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Principais aspectos e importância do inquérito policial

Agenda 29/12/2015 às 10:13

O presente artigo trás uma breve visão jurídica do papel da polícia e do cidadão frente ao tema inquérito policial, objetivando, de forma geral, identificar e apontar quem são os seus atores e quais os seus direitos e deveres.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SUMÁRIO

 

 

1- INTRODUÇÃO.                                                                                                                               08

 

2- CONCEITO E FINALIDADE.                                                                                                           10

 

3- A POLICIA JUDICIÁRIA E O PODER DE POLICIA                                                                           11

 

4- PERSECUCÃO PENAL E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO.                               12

 

5- CARACTERISTICA DO INQUÉRITO POLICIAL.                                                                               14

 

6- VICIOS E A INCOMUNICABILIDADE DO INDICIADO.                                                                        15

 

7- A POSSIBILIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO REALIZAR                                                                17

    INVESTIGAÇÃO CRIMINAL.                                                  

 

8- ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL E OUTRAS PROVIDÊNCIAS.                                     20

           

            8.1- REQUERIMENTO DE ARQUIVAMENTO  EM COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA.                     21

           

            8.2- ARQUIVAMENTO DE  INQUÉRITO DE CRIMES CONTRA A ECONOMIA                          22               POPULAR OU CONTRA A SAÚDE PÚBLICA.

           

            8.3- OBRIGATÓRIEDADE DE OFERECIMENTO DE RAZÕES E O DENOMINADO                  22   ARQUIVAMENTO IMPLICITO.

 

            8.4- ARQUIVAMENTO INDIRETO                                                                                              22

           

            8.5- DESARQUIVAMENTO                                                                                                         23

 

9- TERMO CIRCUNTANCIADO.                                                                                                             23

 

10- TRANCAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL.                                                                                  24

 

11- PROSSEGUIMENTO DAS INVESTIGAÇÕES APÓS ENCERRAMENTO  DOINQUERITO                 24

 

12- CONSIDERAÇÕES FINAIS.                                                                                                              26

 

13- REFERÊNCIAS                                                                                                                                 27

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

RESUMO

 

         O presente artigo trás uma breve visão jurídica do papel da polícia e do cidadão frente ao tema inquérito policial, objetivando, de forma geral, identificar e apontar quem são os seus atores e quais os seus direitos e deveres, levando em  consideração  o  arcabouço  legal/constitucional,  a  jurisprudência  e  as doutrinas  nacionais  atuais  e  mais  pertinentes.  Para  tanto,  conceitua-se inquérito  policial,  tendo-se  em  conta  os  princípios  que  o  regem,  bem  como, delimitando-se a atuação policial para efetivação deste  tipo de procedimento, levando-se em consideração à responsabilidade social de seus agentes, sejam eles  os  apreensores  ou  os  aprendidos, compreendendo-se  que,  este instrumento  jurídico do Estado, é de capital importância, uma vez que trata do mais  básico  direito  do  ser  humano:  que  é  a  sua  liberdade  de  ir  e  vir; contribuindo-se, também, para a melhoria da qualidade dos serviços prestados por esses operadores jurídicos e repercutindo, assim, no resgate das imagens das instituições envolvidas com esse proceder. O método utilizado neste artigo foi o indutivo, tendo-se como técnica bibliográfica a jurisprudência e a legal.

 

 

 

 

Palavras  –  chaves:  inquérito  –  policia  –  procedimento  –  investigação  - prisão

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ABSTRACT

 

 

            The present monograph backwards one soon legal vision of the paper of the policy and  the citizen front  to  the subject caught  in  the act, objectifying, of general  form,  to  identify and  to point who is  its actors and which  its rights and duties,  leading  in consideration  legal/constitutional base, the current and more  pertinent jurisprudence and national doctrines. For in such a way, caught in the act isappraised, having itself in account the principles that conduct it, as well as, delimiting  it  police  performance  for  effectuation  of  this  type  of  arrest,  being taken  itself  in  consideration  to  the  socialbresponsibility  of  its  agents,  is  they them apprehensibler or  the  learned ones, understanding  themselves  that,  this legal  instrument of  the State,  it  is of capital  importance, a  time  that deals with the most  basic  right  of  the  human  being:  that  it  is  its  freedom  of movement; contributing themselves, also, for the improvement of the quality of the services given for these legal operators and reing-echo, thus, in the rescue of the images of  the  involved institutions  with  this  to  proceed.  The  method  used  in  this monograph was the inductive one, having itself as bibliographical technique the legal and jurisprudencia.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1 – INTRODUÇÃO

 

         O  presente  estudo  tem  o  fim  precípuo  de  esclarecer  o  conceito  e  a finalidade do inquérito policial, uma peça administrativa, informativa e preparatória da  ação  penal,  sem  dúvida  nenhuma  de  grande  importância  para  um  futuro processo. 

           

            Por  inquérito  policial  compreende-se  o  conjunto  de  diligências  realizadas pela autoridade policial visando à obtenção de elementos que apontem a autoria e comprovem  a  materialidade  dos  crimes  investigados,  permitindo  assim,  ao Ministério Público  (nos crimes de ação penal pública) e ao ofendido  (nos crimes de ação penal privada) o oferecimento da denúncia e da queixa-crime.  

           

            Os  manuais  doutrinários  de  Processo  Penal,  bem  como  a  maioria  dos estudiosos da área, definem o Inquérito Policial como sendo uma peça meramente informativa, destinada à apuração de uma infração penal e de sua autoria. Poucos se  aprofundaram  no  assunto,  projetando,  assim,  há  nítida  impressão  de  que referido  procedimento  investigativo  não  possui  nenhum  tipo  de  importância significativa  para  o  sistema  processual  penal.  Esquecem-se,  no  entanto, a quase  totalidade das ações penais em curso ou  já  transitadas em  julgado,  foram precedidas de um Inquérito Policial. Tal assertiva pode ser comprovada através de pesquisas junto a qualquer Comarca do nosso extenso território. Para tal, basta a verificação de que a denuncia oferecida pelo representante do Ministério Público, titular  exclusivo  da  ação  penal  publica  incondicionada,  inicia-se  da  seguinte maneira:  “ Consta do  incluso  Inquérito Policial que no dia..., por volta das  ...., fulano  de  tal,  seguida  da  exposição  do  fato  criminoso  com  todas  as  suas circunstâncias”.

