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Reflexões acerca de aspectos processuais da obrigação alimentar avoenga

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Agenda 14/07/2016 às 11:20

Neste trabalho buscou-se refletir sobre aspectos processuais da obrigação alimentar dos avós para com seus netos, a saber: a natureza dessa obrigação; a possibilidade de formação de litisconsórcio passivo e o cabimento ou não prisão civil aos avós.

Sumário: Introdução; 1.Aspectos gerais da obrigação alimentar avoenga; 2.Dos aspectos processuais da obrigação alimentar avoenga; 2.1. Da subsidiaridade e complementaridade da obrigação alimentar dos avós; 2.2 Divisibilidade da obrigação alimentar avoenga entre parentes do mesmo grau (avós paternos e maternos) – Litisconsórcio passivo; 2.3 Execução de alimentos - prisão cível – cabimento/ não cabimento na obrigação alimentar avoenga.


Introdução

O presente trabalho constitui-se de uma reflexão de alguns aspectos processuais da obrigação alimentar dos avós para com os seus netos, também denominada de obrigação alimentar avoenga. Promover uma reflexão nesse sentido possui relevância para o Estado, sociedade e família, uma vez que o direito a obrigação de alimentar está relacionada à garantia do direito à vida, à sobrevivência, à dignidade humana daqueles que necessitam dos alimentos, crianças e adolescentes e por outro lado delimita o alcance do dever dos avós com essa obrigação. Leis, doutrinas, artigos científicos, jurisprudências sobre a questão da obrigação alimentar avoenga foram instrumentos básicos que deram a tônica às reflexões aqui expostas, especificamente julgados do Tribunal de Justiça de Alagoas a respeito da obrigação alimentar avoenga e como vem se posicionando os Tribunais Superiores e doutrinadores sobre o tema.


1. Aspectos gerais da obrigação alimentar avoenga

A obrigação alimentar avoenga encontra fundamento legal no Artigo 1.696 do Código Civil Brasileiro que assim preconiza: “O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros".

Esse dispositivo legal além de regular as relações de reciprocidade, decorrentes da relação de parentesco no que diz respeito à prestação de alimentos entre pais e filhos, ainda pontua a ordem de chamamento dos parentes que serão obrigados a assumir a obrigação de alimentar crianças e adolescentes cujos pais não possuam condições de assumir tal encargo total ou parcialmente.

É aí onde se insere, em primeiro plano, o chamamento dos avós a prestarem alimentos aos seus netos, quando os principais responsáveis, os pais, não dispõem de meios para assumir total ou parcialmente tal responsabilidade.

Nos casos em que os avós idosos são chamados judicialmente a prestar alimentos aos netos deve ser analisado, nessas hipóteses, o critério possibilidade do alimentante, de modo a não comprometer a sobrevivência deste que já possui inúmeros compromissos financeiros decorrentes da idade avançada. Por outro lado, também a criança ou adolescente que pleiteia a contribuição alimentar avoenga está em condição de vulnerabilidade, enfrentando problemas econômicos pertinentes à faixa etária, devendo ser observado também a necessidade do alimentando.

Tanto a criança e o adolescente quanto o idoso encontram seus direitos e garantias fundamentais juridicamente tutelados, respectivamente, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e no Estatuto do Idoso. Assim, o artigo 3°e 4° do ECA e o art. 3° do Estatuto do Idoso é expressivo da centralidade da proteção à dignidade da pessoa humana no ordenamento pátrio, decorrente de princípios constitucionais que os norteiam.

Posto isto, vale destacar que a vinculação dos avós à obrigação alimentar dos netos assume o contorno de assistência e solidariedade familiar em observância ao respeito e garantia ao princípio da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse da criança. Tal incumbência legal atribuída aos avós não pode ser confundida com o dever de sustento que é de responsabilidade exclusivamente dos pais, decorrente do poder familiar, conforme dispõe o artigo 1.566 do Código Civil, o Artigo 229 da Constituição Federal e o artigo 22 do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), abaixo transcritos.

Art. 1.566 do Código Civil. São deveres de ambos os cônjuges:

IV – sustento, guarda e educação dos filhos;

Art. 229 da Constituição Federal- Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores (...).

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. (Grifos Nosso)

Tais dispositivos legais evidenciam o entendimento que a obrigação alimentar das crianças e adolescentes é atribuição principal dos pais e somente na falta ou incapacidade econômica destes em cumprir com esse dever é que os avós são chamados a assumir a obrigação alimentar dos netos menores de idade, de forma complementar e subsidiária.


