"...il processo deve dare per quanto e possible praticamente chi ha um diritto tutto quello e proprio quello ch’ egli ha diritto di conseguire".
Giuseppe Chiovenda
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO ; 1. EFETIVIDADE DO PROCESSO, 1.1. O processo como método de atuação da jurisdição, 1.2. Instrumentalidade do processo, 1.3. O devido processo legal, 1.4. O acesso à justiça, 1.5. A problemática da ef,etividade do processo, 1.6. Tempo e processo, 1.7. Efetividade e técnica processual; 2. A TUTELA ESPECÍFICA DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER, 2.1. Breve introdução, 2.2. O conceito de obrigação de fazer e de não fazer, 2.3. Fungibilidade e infungibilidade das obrigações, 2.4. Tutela específica e tutela equivalente, 2.5. A aplicação de multa, 2.6. As medidas de apoio para obtenção da tutela específica, 2.7. O problema da extinção do processo na "fase executiva";3. O PROCESSO SINCRÉTICO, 3.1. Espécies de processo, 3.2. O binômio cognição-execução, 3.3. A gradual extinção da autonomia do processo de execução, 3.4. O sincretismo processual e as tutelas mandamental e executiva lato sensu, 3.5. As inovações trazidas pela Lei nº 10.444/2002 e a tutela antecipada, 3.5.1. A efetivação da tutela antecipada, 3.5.2. O julgamento antecipado de pedido incontroverso, 3.5.3. A fungibilidade das tutelas de urgência, 3.6. Conhecimento, execução e cautelar – processo sincrético; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
RESUMO
Análise dos principais questionamentos que circundam a efetividade do processo. O acesso à justiça. A técnica como elemento de agilização do trâmite processual. A tutela específica das obrigações de fazer e não fazer: aplicação de multa, medidas de apoio, prisão, fase cognitiva e fase executiva. Abordagem sobre o processo sincrético. A relativização do binômio cognição – execução. A gradual extinção do processo de execução oriundo de sentença condenatória. Tutela antecipada: julgamento antecipado de pedido incontroverso e fungibilidade das tutelas de urgência.
Palavras-chave: Efetividade. Instrumentalidade. Tutela específica. Sincretismo.
ABSTRACT
Analysis of the main questions which involve the effectiveness of the process. The access to justice. The technique as an element of speeding up the path of the procedure. The specific protection about the obligations of doing and not-doing. Fine application, support ways, prison, and executive fase. A broach about the eclectic process. The flexibility of the knowledge–execution. The gradual extinction of the executive process deriving from a condemnation sentence. Antecipated protection: in advance judgement of the uncontroversial request and of the urgent protections.
INTRODUÇÃO
No presente trabalho será abordado tema referente à efetividade da prestação jurisdicional, enfatizando a tendência dos processualistas em conceber um processo sincrético, cujo marco principal decorreu da criação da tutela específica das obrigações de fazer.
Superada a fase autonomista, a ciência processual civil vive hoje calcada numa visão instrumentalista, preocupada com a eficiência do processo. Essa propensão deu azo à reelaboração de alguns institutos basilares e à flexibilização de alguns dogmas processuais, daí a necessidade de um estudo mais aprofundado, sobretudo pelas modificações a que vem passando o sistema processual.
Num primeiro momento, o trabalho enfocará os problemas enfrentados pelos processualistas na busca pela efetividade, analisando o acesso à justiça, as causas da dilação excessiva do processo e o emprego da técnica como subsídio para conter o trâmite de demandas infundadas e procrastinatórias.
No capítulo seguinte, o objeto do estudo será a tutela específica das obrigações de fazer e não fazer. A intenção é enfatizar os mecanismos que o magistrado poderá valer-se para conceder precisamente aquilo que foi pedido, além da utilidade em se conceber um processo único, no qual se aglutinam as tutelas de cognição, de execução e cautelar.
Por fim, a terceira parte do trabalho será dedicada ao sincretismo processual, destacando a concepção clássica de tripartição de processos preconizada por Liebman e sua incompatibilidade com a realidade sócio-jurídica. Em seguida, será dado enfoque especial ao intitulado processo sincrético e à relativização do binômio processo de conhecimento – processo de execução, de forma a dar maior efetividade ao processo.
