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O Enunciado nº 331, IV, do TST e o regime próprio da Administração Pública

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Agenda 18/05/2004 às 00:00

6. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

O vocábulo subsidiário diz respeito ao que é secundário, auxiliar ou supletivo. Origina-se do latim subsidiarius, com o significado de reserva, de reforço. Dessa forma é que responsabilidade subsidiária é aquela que reforça a principal, desde que esta não seja suficiente para atender aos imperativos da obrigação assumida.

Face à realidade sucessória que se estabelece entre a garantia principal e a secundária, imprescindível a comprovação da inadimplência ou da insolvência do devedor, para que se configure a responsabilidade subsidiária.

Há importantes questões a serem enfocadas quanto à averiguação deste tipo de responsabilidade num contrato de terceirização, principalmente no que tange ao tomador ente público. Em primeiro lugar, a fonte de onde emana esta obrigação, visto que deve sempre estar atrelada a uma principal. Em outras palavras, necessária se faz uma investigação mais aprofundada do tema, afim de não se imputar ao Poder Público obrigação que não decorra de lei.

Acuidade ainda maior na inquirição dos fatos, a fim de não premiar a irresponsabilidade dos prestadores de serviço, que, ao se negarem ao adimplemento das obrigações trabalhistas, muitas vezes procedem de modo arbitrário a fim de se beneficiarem dos cofres públicos.

Uma vez negada a conferência das verbas salariais e encargos respectivos devidos ao trabalhador, a justiça tem ao seu dispor instrumentos de coercibilidade eficazes contra resistência patronal, qual seja a responsabilização dos sócios, além da desconsideração da pessoa jurídica.

6.1. OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE

De aparente irrelevância, mas de fundamental importância para o estudo a que nos propomos é a distinção entre os institutos da obrigação e da responsabilidade. A partir de tal diferenciação, é possível identificar quem são os possíveis sujeitos da responsabilidade civil e aqueles que estão fora de sua esfera de alcance.

A obrigação é sempre um dever jurídico originário de dar, fazer ou não fazer. A responsabilidade nasce com o descumprimento da obrigação, constituindo-se, a partir daí, o dever jurídico secundário. Dessa premissa é que se pode dizer que não há responsabilidade sem prévia obrigação.

Elucidativa e oportuna a exposição de Sérgio Cavalieri Filho [9]:

"Assim como não há sombra sem corpo físico, também não há responsabilidade sem a correspondente obrigação. Sempre que quisermos saber quem é o responsável teremos que identificar aquele a quem a lei imputou a obrigação, porque ninguém poderá ser responsabilizado por nada sem ter violado dever jurídico preexistente." (nosso grifo)

Ainda que o enfoque seja a responsabilidade subsidiária, há de se atentar para o fato de que, assim como, para cada obrigação principal, haverá uma responsabilidade correspondente, assim também, antecedendo a responsabilidade subsidiária, há de se constatar uma obrigação subsidiária precedente.

O que se quer enfatizar é que, embora seja possível imputar responsabilidade subsidiária a alguém, é necessário que esta pessoa (física ou jurídica), já tenha um prévio elo obrigacional de subsidiariedade previsto em lei ou contrato. É o que ocorre, por exemplo, com o fiador, que responde pelo inadimplemento do afiançado, pois a isto, previamente, se obrigou.

Imputar ao Estado responsabilidade subsidiária por verbas trabalhistas inadimplidas por empresa prestadora de serviço constitui-se equívoco de imputação, uma vez que não emana da lei nem do contrato administrativo a correspondente obrigação subsidiária do ente público. Inexistindo obrigação, frise-se, não há que se falar em responsabilidade subsidiária.

6.2. NEXO DE CAUSALIDADE

Nexo causal é a relação natural de causa e efeito existente entre a conduta do agente e o resultado dela decorrente.

Os autores penalistas explicam a ocorrência do liame causal, esclarecendo que para se saber se algo é causa do resultado, basta excluí-lo da série causal. Se o dano, ainda assim, teria ocorrido, não é causa. Se não teria ocorrido, então é a causa. [10] Exemplificando com o tema em questão, se independentemente da terceirização, o empregador teria inadimplido as suas obrigações trabalhistas, então não haveria nexo de causalidade entre a terceirização e o dano sofrido pelo trabalhador.

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Ao contratar a empresa terceirizada, o Estado não está firmando um ajuste com uma fornecedora de mão-de-obra, mas com uma prestadora de serviços. Assim é que os empregados são empregados da prestadora de serviços que teria descumprido suas obrigações patronais, independentemente do ente tomador de serviços que a contratou. Se o tomador cumpre em dia com suas obrigações relativas ao quantum acertado pelo serviço, não resta dúvida de que a mora atinge somente o empregador; falta o liame necessário entre o prejuízo do trabalhador e a atitude da entidade estatal, para que seja configurada a culpa desta.