2. Dos aspectos processuais da obrigação alimentar avoenga

Os aspectos processuais da obrigação alimentar avoenga objeto de reflexão desse trabalho são:

2.1. Da subsidiaridade e complementaridade da obrigação alimentar dos avós

No artigo 1.696 do CC/2002 está explicito que obrigação de prestar alimentos é recíproca entre pais e filhos e extensiva a outros integrantes da família do alimentante e alimentando, observada a ordem de grau de parentesco com o alimentante para suceder no dever de alimentar, uns em falta dos outros e os mais próximos são preferidos até alcançar os mais distantes em grau.

Em observância ao sentido literal do disposto no art.1.696 do CC/ 2002, não podem os avós serem demandados diretamente a assumir a obrigação alimentar dos netos sem que antes os pais da criança ou adolescente credora dos alimentos tenham figurado no pólo passivo da ação de alimentos e ter havido o esgotamento de todas as possibilidades deste arcar com a pensão alimentícia dos filhos. É esse mesmo entendimento que se pode extrair do julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas que negou provimento à Apelação Cível n.º 2011.001147-8, mantendo a decisão do juiz a quo, no sentido de não condenar a avó paterna a pagar alimentos à neta, uma vez que na Ação de Alimentos promovida pela genitora da criança, a representando, na primeira instância foi caracterizado a ausência de um dos requisitos das condições da ação que é a legitimidade da parte, ou seja, o demandado deveria ser o genitor da criança e não a avó paterna. Transcrito abaixo segue o referido acórdão.

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CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS. PROPOSITURA EM FACE DA AVÓ. EXTINÇÃO DA DEMANDA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA IMPOSSIBILIDADE DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR PELO GENITOR. DE ACORDO COM O ARTIGO 1.698 DO CÓDIGO CIVIL, A RESPONSABILIDADE DOS ASCENDENTES É SUBSIDIÁRIA. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO CONHECIDO. PROVIMENTO NEGADO. UNANIMIDADE.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2011.001147-8, ALIMENTOS, 2ª CÂMARA CÍVEL, RELATOR: DES. ESTÁCIO LUIZ GAMA DE LIMA JULGADO EM 19.05.2011, RECURSO IMPROVIDO. ACÓRDÃO N.º 2.0508/2011

Evidente que não cabe ao credor dos alimentos escolher a quem demandar a integralidade da obrigação alimentar na falta, ausência ou impossibilidade dos pais em cumprirem com o dever de sustento para com os filhos, o que leva a compreensão que os alimentos avoengos não são considerados uma obrigação solidária. Nas demandas de alimentos há de se observar a linha sucessória, em grau de parentesco com o alimentante, quais parentes assumirão a obrigação alimentar, como dispõe o artigo 1.696 do Código Civil e que explicita a natureza subsidiária e complementar da obrigação alimentar avoenga.

Outro julgado do Tribunal de Justiça de Alagoas Apelação Cível n.º 2010.001014-3 exemplifica a natureza subsidiária e complementar da obrigação alimentar avoenga, por ter os avós paternos da menor seu recurso provido, determinando improcedente a ação de alimentos n° 021.07.5000072-6, que foi proposta na primeira instância diretamente contra os avós paternos sem que o credor dos alimentos demonstrasse com provas cabais que o genitor da criança não poderia pagar a majoração no valor dos alimentos que a menor pleiteava.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. APELAÇÃO CÍVEL. PEDIDO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA COMPLEMENTAR AOS AVÓS PATERNOS. AUSÊNCIA DE PRÉVIO PEDIDO EM RELAÇÃO AO PAI. RESPONSABILIDADE DOS PROGENITORES SUBSIDIÁRIA E COMPLEMENTAR. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. UNANIMIDADE.

APELAÇÃO CÍVEL N.º 2010.001014-3, ALIMENTOS, 2ª CÂMARA CÍVEL, RELATOR: DES. ALCIDES GUSMÃO DA SILVA, JULGADO EM 22.11.2010, RECURSO PROVIDO. ACÓRDÃO N º 2959 /2010.