1. EFETIVIDADE DO PROCESSO
1.1. O processo como método de atuação da jurisdição
A gama de contendas existentes no meio social resulta do próprio convívio dos homens com seus semelhantes. Dotados de interesses diversos, o ser humano encontra nos bens da vida a satisfação para suas necessidades.
Os conflitos surgem da disparidade entre a carência de bens disponíveis e a infinidade de interesses a serem atendidos, sendo, pois, comum que duas ou mais pessoas voltem suas pretensões para o mesmo bem. Tal situação desencadeia a lide ou litígio que na visão precisa de Francesco CARNELLUTTI, caracteriza-se como sendo "o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida".
A lide afeta sobremaneira a vida em sociedade, sendo necessário o emprego de meios que a solucionem, a fim de que o bem comum prevaleça no grupo social. Vedada a autotutela e como nem sempre os litigantes eram tão altruístas a ponto de chegarem a um acordo (autocomposição), o Estado percebeu que seria verdadeira temeridade deixar ao arbítrio dos particulares a solução dos conflitos, passando a se utilizar de um meio para que esta ocorra, ainda que contra a vontade dos indivíduos.
Diante dessa conjuntura, o Estado, em determinada época da história, avocou para si a tarefa de compor os litígios. Como detentor do "monopólio de administração da justiça", passou a intervir nas contendas como terceiro imparcial, dizendo, diante da causa posta à sua apreciação, quem tem razão. Daí surge a noção de jurisdição como importante fator de pacificação social, à medida que sua atuação tende a colocar fim às situações litigiosas, as quais, por sua vez, configuram-se em atitudes de rebeldia às regras indispensáveis à própria sobrevivência da sociedade.
Frise-se que a atividade jurisdicional, malgrado seja de incumbência exclusivamente estatal, não pode ser desempenhada de forma arbitrária, livre de quaisquer regras. Assim como o Estado impõe limites à conduta dos indivíduos por meio das leis, ele autolimitou sua atuação, enunciando princípios e regras a serem respeitados.
Destarte, o Estado exerce sua função jurisdicional por meio de um método, que é o processo. José Frederico MARQUES doutrina com muita propriedade, que processo e jurisdição
são conceitos incindíveis: não há jurisdição sem processo, e tampouco processo sem jurisdição. A jurisdição é a força operativa com que se realiza o imperium do Estado para compor um litígio, e o processo o instrumento imanente à jurisdição, para que o Estado alcance esse escopo.
A jurisdição e o processo, ao lado da ação, formam a chamada trilogia estrutural do direito processual. É através da ação que a parte deduz uma pretensão em juízo e, conseqüentemente provoca a atuação do órgão jurisdicional, que irá desempenhar sua função por meio do processo.
1.2. Instrumentalidade do processo
No decorrer da evolução do direito processual como ciência, houve três fases distintas: sincretista, autonomista e instrumentalista.
Até meados do século XIX, o direito processual ainda não era reconhecido como ciência autônoma. A fase sincrética, também chamada imanentista, caracterizou-se pela confusão entre os planos substancial e processual do ordenamento jurídico, sendo o processo tratado como mero apêndice do direito material. Os civilistas ou imanentistas, consideravam essencial o direito material, tanto que o denominaram direito substantivo, ao passo que o processo, tido como simples conjunto de formalidades (mero procedimento) para atuação prática daquele, era chamado de direito adjetivo.
Tal concepção começou a ruir em face dos questionamentos levantados em torno do instituto da ação, ressaltando sua autonomia em relação ao direito material, e não mais como algo agregado a ele. Essas afirmações revolucionárias provocaram reações em cadeia, que chegaram até a plena consciência da autonomia não só da ação, mas também dos demais institutos processuais.
A formulação das teorias da relação processual e da nova conceituação do direito de ação pelos alemães, sob influência do direito italiano, foram decisivas para o desmembramento do direito processual frente ao direito material.
O marco da autonomia científica do direito processual data da publicação, em 1868, da obra do jurista alemão Oskar von Bülow denominada Die Lehre von den Prozesseinreden und die Prozessvoraussetzungen (Teoria das Exceções e dos Pressupostos Processuais), com a qual se inicia o desenvolvimento da teoria do processo como relação jurídica. O trabalho do mencionado processualista traçou os princípios básicos de forma a dar contornos de ciência ao direito processual.
