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Princípio indenitário

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Agenda 25/09/2016 às 13:24

Com previsão expressa no artigo 778 do Código Civil, o princípio indenitário é aplicável apenas nos chamados seguros de danos e significa que a garantia prometida não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento da conclusão do contrato.

1. SEGURANÇA. 2. CONTRATO DE SEGURO. 3. SEGURO DE DANO. 4. SEGURO DE PESSOA. 5. PRINCÍPIO INDENITÁRIO. 6. JURISPRUDÊNCIA. 7. CONCLUSÃO. 8. BIBLIOGRAFIA.


1. Segurança

O homem sempre se preocupou com a segurança pessoal, familiar e patrimonial. A Constituição Federal tutela a segurança, pois o caput do artigo 5º da Constituição Federal garante indistintamente a todos: a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Há diversos tipos de segurança. Há a segurança jurídica, a segurança econômica, a segurança pública, a segurança privada, dentre tantas outras. Comentando o dispositivo constitucional referido, Wolgran Junqueira Ferreira atingiu em cheio a inteligência constitucional, ao afirmar que a segurança é garantida pela Constituição Federal como um Direito e constitui-se “na proteção contra qualquer perigo. Tranquilidade psicológica que resulta da certeza de que não há qualquer perigo a temer ou de que se está protegido contra as ameaças, pois assim lhes garante a Lei Maior”.[1]

Com os olhos colocados na segurança pessoal ou patrimonial, o ordenamento jurídico autoriza como legítima a celebração de contrato de seguro para a finalidade de cobrir futuros e eventuais danos, evitando-se com isso os reveses do acaso. Devem ser seguidas as diretrizes do artigo 104 do Código Civil, exigindo-se para a validade do negócio a ser celebrado: (a) agente capaz; (b) objeto lícito, possível, determinado ou determinável; (c) forma prescrita ou não defesa em lei.

O contrato de seguro é daqueles contratos que tem por finalidade propiciar certo conforto com as externalidades negativas, riscos, reveses e aleatoriedade que cerca a todos no dia a dia. Roubos, furtos, acidentes, greves, terremotos, maremotos são alguns dos incidentes que podem atingir os membros de uma determinada sociedade e que podem ser cobertos por um seguro.

Os princípios contratuais e os deveres contratuais anexos (informação completa e adequada, colaboração, cautela, duty the mitigate the loss) são institutos plenamente aplicáveis ao contrato de seguro. Cabe realçar que tais deveres contratuais anexos e os respectivos princípios que impõem o comportamento com transparência, confiança e boa-fé (subjetiva e objetiva)[2] como expressão dos princípios da solidariedade e justiça são aplicáveis tanto às companhias seguradoras (em decorrência da incidência do Código de Defesa do Consumidor) quanto aos contratantes-segurados.


2. Contrato de Seguro

O contrato de seguro encontra previsão no Código Civil que no caput do artigo 757 traça seus contornos: “Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.”

O instituto secular, portanto, pode ser conceituado como contrato pelo qual uma pessoa, denominada seguradora, se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. O contrato de seguro é um contrato bilateral, oneroso, aleatório e consensual.

Os artigos 757 a 777 do Código Civil trazem as disposições gerais do contrato de seguro; nos artigos 778 a 788 encontramos as principais regras sobre o seguro de danos e nos artigos 789 a 802 os dispositivos legais incidentes sobre o seguro de pessoas. 

Pontes de Miranda: “Contrato de seguro, segundo a definição corrente, é o contrato pelo qual o segurador se vincula, mediante pagamento de prêmio, a ressarcir ao segurado, dentro do limite que se convencionou, os danos produzidos por sinistro, ou a prestar capital ou renda quando ocorra determinado fato, concernente à vida humana, ou ao patrimônio. Aí, a falta de unidade na definição resulta de se ter em vista a distinção entre os seguros”.[3]

Algumas observações importantes sobre o contrato de seguro devem ser realizadas: (a) a companhia seguradora necessita uma qualidade especial, deve ser uma entidade autorizada, pelas autoridades competentes, a figurar como tal; (b) a apólice de seguro é apenas um meio de prova da existência do contrato, não requisito de validade; (c) os contratos de seguros não podem garantir atos dolosos; (d) o valor pago pelo segurado é denominado prêmio, o valor pago pela  seguradora é o "pagamento do sinistro" ou indenização; (e) o valor pago a título de ocorrência do sinistro pode ser efetivado em dinheiro ou coisa; (f) se o segurado agravar o risco contratual perderá direito ao valor do sinistro; (g) se a companhia seguradora sabe que não mais existe risco sobre o que está segurado, deverá pagar em dobro o valor do prêmio.