 

            Verifica-se, assim, que a expressão  “mera peça” deveria ser excluída dos livros  doutrinários,  já  que,  como  é  cediço,  todas  as  provas  produzidas  dentro desse  importante procedimento  investigativo, são, na maioria das vezes, apenas repetidas  em  Juízo.  Segundo  Magalhães  Noronha  (CURSO  DE  PROCESSO PENAL  17.  ed.  São  Paulo:  Saraiva  1986),  o  inquérito  reduz  a  Justiça  quase  à função de repetidor de seus atos. Analisando o principio da persuasão racional ou do  livre  convencimento,  constata-se  que  o  Juiz  não  pode  condenar  o  réu  com base exclusivamente nas provas produzidas no Inquérito, salientando-se que isso não  é  possível,  não  por  se  tratar  de  uma mera  peça  informativa, mas  sim  em virtude  de  não  estar  presente  o  contraditório.  Aliás,  no  que  diz  respeito  a  este principio, também conhecido por principio da bilateralidade da audiência, de onde se extrai o binômio: ciência e participação, talvez tenha chegado o momento para implanta-lo, como  regra, nos autos de  Inquérito Policial. O seu caráter  inquisitivo transparece uma pseudo-impressão pejorativa de que a Polícia Judiciária produz provas de  forma abusiva e contraria aos ditames da Lei. Nada mais  justo de que abrir vistas ao Advogado da parte a quem esta sendo imputada a prática de uma infração  penal  para  que  ele,  num  primeiro momento,  apresente  argumentos  em defesa  de  seu  cliente.  Ainda  segundo  renomado  doutrinador  “  não  se  pode  de antemão  repudiar  o  inquérito,  como  integrante  do  complexo  probatório  que informara  a  livre  convicção  do Magistrado. Claro  que  se  a  instrução  judicial  for inteiramente  adversa  aos  elementos  que  ele  contem,  não  poderá  haver prevalência sua”.

 

            A  finalidade do  Inquérito Policial não é a de produzir a acusação de uma pessoa, mas  sim  reunir  provas  dos  fatos,  sempre  na  busca  da  verdade  real. A Autoridade Policial, tida esta como o Delegado de Policia de carreira, Bacharel em Direito  e  aprovado  em  concurso  público,  nos  casos  de  crimes  de  ação  penal     publica  incondicionada,  tem  a  obrigação  de  instaurar  o  competente  Inquérito Policial, proceder as diligências preliminares constantes no artigo 6º do Código de Processo Penal, dar prosseguimento às investigações e por fim relatar tudo aquilo que  foi  realizado, encaminhando  tal expediente a Juízo.  Dentro dessa  fase pré-processual, várias são as providências a serem adotadas pela Autoridade Policial, dentre  as  quais  se  destacam  as  seguintes:  requisição  de  exames  periciais, representação  pelo  mandado  de  busca  domiciliar,  representação  pelas  prisões temporárias  ou  preventiva,  indiciamento,  representação  pela  interceptação telefônica,  pela  quebra  do  sigilo  bancário,  interrogatório  do  indiciado,  oitiva  da vitima, de testemunhas, de terceiras pessoas envolvidas.

 

            Dada  a  importância  dessa  atividade  de  policia  judiciária,  não  tem  mais como sustentar que o Inquérito Policial é uma mera peça de informação. Ademais, cabe  consignar  que  o  Inquérito  pode  se  iniciar  de  varias maneiras,  dentre  elas, através da lavratura do Auto de Prisão em Flagrante, onde o Delegado de Policia, na  condição  de  representante  do  Estado  e,  principalmente  de  garantidor  da legalidade,  deve  analisar  o  caso  concreto,  adequá-lo  ou  não  a  uma  tipificação criminal e, convicto do estado  flagrancial, deve proceder à captura do  indigitado autor do delito, cuja conseqüência imediata é a sua privação de liberdade. 

 

 

 

 

 

 

2 – CONCEITO E FINALIDADE DO INQUÉRITO POLICIAL.

 

            O  inquérito  policial  é  um  procedimento  preparatório  da  ação  penal,  de caráter  administrativo,  conduzido  pela  policia  judiciária  e  voltado  à  colheita preliminar de provas para apurar a prática de uma  infração penal e sua autoria. Seu objetivo precípuo é a  formação da convicção do representante do Ministério Público, mas  também  a  colheita  de  provas  urgentes,  que  podem  desaparecer, após o cometimento do crime.

 

            A  denominação  inquérito  policial,  no  Brasil,  surgiu  com  a  edição  da  lei 2.033, de 20 de setembro de 1871, regulamentado pelo Decreto-lei 4.824, de 28 de novembro de 1871, encontrando-se no art. 42 daquela Lei a seguinte definição:

O  inquérito  policial  consiste  em  todas  as  diligências  necessárias  para  o descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e de seus autores e cúmplices, devendo ser reduzido a instrumento escrito.

 

 

            Passou a ser  função da policia  judiciária a sua elaboração. Apesar de seu nome  ter sido mencionado pela primeira vez na referida Lei 2.033, suas  funções, que são de natureza do processo criminal, existem de  longa data e  tornaram-se especializadas  com  aplicação  efetiva  do  princípio  da  separação  da  polícia  e  da judicatura. 

 

            O  inquérito  é  um  meio  de  afastar  dúvidas  e  corrigir  o  prumo  das investigações,  evitando-se  o  indesejável  erro  judiciário.  Se,  desde  o  início,  o Estado possuir elementos confiáveis para agir contra alguém na esfera criminal, torna-se mais  difícil  haver  equívocos  na eleição  do  autor  da  infração  penal. Por outro lado, além da segurança, fornece a oportunidade de colher provas que não podem esperar muito tempo, sob pena de perecimento ou deturpação irreversível. 

 

            Esse é o seu caráter conflituoso: pretende ser um  instrumento de garantia contra  acusações  levianas,  mas  acaba  funcionando  contra  o  próprio investigado/indiciado, que não pôde contrariar a prova colhida pela policia.

 

            O ideal é que o juiz tenha discernimento para tomar as seguintes medidas, assegurando  todos  os  enfoques  necessários  (segurança  pública  e  garantia individual de ampla defesa) ao devido processo  legal: a) deve desprezar  toda e qualquer prova que possa ser  renovada em  juízo sob o crivo do contraditório; b) deve  permitir  à  defesa  que  contrarie,  em  juízo,  os  laudos  e  outras  provas realizadas durante o inquérito, produzindo contraprova; c) deve tratar como mero indício  e  jamais  como  prova  direta  eventual  confissão  do  indiciado;  d)  deve exercer  real  fiscalização sobre a atividade da policia  judiciária, aliás, é para  isso que há sempre um magistrado acompanhado o desenrolar do  inquérito; e) deve ler o inquérito antes de receber a denúncia ou queixa para checar se realmente há justa causa para a ação penal; f) pode aceitar toda prova colhida na fase policial, desde que seja incontroversa, ou seja, não impugnada pelas partes.

 

3 – A POLICIA JUDICIÁRIA E O PODER DE POLICIA.

