aplicável a todas as pessoas, excetuando-se os marítimos (artigo 02). Justifica-se a exclusão dos marítimos sob o aspecto de que essa categoria profissional tem condições especiais de trabalho. Existem circunstâncias peculiares na prestação de seus serviços desenvolvidos a bordo do navio. A própria OIT elaborou convenções internacionais do trabalho sobre as férias remuneradas dos marítimos.

O artigo 02, item 02, da Convenção n. 132 da OIT, possibilita a exclusão de determinadas categorias profissionais, desde que a aplicação dessa norma internacional cause problemas particulares de execução ou de natureza constitucional ou legislativa de certa importância. O Brasil não optou pela exclusão de qualquer categoria. A parte final do artigo 1º do Decreto de Promulgação n. 3.197, de 05 de outubro de 1999, nesse contexto, determina que a norma deverá ser executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém.

O artigo 03, item 03, do texto convencional, prescreve que a duração das férias não deverá, em caso algum, ser inferior a três semanas de trabalho por ano de serviço. A norma celetista, em seu artigo 130, dispõe período superior (30 dias corridos, quando o empregado não houver faltado ao serviço mais de cinco vezes e 24 dias corridos, quando o obreiro houver tido de seis a quatorze faltas). Os incisos III e IV, do artigo 130, da CLT, em contrapartida, prevêem a duração das férias inferior a três semanas quando o empregado não comparecer ao trabalho no período igual ou superior a quinze vezes injustificadamente. A aplicação desses últimos dispositivos citados está prejudicada, uma vez que o texto convencional determina o período mínimo de três semanas em qualquer hipótese, não estando vedado o gozo das férias em certo lapso temporal superior ao previsto na norma internacional.

Consta no artigo 04, item 01, no artigo 05, itens 01 e 02, e no artigo 11, da Convenção n. 132 da OIT, que toda pessoa terá direito a férias proporcionais, desde que adquirido um período mínimo de serviço, no curso de um ano determinado, independentemente do motivo da rescisão contratual. A duração mínima de tal período de serviço não poderá ultrapassar a seis meses, cabendo a autoridade competente ou o órgão apropriado de cada país determiná-la.

Observa-se que, no ordenamento jurídico interno, os dispositivos acerca do direito à proporcionalidade estão em desconformidade com a norma internacional. Segundo o artigo 147 da CLT, o empregado terá direito a férias proporcionais, nos primeiros 12 meses de contrato, somente quando for despedido sem justa causa ou cujo contrato de trabalho se extinguir em prazo determinado. Constata-se, nessa linha, a exclusão do direito à proporcionalidade para o dispensado por justa causa e para os demissionários com menos de doze meses de serviço (vide Súmula n. 261 do TST [9]). Reza o artigo 146, em seu parágrafo único, da CLT, que cessado o contrato de trabalho, após doze meses de serviço, o empregado, desde que não haja sido demitido por justa causa, terá direito à remuneração relativa ao período incompleto de férias, de acordo com o artigo 130, na proporção de 1/12 (um doze avos) por mês de serviço ou fração superior a quatorze dias.

Os artigos supra mencionados apresentam controvérsias. O tratado internacional não retira o direito a férias proporcionais aos empregados que deram justa causa à extinção do contrato de trabalho (artigo 11) e aos trabalhadores que saem, espontaneamente, do emprego. O texto convencional não associou o direito à remuneração das férias à causa de extinção do contrato de trabalho. Com a vigência da Convenção n. 132 da OIT, assim sendo, o contrato de trabalho encerrado, a qualquer título, a partir do sexto mês de serviço, dá ao empregado o direito à proporcionalidade. Antes deste lapso temporal, vale a regra celetista: terá direito às férias proporcionais o empregado despedido sem justa causa e cujo contrato a termo extinguir pelo decurso natural do prazo.

Vale transcrever, por oportuno à espécie, os entendimentos sustentados pelos Tribunais Regionais do Trabalho, nos seguintes termos:

