Ao final do julgamento, pelo Senado Federal, do processo de impeachment da agora ex-presidente Dilma Rousseff, presidido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, permiti-me analisar um julgamento histórico do STF, de 1993.
1. É que sempre tive muita curiosidade em saber o que dissera o então Min. Paulo Brossard no STF quando do julgamento do caso Collor pós-impeachment. Fora fartamente alegado que aquele jurista, ex-Senador, em conhecidíssima obra doutrinária ("O Impeachment", de 1964), sustentava que a renúncia “encerra o processo de impeachment em andamento ou impede sua instauração”.
2. O presidente afastado um ano antes pelo Senado impetrou Mandado de Segurança argumentando que, por ter renunciado, nada tinha a opor quanto a seu afastamento definitivo do cargo de presidente da república, mas, por não ser mais presidente desde que renunciara, não poderia ter sido condenado a ficar afastado do exercício de funções públicas por oito anos, e contra essa condenação se insurgia pedindo sua anulação.
O MS acabou por ser denegado e, no ponto, consta da Ementa:
VI - A renúncia ao cargo, apresentada na sessão de julgamento, quando já iniciado este, não paralisa o processo de “impeachment”.
3. O julgamento a que se referiu o Min. Ricardo Lewandowski na sessão de julgamento de 31 de agosto de 2016 (no qual três ministros não votaram e houve empate entre os demais, resultando na convocação de três ministros do STJ de acordo com o que então previa o RISTF, art. 40) realizou-se em duas assentadas, de 06 e 16.12.1993.
Na primeira, verificou-se que quatro ministros indeferiam o pedido (Min. Carlos Velloso-Relator, Min. Sepúlveda Pertence, Min. Paulo Brossard e Min. Néri da Silveira) e outros quatro (Min. Ilmar Galvão, Min. Celso de Mello, Min. Moreira Alves e Min. Octavio Gallotti – então presidente da Corte) o deferiam.
Os ministros do STJ convocados para a assentada do dia 16 foram os mais antigos da Corte: Min. José Dantas, Min. Torreão Braz e Min. William Patterson, e todos acompanharam o Relator denegando a segurança.
4. O Min. Sidney Sanches (que presidira o julgamento no Senado, tal como agora fez o Min. Ricardo Lewandowski no caso Dilma Rousseff) declarou-se impedido, o Min. Marco Aurélio alegou suspeição por escrito e também o Min. Francisco Rezek, que fora Ministro das Relações Exteriores no governo Collor, não votou por ter sido considerado suspeito.
5. Parece relevante observar que, naquele caso Collor e após apresentada sua renúncia, o Senado analisou inicialmente se a renúncia interromperia ou não o processo de impeachment, e a matéria foi decidida pelos senadores (e não por decisão monocrática do presidente da sessão), tendo 73 senadores votado pelo prosseguimento. No segundo momento, outra vez, os senadores decidiram, por 76 votos, que cabia a aplicação da sanção de inabilitação por oito anos para o exercício de funções públicas, mesmo após a renúncia ao cargo de presidente.
6. Outro aspecto interessante foi a opinião levada durante os debates de julgamento no STF de, dentre muitos outros, dois ditos constitucionalistas de nomeada: Michel Temer (hoje presidente da república) e Carmen Lúcia (que assume a presidência do STF daqui a poucos dias), com entendimentos divergentes, ele entendendo (tal como Paulo Brossard) que a renúncia (ato pessoal de vontade que não permite questionamentos; não se “pede”, mas se “apresenta” ou se “comunica”) interrompia o processo em curso e ela sustentando que “a renúncia que se põe após o início da sofrida experiência (...) não obsta processamento e julgamento do renunciante” e que extinguir o processo no caso concreto seria “adotar o princípio da pessoalidade e da voluntariedade a predominar sobre a finalidade pública”.
7. A sentença no caso do julgamento do impeachment de Fernando Collor diz que ficara prejudicado o pedido de aplicação da sanção da perda do mandato, em vista da renúncia ao mandato, e que fora julgada procedente a denuncia por crime de responsabilidade, em consequência do que ficava imposta a sanção de inabilitação de que trata o parágrafo único do art. 52 da Constituição Federal de 1988.
8. Pesquisando o inteiro teor do MS 21.968 no portal do Supremo, satisfiz minha curiosidade:
(Excertos do Voto do Ministro Paulo Brossard no julgamento do MS 21.689, em 06/12/1993, destaques acrescidos)
“(...). Por via dele (Mandado de Segurança) não posso revisar a decisão pelo órgão competente, nos estritos limites de sua competência e de suas atribuições (...); decidindo bem, ou decidindo mal, o Senado ficou nos estritos limites constitucionais, não os excedendo em momento algum.”