 

            Possui como característica a atuação repressiva, que age, em regra, após a ocorrência de infrações, buscando reunir o máximo de provas possíveis, no intuito de  apontar  a  constatação  da  materialidade  delitiva  e  a  autoria  do  fato.  Neste aspecto, destacamos o papel da Policia Civil que deflui do art. 144, § 4º da CF/88, verbis: 

 

às  policias  civis,  dirigidas  por  delegados  de  carreira,  incumbem,  ressalvada  a competência da União, as funções de policia judiciária e a apuração de infrações penais, excerto as militares.

 

                                   Como afirma Nestor Távora:

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no que nos interessa, a policia judiciária tem a missão primordial de elaboração do  inquérito  policial.  Incumbirá  ainda  à  autoridade  policial  fornecer  às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos;  realizar  as  diligências  requisitadas  pelo  juiz  ou  pelo  Ministério Público;  cumprir os mandados de prisão e  representar,  se necessário  for, pela decretação de prisão cautelar.( TÁVORA, ED. 2009)

 

            O Código Tributário Nacional, em seu art. 78, ao tratar dos fatos geradores das taxas, assim conceituou poder de policia:

 

considera-se  poder  de  policia  a  atividade  da  Administração  Pública  que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene,  à  ordem,  aos  costumes,  à  disciplina  da  produção  e  do mercado,  ao exercício de atividades econômicas dependentes de  concessão ou autorização do  Poder  Público,  à  tranqüilidade  pública  ou  ao  respeito  à  propriedade  e  aos direitos individuais ou coletivos.

 

Hely Lopes Meireles nos ensina que:

 

poder  de  policia  é  a  faculdade  de  que  dispõe  a  Administração  Pública  para condicionar e restringir o uso e gozo dos bens, atividades e direitos  individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado.( MEIRELES ED. 2006).

 

            Devemos  distinguir  a  policia  administrativa  da  policia  de manutenção  da ordem  pública  e  da  policia  judiciária.  A  primeira  incide  sobre  bens,  direitos  e atividades,  enquanto  as  outras  atuam  sobre  as  pessoas;  a  atuação  da  primeira esgota-se  no  âmbito  da  função  administrativa,  enquanto  a  polícia  judiciária prepara a atuação da função jurisdicional penal; a policia administrativa é exercida por órgãos administrativos de caráter  fiscalizador,  integrantes dos mais diversos setores  da  administração  Pública  como  um  todo,  ao  passo  que  a  polícia  de manutenção  da  ordem  pública  e  a  policia  judiciária  são  executadas especificamente pro órgãos da segurança (policia civil ou militar).

 

            Cabe ressaltar que a doutrina, em sua maioria, não admite a delegação do poder de policia a pessoas da iniciativa privada, ainda que prestadores de serviço de titularidade do Estado. Na mesma esteira de julgamento da ADIN 1.717/DF, rel. Min. Sydney Sanches, em 07.11.2002, o STF decidiu que o exercício do poder de policia não pode ser delegado a entidades privadas.

            A  atuação  da  policia  só  será  legitima  se  realizada  nos  estritos  termos jurídicos,  respeitados  os  direitos  do  cidadão,  as  prerrogativas  individuais  e  as liberdades públicas asseguradas na Constituição e nas leis. Há que se conciliar o interesse social com os direitos  individuais consagrados na Constituição. Caso a Administração  aja  além  desses  mandamentos,  ferindo  a  intangibilidade  dos direitos individuais, sua atuação será arbitrária, configuradora de abuso de poder, corrigível pelo poder judiciário.

 

 

4  –  PERSECUÇÃO  CRIMINAL  E  APLICAÇÃO  DO  PRINCÍPIO  DO CONTRADITÓRIO.

 

            A  persecução  criminal  para  a  apuração  das  infrações  penais  e  sua respectiva  autoria  comporta  duas  fases  bem  delineadas.  A  primeira,  preliminar, inquisitiva,  e  objeto  do  presente  trabalho,  caracterizado  assim  como  um procedimento  administrativo,  presidido  por  delegado  de  policia,  no  intuito  de identificar  o  autor  do  ilícito  e  os  elementos  que  atestem  a  sua  materialidade, “existência”,  contribuindo  para  a  formação  da  opinião  delitiva  do  titular  da  ação penal, ou seja, fornecendo elementos para convencer o titular da ação penal se o processo deve ou não ser deflagrado.

 

            A segunda fase da persecução penal é submissa ao contraditório e à ampla defesa, é denominada de fase processual. Assim, materializando o dever de punir do Estado  com  a  ocorrência  de  um  suposto  fato  delituoso,  cabe  a  ele, Estado, como  regra,  indicar  a  persecutio  criminis  para  apurar,  processar  e  enfim  fazer valer o direito de punir, solucionando as lides e aplicando a lei ao caso concreto. Não há de se falar em ampla defesa e contraditório no inquérito policial, salvo em relação ao inquérito objetivando a expulsão de estrangeiro, pois, quanto a este, o Decreto 86.715/1981, regulamentou os dispositivos da lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro),  que  estabelece  uma  seqüência  de  etapas,  a  qual  abrange  a possibilidade de defesa, devendo ser observadas com o  intuito de concretizar o ato de expulsão.

 

            Como  regra  geral  as  provas  incorporadas  ao  inquérito  policial  tem  valor relativo,  incapaz  de  por  si  só  formar  o  convencimento  do magistrado  quanto  à responsabilização  penal  do  imputado.  Com  a  edição  da  lei  11.690/08,  foi expressamente  incorporada  à  regulamentação  do  Código  de  Processo  Penal, dispondo, agora, o art. 155 que:

 

o  juiz  formará  sua  convicção  pela  livre  apreciação  da  prova  produzida  em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos  informativos  colhidos  na  investigação,  ressalvadas  as  provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

           

            É pacifico o entendimento doutrinário e  jurisprudencial em que não existe

nulidade do processo criminal por vícios eventualmente constatados no  inquérito policial. Nesse sentido, existem reiteradas decisões do STJ, compreendendo que eventual nulidade do inquérito policial não contamina a ação penal superveniente, vez que aquele é mera peça  informativa, produzida sem o crivo do contraditório (RHC 21.170, DJ 08.10.2007).

           

            O inquérito policial não é imprescindível ao ajuizamento da ação penal. Na medida  em  que  seu  conteúdo  é  meramente  informativo,  se  já  dispuserem Ministério Público  (na ação penal pública) ou o ofendido  (na ação penal privada) os elementos necessários ao oferecimento da denúncia ou queixa-crime (indícios de  autoria  e  prova  da  materialidade  do  fato),  poderá  ser  dispensado  o procedimento policial sem que isto importe qualquer irregularidade.

 

 

 

5 – CARACTERISTICA DO INQUÉRITO POLICIAL.