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A jurisprudência vem analisando a natureza jurídica dos contratos de seguro. Confira-se:

"Contrato de seguro, por definição, é o enlace volitivo por meio do qual o segurado, mediante o pagamento de um prêmio, translada à seguradora, entidade autorizada pelo governo a explorar a atividade securitária, alguns dos riscos incidentes sobre determinado bem jurídico (art. 757, CC/02). Cuida-se de contrato com contornos aleatórios. À seguradora, assim, em sobrevindo o sinistro, compete indenizar o segurado com pagamento equivalente ao prejuízo experimentado (princípio indenitário). Não ocorrendo o sinistro, em contrapartida, o segurado não frui do valor despendido. Convém notar que os prêmios pagos pelo universo de segurados, inferiores ao valor do bem, são calculados na forma de intrincados cálculos atuariais, fundados em dados estatísticos. Tais recursos compõem o caixa de coletivização dos riscos, origem do capital destinado a cobrir os danos que vierem ocorrendo. Há, inclusive, em vista dessas repercussões coletivas do pacto, forte ingerência interventiva do Estado na atividade securitária (cf. Lei dos Seguros - Decreto-lei n. 73/66 - e Fábio Ulhoa Coelho. Manual de Direito Comercial. Saraiva, 2003, págs. 485/489)" (TJSP, Apelação Cível 2005.042366-7, Relatora: Desembargadora Maria do Rodo Luz Santa Ritta, j. 21/3/2006).

"O contrato de seguro, a teor do disposto pelo art. 757, caput, do Código Civil, é contrato pelo qual o segurado se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos pré-determinados" TJMG, Apelação Cível 1.0479.03.045551-9/001, Relator: Desembargador Fernando Botelho, j. 4/10/2007).

"O seguro, no dizer de Sílvio de Salvo Venosa, constitui, em sua essência, transferência de risco de uma pessoa a outra. "Tecnicamente, só se torna possível quando o custeio é dividido entre muitas pessoas, por número amplo de segurados" (Direito Civil, vol. III, 5ª ed., Editora Jurídico Atlas, p. 371)" TJSC, Apelação Cível 2004.008005-0, Relator: Desembargador Sérgio Izidoro Heil, j. 17/8/2006);

''Acerca do assunto, preleciona Maria Helena Diniz: "O contrato de seguro é aquele pelo qual uma das partes (segurador) se obriga para com outra (segurado), mediante o pagamento de um prêmio, a garantir-lhe interesse legítimo relativo a pessoa ou a coisa e a indenizá-la de prejuízo decorrentes de riscos futuros, previstos no contrato" (Curso de Direito Civil Brasileiro, responsabilidade civil, 18ª ed., vol. 7, São Paulo: Saraiva, 2004, p. 369)" TJSC, Apelação Cível 2005.036488-2, Relator: Desembargador Sérgio Izidoro Heil, j. 13/1/2006);

"O seguro é contrato bilateral, oneroso, sinalagmático, cabendo à seguradora responder nos limites estreitos dos riscos futuros do segurado, desde que assumidos contratualmente por ela, restando ao segurado pagar o prêmio já calculado, também tendo em conta que é em função do valor pago e da pontualidade no cumprimento dessas obrigações, em havendo nexo de causalidade que justifique a ocorrência do evento, que terá o direito de exigir o pagamento do valor contido na apólice" TJSP, Apelação Cível 521.887-4/0-00, Relator: Desembargador Salles Rossi, j. 8/11/2007).

Estabelecido o conceito de contrato de seguro, instar lembrar a existência do co-seguro e do resseguro.

O co-seguro ocorre tendo por objeto um mesmo bem, que pode ser realizado por dois ou mais seguradores, ou companhias seguradoras, de forma cotizada. Assim, “cada segurador se vincula a ressarcir em proporção da respectiva quota, ainda que tenham feito num só contrato os seguros”.[4] Já o resseguro ocorre quando o valor de uma operação (=cobertura) securitária, se ocorrer, deve ser distribuída entre os componentes do sistema. A preocupação do legislador é garantir pela solvabilidade das companhias securitárias. Assim, ele se torna obrigatório “se um dos seguradores se vinculou ou alguns seguradores se vincularam (pré-contrato ou contrato), ou, se a obrigatoriedade resulta de lei”[5].

 Por sua vez, o contrato de resseguro pode ser plúrimo, como pode ser co-seguro. Diz-se facultativo o resseguro se ao segurador é livre de ressegurar ou não, o que não se há de confundir com o resseguro obrigatório com a liberdade para o segurador de escolha dos seguros ou riscos a que há de corresponder o resseguro (resseguro obrigatório com escolha dos riscos).  Pontes de Miranda esclarece que quando os riscos são grandes e de alto valor segurável, ou quando é grave e de alto valor segurável o risco que se quer cobrir, o co-seguro exerce função notável. Issso porque entre as companhias seguradoras “Previamente se reparte a soma do seguro, isto é, o valor segurado, entre os dois ou mais seguradores. Assim, cada um evita assumir o risco por inteiro. Quanto à forma, pode haver o contrato único, firmado pelos diferentes seguradores, ou dois ou mais contratos de seguros (co-seguros separados), tendo havido antes ou simultaneamente o acordo entre eles, que se há de considerar pré-contrato, sem que se afaste ter havido pluralidade de seguros sobre quotas e suceder o acordo de assunção de co-seguro.”[6]

Sobre a exigência da cobertura, o artigo 206, inciso II, do Código Civil estabelece que prescreve em um ano a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo de duas formas, a saber: (a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador; (b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão.


