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A desconsideração da personalidade jurídica e sua aplicação à empresa individual de responsabilidade limitada – EIRELI

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Agenda 15/07/2016 às 09:23

A empresa individual de responsabilidade limitada poderá ter sua personalidade desconsiderada quando o titular agir com abuso de direito, escondendo-se por detrás do véu da empresa para praticar atos fraudulentos.

SUMÁRIO: Introdução; 1. A Empresa Individual de Responsabilidade Limitada; 2. O Instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica; 3. A Possibilidade de Desconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI; Considerações Finais; Referências das Fontes Citadas.

RESUMO: O presente artigo tem por escopo o estudo acerca da possibilidade de aplicação do instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica no cerne da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI, demonstrando seus aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais. Neste artigo, poderá se compreender, de forma clara, os motivos que levam o magistrado a desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa, os quais podem ocorrer em decorrência de desvios da finalidade, abusos do direito, mediante fraudes à lei ou, até mesmo, confundindo-se sua personalidade com a do titular. Quanto à metodologia empregada, esta pesquisa foi desenvolvida utilizando o método indutivo, isto é, estabelecidas as partes do fenômeno, centrou-se na pesquisa em direção à formulação principal, através de pesquisa bibliográfica, jurisprudencial e legislativa.

PALAVRAS CHAVES:Direito Empresarial. Pessoa Jurídica. Personalidade Jurídica. Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI). Desconsideração da Personalidade Jurídica.


INTRODUÇÃO

O objeto deste artigo cientifico é o estudo acerca das possibilidades de aplicação do instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica à Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI). Seus objetivos são: a) Institucional: produção de Artigo Científico para obtenção de título de Especialista em Direito Empresarial, pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI; b) geral: analisar a legislação a doutrina e a jurisprudência acerca da aplicação da Desconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada. Os Objetivos Específicos são: a) compreender, em breve resumo, os motivos que levam o magistrado a aplicar o instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica à EIRELI; b) entender os aspectos gerais da constituição da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada; c) analisar as correntes doutrinárias favoráveis e desfavoráveis acerca da Desconsideração da Personalidade Jurídica; d) identificar qual é o entendimento doutrinário e jurisprudencial atual acerca da possibilidade de Desconsiderar a Personalidade Jurídica da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada.

O artigo está dividido em três momentos: no primeiro se fez uma análise da constituição da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada; no segundo momento se avalia a aplicação do Instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica. Posteriormente se faz um breve estudo acerca da possibilidade de aplicar o instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica à Empresa Individual de Responsabilidade Limitada.

Quanto à Metodologia, o relato dos resultados será composto na base lógica Indutiva3. Nas diversas fases da Pesquisa, serão utilizadas as Técnicas do Referente4, da Categoria5, do Conceito Operacional6 e da Pesquisa Bibliográfica7.


EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA

A Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, também conhecida como EIRELI, foi criada pela lei n. 12.441/2011, que acrescentou o artigo 980-A, ao Livro II da Parte Especial do Código Civil Brasileiro8:

Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.

§ 1º O nome empresarial deverá ser formado pela inclusão da expressão "EIRELI" após a firma ou a denominação social da empresa individual de responsabilidade limitada.

§ 2º A pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade.

§ 3º A empresa individual de responsabilidade limitada também poderá resultar da concentração das quotas de outra modalidade societária num único sócio, independentemente das razões que motivaram tal concentração.

§ 4º (VETADO).

§ 5º Poderá ser atribuída à empresa individual de responsabilidade limitada constituída para a prestação de serviços de qualquer natureza a remuneração decorrente da cessão de direitos patrimoniais de autor ou de imagem, nome, marca ou voz de que seja detentor o titular da pessoa jurídica, vinculados à atividade profissional.

§ 6º Aplicam-se à empresa individual de responsabilidade limitada, no que couber, as regras previstas para as sociedades limitadas

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Em suma, nas palavras da norma acima descrita, a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) é uma empresa constituída por apenas um titular, o qual é dono de todo o capital integralizado, sendo que os patrimônios do titular e da empresa não se confundem.