 

            O  inquérito,  como  procedimento  administrativo  preliminar,  é  regido  por características  que  o  diferenciam,  em  substância,  do  processo,  são  elas:  a discricionariedade: a autoridade policial pode atender ou não aos  requerimentos patrocinados  pelo  indiciado  ou  pela  própria  vitima,  fazendo  um  juízo  de conveniência e oportunidade quanto à relevância daquilo que foi solicitado. Só não poderá  indeferir  a  realização  do  exame  do  corpo  de  delito,  quando  a  infração praticada  deixar  vestígios.  Sempre  é  bom  lembrar  que  apesar  de  não  haver hierarquia  entre  juizes,  promotores  e  delegados,  caso  os  dois  primeiros  emitam requisições  ao  último,  este  está  obrigado  a  atender  por  imposição  legal  (art.13, inc. II do CPP).

 

            Outra  característica  do  inquérito  policial  por  exigência  legal  é  a  de  ser escrito, prescrevendo o art. 9º do CPP “todas as peças do inquérito policial serão, num  só  processado,  reduzidas  a  escrito  ou  datilografadas  e,  neste  caso, rubricadas  pela  autoridade”.  Os  atos  produzidos  oralmente  serão  reduzidos  a termo.  Ao  contrário  do  que  ocorre  no  processo,  o  inquérito  não  comporta publicidade, sendo procedimento essencialmente sigiloso, disciplinando o art. 20 do  CPP  que:  “a  autoridade  assegurará  no  inquérito  o  sigilo  necessário  à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade”.

 

            Este  sigilo,  contudo,  não  se  estende,  por  uma  razão  lógica,  nem  ao magistrado,  nem  ao membro  do Ministério Público.  Já  o  advogado  do  indiciado pode  consultar  os  autos  do  inquérito  policial,  conforme  determina  o Estatuto  da OAB, o professor Aury Lopes Jr afirma: “...... não existe sigilo para o advogado no inquérito  policial  e  não  lhe  pode  ser  negado  o  acesso  às  suas  peças  nem  ser negado o direito à extração de cópias ou fazer apontamentos”.

 

            O  que  se  deve  ter em mente  é  que o  sigilo  do  inquérito  é  o  estritamente necessário  ao  êxito  das  investigações  e  à  preservação  da  figura  do  indiciado, evitando-se  um  desgaste  daquele  que  é  presumivelmente  inocente. Objetiva-se assim o sigilo aos terceiros estranhos à persecução e principalmente à imprensa, no  intuito de serem evitadas condenações sumárias pela opinião pública, com a publicação  de  informações,  que  muitas  vezes  não  se  sustentam  na  fase processual.

 

            Já há posição, contudo, sustentando o sigilo absoluto do  inquérito policial, determinado  pelo magistrado,  a  impedir  até mesmo  o  acesso  do  advogado  aos autos do procedimento, devendo-se dar prevalência ao  interesse público sobre o privado,  em  fase  da  relevância  do  sigilo  investigatório. Este  entendimento  rasga de corpo e alma o Estatuto da OAB, na conveniência casuística de desconsiderar a vigência da norma, o que não e dado ao intérprete.

 

            Podemos  citar  também  como  característica  do  inquérito  policial  a oficialidade  e  a  oficiosidade,  essa  determina  que  o  inquérito  policial  deve   ser instaurado  ex  officio  pela  autoridade  policial  sempre  que  tiver  conhecimento  da pratica de um delito, independentemente de provocação, ressalvadas as hipóteses de  crimes  de  ação  penal  pública  condicionada  a  representação  e  os  delitos  de ação penal privada,  já aquela determina que as  investigações deve ser realizada por  autoridades  e  agentes  integrantes  dos  quadros  públicos,  sendo  vedada  a delegação da atividade investigatória a particulares, inclusive por força da própria Constituição Federal (art. 144, § 4º).

 

            Outra característica é a indisponibilidade, prevista no art. 17 do CPP. Uma vez  iniciado  o  procedimento  investigativo,  deve  a  autoridade  leva-lo  até  o  final, não podendo arquiva-lo, pois a persecução criminal é de ordem pública.

 

            O  inquérito  é  inquisitivo:  as  atividades  persecutórias  ficam  concentradas nas mãos  de  uma  única  autoridade  e  não  há  oportunidade  para  o  exercício  do contraditório  e  da  ampla  defesa.  Na  fase  pré-processual  não  existem  partes, apenas uma autoridade  investigando e o suposto autor da  infração normalmente na condição de indiciado.

 

            Por  último  podemos  dizer  que  o  inquérito  é  dispensável,  ou  seja  não  é imprescindível  para  a  propositura  da  ação  penal. Se  os  elementos  que  venham lastrear  a  inicial  acusatória  forem  colhidos  de  outra  policial  for  a  base  para  a propositura da ação, este vai acompanhar a inicial acusatória apresentada.

 

6 – VICIOS E A INCOMUNICABILIDADE DO INDICIADO.

 

            A idéia que a atuação da policia judiciária atuar em fato ocorrido fora de sua circunscrição,  poderia  ocasionar  vicio  no  procedimento  é  equivocada.  Podemos afirmar  isso  baseado  em  circunstância  de  ser  consolidado  na  jurisprudência  o entendimento no sentido de que, em se tratando de mera peça de informação, não há de se  falar em nulidade de inquérito policial e muito menos em nulificação da ação  penal  pelo  fato  de  ter  sido  iniciada  a  partir  de  procedimento  policial instaurado por autoridade  “incompetente”. Além do  fato de que o art. 5º, LIII, da CF/88  dispor  que  “ninguém  será  processado  nem  sentenciado  senão  pela autoridade competente”, não se aplica às autoridades policiais, as quais não têm, entre  suas  funções,  a  incumbência  de  processar  ou  sentenciar.  Note-se  que  o dispositivo refere-se a  “processado” e a “sentenciado”.

 

            Neste sentido, aliás, consolidada a  jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, compreendendo que “as atribuições no âmbito da policia judiciária não se submetem  aos  mesmos  rigores  previstos  para  a  divisão  de  competência,  haja vista  que  a  autoridade  policial  pode  empreender  diligências  em  circunscrição diversa, independentemente da expedição de precatória e requisição”.

 

            Os  vícios  ocorridos  no  inquérito  policial  não  atingem  a  ação  penal.  Tem prevalecido  tanto  nos  tribunais  como  na  doutrina  que,  sendo  o  inquérito dispensável, algo que não é essencial ao processo, não  tem o condão de, uma vez viciado, contaminar a ação penal. Em outras palavras, os males ocorridos no inquérito  não  tem  a  força  de  macular  a  fase  judicial.  A  irregularidade  ocorrida durante  o  inquérito  poderá  gerar  a  invalidade  ou  ineficácia  do  ato  inquinado, todavia, sem levar à nulidade processual.