Cândido Rangel DINAMARCO preleciona que Bülow, na verdade, não criou a idéia da relação jurídica processual e sua concepção tríplice:
ele apenas a racionalizou e desenvolveu, propondo desdobramentos. Antes dele, já dissera Búlgaro que judicium est actus trium personarum, judicis, actoris, rei; as Ordenações do Reino diziam que "três pessoas são por direito necessárias em qualquer Juízo, Juiz que julgue, autor que demande e réu que se defenda" (L. III, XXX, pr.); na obra de Bethmann-Holweg, que o próprio Von Bülow refere na sua, igualmente havia alusão à relação jurídica processual. A inovação racionalizadora teve por mérito principal o destaque dos dois planos do próprio ordenamento jurídico, a partir da visão da relação processual e da relação de direito privado como duas realidades distintas.
A fase autonomista, além do mérito de afirmar a existência de uma relação jurídica deduzida no processo distinta daquela travada pelos indivíduos no plano material, destacou-se, outrossim, pela enumeração das premissas metodológicas do processo como ciência, sobretudo na criação de institutos processuais, na postura autonomista da ação e no apego à técnica como forma de se pôr em evidência a importância do direito processual.
O direito processual vive, na sua atual fase de evolução, uma postura instrumentalista. Partem hoje os processualistas para a busca de um processo de resultados. Deve-se deixar de lado a visão puramente interna do processo, como simples instrumento de regramento da aplicação das normas substanciais aos casos concretos, e passar a considerá-lo a partir de ângulos externos, visando cumprir seus escopos sociais, políticos e jurídicos, isto é, deve-se levar em conta os resultados que ele proporciona para os destinatários dos provimentos jurisdicionais. Destarte, "depois de um longo período caracterizado por preocupações endoprocessuais, volta-se a ciência para os resultados pretendidos pelo direito processual".
A realidade sócio-jurídica não é compatível com o tecnicismo exacerbado que imperou durante a fase científica, época que teve por intuito caracterizar o direito processual, criando institutos solenes de forma a ratificar sua autonomia.
Ao abordar essa perspectiva instrumental, Kazuo WATANABE aduz que
do conceptualismo e das abstrações dogmáticas que caracterizam a ciência processual e que lhe deram foros de ciência autônoma, partem hoje os processualistas para a busca de um instrumentalismo mais efetivo do processo, dentro de uma ótica mais abrangente e mais penetrante de toda a problemática sócio-jurídica.
A instrumentalidade pode ser analisada em seu duplo aspecto: negativo e positivo.
O aspecto negativo diz respeito à negação do processo como valor em si mesmo e rejeição aos excessos de forma. O apego exagerado à técnica retira do processualista a consciência de que o processo não vale pelo que ele é, mas pelos resultados que ele visa atingir. É a valorização dos fins a serem atingidos e não dos meios.
O aspecto positivo está ligado à problemática da efetividade do processo, "que deve ser apto a cumprir integralmente toda a sua função sócio-jurídica, atingindo em toda a plenitude todos os seus escopos institucionais".
Da análise de tais aspectos denota-se que o instrumentalismo inclina-se para a busca de um processo que atinja a finalidade para a qual ele foi concebido, vale dizer, a realização do direito material. E mais, que essa realização atenda, na medida do possível, a pretensão daquele que demanda exatamente nos termos de seu pedido.
1.3. O devido processo legal
Ao proclamar que "ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal" (art. 5º, LIV), a Constituição Federal sintetizou os limites ao exercício da própria jurisdição, no sentido de que todas as demais garantias e exigências estão condensadas nesse inciso.
A garantia do due process of law, consiste, segundo José Frederico MARQUES,
no direito ao processo como actus trium personarum e suas diversas implicações essenciais: a garantia do direito de ação de par com a garantia do direito de defesa; a adoção do contraditório processual; a eqüidistância do juiz no tocante aos interesses em conflito, como órgão estatal desinteressado, justo e imparcial.
Colaciona desse entendimento o processualista Cândido Rangel DINAMARCO, para quem
a expressa garantia do due process of law, contida no inciso LIV do art. 5º, da Constituição Federal, tem o significado sistemático de fechar o círculo das garantias e exigências constitucionais relativas ao processo, numa fórmula sintética, destinada a firmar a indispensabilidade de todas e reafirmar a autoridade de cada uma.
Pode-se dizer então, que todos os princípios e garantias constitucionais do processo descendem do princípio do devido processo legal, e estariam presentes no sistema ainda que não enunciados expressamente no texto constitucional.