No enredo do parágrafo terceiro da norma acima transcrita, sua constituição empresária pode se dar de forma originária ou derivada. Será originária sempre que sua instituição coincidir com o início da atividade empresária e derivada quando houver transformação para EIRELI9.

Porém, para a constituição, de forma derivada, da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, o empresário necessita optar pelo seu regime, sob pena de constituir-se como empresário individual, nos termos dos entendimentos jurisprudenciais vigentes:

EXECUÇÃO DE TITULO EXTRAJUDICIAL PRETENSÃO DE REFORMA DA DECISÃO QUE INDEFERIU O REQUERIMENTO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA SOCIEDADE EXECUTADA - CABIMENTO A retirada de sócio de pessoa jurídica resulta em uma empresa unipessoal, e a pluralidade de sócios não foi regularizada no prazo de 180 dias (CC, art. 1.033, inc. IV), gerando a dissolução da sociedade por força legal, sendo que nas hipóteses em que ela continuar suas atividades sem optar pela EIRELI (empresa individual de responsabilidade limitada), passa a se constituir em empresa individual, onde seu sócio responde ilimitadamente pelas obrigações comerciais. Abuso de personalidade jurídica caracterizado, pelo desvio de finalidade, porque o empresário individual não pode se escudar do cumprimento das obrigações assumidas por seu único sócio, revestido de uma pseudo pessoa jurídica. Cabimento da desconsideração da personalidade jurídica da devedora. Recurso provido10.

Doutra senda, uma das maiores peculiaridades encontradas no cerne da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada é que, embora a empresa seja constituída por apenas um titular, a responsabilidade entre o titular e a Pessoa Jurídica não se confundem.

Vislumbra-se, também, pelo texto do artigo 980-A do Código Civil, que a constituição da EIRELI somente se consolidará quando a totalidade do capital for igual ou superior a 100 (cem) salários mínimos.

O montante exigido ao capital tem gerado grandes discussões doutrinárias e jurisprudenciais, visto que, em se tratando de empresa unipessoal, muitos não possuem quantia tão elevada para investir e iniciar negócio próprio.

Diante deste enlevo, extrai-se da obra de GONÇALVES NETO11, a seguinte vertente:

O piso de 100 (cem) salários mínimos, se não impossibilitar, pode dificultar a adoção do instituto da empresa individual de responsabilidade limitada pelo microempreendedor individual, isto é, pelo empresário que aufere no ano receita bruta inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) (art. 18-A, parágrafo único, da Lei Complementar n. 123/2006). Embora capital não se confunda com receita, o fato é que quem não alcança uma receita dessa grandeza nem sempre terá capital correspondente a ela.

No mesmo norte, a Ação Direta de Inconstitucionalidade n°. 4.637, apresentada junto ao Supremo Tribunal Federal, tem o condão de emergir a inconstitucionalidade da regra que delimita o montante do capital à EIRELI, sob o escopo de infringir diretamente o princípio da livre iniciativa, bem como, no sentido de que a exigência vai de encontro à vedação imposta no inciso IV do art. 7° da CRFB/1988, a qual proíbe a vinculação do salário mínimo para qualquer fim12.

Conquanto, por outro lado, há de se denotar que o capital mínimo tem o condão de proteger os credores, vez que possuem a garantia do capital inicial integralizado, em casos de insolvência.

Ademais, a imposição de capital mínimo tem o fito “de não desvirtuar a iniciativa que se preste a meio e ocasião para dissimular ou ocultar vínculo ou relação diversa13”.

Ultrapassadas as discussões acerca do capital integralizado, infere-se que, na concepção de CRISTIANO14, a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada se conceitua como uma unidade econômica independente e definida, com separação clara entre o titular e a Pessoa Jurídica.

No que tange à responsabilidade do empresário, vislumbra-se que esta deverá ser limitada ao valor total do capital integralizado, declarado na sua constituição15.

Em suma, a EIRELI foi uma maneira encontrada pelo legislador de proteger o empresário, cujo qual, com a nova regra, poderá manter a empresa de forma a não atingir seus bens pessoais.

