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Colação: aspectos gerais e aplicação legal

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O instituto da Colação encontra-se disposto no ordenamento jurídico brasileiro com intuito de resguardar o direito dos herdeiros necessários (descendente e cônjuges) quanto à legítima.

RESUMO:O instituto da Colação encontra-se disposto no ordenamento jurídico brasileiro com intuito de resguardar o direito dos herdeiros necessários (descendente e cônjuges) quanto à legítima. Estabelece que determinados bens doados, direta ou indiretamente, a um dos herdeiros obriga este a colacioná-lo com intuito de contabilizar a herança plena a fim de dividir em partes iguais entre os herdeiros, visto que, presume-se ser a vontade do ascendente falecido. Entretanto o CC/2002 faculta ao doador a possibilidade de excluir o beneficiado da colação, bastando, para tanto, que expresse claramente ao doar.

Palavras-chave: Ascendente – Igualdade entre as partes – Herança – Legítima

ABSTRACT:The institute of collation exists amongst the Brazilian legal order with the intent of protecting the heritage right of the descendants and consorts. It establishes that certain donated property, whether it is donated directly or indirectly, forces one of the heirs to collate it with the objective of dividing it equally among the other heirs, assuming it is the deceased`s will. The Brazilian Civil Code provides the donor the option of excluding the beneficiary from the collation, the only requirement being that he expresses it at the moment of donation.

Keywords: Ascendant – Equality between heirs – Heritage - Legitimate


1 INTRODUÇÃO

O ordenamento jurídico brasileiro, no âmbito do Código Civil de 2002, traz o instituto da Colação como forma de amparar o Direito das Sucessões, este que se inicia a partir da morte do de cujus e tem como fundamento a partilha dos bens entre os beneficiários vivos.

Deveras importante mostra-se a Colação, pois, tem fito garantir a igualdade das legítimas dos herdeiros necessários, este considerado princípio essencial do direito sucessório contemporâneo. É contemplado no Código Civil vigente pelos artigos 2.002 até o 2.012 e em outros artigos que ligeiramente fogem desse rol, mas que contribuem com a mesma importância, os quais se destacam os artigos 544 e 1.992 do CC.

Tal instituto estabelece obrigações aos herdeiros que recebem doações, em vida, do ascendente, sejam elas diretas e indiretas, tendo como principal ato obrigatório a remessa dos bens à colação para que seja efetuada a divisão em partes iguais da herança presumindo, ser esta a última vontade do ascendente doador falecido.

Faz-se necessário destacar críticas e abordagens feitas por determinados doutrinadores, além de demonstrar pressupostos e os principais fundamentos em que se pautam devidas obrigações impostas aos herdeiros beneficiários. Ademais, delimitam-se os objetos sujeitos à colação, bem como os que não poderão ser abordados, elencando finalidades e importância.


2 CONCEITO

A colação, do latim: colatio (reunir, trazer, agregar), instituto do Direito Civil Brasileiro, configura-se por ser o ato pelo qual os herdeiros necessários concorrentes entre si à sucessão do ascendente comum, reúnem ao monte partível quaisquer liberalidades que dele em vida tenham recebido, sobre pena de sonegados, para que sejam conferidas e igualadas as respectivas legítimas (CC, arts. 2.002 e 2.003)

Assim, de acordo com a devida conceituação, nota-se que o direito sucessório brasileiro é norteado pelo princípio da igualdade dos quinhões hereditários que se interpreta a partir da leitura do artigo 1846 do CC, ou seja, a colação tem como fim igualar as partes legítimas que, em determinado momento, se tornaram desiguais por força de doação feita pelo ascendente e descendente.

Sobre o tema, Carlos Maximiliano ensina:

“Considera-se, em regra, as doações, os dotes e quaisquer outras liberalidades a descendentes, como adiantamento de legítima; presume-se ter sido este o instituto do ascendente – não romper com a igualdade entre a prole; antecipar o gozo, porém não o domínio definitivo de certos bens; permitir que i filho desfrute imediatamente o que só iria à sua posse quando se abrisse a sucessão paterna, sem prejuízo algum para os irmãos, cujos quinhões seriam equipolentes aos do beneficiado. Por isso, verificado o óbito, a massa hereditária é acrescida dos bens entregues à prole em vida do progênitos; entram no inventário como se ainda fizessem parte do patrimônio do doador, e sofrem a redução da parcela que prejudica a legítima dos outros sucessores forçados. Fica o acervo como se não tivesse ocorrido a dádiva” (1943, pag. 423)

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Corroborando, aduz Maria Beatriz Perez Câmara: “Neste sentido, presume-se que as doações e vantagens feitas em vida pelo ascendente aos seus herdeiros necessários são antecipações das respectivas quotas hereditárias, ou seja, adiantamento das legítimas, que devem reverter ao acervo" (2004, pag. 335).

Válido ressaltar, que se o herdeiro omitir a conferencia aos bens recebidos em doação, quando aberta a sucessão do ascendente doador, será considerado sonegador, e a ele, será imposta pena que se configurará na perda da liberalidade recebida pelo ascendente doador quando este ainda era vivo (CC, art. 1.992).