Ainda outro julgado do Tribunal de Justiça de Alagoas demonstra o mesmo entendimento da obrigação dos avós em prestar alimentos aos netos como medida excepcional e de caráter subsidiário, a saber:

DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ALIMENTOS. PENSÃO ALIMENTÍCIA. PEDIDO DE COMPLEMENTAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA PELOS AVÓS PATERNOS. IMPOSSIBILIDADE. CARÁTER SUBSIDIÁRIO E EXCEPCIONAL DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR AVOENGA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE INCAPACIDADE DO GENITOR DE ARCAR COM A PENSÃO ALIMENTÍCIA FIXADA PELO JUÍZO DE PISO. OBRIGAÇÃO DOS AVÓS NÃO CONFIGURADA. SUSTENTO DO MENOR QUE DEVE SER SUPORTADO POR AMBOS OS GENITORES, RESGUARDADAS AS PROPORÇÕES DE POSSIBILIDADE DE CADA UM. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

APELAÇÃO CÍVEL N.º 0027475-82.2009.8.02.0001, ALIMENTOS, 1ª CÂMARA CÍVEL, RELATOR:DES. WASHINGTON LUIZ D. FREITAS, JULGADO EM 22.11.2014, PROVIMENTO NEGADO

No que diz respeito ao viés complementar da obrigação alimentar avoenga, necessário ressaltar que este se observa quando os avós são demandados para complementar o valor da prestação alimentícia dos netos quando os pais destes possuem poder econômico considerado aquém do necessário para suprir as necessidades alimentares básicas do alimentando. Mas, é necessário não apenas que o alimentando alegue suas necessidades para que o quantum requerido por este seja determinado à título de alimentos. Em toda ação de alimentos o critério necessidade versus possibilidade versus proporcionalidade/ razoabilidade deve ser observado para a estipulação do quantum alimentar pelo magistrado, seja quando figurar no pólo passivo da relação processual somente os pais do alimentando, seja quando os avós também forem demandados à prestação alimentícia dos netos. Desse modo tem se pronunciado o Tribunal de Justiça de Alagoas quanto aos critérios que devem ser observados para o arbitramento do quantum alimentício, vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. ALIMENTOS. MAJORAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA. INVIABILIDADE. FIXAÇÃO DE ACORDO COM O BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DOS TRIBUNAIS PÁTRIOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO À UNANIMIDADE

APELAÇÃO CÍVEL N.º 2010.006066-7, ALIMENTOS, 26ª Vara Cível da Capital Família RELATOR: DES. ALCIDES GUSMÃO DA SILVA, JULGADO EM 13.01.2011, RECURSO IMPROVIDO À UNANIMIDADE. ACÓRDÃO N º 2.0020 /2011

Mesmo nos casos de crianças de menor idade cuja necessidade alimentar é presumida e que deve prevalecer o melhor interesse da criança tais critérios devem ser levados em consideração como forma de sopesar os princípios em conflito e garantir que a decisão não afronte e a dignidade humana, à vida e a sobrevivência de todos os envolvidos na lide de alimentos.

2.2 Divisibilidade da obrigação alimentar avoenga entre parentes do mesmo grau (avós paternos e maternos) – Litisconsórcio passivo

O artigo 1.698 do Código Civil dispõe que pertencendo os parentes ao mesmo grau, a obrigação alimentar poderá ser dividida entre eles em quotas proporcionais às possibilidades financeiras de cada um.

Isto posto, vale ressaltar que quando os pais não dispõem de recursos financeiros suficientes para arcarem com a pensão alimentícia dos filhos ou quando não tem condições financeiras alguma para cumprir com esse dever, tanto os avós paternos como os maternos deverão ser demandados para assumir integralmente a obrigação alimentar dos netos ou complementar a pensão alimentícia prestada pelo genitor do alimentado que se configurar insuficiente para manter suas necessidades compatível com uma vida digna. Quando os avós paternos e maternos figurarem no pólo passivo da relação processual a obrigação alimentar poderá ser dividida entre eles em quotas proporcionais às possibilidades financeiras de cada um.. Existem posicionamentos do Superior Tribunal de Justiça que conduzem a este entendimento, a saber:

CIVIL. ALIMENTOS. RESPONSABILIDADE DOS AVÓS. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. TERMO FINAL. TRÂNSITO EM JULGADO.

1. (...)

2. A responsabilidade dos avós quantos aos alimentos é complementar e deve ser diluída entre todos eles (paternos e maternos). (Grifos Nosso)

3. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para estabelecer que, até o trânsito em julgado, o pensionamento deverá ser no valor estabelecido provisoriamente, reduzido em 50% (cinqüenta por cento) o quantitativo estabelecido em definitivo.

REsp 401484 / PB RECURSO ESPECIAL 2001/0150265-4, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES

CIVIL. ALIMENTOS. RESPONSABILIDADE DOS AVÓS. OBRIGAÇÃO COMPLEMENTAR E SUCESSIVA. LITISCONSÓRCIO. SOLIDARIEDADE. AUSÊNCIA.