O devido processo legal, assegurado como instrumento necessário à solução dos litígios pela jurisdição, não pode ser considerado como simples meio de se obter uma decisão do Estado-Juiz, mas sim como aquele que se desenvolve de maneira a cumprir a função que lhe foi reservada, ou seja, a proteção do direito subjetivo individual de qualquer lesão ou ameaça. "Dessa forma, a idéia de devido processo legal deve ser fundida com a de fim – idéia teleológica".
1.4. O acesso à justiça
A Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso XXXV, consagra o princípio do acesso à justiça, possibilitando a todos aqueles que sofrerem uma lesão ou estiverem com seus direitos ameaçados, recorrerem ao Poder Judiciário.
A doutrina encontra dificuldade para determinar o conteúdo exato da expressão "acesso à justiça". Para Mauro CAPPELLETTI e Bryanth GARTH, ela é utilizada para fixar duas finalidades básicas do sistema jurídico, pelo qual as pessoas podem pleitear seus direitos e pôr termo às contendas por meio da atuação do Estado: "Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos".
Uma das preocupações do movimento de acesso à justiça, é propiciar às classes menos favorecidas, assistência judiciária gratuita. O acesso ao Poder Judiciário, ou melhor, a possibilidade de se obter a tutela jurisdicional, não pode ser prerrogativa tão-somente dos indivíduos mais abastados. Medidas como o barateamento das custas judiciais e a instituição de Defensorias Públicas em todos os Estados da federação, contribuiriam para uma justiça mais acessível aos mais pobres.
A doutrina de José Eduardo Carreira ALVIM é esclarecedora:
Como as lides envolvem pessoas das mais diversas classes sociais, muitas das quais sem as mínimas condições de arcar com as despesas do processo, é dever do Estado proporcionar-lhes as condições necessárias à salvaguarda de seus interesses, não só criando os órgãos encarregados de prestar a jurisdição, mas, sobretudo, o acesso a esses órgãos, seja pessoalmente, seja através de advogados, seja de serviços de assistência judiciária para esse fim.
A idéia do acesso à justiça constitui a síntese do pensamento instrumentalista, colocando em destaque a prestação de uma tutela jurisdicional ágil e de maior utilidade.
Conforme os ensinamentos de Luiz Rodrigues WAMBIER e Teresa Arruda Alvim WAMBIER:
Quando se fala em direito de acesso à justiça, o que se quer dizer é direito de acesso à efetiva tutela jurisdicional, ou seja, o direito à obtenção de provimentos que sejam realmente capazes de promover, nos planos jurídico e empírico, as alterações requeridas pelas partes e garantidas pelo sistema.
Tal garantia, portanto, não pode ser meramente formal, isto é, estampada num dispositivo de lei mas sem qualquer produção de efeitos práticos. Citando as palavras de Luiz Guilherme MARINONI: "Todos têm direito à adequada tutela jurisdicional, ou melhor, à tutela jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva".
Kazuo WATANABE leciona que
o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional inscrito no inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, não assegura apenas o acesso formal aos órgãos judiciários, mas sim o acesso à justiça que propicie a efetiva e tempestiva proteção contra qualquer forma de denegação da justiça e também o acesso à ordem jurídica justa. Cuida-se de um ideal que, certamente, está ainda muito distante de ser concretizado, e, pela falibilidade do ser humano, seguramente jamais o atingiremos na sua inteireza. Mas a permanente manutenção desse ideal na mente e no coração dos operadores do direito é uma necessidade para que o ordenamento jurídico esteja em contínua evolução.
Como detentor exclusivo da incumbência de resolver os conflitos e da prestação da tutela jurisdicional, deve o Estado, pois, de forma a atingir "maior efetividade e presteza no mecanismo jurisdicional no plano crescente e aperfeiçoar a máquina da justiça (...)", procurar dentro do possível, fazer com que essa garantia esculpida no texto constitucional possa refletir concretamente, propiciando meios de ingresso no judiciário menos onerosos, mas também agilizando o desenrolar do processo, satisfazendo o jurisdicionado que necessita do amparo estatal e atendendo sua pretensão. Não basta, portanto, assegurar o acesso, sendo necessário, outrossim, que os litigantes não permaneçam por um longo período em juízo discutindo situação que permite solução rápida. Em outras palavras, é preciso também garantir a saída daquele que demanda.