"DAS FÉRIAS PROPORCIONAIS. São devidas férias proporcionais quando o empregado pede demissão. Como a lei não dispõe expressamente sobre essa questão, a mesma deve ser resolvida mediante a compreensão do ato jurídico praticado e do instituto das férias vencidas e proporcionais. Existe expressamente a obrigação de pagar as férias proporcionais, quando o empregado pede demissão após completar um ano de serviço. Não existe qualquer fundamento plausível ou relevante que justifique o não reconhecimento do mesmo direito antes do empregado completar um ano de emprego. Quando o empregado pede demissão do emprego, exerce um direito potestativo que lhe confere o ordenamento jurídico, que somente lhe exige a obrigação de pré-avisar o seu empregador, como ocorre em todo tipo de contrato por prazo indeterminado. Assim, não pode sofrer, em decorrência do exercício de um legítimo direito, qualquer perda ou punição, salvo a que resultar do descumprimento da obrigação de pré avisar. Esse é o entendimento do acórdão a seguir reproduzido: ‘Diante do vazio da legislação consolidada, a interpretação mais condizente com a nossa realidade trabalhista deve ser construída no sentido de mandar pagar as férias proporcionais a empregado que se demite com menos de um (1) ano na empresa. A tradição legal brasileira transforma no dever de indenizar, toda a vez que o instituto das férias se frustre, excepcionada naturalmente a hipótese de contrato de emprego rompido por justa causa, na faixa do período aquisitivo’ (TRT-11.a Reg. Proc. RO-144/84, julg. 27-06-84; Rel. Juiz Benedito Cruz Lyra).

Se antes do advento da Convenção 132 da OIT era perfeitamente sustentável a tese de que o empregado com menos de um ano de serviço que pede demissão (fl. 97) faz jus às férias proporcionais, por inexistência de restrição expressa na CLT, com muito mais razão após promulgação dessa Convenção Internacional. A Convenção 132 da OIT, foi promulgada e passou a viger no Brasil a partir da publicação do Decreto 3.197, de 05 de outubro de 1999. No caso dos autos, o dispositivo que favorece à tese proposta é o presente no artigo 11 que desvincula as férias proporcionais do motivo da rescisão contratual, determinando apenas que toda pessoa empregada que tenha completado o período mínimo de serviço (estabelece um mínimo de seis meses no artigo 5.2) deverá ter direito ou a um período de férias remuneradas proporcional, ou indenização compensatória. Por tais argumentos, o reclamante é credor de férias proporcionais acrescidas de 1/3" [10].

"FÉRIAS PROPORCIONAIS AO OBREIRO DEMISSIONÁRIO COM MENOS DE ANO DE SERVIÇO. CONVENÇÃO 132 DA OIT. Ao obreiro que pede demissão com menos de ano de serviço são devidas as férias proporcionais, por força do art. 11 da Convenção 132 da OIT, já incorporada ao ordenamento pátrio (Dec. 3197/99)" [11].

"CONVENÇÃO Nº 132 DA OIT. JUSTA CAUSA. DIREITO ÀS FÉRIAS PROPORCIONAIS. A partir de 06.10.1999, data da publicação no DJU do Decreto nº 3.197, através do qual foi promulgada a Convenção nº 132 da OIT, na rescisão contratual, independentemente de sua causa, todo o trabalhador que tiver prestado trabalho por um período mínimo de seis meses terá direito ao recebimento de férias proporcionais" [12].

"FÉRIAS. INCLUSÃO DOS FERIADOS. CONVENÇÃO Nº 132 DA OIT. As Convenções Internacionais são incorporadas ao sistema jurídico pátrio no mesmo nível hierárquico da lei ordinária, revogando as disposições desta sempre que se afigurarem incompatíveis. Como as disposições dos artigos 146, parágrafo único, e 147 da CLT contrariam, em parte, as disposições do artigo 11 da Convenção nº 132 da OIT, devem estas últimas prevalecer. Assim, a partir de 06.10.1999, data da publicação no DJU do Decreto nº 3.197, de 5 de outubro de 1999, na rescisão contratual, independentemente de sua causa, todo o trabalhador que tiver prestado trabalho por um período mínimo de seis meses terá direito ao recebimento de férias proporcionais, independentemente da causa da rescisão contratual. Tal alteração na sistemática de pagamento das férias por ocasião da rescisão contratual não afronta à logicidade do sistema legal que rege a dispensa por justa causa. No sistema vigente anteriormente à incorporação das disposições da Convenção em apreço à legislação nacional, o empregado dispensado por justa causa já detinha o direito de receber o pagamento de forma indenizada das férias cujo período aquisitivo já estivesse vencido. A alteração implementada nada mais fez do que reduzir o período aquisitivo de férias, que antes era de um ano, para seis meses" [13].

O Tribunal Superior do Trabalho assim manifestou-se recentemente:

"DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA. CLÁUSULAS. FÉRIAS PROPORCIONAIS. EMPREGADO QUE SE DEMITE COM MENOS DE UM ANO DE TEMPO DE SERVIÇO. 1. Defere-se cláusula que assegura férias proporcionais ao empregado que se demite com menos de um ano de tempo de serviço, pois se trata de direito introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Convenção nº 132 da Organização Internacional do Trabalho, vigente no Brasil desde setembro de 1999. 2. Recurso ordinário interposto pelos Sindicatos representantes da categoria profissional parcialmente provido" [14].