Ainda no que tange à ausência do nexo de causalidade, ponto crucial diz respeito à inexistência de vínculo empregatício, apropriadamente comentada por Carlos Valder do Nascimento [11]:

"Em primeiro plano, inexistindo vínculo entre o ente público e a empresa privada, no que diz respeito aos empregados desta, improcedem quaisquer verbas reivindicadas em função da responsabilidade subsidiária ou solidária. Com efeito, para locação de serviços-meio a Administração atua no âmbito do contrato terceirizado, firmado em razão de procedimento licitatório."

Distintos, portanto, uma vez que geridos por regimes jurídicos díspares, os contratos de trabalho e o de terceirização pública, no tocante ao nexo causal, e, por conseguinte, à responsabilidade.


7. CONCLUSÃO

A terceirização na Administração Pública é regida por regime jurídico próprio, uma vez que se instrumentaliza por intermédio das espécies contratuais previstas na Lei de Licitações e Contratos. Estrutura-se, ainda, sobre os pilares do Direito Administrativo, tais como os princípios da legalidade, da supremacia do interesse público sobre o particular, da indisponibilidade do interesse público e o constitucionalmente consagrado princípio da eficiência.

O regime jurídico trabalhista difere, e muito, do regime jurídico administrativo, não devendo açambarcar a esfera de ingerência deste, em que pese ainda o fato de a própria CLT, no seu art. 8º, fazer enfática advertência sobre a impossibilidade de direitos trabalhistas sobreporem-se ao interesse coletivo.

Em se tratando de terceirização, principalmente, se o Poder Público não é responsabilizado pelo montante das parcelas trabalhistas, quando da verificação da ilicitude da mesma, maior razão haverá para que não seja responsabilizado quando agir licitamente.

O Enunciado 331, IV do TST, fere flagrantemente os princípios da administração pública, afronta a legislação administrativa, que veda a responsabilidade subsidiária do Estado no tocante a verbas trabalhistas, e, ainda insurge-se contra a própria legislação que representa, a qual, não só confere, mas determina tratamento preferencial ao interesse público.

O aplicador do direito, portanto, deverá zelar pela co-relação harmônica dos ramos de direito, infligindo, para isto, as limitações cabíveis.


BIBLIOGRAFIA:

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DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 1. ed. São Paulo: LTr, 2002.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

CAVALCANTE JÚNIOR, Ophir. A terceirização das relações laborais. São Paulo: LTr, 1996.

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GÓIS, Antônio Carlos da Silva. Terceirização no Setor Público: Estratégia de eficiência ou precarização das relações de trabalho?. [on line] Disponível na Internet via WWW.URL: www.sindsan.org.br/artigo2.htm.

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MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

NASCIMENTO, Carlos Valder do. A Administração Pública e a Responsabilidade Subsidiária. [on line] Disponível na Internet via WWW.URL: www.bureaujuridico.com.br/artigos/adm/artigo_2.htm.

PINTO, José Augusto Rodrigues. Curso de Direito Individual do Trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2003.

PINTO, Raymundo Antônio Carneiro. Enunciados do TST comentados. 6.ed. São Paulo: LTr, 2002.

PIRES, Aurélio. Terceirização: responsabilidades; um tema para reflexão. Revista do TRT-05, Vol. XLVI. P. 65-73. Ano XLIV, 1999.


NOTAS

1 PINTO, José Augusto Rodrigues. Curso de Direito Individual do Trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2003, p.24.

2 CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Terceirização e intermediação de mão-de-obra na Administração Pública. I Seminário de Integração do Ministério Público Federal e Ministério Público do Trabalho. Goiânia, 23/05/2002.

3 NASCIMENTO, Carlos Valder do. A Administração Pública e a Responsabilidade Subsidiária. [on line] Disponível na Internet via WWW.URL: www.bureaujuridico.com.br/artigos/adm/artigo_2.htm.

4 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 5.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.311.

5 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p.422.

6 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p.311.

7 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p.72.

8 NASCIMENTO, Carlos Valder do. Op. cit.

9 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.26.

10 GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal: parte geral (Sinopses Jurídicas). Vol.7. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 42.

11 NASCIMENTO, Carlos Valder do. Op. cit.

Sobre a autora
Desireé de Araujo Pimentel

Analista Previdenciário. Advogada. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Jorge Amado. Salvador – BA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PIMENTEL, Desireé Araujo. O Enunciado nº 331, IV, do TST e o regime próprio da Administração Pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 315, 18 mai. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5187. Acesso em: 24 nov. 2024.

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