Quanto à disponibilidade dos bens que são doados, deferem-se em dois momentos. As doações feitas pelo de cujus a qualquer pessoa farão parte os bens disponíveis do patrimônio do doador, ou seja, os bens que podem ser dispostos em testamento (CC, art. 549). De outro lado, as doações feitas com fito de favorecimento dos herdeiros necessários recaem sobre a parte indisponível do patrimônio do doador, sendo assim consideradas adiantamento da legítima (CC, art. 544). Entretanto, há situações em que o bem doado a herdeiro necessário é computado da parte dos bens disponíveis, bastando para tanto que o ascendente doador declare expressamente sendo essa sua vontade, assim, dispensaria a obrigação do herdeiro trazer à colação as liberalidades recebidas.

Com isso, faz necessário distinguir a colação de redução de liberalidades. A primeira tem intuito de igualar as partes legitimas dos herdeiros necessários assentando-se na presunção da vontade do morto, caso em que a doação só se consideraria válida-permanente quando retirada da meação disponível do doador. Por sua vez, a redução tem finalidade de conter as liberalidades dentro daquela metade, quer beneficiando o herdeiro ou a um estranho.

A partir da leitura conceitual é possível demonstrar três pressupostos caracterizadores do instituto da Colação no direito brasileiro. O primeiro pressuposto destaca-se por ser a colação cabível apenas na sucessão legítima, não havendo possibilidade da colação na sucessão testamentária, pois, o objetivo da colação paira sobre a legítima, esta por sua vez estando fora do poder de disposição do testador. Por sua vez, o segundo pressuposto é a existência de co-herdeiros necessários, descendentes. Não havendo que se falar em colação quando houver apenas um descendente já que não há que se buscar igualdade sobre a herança. Ainda, não haverá quando os legitimários forem apenas ascendentes.

Por fim, o último pressuposto extraído é a obrigatoriedade de que uma liberalidade tenha sido feita em vida pelo de cujus a um de seus descendentes ou do cônjuge sobrevivente. Válido ressaltar que farão parte dessas liberalidades todos as doações, diretas ou indiretas, feitas em favor do gratificado, sendo todas elas computados à sua legítima.


3 FUNDAMENTOS 

 Acerca dos fundamentos que justificam a exigência da Colação, o renomado professor Carlos Roberto Gonçalves aduz que a doutrina contemporânea acredita que o referido instituto tem como finalidade a equidade e a igualdade das legítimas, utilizando como principal argumento a vontade presumida do morto. Tal argumento configura-se na presunção de que ascendente tratava todos os seus herdeiros em igual afeto, tendo como último desejo antes da morte o de que todos herdassem partes iguais. Destarte, o simples ato de doação em vida não transfere o domínio do bem, mas tão somente o gozo, consequentemente tornando-se obrigado à colacionar o bem quando aberta a sucessão.

É inevitável destacar que o referido fundamento, antes exposto, sofre das mais variadas críticas. Orlando Gomes aduz que:

 “A teoria da vontade presumida deve ser rejeitada, não somente por se atritar com a disciplina legal do instituto, como também, por defeito técnico. Choca-se, realmente, com a norma que faculta ao ascendente dispensar a colação. Tecnicamente, as regras que estabelecem presunção não criam, como na hipótese, direitos substantivos nem constituem obrigações, limitando-se a impor ao juiz o dever de considerar provado determinado fato jurídico. Da vontade presumida do ascendente não poderia nascer a obrigação de conferir, constituída por lei supletiva” (2003, pag. 288)

Entretanto, apesar de pertinentes críticas, a instituto da colação ainda mantém como fundamento de sua exigência a presunção da vontade do finado, pois dispõe em seus dispositivos a possibilidade da dispensar da colação o herdeiro beneficiado (CC, arts. 2.005 e 2.006)

 Ademais, há outros fundamentos os quais objetivam tal obrigação, tais como: i) A compropriedade familiar, que consiste ao fato de que os bens acumulados pelo ascendente em vida pertenciam a todos os herdeiros necessários, configurando-se, em outras palavras, em uma propriedade comum a todos, consequentemente obrigando o beneficiário a colacionar os bens agraciados; ii) Interesse superior da família, este considerado um fundamento genérico; iii) Igualdade entre os descendentes, como já demonstrado caracteriza-se por ser um princípio norteador a equidade das legítimas, fundamento nevrálgico para o suporte do instituto em questão; iv) Adiantamento da legítima – tal fundamento vem disposto no artigo 544 do Código Civil, constituído a partir da doação de bens, em vida, aos herdeiros necessários, obrigando-os à trazer à colação.


4 OBJETO DA COLAÇÃO

Estão sujeitos à colação os valores que os herdeiros necessários (descendentes e o cônjuge) tenham recebido através de doação, em vida, pelo doador da herança. Faz-se mister ressaltar, que até o falecimento do doador, o bem pertence à este, donatário exclusivo, e somente após a morte os bens serão passados aos herdeiros de forma plena, única, em propriedade comum a todos.