Visualiza-se com clareza que essas decisões judiciais estão de acordo com o disposto na Convenção n. 132 da OIT, uma vez que o empregado terá direito à proporcionalidade, independentemente da modalidade de rescisão contratual, desde que tenha trabalhado pelo período mínimo de seis meses no serviço.

O artigo 05, item 04, da Convenção n. 132 da OIT, disciplina que as faltas ao trabalho por motivos independentes da vontade individual do empregado interessado, tais como faltas em decorrência de doenças, de acidente ou de licença para gestante, não poderão ser computadas para efeito de férias anuais remuneradas mínimas. O referido dispositivo está em perfeita sintonia com o previsto no artigo 131, em seu inciso III, da CLT.

O artigo 133, em seu inciso II, da CLT, deverá ser analisado no caso concreto. Esse dispositivo determina que não terá direito a férias o empregado que permanecer em gozo de licença, com percepção de salário, por mais de trinta dias. Ocorre que o tempo de desligamento não poderá ser considerado como férias caso a licença seja proveniente de motivo independente da vontade do obreiro.

O artigo 05, item 04, da norma internacional, colide com o artigo 133, em seu inciso III, da CLT. Com a vigência da Convenção n. 132 da OIT no Brasil, o empregado que deixar de trabalhar, com percepção do salário, por mais de trinta dias, em virtude de paralisação parcial ou total dos serviços da empresa, terá direito a férias anuais remuneradas. Verifica-se que, nessa hipótese, a falta é proveniente de motivo independente da vontade do trabalhador. O período de afastamento, destarte, não poderá ser computado para efeito de férias.

Igualmente, há incompatibilidade com o artigo 133, em seu inciso IV, da CLT, que assim determina: "não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo: [...] tiver percebido da Previdência Social prestações de acidente de trabalho ou de auxílio-doença por mais de seis meses, embora descontínuos". Georgenor de Sousa Franco Filho, comentando sobre a matéria, assim preleciona:

"[...] Rodrigues Pinto havia apontado a injustiça da CLT nesse aspecto, assinalando que chega a ser cruelmente irônico dizer-se que o empregado em inatividade por doença ou por acidente do trabalho gozou férias.

Pelo contrário, acentua o jurista baiano, são comuns os casos em que a alta do auxílio-doença ou acidentário devolve à sociedade indivíduos de tal modo abalados psicologicamente que, aí sim, clamam por um repouso reparador do trauma sofrido. É profundamente injusto equiparar o leito do enfermo à rede do ocioso" [15].

Com efeito, não remanescem dúvidas de que o inciso IV, do artigo 133, da norma celetista, foi derrogado, pois o tempo em que o empregado está sem trabalhar, em razão de acidente de trabalho ou de auxílio-doença, não está relacionado com sua vontade individual.

O artigo 06 do texto convencional exclui os feriados oficiais ou costumeiros do cômputo dos dias de férias anuais remuneradas. Através dessa nova redação, por exemplo, o empregado que gozar as férias no mês de outubro, terá direito ao acréscimo de um dia ao término dos trinta dias corridos, diante do feriado de 12 de outubro (Nossa Senhora Aparecida).

Todos os feriados nacionais, estaduais e municipais, bem como os costumeiros serão observados. Os feriados nacionais são 1º de janeiro (Paz), 21 de abril (Tiradentes), 1º de maio (Trabalhador), 07 de setembro (Pátria), 12 de outubro (Nossa Senhora Aparecida), 15 de novembro (República), 25 de dezembro (Natal) e o dia das eleições. O feriado estadual é a data do Estado determinada em lei estadual. Os feriados municipais são a sexta-feira da Paixão, Corpus Christi, Finados e o dia da fundação do município. Os feriados costumeiros são aqueles gozados na prática, como a terça-feira de Carnaval.

O artigo 07 da Convenção n. 132 da OIT trata sobre a remuneração das férias. Esse dispositivo não modificou a legislação brasileira. O artigo 142 da CLT prevê o direito à remuneração normal do trabalhador em descanso e o artigo 145 da norma consolidada estabelece que o pagamento dessa remuneração será efetuado até dois dias antes do início do período de descanso. Imprescindível ressaltar que o sistema jurídico pátrio é mais benéfico e estabelece o acréscimo de um terço ao salário normal (artigo 7º, em seu inciso XVII, da Constituição Federal), entre outros direitos.

O artigo 08, item 01, do texto convencional, estipula que o fracionamento do período de férias anuais remuneradas poderá ser autorizado pela autoridade competente ou pelo órgão apropriado de cada país. A norma pátria procede nesse sentido nos parágrafos do artigo 134.