 

            Não  é  outro  o  entendimento  do  Supremo Tribunal  Federal  que  já  se manifestou no seguinte sentido:

Eventuais vícios concernentes ao  inquérito policial não  têm o condão de infirmar a validade  jurídica do subseqüente processo penal condenatório. As nulidades processuais concernem, tão somente, aos defeitos de ordem jurídica  que  afetam  os  atos  praticados  ao  longo  da  ação  penal condenatória.  

 

            Um  importante  ponto  a  ser  debatido  neste  artigo,  diz  respeito  a incomunicabilidade  do  investigado  no  inquérito  policial,  que  esta  regulamentado no  art.  21 do CPP,  dispondo  que  “dependerá  sempre  de  despacho  nos  autos  e somente  será  permitida quando  o  interesse da  sociedade  ou  a  conveniência da investigação  o  exigir”,  há  na  atualidade  divergências  quanto  à  recepção  dessa previsão pela Constituição Federal.

 

            Parte  da  doutrina  possui  o  entendimento  no  sentido  de  que  é  inconstitucional  a incomunicabilidade,  pois,  se  na  vigência  do  Estado  de  Defesa,  quando  há  a supressão  de  inúmeras  garantias  individuais  o  preso  não  poderá  ficar incomunicável  (art.136,  §  3º,  IV,  da  CF/88),  com  mais  razão  isto  deve  ser observado  nos  estados  de  normalidade,  em  que  as  garantias  estão  sendo consideradas.  Ora,  se  em  momentos  de  grave  instabilidade  institucional, ensejadores da decretação do Estado de Defesa, não poderá ser determinada a incomunicabilidade, também não será viável nos períodos de normalidade.

           

            Após  estudo  aprofundado  da  matéria,  cremos  que  a  melhor  posição  é admitir a decretação da incomunicabilidade, ou seja, que o art. 21 do CPP não foi revogado pela nossa Carta Magna. Em primeiro lugar, a proibição diz respeito ao período em que ocorrer a decretação do estado de defesa, aplicável a prisão por crime  contra  o  Estado,  constituindo  infração  de  natureza  política.  Em  segundo lugar,  o  legislador  constituinte,  se  quisesse  elevar  tal  proibição  à  categoria  de princípio geral, o  teria  feito inserindo no art. 5 º, ao  lado de outros mandamentos que procuram resguardar os direitos do preso. Não o  fez, relacionando a medida com os direitos políticos. Daí porque, segundo nosso entendimento, o art. 21 do CPP continua em vigor.

 

            De fundamental importância ressaltar, que essa incomunicabilidade não se estende ao advogado do indiciado. A incomunicabilidade não excederá três dias e deverá  ser  decretada  por  despacho  fundamentado  do  juiz,  a  requerimento  da autoridade policial ou do Ministério Público, respeitando-se, em qualquer hipótese, o direito do advogado, como já salientado. 

 

7– A POSSIBILIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO REALIZAR INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. 

 

            Outro ponto relevante que vem sendo muito debatido é a possibilidade do Ministério  Público  realizar  investigação  criminal.  O  tema  é,  sem  duvida, controverso,  comportando  várias  visões  a  respeito, mas  cremos  inviável  que  o promotor  de  justiça,  titular  da  ação  penal,  assuma  a  postura  de  órgão investigatório,  substituindo  a  policia  judiciária  e  produzindo  inquéritos  visando  à apuração de infrações penais e de sua autoria.

 

           

            A  Constituição  Federal  foi  clara  ao  estabelecer  as  funções  de  policia, federal e civil, para investigar e servir de órgão auxiliar do Poder Judiciário, daí o nome  de  policia   judiciária,  que  possui  atribuições  de  apurar  a  ocorrência  e  a autoria  de  crimes  e  contravenções  penais,  como  já  posto  acima.  Ao Ministério Público foi ressalvada a titularidade da ação penal, ou seja, a exclusividade no seu ajuizamento, salvo excepcional caso reservado à vitima, quando a ação penal não foi  intentada  no  prazo  legal.  Note-se  ainda,  que  o  art.  129,  inciso  III,  da Constituição  Federal,  prevê  a  possibilidade  do  promotor  elaborar  inquérito  civil, mas  jamais  inquérito  policial.  Entretanto,  para  aparelhar  convenientemente  o órgão  acusatório  oficial  do  Estado,  atribui-se  ao  Ministério  Público  o  poder  de expedir  notificações  nos  procedimentos  administrativos  de  sua  competência, requisitando  informações e documentos  (o que pode ocorrer no  inquérito civil ou em  algum  processo  administrativo  que  apure  infração  funcional  de membro  ou funcionário  da  instituição,  por  exemplo),  a  possibilidade  de  exercer  o  controle externo da atividade policial (o que não significa a substituição da presidência da investigação, conferida ao delegado de carreira), o poder de requisitar diligências investigatórias  e  a  instauração  de  inquérito  policial  (o  que  demonstra  não  ter atribuição  para  instaurar  o  inquérito  e,  sim  para  requisitar  a  sua  formação  pelo órgão competente).

 

            Enfim, ao Ministério Público cabe, tomando ciência da prática de um delito, requisitar  a  instauração  da  investigação  pela  policia  judiciária,  controlar  todo  o desenvolvimento  da  persecução  investigatória,  requisitar  diligência  e,  ao  final, formar  sua  opinião,  optando  por  denunciar  ou  não  eventual  pessoa  apontada como  autora.  O  que  não  lhe  é  constitucionalmente  assegurado  é  produzir, sozinho, a investigação, denunciando a seguir quem considerar autor da infração penal,  excluindo,  integralmente,  a  policia  judiciária  e,  consequentemente,  a fiscalização salutar do juiz.

 

            O sistema processual penal  foi elaborado para apresentar-se equilibrado e harmônico, não devendo existir qualquer instituição super-poderosa. Note-se que, quando  a  policia  judiciária  elabora  e  conduz  a  investigação  criminal,  é supervisionada pelo Ministério Público e pelo Juiz de Direito. Este, ao conduzir a instrução criminal  tem a supervisão das partes – Ministério Público e advogados. Logo,  a  permitir-se  que  o  Ministério  Público,  por  mais  bem  intencionado  que esteja, produza de per si  investigação criminal,  isolado de qualquer  fiscalização, sem a participação do indiciado, que nem ouvido precisa ser, significaria quebrar a harmônica e garantista investigação de uma infração penal. Não é pelo fato de ser inquérito naturalmente sigiloso que o acesso do advogado, por exemplo é vedado. Ao contrario,  trata-se de prerrogativa sua consultar quaisquer autos do  inquérito, como  já demonstramos acima, especialmente quando  já há  indiciado cliente seu. O  mesmo  não  ocorreria  em  investigação  sigilosa  em  transcurso  na  sede  do Ministério Público  federal ou estadual, pois nem mesmo ciência de que ele está ocorrendo  haveria. Por  isso,  a  investigação  precisar  ser  produzida  oficialmente, embora com o sigilo necessário, pela policia judiciária, registrada e acompanhada por magistrado e membro do Ministério Público.

