5. Considerações finais
A sociedade do século XXI não mais convive pacificamente com o dano irreparado. A cada dia, novas Leis, que aplicam a teoria objetiva, surgem para reforçar essa certeza. É nesse contexto que se insere a Lei 10.671/03: uma lei que na matéria de responsabilidade civil reforçou antigas convicções e criou novos paradigmas que em tudo engrandecerão o Direito Pátrio.
Ao final desse estudo, e com base na doutrina, jurisprudência e lei, reputamo-nos aptos a concluir:
O estatuto do torcedor não exclui a incidência do CDC;
Com o disposto no art. 3º do estatuto, não mais resta duvida de que a relação entre torcedor e clube/EROC constitui, verdadeiramente, relação de consumo;
Nos termos do art. 14. do estatuto, o dever de garantir a segurança do torcedor nos estádios, é do clube com mando de jogo;
Se, da inobservância desse dever, sobrevém dano ao torcedor, a responsabilidade será solidária e objetiva do clube e da EROC;
O cumprimento, por parte do clube, do dever de solicitação de força pública, não elide sua própria responsabilidade por danos decorrentes de falhas de segurança nas dependências do estádio;
Da mesma forma, o descumprimento desse dever não elide a responsabilidade do Estado e
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O conceito de falha de segurança presente no artigo 19 do estatuto não se confunde com o de fato do produto/serviço: Por aquela, respondem sempre o clube e a EROC solidariamente e independentemente de culpa. Ao passo que pelo fato do produto/serviço, responderá, nos termos do CDC o prestador do serviço ou do produto, que eventualmente, mas não necessariamente, será o clube ou EROC.
Referências
BONAVIDES, Davi de Oliveira Paiva. Uma Análise sobre o estatuto do torcedor. In In verbis n. 15, jan/jun de 2003. P. 116-125
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Vol. I 5ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1973
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. São Paulo: Atlas, 2001
MOURA, Rodrigo Almeida Gomes. O estatuto de defesa do torcedor e a responsabilidade objetiva: disponível em https://www.juspodivm.com.br/novo/arquivos/artigos/outros/estatuto_do_torcedor_rodrigo_almeida_gomes_moura.pdf capturado em 10:06 21/11/03
SITES
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: https://www.tj.rs.gov.br/
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: https://www.tj.rj.gov.br/
Notas
[1] Apud José de Aguiar Dias. Da responsabilidade civil. Vol. I 5ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1973. P. 56
[2] No Direito estrangeiro, são citados os seguintes precedentes legislativos: O decreto real de 1993 na Espanha, e o Football Act de 2000 na Inglaterra. Cf a respeito: Davi de Oliveira Paiva Bonavides. Uma Análise sobre o estatuto do torcedor. In In verbis n. 15, jan/jun de 2003. P. 116-125.
[3] "... afinal de contas, todos somos, em maior ou menor grau, consumidores de produtos e serviços, a cada instante de nossas vidas". (Manual de Direitos do Consumidor. São Paulo: Atlas, 2001. Nota do autor).
[4] Rodrigo Almeida Gomes Moura (O estatuto de defesa do torcedor e a responsabilidade objetiva: disponível em https://www.juspodivm.com.br/novo/arquivos/artigos/outros/estatuto_do_torcedor_rodrigo_almeida_gomes_moura.pdf capturado em 10:06 21/11/03) registra o dissenso doutrinário. E na jurisprudência, encontramos julgado de 2002, no qual se responsabiliza o clube, responsável pelo jogo, por agressões cometidas por seus prepostos, com base na culpa in eligendo (art. 1.523. do antigo código); não aplicando-se, portanto, o artigo 14 do CDC (que trata da responsabilidade por fato do serviço) que, como se sabe, autoriza a responsabilização objetiva (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: Apel. Cív. 14.908/2002). E o fato do lesionado não ter sido propriamente torcedor, mas ambulante, não justifica a inaplicação do CDC. Caso se admitisse, já naquela época, o clube responsável pelo mando de campo como fornecedor, nos termos da lei 8.078/90, inevitavelmente o ambulante seria consumidor por equiparação. Eis que prevê o art. 17. do CDC: Para os efeitos dessa seção (fato do produto e do serviço), equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.
[5] Eis o dispositivo da mencionada Lei: Art. 42. (...) § 3º. O espectador pagante, por qualquer meio, de espetáculo ou evento desportivo equipara-se, para todos os efeitos legais, ao consumidor, nos termos do artigo 2º da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.
[6] Mas justiça seja feita: havia Tribunais que já a partir da Lei Pelé aplicavam o CDC nas relações de que tratamos. Citamos, por todos, os seguintes julgados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: Apel. Cív. Nº 70002711240, nona câmara cível, tribunal de justiça do rs, relator: Rejane Maria Dias de Castro Bins, julgado em 03/08/2001; e Apel. Cív. nº 70001973718, décima câmara cível, tribunal de justiça do rs, relator: Luiz Ary Vessini de Lima, julgado em 23/08/2001). No segundo acórdão, rebate-se aquele que julgamos ser o principal argumento contra a incidência do CDC nas relações de que tratamos: A suposta inconstitucionalidade do art. 42. § 3º da Lei Pelé. Argumenta-se que o CDC, por possuir expressa previsão constitucional, teria, senão formalmente, mas ao menos materialmente, status de Lei Complementar. Só podendo, portanto, ser alterado por outra Lei da mesma categoria. Esse tema merece ponderação, uma vez que reconhecida a inconstitucionalidade do dispositivo da Lei Pelé, o efeito deveria ser o mesmo quanto ao art. 3º do estatuto do torcedor. Mas, como nesse trabalho não há espaço para tanto, recomendamos a leitura do mencionado julgado na Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Vol 214, página 297. Muito embora nem ali se esgote o tema.
[7] E o art. 3º § 2º do CDC estabelece que só é fornecedor quem exerce atividade remunerada.
[8] Nesse artigo havia definição de estádio. Nas razões de veto ponderou-se do conhecido risco que há de se engessar a aplicação da lei com definições despiciendas.
[9] Apud. Sergio Cavalieri Filho. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 26
[10] Designando número de policiais aquém do necessário, ou despreparados para desempenhar seu papel, por exemplo.
[11] Apel. Cív. 5.536. de 1998 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Tendo o fato ocorrido no Maracanã, responsabilizou-se a SUDERJ, mas cogitou-se, até mesmo, de responsabilizar a própria empresa da qual se fazia publicidade na placa