Salvo estipulação em contrário contida em acordo que vincule o empregador e a pessoa empregada em questão, e desde que a duração do serviço dessa pessoa lhe dê o direito a tal período de férias, uma das frações do período deverá corresponder, pelo menos, a duas semanas de trabalho ininterrupto. Um dos períodos de férias, portanto, deverá ser necessariamente quatorze dias. Nessa exigência, o artigo 134, em seu § 1º, da CLT, foi derrogado, visto que o dispositivo estatui que um dos períodos não poderá ser inferior a dez dias. Homero Batista Mateus da Silva, acertadamente, afirma:

"O objetivo das normas é, sempre, garantir a recomposição do trabalhador, o que não se consegue ser feito com brevidade, segundo ensina a biologia. Somente após alguns dias o trabalhador se desliga de seu ofício e passa a poder descongestionar mente e espírito, pelo que razoável que a Convenção 132 venha a expandir, entre nós, este intervalo mínimo de dez para quatorze dias" [16].

O período concessivo das férias anuais remuneradas é abordado no artigo 09 da norma internacional, que prevê o prazo de dezoito meses ou até mais, se houver consentimento do empregado e se exceder o mínimo fixado. A legislação brasileira, por sua vez, limita o lapso temporal aos doze meses subseqüentes ao período aquisitivo (artigo 134 da CLT). Constata-se que, no embate entre esses dispositivos, a regra interna é mais benéfica ao trabalhador. Portanto, em atenção ao contido no artigo 19, em seu § 8º, da Constituição da OIT, o obreiro permanecerá a ter direito ao gozo de suas férias até doze meses após adquirir seu direito.

O artigo 10 da Convenção n. 132 da OIT inovou o Capítulo IV da CLT. O dispositivo indica que a ocasião em que as férias serão gozadas será determinada pelo empregador, após consulta à pessoa empregada interessada em questão ou seus representantes, a menos que seja fixada por regulamento, acordo coletivo, sentença arbitral ou qualquer outra maneira conforme a prática nacional. Para a fixação das férias serão levados em consideração as necessidades do trabalho e as possibilidades de repouso e diversão ao alcance da pessoa empregada.

Seguindo esse raciocínio, percebe-se que o artigo 136 da CLT, que previa que a época da concessão das férias deveria atender aos interesses do empregador, foi derrogado. As férias serão concedidas mediante ato do empregador, atualmente, observando-se o estatuído no artigo 10 do texto convencional.

Dispõe o artigo 12 da Convenção n. 132 da OIT que todo acordo relativo ao abandono do direito ao período mínimo de férias anuais remuneradas de três semanas por ano de serviço ou referente à renúncia ao gozo das férias mediante indenização ou de qualquer outra forma, será, dependendo das condições nacionais, nulo de pleno direito ou proibido. Esse dispositivo pretende banir a renúncia ao período mínimo de férias anuais remuneradas. Confrontou, conseqüentemente, com o determinado no artigo 143 da CLT. O artigo celetista autoriza a conversão de 1/3 (um terço) do período das férias em abono pecuniário pelo empregado. Caso o obreiro, por exemplo, tenha direito ao período de trinta dias corridos e converta dez dias em abono pecuniário, restar-lhe-ão tão somente vinte dias destinados ao descanso anual remunerado. Esse lapso temporal restante está em contrariedade com o período mínimo aludido no texto convencional. Consoante Marcos Neves Fava, a conversão de dez dias em pecúnia passou a ser proibida, porque implicará em renúncia do gozo de parte do período mínimo das férias, mediante indenização [17].

O artigo 13 da Convenção n. 132 da OIT esclarece que a autoridade competente ou o órgão apropriado de cada país poderá adotar regras particulares em relação aos casos em que uma pessoa empregada exerça, durante suas férias, atividades remuneradas incompatíveis com o objetivo dessas férias. O artigo 138 da CLT continua em vigor, quando estipula que durante as férias, o empregado não poderá prestar serviços a outro empregador, salvo se estiver obrigado a fazê-lo em virtude de contrato de trabalho regularmente mantido com aquele.

Os artigos 14 a 23 da Convenção n. 132 da OIT tratam de disposições genéricas sobre a aplicação da norma internacional, sua ratificação e seus efeitos.

Sobre a autora
Luciana Veck Lisbôa

acadêmica de Direito na Universidade do Vale do Itajaí

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LISBÔA, Luciana Veck. A Convenção nº 132 da OIT e seus efeitos no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 117, 29 out. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4460. Acesso em: 24 nov. 2024.

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