 

            Preocupando-se  justamente  com  alcance  de  investigações  que  possam ofender  o  direito  à  intimidade  de  qualquer  cidadão,  feitas  sem  controle  judicial, expõe Sylvia Helena de Figueiredo Steiner que:

assoma a magnitude do poder do órgão ministerial, como agente público co-responsável  pela  apuração  das  infrações  penais,  exercendo,  por  um lado  função  de  acompanhamento  e  coordenação  da  atividade-fim  da policia  judiciária e, por outro, atribuindo-lhe poderes de  investigação e de requisição de dados que sequer àquela são permitidos. É pois, repetimos, o  artífice  da  investigação  criminal.  Delineado,  portando,  seu  poder  de invadir  a  seara  de  intimidade  do  investigado,  obtendo  dados  a  seu respeito. No entanto, tal poder não prescinde de comprovação de que essa invasão seja necessária à apuração do delito, nem  tampouco do controle judicial, eis que se trata de medida restritiva de direitos fundamentais. (...) a  invasão  que  lhe  é  permitida  está  submetida  às  demais  garantias constitucionalmente  asseguradas  aos  cidadãos:  a  apreciação pelo Poder Judiciário,  o  princípio  da  legalidade,  o  devido  processo  legal,  o contraditório, o direito ao silêncio, a ampla defesa e  todos os  recursos e ela  inerentes”. Citamos  também  a  lição  do  ilustre membro  do Ministério Público  Federal  e  professor  da  Universidade  do  Rio  de  Janeiro  Juarez Tavares  “é  inconcebível que  se  atribua  a um órgão  do  Estado, qualquer que seja, inclusive ao Poder Judiciário, poderes sem limites. A democracia vale,  precisamente,  porque  os  poderes  dos  Estados  são  limitados, harmônicos  entre  si,  controlados mutuamente  e  submetidos ou  devendo submeter-se  à  participação  de  todos,  como  exercício  indispensável  da cidadania.  (  A  convenção  Americana  sobre  Direitos  Humanos  e  sua integração ao processo penal brasileiro, São Paulo: RT, 2000).

 

            Convém  destacar  que  o  Supremo  Tribunal  Federal,  no  Inquérito  1.968-2

(DF), debate se é possível o Ministério Público conduzir investigação criminal. Do voto do Ministro Joaquim Barbosa extrai-se o seguinte:

 

“O que autoriza o Ministério Público a  investigar não é a natureza do ato punitivo que pode resultar da investigação (sanção administrativa civil ou penal), mas sim, o fato a ser apurado, incidente sobre bens jurídicos cuja a  proteção  a  Constituição  explicitamente  confiou  ao  Parquet.  A  rigor, nesta como em diversas outras hipóteses, é quase  impossível afirmar, a priori,  se  se  trata  de  crime,  de  ilícito  civil  ou  de  mera  infração administrativa. Não raro, a devida valoração do fato somente ocorrerá na sentença! Note-  se que não  existe uma diferença ontológica  entre  ilícito administrativo, o civil e o penal. Essa diferença, quem faz é o legislador ao atribuir  diferentes  sanções  para  cada  ato  jurídico  (sendo  a  penal subsidiária  e  a  mais  gravosa).  Assim,  parece-me  licito  afirmar  que  a investigação  se  legitima  pelo  fato  investigado,  e  não  pela  ponderação subjetiva  acerca  de  qual  será  a  responsabilidade  do  agente  e  qual natureza da ação a ser eventualmente proposta. Em síntese, se o fato diz respeito  ao  interesse  difuso  ou  coletivo,  o  Ministério  Público  pode instaurar  procedimento  administrativo  com  base  no  art.  129,  III,  da Constituição  Federal  (...).  Não  quero  com  isso  dizer  que  o  Ministério Público possa presidir o inquérito policial. Não. A própria denominação do procedimento  (inquérito  policial)  afasta  essa  possibilidade,  indicando  o monopólio  da  policia  para  sua  condução.  Ocorre  que  a  elucidação  da autoria  e  da  materialidade  das  condutas  criminosas  não  se  esgota  no âmbito do inquérito policial, como todos sabemos. Em inúmero domínios em que a ação fiscalizadora do Estado se faz presente, o ilícito penal vem à  tona  exatamente  no  bojo  de  apurações  efetivadas  com  propósitos cíveis.  Nesses  casos,  como  em muitos  outros,  o  desencadeamento  da ação  punitiva  do  Estado  prescinde  da  atuação  policial.  Daí  a irrazoabilidade da tese que postula  o condicionamento, o aprisionamento da atuação do Ministério Público à atuação da policia, o que, sabidamente, não condiz com a orientação da constituição de 1988”.   

 

 

8 – ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL E OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

  

            Somente o Ministério Público,  titular da ação penal, órgão para o qual se destina o  inquérito policial, pode pedir o arquivamento, dando por encerradas as possibilidades de investigação. Não é atribuição da policia judiciária dar por findo o  seu  trabalho,  nem  do  juiz,  concluir  pela  inviabilidade  do  prosseguimento  da colheitas de provas.

 

            É possível, no entanto, que o representante do Ministério Público requeira o arquivamento,  a  ser  determinado  pelo  magistrado,  sem  qualquer  fundamento plausível.  Ora,  sendo  a  ação  penal  obrigatória,  cabe  a  interferência  do  juiz, fazendo  a  remessa  dos  autos  ao  Procurador-Geral  de  Justiça  (dirigente  do Ministério Público estadual) para que, nos termos do art. 28 do CPP, possa dar a última  palavra  a  respeito  do  caso.  Por  outro  lado,  caso  as  investigações  seja manifestamente  infrutíferas  e  o  promotor  deseje  prosseguir  com  o  inquérito somente  para  prejudicar  alguém,  é  possível  a  concessão  de  ordem  de  hábeas corpus  para  trancar  a  investigação  por  falta  de  justa  causa.  Essa  situação,  no entanto, deve ser sempre excepcional.

 

            Caso  o  chefe  do  Ministério  Público  entenda  que  a  razão  está  com  o promotor, devolve o  inquérito ou as peças ao Juiz,  insistindo no arquivamento e dando a sua fundamentação. Nesse caso, está o magistrado obrigado a acolher o pedido, uma vez que não pode dar início à ação penal, sem participação ativa do Ministério Público.

 

            Crendo,  no  entanto,  que  a  razão  se  encontra  com  o  magistrado,  o Procurador-Geral  pode  denunciar  diretamente  –  o  que  não  costuma  fazer  –  ou designar outro promotor para oferecer, em seu nome, a denúncia – o que é mais comum. Trata-se de uma delegação e, por esse motivo, o promotor designado não poderá recusar-se a dar início à ação penal, sob pena de falta funcional. Ele age em  nome  do  Procurador-Geral,  razão  por  que  não  há  escusa  para  deixar  de oferecer denúncia.