Destarte, em nosso ordenamento jurídico são objetos da colação as doações feitas aos herdeiros necessários (CC, art. 2.002); as dividas pegas pelo ascendente de filho ou cônjuge sobrevivente; os rendimentos de bens dos pais desfrutado pelos filhos; perdas e danos pagos pelos pais como responsável pelos danos do menor, ou quaisquer indenização ou multa; pagamento consciente de uma soma não devida ao legitimário; remissão de dívida; as quantias adiantadas aos descendentes para que estes adquiram tal coisa (fará parte da colação apenas o valor do adiantamento e não os lucros advindo de determinada coisa adquirida); entre outras.

Entretanto, há hipóteses pouco distantes da realidade, visto que os meios de provas que o herdeiro pretendente à exigência da colação de tais doações “indiretas” deva juntar tornam-se cada vez mais escassos ao passar do tempo, tendo o interessado que discriminar no decorrer da convivência familiar todos os momentos oportunos em que ocorreram doações indiretas, o que não ocorre com naturalidade.

A dispensa jamais poderá ser presumida, exigindo-se em cada caso expressa através da escritura de doação ou por testamento. A lei prevê que são dispensados da colação os bens que cujo testador determinar a saída de sua metade disponível. Não poderão, contudo, excedê-la, computado o seu valor ao tempo da doação. Nestes casos, nada poderá ser alegado pelos herdeiros concorrentes.

Existem também os casos de exclusão legal, previstos no artigo 2.010 do CC, que afastam a obrigatoriedade quanto aos gastos ordinários dos descendentes com o ascendente, enquanto menor, na sua educação, estudos, sustento, vestuário, tratamento nas enfermidades, enxoval e despesas de casamento e livramento em processo-crime, de que tenha sido absolvido o menor.

Tais gastos devem ser entendidos como aqueles inerentes ao pleno exercício do poder familiar, sendo insuscetíveis de serem considerados como antecipação de herança.

Afasta a lei, também, as doações remuneratórias em troca de serviços prestados por não constituírem liberalidades. As benfeitorias e acessões dispensam de conferência, sendo imputadas, ao donatário, igualmente, as perdas e danos que os bens sofrerem.

Os frutos também não poderão ser objeto da colação sob pena de enriquecimento por parte daqueles que não contribuíram para que tais frutos fossem gerados. Ademais, as legitimas somente se atualizam com a morte do de cujus. Se houver o perecimento do bem, eximida a culpa do donatário, caso em que a conferência ainda se faria obrigatória, é certo que a obrigação não persiste porque para o dono também a coisa pereceu.

Faz-se válido ressaltar que seguros de vida não poderão ser incluídos no objeto da colação, já que não assumem caráter de herança, portanto, não se sujeitam às normas do Direito Sucessório. 


5 MOMENTO E VALOR

Em sendo a colação uma obrigação legal daquele que se viu beneficiado com a doação antecipatória, deverá fazê-lo, espontaneamente, sob pena de ser compelido através da competente ação de sonegados (artigo 1992, CC). Isto deverá ocorrer no primeiro momento em que se lhe tornar possível a manifestação sobre as primeiras declarações. Silenciando o donatário, qualquer herdeiro necessário concorrente poderá interpelá-lo a fazer.

Conforme bem refere Ney de Mello Almada falta ao inventariante, que não é herdeiro, legitimidade para exigir a colação uma vez que “não se inclui essa iniciativa entre seus deveres funcionais, salvo no tocante aos herdeiros renunciantes, ausente ou excluídos”.

O Código Civil de 1916, em seu artigo 1792, previa que a avaliação devia remontar à época da data da doação. Já o parágrafo único do artigo 1014 do Código de Processo Civil determina que o cálculo se faça pelo valor que tiverem os bens ao tempo da abertura da sucessão.

Em obra que analisava o sistema anterior, Arnaldo Rizzardo faz referência à posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal ao analisar a matéria, entendendo que a avaliação deva ser àquela ao tempo da abertura da sucessão devendo os valores serem corrigidos desde então.

Nelson Nery aborda Enunciado aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça Federal sob os auspícios do STJ, a de nº 119 que dispõe:

Para evitar o enriquecimento sem causa, a colação será efetuada com base no valor da época da doação, nos termos do caput do 2004, exclusivamente na hipótese em que o bem doado não mais pertença ao patrimônio do donatário. Se ao contrário, o bem ainda integrar seu patrimônio, a colação se fará com base no valor do bem na época da abertura da sucessão, nos termos do artigo 1014, de modo a preservar a quantia que efetivamente integrará a legitima quando esta se constitui, ou seja, na data do óbito (Resultado da interpretação sistemática do CC 2003 e §§, juntamente com o CC 1832 e 844). 

Sobre os autores
Aleilson Coelho

Graduando em Direito pela Universidade Federal do Maranhão

Iago Fernandes Leite Silva

Graduando em Direito pela Universidade Federal do Maranhão

Vinícius Pestana Rodrigues

Graduando em Direito pela Universidade Federal do Maranhão

Informações sobre o texto

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