“Não me cabe apreciar o acerto ou desacerto da Câmara Alta; bem ou mal, ela decidiu assim e só ela podia fazê-lo. (...). Pode o STF interferir no mérito do julgamento que compete ao Senado fazer (...)? Não me parece que isto possa ser feito.”
“Decidindo como decidiu, o Senado não ofendeu nenhum preceito de lei, limitando-se a endossar uma interpretação (quanto ao fato de a renúncia pôr ou não fim ao processo de impeachment) jurídica, que eu não defendo, (...), mas que, tenho de reconhecer, é defendida por autoridades respeitáveis.”
“O Senado não trateou nenhuma lei; terá adotado a doutrina menos defensável? Não sei, o que sei é que consagrou um entendimento, que não é o meu, mas que tem o sufrágio de autores ilustres. (...). Em outras palavras, não posso reformar a decisão do Senado prolatada em matéria de sua exclusiva competência no exercício de sua original e conclusiva jurisdição. Em verdade, as leis não concebem recurso algum da decisão do Senado para qualquer outra Corte, nem mesmo para o próprio Senado; nem a rescisória é admitida; o judiciário, originariamente ou em grau de recurso, não pode conhecer da matéria, dado que a Constituição, bem ou mal, reservou para o Senado, e exclusivamente a ele, conhecer e decidir acerca do assunto.
Absolutória ou condenatória, justa ou injusta, sábia ou errônea, da decisão do Senado não cabe recurso, direto ou indireto.”
9. Constata-se que o Min. Paulo Brossard manifestou-se repetidamente pela incompetência (“falta de jurisdição”) do STF para julgar aquele Mandado de Segurança, no que foi voz isolada.
10. Dos ministros do STF que participaram daquele julgamento, apenas o MIn. Celso de Mello ainda permanece na Corte, uma vez que o Min. Marco Aurélio se declarara suspeito (não votando). Os três do STJ também já deixaram a Corte.
11. No tocante ao chamado “fatiamento”, no caso do impeachment de Dilma Rousseff, isso não fora objeto expresso do MS 21.689, o que não impediu o pronunciamento de praticamente todos os ministros do STF sobre a matéria ao julgar aquele MS.
Retiro do inteiro teor do MS 21.689, disponível no portal do STF, com 295 páginas (da fl. 193 à fl. 487 dos autos):
I. Ementa:
IV – No sistema do direito anterior à Lei 1.079, de 1950, isto é, nos sistema das Leis nºs 27 e 30, de 1892, era possível a aplicação tão somente da pena de perda do cargo, podendo esta ser agravada com apena de inabilitação para exercer qualquer outro cargo (...), emprestando-se à pena de inabilitação o caráter de pena acessória (...). No sistema atual, da Lei 1.079, de 1950, não é possível a aplicação da pena de perda do mandato apenas, nem a pena de inabilitação assume caráter de acessoriedade.
II. Min. Carlos Velloso, relator, no Relatório:
Alega o impetrante, em resumo:
(...)
c) que o art. 52, parágrafo único, da Constituição, não institui duas penalidades autônomas mas somente uma, da qual “a outra é apenas um apêndice”;
d) que a atual Constituição, repetindo as anteriores, desde 1934, prevê a condenação à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública. (...);
(...)
O eminente Ministro Sidney Sanches, então presidente desta Corte, prestou informações (...), esclarecendo:
(...)
4º - acham-se reproduzidas (...) as razões pelas quais entendi que só o Plenário do Senado Federal haveria de decidir (...) se podia, ou não, prosseguir no julgamento, para impor, ou não, a sanção de inabilitação (...);
(...)
7º - sendo assim, o Plenário do Senado Federal – e não apenas o Presidente do processo, por ato singular – é que poderia, eventualmente, (...); ou por considerar meramente acessória, - e não autônoma – a pena de inabilitação (...) prevista no parágrafo único do art. 52 da Constituição Federal; nesta última hipótese, essa avaliação quanto à natureza da pena de inabilitação, envolvia a interpretação de direito material constitucional e não estritamente processual;
(...)
9º - por essas razões, como simples Presidente do processo, no Senado, entendi de remeter ao Plenário o exame da questão (...) e também a concernente à possibilidade, ou não, de o Senado prosseguir no julgamento quanto à pena de inabilitação;
(...)
11º - abstenho-me de manifestação sobre o acerto ou desacerto da decisão do Plenário do Senado Federal, porque só a este é que cabia decidir de sua competência remanescente, ou não, e de prosseguir no julgamento; não a mim, enquanto Presidente do processo (...);
(...)