 

           

            Registremos poder o Procurador-Geral de Justiça determinar a  realização de diligências, requisitando-as à policia judiciária, para sanar alguma dúvida, antes de se pronunciar pelo arquivamento ou pela propositura da ação penal.

 

            Na  esfera  Federal,  cabe  a  um  órgão  colegiado  a  análise  do  pedido  de arquivamento feito por procurador da república e rejeitado por juiz federal.

 

8.1 – REQUERIMENTO DE ARQUIVAMENTO EM COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA.

  

            Quando  o  inquérito  é  controlado  diretamente  pelo  Procurador-Geral  de Justiça (ou da República, conforme o caso), por se tratar de feito de competência originária (o processo inicia-se diretamente em grau de jurisdicional superior, não passando pela 1º  instância), o pedido de arquivamento é dirigido diretamente ao tribunal  (cabe  ao  relator  determinar  o  arquivamento,  segundo  a  maioria  dos regimentos internos dos Tribunais).

 

            Não há, nesse caso, como utilizar o art. 28, sendo obrigatório o acolhimento do  pedido.  E  mais,  não  tendo  sido  requerido  o  arquivamento  pelo  Ministério Público, não é possível ao tribunal encerrar a investigação de oficio.

 

 

8.2  –  ARQUIVAMENTO  DE  INQUÉRITO  DE  CRIMES  CONTRA  A  ECONOMIA POPULAR OU CONTRA A SAÚDE PÚBLICA.

  

            Não  pode  o  tribunal  determinar  que  o  promotor  denuncie,  por  isso  fere a titularidade  da  ação  penal,  não  pertencente  ao  Poder  Judiciário.  Entendeu  o legislador,  nesse  caso,  que  deveria  haver  um  controle  a  mais  no  tocante  ao arquivamento  de  autos  de  inquérito  e  também  no  que  toca  às  absolvições proferidas. Exclui-se do contexto dos crimes contra a saúde pública, para o fim de submeter  o  arquivamento  de  inquérito  a  segundo  grau  de  jurisdição,  todas  as infrações  penais  referentes  a  drogas  ilícitas,  pois  regidas  por  lei  especial  Lei 11.343/06.

 

 

 

 

8.3  –  OBRIGATORIEDADE  DE  OFERECIMENTO  DE  RAZÕES  E  O DENOMINADO ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO.  

 

            Não  existe,  tecnicamente,  pedido  de  arquivamento  implícito  ou  tácito.  É indispensável que o promotor se manifeste claramente a respeito de cada um dos indiciados, fazendo o mesmo no que concerne a cada um dos delitos imputados a eles durante o inquérito. Assim, não pode, igualmente, denunciar por um crime e calar quanto a outro ou outros. Recusando-se a oferecer suas razões, devem os autos  ser  remetidos  ao  Procurador-Geral  para  as  medidas  administrativas cabíveis, uma vez que o promotor não está cumprindo, com zelo, a sua função. 

 

8.4 – ARQUIVAMENTO INDIRETO.

            Seria, segundo  parcela  da  doutrina,  a  hipótese  de  o  promotor  deixar  de oferecer  denúncia  por  entender  que  o  juízo  é  incompetente  para  a  ação  penal. Cremos  que  tal  situação  é  inadmissível,  pois  o Ministério  Público  deve  buscar, sempre  que  possível,  a  solução  que  lhe  compete  para  superar  obstáculos processuais. Assim, caso entenda que o juízo é incompetente, mas há justa causa para a ação penal (materialidade e  indícios de autoria), deve solicitar a remessa

dos  autos  ao  magistrado  competente  e  não  simplesmente  deixar  de  oferecer denúncia, restando inerte.

 

            Caso  o  juiz,  após  o  pedido  de  remessa,  julgue-se  competente,  poderá invocar  o  preceituado  no  art.  28,  para  que  o  Procurador-Geral  se  manifeste. Entendendo este ser o  juízo competente, designará outro promotor para oferecer denúncia.  Do  contrário,  insistirá  na  remessa.  Caso,  ainda  assim,  o  magistrado recuse-se  a  faze-lo,  cabe  ao Ministério Público  providenciar  cópias  necessárias para  provocar  o  juízo  competente. Assim  providenciando,  haverá,  certamente,  a suscitação  de  conflito  de  competência  se  ambos  os  juizes  se  proclamarem competentes para julgar o caso. Logo, a simples inércia da instituição, recusando-se  a  denunciar,  mas  sem  tomar  outra  providência  não  deve  ser  aceita  como arquivamento indireto.

 

8.5 – DESARQUIVAMENTO.

O  desarquivamento  é  ato  privativo  do  Ministério  Público,  sem  a necessidade de intervenção judicial, ocorrendo quando o promotor, convencido da existências de novas provas (Súmula nº. 524, STF), oferece denúncia, exercendo a ação penal. O ato jurídico do desarquivamento ocorreria com o oferecimento da denúncia,  que  está  condicionada  ao  surgimento  de  novas  provas,  segundo  a jurisprudência  sumulada  do Pretório Excelso,  sempre  que  em momento  anterior tenha ocorrido o arquivamento.

 

            Concluímos  que,  enquanto  os  autos  do  inquérito  estiverem  arquivados, pode  o  delegado  de  policia  validamente  colher  qualquer  elemento  que  possa simbolizar a existência de prova nova, remetendo-os prontamente ao magistrado. Uma vez entregue o inquérito policial ao Ministério Público e caso se convença o promotor de que se trata realmente de prova nova, oferecerá denúncia, operando-se assim o desarquivamento.  

 

9 – TERMO CIRCUNSTANCIADO

 

            Nos crimes de menor potencial ofensivo, quais sejam, os crimes com pena máxima  não  superior  a  dois  anos  e  todas  as  contravenções  penais  comuns, tratados pela Lei nº. 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais), o  legislador, visando imprimir  celeridade,  prevê,  como  regra,  no  art.  69,  a  substituição  do  inquérito policial pela confecção do termo circunstanciado de ocorrência (TCO), que é uma peça  despida  de  rigor  formal,  contendo  breve  e  sucinta  narrativa  que  descreve sumamente os fatos e indica os envolvidos e eventuais testemunhas, devendo ser remetido, incontinenti, aos Juizados Especiais Criminais.

 

            É mera  irregularidade a  realização de  inquérito policial ao  invés do  termo circunstanciado. Em algumas situações, como na hipótese da autoria da infração ser desconhecida ou da alta complexidade do  fato,  restará à autoridade policial, como alternativa, a elaboração do inquérito.  

 

 

 

 

 

10 – TRANCAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL.