1.5. A problemática da efetividade do processo
A efetividade do processo é tema que tem desafiado a argúcia dos processualistas contemporâneos, sobretudo nos obstáculos encontrados, mostrando-se, na sua maioria, intransponíveis. Conforme as lições de Egas Diniz Moniz de ARAGÃO:
O vocábulo "efetividade", enraíza no verbo latino efficere, que corresponde a produzir, realizar, e significa "qualidade do que está efetivo; estado ativo de fato". Relacionado ao processo, o vocábulo traduz preocupação com a eficácia da lei processual, com sua aptidão para gerar os efeitos que dela é normal esperar.
A problemática da efetividade do processo pode ser sintetizada em quatro aspectos fundamentais, a saber: admissão em juízo; modo-de-ser do processo; critérios de julgamento (ou justiça nas decisões); efetivação dos direitos (ou utilidade das decisões).
A admissão em juízo refere-se à abertura da via de acesso à tutela jurisdicional, seja para pleitear um provimento, seja para impor resistência, pois não tem se mostrado efetiva, mormente pela desigualdade econômica (pobreza, alto custo do processo) e cultural (desinformação, descrença na justiça).
No que pertine ao modo-de-ser do processo, faz-se necessário pôr em prática os princípios e garantias constitucionais do processo, a fim de que se tenha uma participação simétrica das partes, um juiz interessado na correta prestação da jurisdição, bem como a diversidade de procedimentos para um melhor exercício da função jurisdicional.
Os critérios de julgamento devem pautar-se de forma que o juiz valore situações de fato de acordo com o sentimento social de justiça, encontrando na lei seu limite. Entretanto, sempre que o texto legal possibilitar mais de uma interpretação razoável, é dever do magistrado decidir pela que melhor atenda ao sentimento social de justiça. Na opinião de José Eudeni MAGALHÃES, para tanto, "é importante investir na formação do juiz, incrementando uma visão interdisciplinar a fim de dotá-lo de conhecimentos culturais, sociológicos e econômicos, inclusive, esclarecendo quanto o significado político da função."
A tendência do direito processual moderno volta-se para a necessidade de se conceder maior utilidade aos provimentos jurisdicionais. O processo deve mostrar-se capacitado a produzir precisamente a providência solicitada. A tutela específica, a execução em espécie, a obtenção de resultados por meio de sentenças constitutivas e eliminação de obstáculos, são fatores para a efetivação do processo.
1.6. Tempo e processo
O tempo é, indubitavelmente, o grande inimigo daquele que busca a reparação ou proteção de seu direito. Já dizia CARNELLUTTI que "o tempo é um inimigo do direito, contra o qual o juiz deve travar uma guerra sem tréguas".
O titular da pretensão insatisfeita se depara, ao pleitear o amparo do Estado-Juiz, com um sistema excessivamente burocrático, detentor de institutos arcaicos que não se adequam à realidade atual. O lapso temporal que medeia entre o ajuizamento da demanda e a prestação jurisdicional definitiva, exige das partes uma espera demasiadamente longa, que em alguns casos pode até superar o período de vida dos litigantes.
Galeno LACERDA obtemperou:
Todo processo implica onus (sic) para as partes. (...) A prestação jurisdicional, cumpre-se, pois, mediante uma atividade onerosa, forçada pelo próprio interêsse (sic) dos litigantes e, necessariamente, desenrolada no tempo. Essa atividade, acrescida do fator temporal, representa o custo, o passivo, da composição da lide. Dessa contingência o processo, atividade humana, não se livra. Jamais logrará realizar justiça perfeita, isentando o resultado de um passivo, material, e também moral – pelas energias gastas, esperanças desfeitas, paixões incontidas. Diminuir êsse (sic) passivo, sem prejudicar o acêrto (sic) da decisão, será tender para o ideal de justiça.
Vale reproduzir o teor do artigo 6º, inciso I, da Convenção Européia para Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, subscrita em Roma, no dia 14/11/1950: "Toda pessoa tem direito a que sua causa seja examinada eqüitativa e publicamente num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial instituído por lei, que decidirá sobre seus direitos e obrigações civis ou sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal". (grifo nosso)
José Olivar de AZEVEDO é enfático ao aduzir que
é dever do Estado conduzir o processo em tempo razoável, sem entraves de caráter meramente protelatório, devendo a tutela, para ser efetiva, reclamar uma decisão num lapso de tempo necessário à realização dos atos processuais, sem atropelar o rito, porém, numa proporção adequada à complexidade da causa.