O eminente Presidente do Senado Federal, Senador Humberto Lucena, prestou informações (...) esclarecendo, em síntese, o seguinte:
(...)
j) – que a interpretação simplista (...) distorce o pensamento constitucional, pois a palavra com surgiu para corrigir uma deficiência da Constituição de 1891, (...) . Chegou-se, assim, a um resultado lógico, pois a condenação à perda do cargo impunha, obrigatoriamente, a inabilitação para o exercício de outros cargos. (...).
(...)
n) que a decisão de inabilitação para o exercício de outro cargo público tem caráter politico e não está sujeito à apreciação pelo Poder Judiciário;
(...) a Procuradoria-Geral da República (...) opina (...) que o impetrante, no decorrer da petição, demonstra que toda a fundamentação se volta contra a decisão do Plenário do Senado Federal que condenou o impetrante à pena de inabilitação para o exercício de função pública.
(...)
Ademais, a questão referente (...) à aplicação da pena de inabilitação somente poderia ser dirimida pelo Plenário do Senado Federal, e não pelo Presidente do processo de impeachment, que não participou da decisão do Senado Federal (...), porque “se tratava de questão de mérito, que importava na qualificação jurídica da pena de inabilitação, e não de questão estritamente processual”.
III. Min. CarLos Velloso, relator em seu Voto:
(...)
A Lei 1.079, de 1950, não permite a aplicação solitária da pena de perda do cargo.
(...)
A preposição com, utilizada no parág. único do art. 52 (da Constituição de 1988) (...), ao contrário do conectivo e, do § 3º, do art. 33, da CF/1891, não autoriza a interpretação no sentido de que se tem, apenas, enumeração das penas que poderiam ser aplicadas. Implica, sim, a interpretação no sentido de que ambas as penas deverão ser aplicadas.
(...)
No sistema atual, entretanto, isto não é mais possível: ambas as penas deverão ser aplicadas em razão da condenação.
(...)
Não há falar, na verdade, na ordem constitucional brasileira, que a pena de inabilitação inscrita no parág. único do art. 52 da Constituição, tenha caráter de pena acessória.
(...)
E, finalmente, também aqui, no caso sob julgamento, o processo de impeachment não visa, apenas, à perda do cargo, mas, também, à inabilitação (...).
IV. Min. Ilmar Galvão, em seu Voto:
(...)
Com efeito, a Constituição não poderia dar à justiça comum o poder de depor o presidente, do mesmo modo que, em contrapartida, atribuir à magistratura política a competência para processar o supremo magistrado na Nação nos crimes comuns.
Limita-se essa, portanto, à aplicação, se for o caso, da pena de perda do cargo público, que, pelo sistema atual, acarretará, inevitavelmente, o efeito de impedir, por oito anos, o exercício de qualquer outro.
(...)
O simples fato de passarem as penas (...) a serem ligadas entre si por meio de preposição (...), em lugar da conjunção coordenativa aditiva “e” (...) constitui dado suficiente para induzir vínculo de acessoriedade entre as duas penas, levando à conclusão inevitável que à principal -- perda mandato, no caso, do exercício da mais eminente magistratura, em nosso país --, se ligou, acompanhando-a, em sua existência, a de inabilitação.
Acresce, para reforçar essa assertiva, a circunstância de a constituição já não falar em penas, mas em pena, com o que, sem dúvida, quis enfatizar que a pena acessória é daquelas que encerram verdadeira consequência da aplicação da pena principal, havendo de ter-se por aplicada, ainda que não mencionada na sentença (...).
V. Min. Celso de Mello, em seu Voto:
(...)
Na interpretação do art. 52, parágrafo único, da Carta Política (...), não vislumbro a existência de sanções político-jurídicas de caráter autônomo. Entendo que, ao contrário, há uma única sanção constitucionalmente estabelecida: a de desqualificação funcional, que compreende, na abrangência de seu conteúdo, a destituição do cargo com a inabilitação temporária. A unidade constitucional da sanção prevista torna-a indecomponível, incindível, impedindo, dessa forma, que se dispense tratamento jurídico autônomo às projeções punitivas que dimanam da condenação senatorial.
De qualquer maneira, e ainda que se vislumbrasse no preceito em causa uma dualidade de sanções, tenho para mim que, entre elas, haveria clara relação de dependência ou de acessoriedade: de um lado, a sanção destituitória (...) condicionante, e, de outro, a pena de inabilitação temporária, que constitui mera decorrência secundaria da decretação da perda do mandato.
VI. Min. Sepúlveda Pertence, em seu Voto:
(...)