O teor do enunciado e da justificativa proferidos na V Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, realizado no ano de 201116, referente ao artigo 980-A, que trata sobre a EIRELI, apontam o seguinte diapasão:

Artigo 980-A:

Enunciado: o patrimônio social da empresa individual de responsabilidade limitada responderá pelas dívidas da pessoal jurídica, não se confundindo com o patrimônio da pessoa natural que a constituiu, sem prejuízo da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica.

Justificativa: o veto presidencial ao parágrafo quarto do artigo 980-A do Código Civil pode engendrar duas interpretações que merecem ser afastadas: 1) a diferenciação patrimonial entre o patrimônio da pessoa constituinte da EIRELI estaria mitigada; e 2) por essa razão, seria descabida a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

No mesmo passo, a jurisprudência brasileira tem se manifestado no sentido de individualizar a responsabilidade da empresa e do titular propriamente dito, quando se tratar de EIRELI:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – PRETENSÃO PENHORA DE BENS DE TITULARIDADE DE EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (EIRELI) CONSTITUÍDA PELO DEVEDOR – INADMISSIBILIDADE – patrimônio da empresa constituída pelo devedor que não se confunde com o patrimônio deste – empresa cujo capital social é constituído por um único titular – figura empresária criada pela Lei nº 12.441/2011 que se equipara, para fins de responsabilização de seu titular, à sociedade limitada – impossibilidade de constrição de bens da empresa, que não figura no polo passivo da execução – pretensão de penhora das cotas do capital social – não conhecimento – pedido ainda não apreciado pelo juiz de 1º grau – apreciação nesta sede recursal que seria açodada e representaria indevida supressão de um grau de jurisdição – agravo parcialmente conhecido e, na parte conhecida, desprovido17.

Doutra visão, pode-se dizer que a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) quebrou os paradigmas da doutrina itinerante, alavancando a regra da possibilidade da existência de uma empresa unipessoal.

Atualmente, entende-se que a EIRELI tem natureza sui generis, constituindo um novo gênero de Pessoa Jurídica de direito privado.

Tanto é verdade, que o artigo 44 do Código Civil aponta, expressamente, a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada como Pessoa Jurídica de direito privado18.

Art. 44.  São pessoas jurídicas de direito privado:

1.As associações;

2.As sociedades;

3.As fundações;

4.As organizações religiosas;

5.Os partidos políticos;

6.As empresas individuais de responsabilidade limitada;

§1°. São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento;

§2°. As disposições concernentes às associações aplicam-se subsidiariamente às sociedades que são objeto do Livro II da Parte Especial deste código;

§3°. Os partidos políticos serão organizados e funcionaram conforme o disposto em lei específica

Nas palavras de BRUSCATO19 a EIRELI se destaca por ser uma figura autônoma, incorporada de forma direta e explícita pela legislação.

Pode se dizer, ainda, que a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada foi criada com o escopo de extinguir a sociedade fictícia, a qual era corriqueira na realidade brasileira.

Sobre as sociedades fictícias, cumpre denotar a vertente trazida à baila por BRUSCATO20:

O fato ocorre quando o empresário – na realidade, individual – deseja obter o benefício da limitação da responsabilidade, salvaguardando seu patrimônio pessoal, mas não necessita, em verdade, somar aos seus, esforços e recursos de outrem, que apenas figura no contrato social para que possa existir um contrato, atendendo ao requisito da pluripessoalidade.

Em outras palavras, na sociedade fictícia existe um sócio majoritário, o qual, na expectativa de limitar a sua responsabilidade, associa-se a outros sócios, que apenas figuram como fantoches, sem interesse genuíno no desenvolvimento da empresa21.

Assim, a EIRELI sobreveio para transpor a irregularidade acima articulada, visto que é dotada de Personalidade Jurídica independente da de seu instituidor e, dessa maneira, estar-se-ia diante de dois sujeitos de direito, cada qual com o correspondente patrimônio22.

Sobre a autora
Greice Cristine Libardo Paterno

Procuradora do Município de Brusque/SC, especialista em direito empresarial e dos negócios.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PATERNO, Greice Cristine Libardo. A desconsideração da personalidade jurídica e sua aplicação à empresa individual de responsabilidade limitada – EIRELI. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4762, 15 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50549. Acesso em: 15 nov. 2024.

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