1 – (...)

2 – (...)

3 - Neste contexto, à luz do novo Código Civil, frustrada a obrigação alimentar principal, de responsabilidade dos pais, a obrigação subsidiária deve ser diluída entre os avós paternos e maternos na medida de seus recursos, diante de sua divisibilidade e possibilidade de fracionamento. (Grifos Nosso). A necessidade alimentar não deve ser pautada por quem paga, mas sim por quem recebe, representando para o alimentado maior provisionamento tantos quantos coobrigados houver no pólo passivo da demanda.

4 - Recurso especial conhecido e provido

REsp 658139 / RS RECURSO ESPECIAL 2004/0063876-0, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. INSUFICIÊNCIA DOS ALIMENTOS PRESTADOS PELO GENITOR. COMPLEMENTAÇÃO. AVÓS PATERNOS DEMANDADOS. PEDIDO DE LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO ENTRE AVÓS PATERNOS E MATERNOS. CABIMENTO, NOS TERMOS DO ART. 1.698 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES.

I. Nos termos da mais recente jurisprudência do STJ, à luz do Novo Código Civil, há litisconsórcio necessário entre os avós paternos e maternos na ação de alimentos complementares. Precedentes. II. Recurso especial provido.

REsp 958513 / SP RECURSO ESPECIAL 2007/0129470-0 RELATOR Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Grifos Nossos)

Pelo conteúdo dos referidos julgados observa-se que os avós maternos e paternos do alimentando devem figurar no pólo passivo da relação processual simultaneamente na ação de alimentos, uma vez que se permite a divisibilidade/ fracionamento da obrigação alimentar entre eles, na proporção das possibilidades de cada um em cumprir com a obrigação. Ademais, a integração de todos os demandados, avós paternos e maternos à lide não é facultativa, mas sim necessária.

A essa modalidade de ingresso simultâneo de pais e avós na relação processual de alimentos Fredier Didier Jr e Maria Helena Diniz (2010:616) denominam de litisconsórcio passivo ulterior simples. Diz-se ulterior porque o ingresso dos avós na relação processual ocorre de forma incidental, no curso no processo, após demonstrado a impossibilidade parcial ou total dos genitores arcarem com a obrigação alimentar da prole. E simples porque o juiz pode proferir decisões diferentes para cada litisconsorte, determinando quantum de obrigação diferente para cada um dos litisconsortes.

Entretanto, os referidos autores divergem em relação a quem cabe demandar o outro parente quando um se apresentar incapacitado para cumprir a sua parcela na obrigação alimentar na proporção dos seus recursos, distribuindo a dívida entre todos. Para Fred Didier o litisconsórcio passivo trata-se de provocação do autor e deve ocorrer até a fase saneadora do processo. Já Maria Helena Diniz entende que cabe ao demandado, na contestação, provocar o chamamento ao processo dos terceiros, os outros parentes coobrigados, para integrar a lide.

Apesar de divergirem quanto a quem cabe demandar os progenitores na ação de alimentos, há convergência de entendimento entre os dois autores acima citados em relação ao fato de se tratar de uma modalidade de intervenção de terceiros não prevista no Código de Processo Civil, se configurando, portanto uma inovação trazida pelo artigo 1.698 do Código Civil 2002.

2.3. Execução de alimentos - prisão cível – cabimento/ não cabimento na obrigação alimentar avoenga

Uma vez fixada em juízo os alimentos, ou acordados judicialmente, caso o responsável pela prestação de alimentos não cumpra com a obrigação determinada existem diversos meios executórios previstos na legislação brasileira para que o credor busque a satisfação do crédito a que tem direito. Dentre estes meios executórios estão: a execução por quantia certa que se caracteriza pela penhora e constrição de bens do devedor dos alimentos; o desconto em folha de pagamento para o devedor que possua vínculo empregatício; a expropriação de aluguéis e outros rendimentos que tem previsão no art. 17 da Lei 5.478/68 (Ação de Alimentos); a aplicação de multa ou astreintes alimentar que representa uma coerção de caráter patrimonial ao devedor que o sujeita ao pagamento de multa diária como forma de pressioná-lo a adimplir com a obrigação e cumprir a determinação legal de arcar com os alimentos devidos e a coerção pessoal do devedor por meio da prisão civil.