 

            Admite-se  que,  valendo-se  do  hábeas  corpus,  a  pessoa  eleita  pela autoridade policial como suspeita possa recorrer ao Judiciário para fazer cessar o constrangimento  a  qual  está  exposto,  pela  mera  instauração  de  investigação infundada. O inquérito é um mecanismo de exercício de poder estatal, valendo-se de  inúmeros  instrumentos que certamente podem constranger quem não mereça ser  investigado.  O  indiciamento,  como  já  se  viu,  é  mais  grave  ainda,  pois  faz anotar, definitivamente, na  folha de antecedentes do sujeito a suspeita de  ter ele cometido um delito.

 

            Por  tal  razão,  quando  se  perceber  nítido  abuso  na  instauração  de  um inquérito  (por  exemplo,  por  fato  atípico)  ou  a  condução  das  investigações  na direção  de  determinada  pessoa  sem  a  menor  base  de  prova,  é  cabível  o trancamento  da  atividade  persecutória  do  Estado.  Entretanto,  é  hipótese excepcional, uma vez que  investigar não significar processar, não exigindo, pois, justa causa e provas suficientes para  tanto. Coíbe-se o abuso e não a atividade regular da polícia judiciária.

 

11–PROSSEGUIMENTO DAS INVESTIGAÇÕES APÓS O ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO.

 

            A  decisão  que  determina  o  arquivamento  do  inquérito  não  gera  coisa julgada material,  podendo  ser  revista  a  qualquer  tempo,  inclusive  porque  novas provas podem surgir. Ocorre que a autoridade policial, segundo o preceituado em lei, independentemente da instauração de outro inquérito, pode proceder a novas pesquisas, o que significa sair em busca de provas que surjam e cheguem ao seu conhecimento.

 

            Para  reavivar o  inquérito policial, desarquivando-o, cremos ser necessário que  as  provas  coletadas  sejam  substancialmente  novas  –  aquelas  realmente desconhecidas  anteriormente  por  qualquer  das  autoridades  -,  sob  pena  de configurar  um  constrangimento  ilegal.  Nesse  sentido,  a  Súmula  524  do  STF “Arquivado o  inquérito policial por despacho do  juiz, a  requerimento do Promotor de Justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas”.

 

            Entretanto,  se  o  arquivamento  ocorrer  com  fundamento  na  atipicidade  da conduta  é  possível  gerar  coisa  julgada  material.  A  conclusão  extraída  pelo Ministério Público (órgão que requer o arquivamento), encampada pelo Judiciário (órgão  que  determina  o  arquivamento),  de  se  tratar  de  fato  atípico  (irrelevante penal)  deve  ser  considerada  definitiva.  Não  há  sentido  em  sustentar  que, posteriormente,  alguém  possa  conseguir  novas  provas  a  respeito  de  fato  já declarado penalmente irrisório. Nesse sentido já decidiu o STF no: HC 83.346-SP, rel. Sepúlveda Pertence, 17/05/2005, Informativo 388.

 

            Em nosso ponto de vista, o mesmo deveria ocorrer se o arquivamento se der por exclusão da ilicitude ou da culpabilidade, afirmando o Ministério Público ao juiz  que  deixa  de  denunciar  o  indiciado  ou  investigado,  tendo  em  vista  inexistir crime.  Da  mesma  forma  que  a  solução  acerca  da  atipicidade,  cremos  estar formada a coisa julgada material, em caso de arquivamento, sem possibilidade de continuidade das investigações no futuro.   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

12 – CONSIDERAÇÕES FINAIS 

            Sem  a  pretensão, por  óbvio,  de  se  ter  esgotado  o  tema,  acredita-se  que, com  esse  artigo,  apresentou-se,  de  forma  prática  e  sintética,  os  principais aspectos que há de ser  levado em conta quanto a uma  investigação penal bem fundamentada de todos aqueles que transitam pelo território nacional e que ficam sujeitos à legislação pátria.

 

            Nesta  breve  visão  jurídica  do  papel  da  polícia  e  do  cidadão  frente  o procedimento  do  inquérito  policial,  pudemos  observar  que  esse  tipo  de procedimento  policial  é  uma  importantíssima  ferramenta  de  controle  social,  que usada  de  modo  adequado  e  proporcional,  mostra-se  extremamente  útil  à prevenção e repressão à prática dos delitos, uma vez que, legitimamente aplicada, retira  do  seio  social  aqueles  que  vão  de  encontro  às  normas  de  um  convívio pacífico e de respeito à inviolabilidade física e patrimonial dos seus pares.

 

            Partindo-se  do  conceito  de  poder de  polícia,  definindo  o  inquérito policial, elencando-se os casos em que ela caiba, descobrindo-se as atribuições de cada instituição estatal nesta tarefa e o papel do cidadão, bem como os seus direitos e deveres,  acredita-se  ter  contribuído  para  uma  melhor  prestação  desse  serviço público  realizado  pelas  equipes  dos  plantões  de  polícia,  contribuindo-se  assim, para a melhoria da qualidade do atendimento, repercutindo, dessa  forma, na boa imagem das instituições envolvidas neste atuar.

 

            Com  estas  considerações,  acredita-se  que  essa  pesquisa  atendeu  aos seus  objetivos,  fornecendo  pontos  de  referência  para  a  discussão  sobre  a necessidade  de  que  todos  tenham  perfeito  conhecimento  de  seus  direitos  e deveres  frente  a  um Estado Democrático  de Direito  face  a  esse  fundamental  e precioso direito humano, que é a  liberdade de  ir e vir; como bem  traz o preceito constitucional do art. 5º, XV, da CF/88: “É livre a locomoção no território nacional em  tempo  de  paz,  podendo  qualquer  pessoa,  nos  termos  da  lei,  nele  entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.” (sem grifos no original).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

13 - REFERÊNCIAS:

 

            1- ALEXANDRINO,  Marcelo  &  PAULO,  Vicente.  Direito  administrativo      descomplicado. 14 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

 

            2- CAPEZ,  Fernando.  Curso  de  processo  penal.  13  ed.  São  Paulo:  Saraiva, 2006.

 

            3- GOMES, Luis Flavio. Direito Penal Vol. 2, Parte Geral. Revista dos Tribunais, 2008.

 

            4- NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 3º ed. São             Paulo: RT, 2007.

 

            5- TÁVORA,  Nestor.  Curso  de  direito  processual  penal.  3º  ed.  Jus  Podivm, 2009.


 

Sobre o autor
Xico Ferreira

Graduado em Química pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Mestre em Química também pela UFRN e Especialista Em Gestão da Segurança Pública pela FACULDADE DE TECNOLOGIA DARCY RIBEIRO.

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Artigo apresentado à Faculdade Darcy Ribeiro, como requisito parcial para obtenção do título de Especialista, pelo curso de pós graduação (lato sensu) em Gestão da Segurança Pública, da Faculdade de Tecnologia Darcy Ribeiro

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