3. Seguro de Dano.

Seguro de dano, como lhe denomina o Código Civil (artigos 778 a 788) é uma espécie de contrato de seguro pelo qual é realizada cobertura em decorrência de fatos que venham danificar bens que não a própria vida humana. Aqui é local especial para afirmar que, em hipótese alguma pode haver seguro de dano que supere o valor da coisa segurada, cerne do princípio indenitário.

Entendemos que a nomenclatura "seguro de danos" é imprópria para extremar-lhe do "seguro de pessoas", uma vez que tanto as pessoas ou bens passíveis de cobertura securitária são passíveis de danos, ou, dito de outra forma, tanto as pessoas quanto seus bens são passíveis de sofrerem danos, que podem ocorrer de variadas formas.

O interesse do segurado irá atingir todos os prejuízos resultantes ou consequentes, como sejam os estragos ocasionados para evitar o sinistro, minorar o dano[7], ou salvar a coisa, consoante intelecção do artigo 779 do Código Civil e, após pagar a indenização ao segurado, a companhia seguradora se sub-roga nos direitos do segurado para cobrar os custos do autor do dano.

Os seguros de responsabilidade civil, que é uma das diversas formas de seguro, em que se cobrem os prejuízos causados a terceiros pelo segurado e estabelecem situação especial pois é "defeso ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador", como determina o parágrafo 2º, do artigo 787 do Código Civil.


4. Seguro de Pessoa.

O contrato de seguro de pessoa é aquele em que a celebração é feita tendo-se por objetivo a proteção a uma pessoa natural. Como as pessoas não possuem preço, mas valor, inviável se mostra colocar um parâmetro como limite a contratação securitária em que a pessoa seja o bem jurídico protegido das intempéries e riscos.

Algumas observações merecem ser realizadas, tais como: (a) é possível fazer seguro sobre a vida de outrem, desde que se declare estimar tal vida; (b) a estimação da vida alheia é presumida nas hipóteses em que figurar o cônjuge, descendente e ascendente do contratante; (c) no seguro de pessoas a apólice não pode ser ao portador; (d) se não houver indicação de beneficiários, a metade será paga ao cônjuge não separado judicialmente[8] (não importando o regime patrimonial estabelecido) e a outra entregue à ordem de vocação do artigo 1829 do Código Civil; (e) é totalmente nulo transigir com o pagamento do seguro de pessoas, no sentido de reduzir o que deve ser pago em caso de sinistro; (f) a concubina não pode ser beneficiária de seguro de pessoa; (g) o seguro recebido pelos beneficiários não é considerado herança (logo, não necessita ser colacionado), nem responde pelas dívidas do falecido; (g) o contrato de seguro de vida é título executivo extrajudicial (inciso VI, do artigo 784 do Código de Processo Civil); (h) são impenhoráveis os seguros de vida (inciso VI, do artigo 833 do Código de Processo Civil). A peculiar natureza jurídica do contrato de seguro de pessoa foi bem identificada pela jurisprudência:

"O contrato de seguro de vida, conforme a definição do brilhante jurista Ricardo Fiúza, [...] tem por objeto garantir, mediante prêmio ajustado, o pagamento de certa soma, livremente fixada pelo segurado e aceita pelo segurador, em razão da morte do segurado, constitui espécie do gênero de seguro de pessoa e, agora está assim tratado, em melhor adequação do sistema. O capital é livremente estipulado pelo proponente, porque difere do seguro de coisa, em que pelo princípio indenitário a indenização há de corresponder a um valor certo do dano sofrido pelo segurado. Em seguro de pessoa, esse princípio não é aplicável, e sim o previdenciário, porquanto o prejuízo é abstrato, a garantia é contra os riscos de morte, de perigo à sua integridade física, de quebra e comprometimento da saúde, e de acidentes dos mais variados, aos quais se acha sujeito o segurado, e, afinal, o valor da vida é inestimável. Por isso, resulta possível contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou mais de um segurador (in Código Civil Comentado. Ed. Saraiva, 6ª ed., p. 717)" TJES, Apelação Cível 24119004430, Relator: Desembargador Telemaco Antunes de Abreu Filho, j. 6/6/2011).

Pedro Alvim arremata a questão, ao afirmar que:

“Ao contrário do que sucede aos seguros de dano, os de pessoa não têm caráter indenitário. Seu valor não depende de qualquer limitação. Varia de acordo com a vontade e as condições financeiras do segurado que pode fazer tantos seguros quantos desejar. A responsabilidade do segurador coincide com o valor do seguro por ele aceito.”[9]

Nesse sentido, não há o menor sentido em se limitar quantia a ser recebida em decorrência da ocorrência de sinistros de seguro de pessoas, em razão da inviabilidade de se precificar, coisificar, medir ou avaliar a vida humana.

Sobre o autor
Horácio Eduardo Gomes Vale

Advogado Público em Brasília (DF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VALE, Horácio Eduardo Gomes. Princípio indenitário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4834, 25 set. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51787. Acesso em: 22 dez. 2024.

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