Posto isto, há que se ressaltar que tanto na legislação quanto na doutrina e jurisprudência dominante a prisão cível é medida excepcional aplicada ao obrigado à prestação alimentícia que se encontra inadimplente com seus deveres de alimentar, por se revelar o modo mais gravoso para o devedor satisfazer sua obrigação. Somente após empregadas todas as demais formas descritas para a satisfação do crédito alimentar é que deve o julgador aplicar a medida de prisão civil. Nesse sentido, assim dispõe o art. 620 do CPC: “Quando por vários meios o credor puder prover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor”.

A excepcionalidade da execução de alimentos por meio da prisão cível do devedor ainda é disciplinada pela Súmula 309 do STJ que assim aduz: “O débito alimentar que autoriza a prisão do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores à citação e as que se vencerem no curso do processo”

Se em relação aos pais que são os responsáveis exclusivos do dever de sustento dos filhos, deve assim proceder no caso de descumprimento da obrigação alimentícia fixada judicialmente, para os avós não é diferente. Apesar da obrigação alimentar avoenga está alicerçada no dever de assistência e solidariedade entre os membros da família e ter a referida obrigação caráter subsidiário e complementar à responsabilidade dos pais, é possível também a fixação de prisão cível para os avós como forma coercitiva para o cumprimento do determinado judicialmente à título de alimentos. Entretanto, o processo de execução de alimentos por meio da prisão cível além de ser utilizado como a última das medidas possíveis para que o alimentando tenha seu crédito satisfeito, deve-se ter maior cautela ainda quando se tratar de avós inadimplentes idosos. É esse o posicionamento defendido por Anderson Luiz de Oliveira Rosson ao afirmar que:

“Cabe ao Juiz analisar as condições físicas, financeira dos avós para decretar a medida de prisão preventiva, também verificar o Estatuto do Idoso e a Constituição para não infringir nenhuma Lei Constitucional. A decisão deverá observar o principio da razoabilidade e principio da proporcionalidade para não agir do modo incoerente, prejudicando uma parte e beneficiando outra. A criança precisa receber os alimentos e o devedor cumprir sua obrigação”.

Caso emblemático da necessidade do emprego pelo julgador dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade em medidas de execução alimentícia contra avós idosos e com saúde debilitada pode ser constatada através do seguinte Julgado do Tribunal Superior de Justiça:

RECURSO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO. PACIENTE COM IDADE AVANÇADA (77 ANOS) E PORTADOR DE PATOLOGIA GRAVE. HIPÓTESE EXCEPCIONAL AUTORIZADORA DA CONVERSÃO DA PRISÃO CIVIL EM RECOLHIMENTO DOMICILIAR.

1. É cabível a prisão civil do alimentante inadimplente em ação de execução contra si proposta, quando se visa ao recebimento das últimas três parcelas devidas a título de pensão alimentícia, mais as que vencerem no curso do processo. Precedentes.

2. Em hipótese absolutamente excepcional, tal como na espécie, em que a paciente, avó dos alimentados, possui patologia grave e idade avançada, é possível o cumprimento da prisão civil em regime domiciliar, em prestígio à dignidade da pessoa humana. Precedentes.

3. Recurso provido.

RHC 42958 / AL. RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS 2013/0393609-7 Relatora Ministra Marilza Maynard (Desembargadora convocada do Tj/SE)

Portanto, evidenciada está a possibilidade de prisão civil dos avós como meio coercitivo utilizado para cumprimento da obrigação alimentar dos netos em atraso das três últimas parcelas devidas à titulo de pensão alimentícia e as que se vencerem no curso do processo. Porém, tal meio de execução só deve ser empregado após esgotadas todas as demais formas disponíveis no ordenamento jurídico para a execução de alimentos já pontuadas anteriormente. E mais, o emprego dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade deve sempre ser observado pelo julgador quando se tratar do meio de execução por prisão cível, nos casos dos avós idosos de modo a não atentar contra o princípio da dignidade humana dos avós e dos direitos destes garantidos tanto na Constituição como no Estatuto do Idoso. Foi o que ocorreu no julgado em tela, em que optou o julgador em aplicar o cumprimento da medida de prisão em regime domiciliar pelas condições desfavoráveis de idade e saúde da avó da alimentanda. É preciso analisar cada caso em concreto e ponderar os princípios em evidência de modo a garantir a não lesão de direitos de todos os envolvidos na lide alimentícia. Às crianças e adolescentes, pleiteantes aos alimentos, também deve ser garantida o seu direito aos alimentos, como forma de permitir que tenha uma vida dignidade, sob os auspícios da proteção integral, por ser um ser em desenvolvimento e buscar atende ao seu melhor interesse.

Sobre o autor
Meire Jane Martins

Graduanda em Direito da FRM-Penedo

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