As razões da dilação excessiva do processo podem ser desdobradas em duas: 1ª) a acomodação dos membros do Poder Legislativo na aprovação das reformas, não obstante os esforços das comissões formadas por processualistas na elaboração de anteprojetos; 2ª) a litigância de má-fé da parte, que de forma maliciosa emprega meios para impedir o trâmite regular do processo.
Frise-se que muitas vezes, o Estado, no desempenho de suas funções, atua de forma ilegal, dando causa a infinitas demandas e, deliberadamente, acaba usufruindo dos mecanismos disponíveis no ordenamento jurídico para viabilizar o retardamento das soluções dos litígios em que é parte interessada.
Nesse sentido, é de inteira procedência a crítica de José Eduardo Carreira ALVIM:
Por inexplicável incoerência, apesar de pregar contra a morosidade da justiça, o Estado sempre demonstrou predileção pelos processos lentos, sobretudo o ordinário, tendo tanto pavor da celeridade que, sempre busca safar-se dos provimentos rápidos, editando normas que o ponham ao largo das liminares. Em linguagem mais direta, o Estado prefere uma justiça mais célere para o povo, mas a mais lenta possível para si próprio, quando demandado como réu. Nos processos em que tem interesse, procura agilizar além do necessário o procedimento como acontece com as cobranças das suas dívidas fiscais (Lei nº 6.830/80).
A morosidade da prestação jurisdicional sempre foi uma questão a desafiar a argúcia e o talento dos cientistas do processo. Além dos fatores anteriormente apresentados, também contribui para essa lentidão, o número exacerbado de processos, que diante da insuficiência de juízes, acaba ocasionando a sobrecarga da máquina judiciária. Contudo, a simples elevação do número de magistrados não seria suficiente, sendo imprescindível também, o aparelhamento do sistema, o que se poderia conseguir se houvesse vontade política em se pôr em pauta a reforma administrativa do judiciário.
Essa inércia dos governantes é mais um obstáculo a ser transposto nessa luta pela efetividade do processo, meta principal dos estudos dos processualistas nos dias atuais.
1.7. Efetividade e técnica processual
Como já dito alhures, a forma pela qual o processo tramita hodiernamente, não condiz com a realidade sócio-jurídica que o norteia. A necessidade de se proceder ao reestudo de seus institutos basilares é patente, principalmente para obtenção da efetividade na prestação da tutela jurisdicional, preocupação atual da processualística moderna.
De acordo com as lições de José Roberto dos Santos BEDAQUE:
Parece imprescindível, pois, um retorno ao interior do sistema processual, com o objetivo de rever conceitos e princípios, adequando-os à nova visão desse ramo da ciência jurídica. É preciso "revisitar" os institutos processuais, todos concedidos segundo a visão autonomista ou conceitual da ciência processual, a fim de conferir a eles nova feição, a partir da necessidade identificada na fase instrumentalista.
A observância da técnica processual, isto é, o correto manejo das regras e institutos processuais não constitui entrave à efetividade do processo, ao contrário, é um importante mecanismo para assegurá-la.
O prazo de duração do processo pode ser ainda mais expandido se o magistrado não tiver o domínio da técnica para conduzir a demanda. Assim, o juiz que não procede à extinção do processo logo após ajuizamento da demanda, por não conseguir identificar a ausência de interesse processual, contribui para o desperdício de tempo e dinheiro, já que a ação está fadada ao insucesso.
Põe-se aqui em evidência a figura do juiz, à medida que é ele o responsável pela condução do processo, isto é, pelo desenrolar do procedimento. Assim, o magistrado deve conhecer com certa profundidade o direito, a doutrina e a jurisprudência, a fim de que, dotado de cultura jurídica, possa gerenciar o trâmite do processo, impedindo a realização de atos processuais desnecessários e, conseqüentemente, fazendo com que a demanda caminhe para um desfecho mais célere.
Não se pretende com tais colocações, pregar o culto à forma, mas ressaltar que a técnica processual é um subsídio extremamente útil para a efetividade. O que não se pode conceber é que o formalismo se sobreponha à própria finalidade para a qual o processo foi criado, qual seja, servir como meio de realização do direito material.