17. (...) condenação aí, está (art. 33 da Lei 1.079/1950), simplesmente, por veredicto afirmativo da responsabilidade do dignitário acusado, do qual derivam duas sanções necessárias e paralelas: a destituição do condenado e a sua inabilitação temporária.
18. Em outras palavras, a pena de inabilitação para outras funções não advém da aplicação da pena de perda do cargo atual, mas, sim, decorrem ambas, fatal e necessariamente, do juízo de condenação.
(...)
30. (...): no direito vigente, o que faz o Senado é absolver ou condenar; condenado, o acusado, ipso facto - (....) – a cominação de ambas as penas incide, sem que à uma se possa qualificar de principal e à outra, de acessória.
(...)
44. A redação do atual do art. 52 CF (...) teve, por isso, com a ênfase, que a preposição marcou, na junção das duas penas cominadas, a preocupação de evitar nova traição do legislador ordinário, tornando imperativa a cumulação de ambas as sanções.
VII. Min. Néri da Silveira em seu Voto:
(...)
6. Cumpre, entretanto, ter presente, também, na consideração do “impeachment”, que as cosequências da procedência da acusação não se restringem ao mero afastamento do acusado do cargo que ocupa, senão que se lhe impõe sanção de grave consequência, no plano dos direitos políticos, eis que inabilitado ficará por certo tempo “para o exercício de função pública”.
Não cabe, destarte, avaliar os efeitos do “impeachment” tão-somente, no que concerne à cominação da perda do cargo (...). A inabilitação a ser imposta, para o exercício de função pública, por oito anos, “ut” parágrafo único do art. 52, da Constituição de 1988, ganharia, à evidência, significado negativo inequivocamente maior à vida pública do assim condenado no processo político. Não é possível, de outra parte, deixar de conferir à inabilitação temporária para o exercício de função pública justificativa correspondente à dos motivos que conduzem ao afastamento do cargo, (...). Os mesmos valores, que estão assim a justificar o afastamento, motivam a interdição temporária do acesso de funções públicas de quem, por essa via do “impeachment”, foi responsabilizado. Não teria sentido, efetivamente, que os tão graves motivos, previstos na Constituição e na lei de regência dos crimes de responsabilidade, para o afastamento, não fossem, também, as razões a basear a inabilitação para o exercício de funções públicas. (...). Se com o “impeachment” se visa a regularidade, a normalização, a moralização do serviço público, concorrem, para isso, tanto o afastamento dos altos cargos (...) dos ocupantes “que se mostraram incapazes de exercê-los dignamente” (...), quanto o impedimento ao retorno, no resguardo da mesma coisa pública, por força da temporária inabilitação para o desempenho de funções públicas, compulsoriamente também imposta, em razão dos mesmos fatos determinantes da destituição. Com isso, colima-se, por igual, impedir que o mau administrador volte a prejudicar o país, quando lhe aprouver, durante o período de inabilitação.
Não basta, destarte, ver, apenas a perda do mandato, como efeito do “impeachment”. Tão importante quanto essa é a inabilitação de quem acusado de malversação da coisa pública quando exerciaa o cargo de que arredado. Ora, força é compreender que não se atenderiam, plenamente, os objetivos do “impeachment”, se se admitisse que, por sua exclusiva vontade, o acusado pudesse, a qualquer hora, (...) impedir ocorresse esse efeito igualmente moralizador da coisa pública, que é a inabilitação (...).
VIII. Min. Moreira Alves, em seu Voto:
Quer se considere a perda do cargo com inabilitação para o exercício da função pública como pena única (...), ou como duas penas, em que a primeira é a principal e a segunda é a acessória, o que me parece manifesto, (...), elas não podem ser autônomas, pois, além de a preposição com indicar acompanhamento, (...), teriam de vir ligadas pela disjuntiva ou, e nesse caso uma poderia ser aplicada sem que a outra o fosse, ou seja, poder-se-ia manter o presidente no cargo, inabilitando-o, por oito anos, para o exercício de qualquer função pública, o que, evidentemente, seria um dispautério.
IX. Min. Octávio Gallotti, presidente, em seu Voto:
Segundo o parágrafo único do art. 52 da Constituição Federal, limita-se a condenação, no processo de crime de responsabilidade, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício dele.
A mim, parece mais do que patente a relação de simultaneidade e de acessoriedade entre as duas cominações – acessoriedade, naturalmente, da segunda em relação à primeira.
A Constituição diz “com”, e, quando se usa essa preposição, quer estabelecer, ou a cominação das duas penas, ou a de nenhuma. Não uma pena sem a outra (...), e seria, penso eu, a inversão do sentido do texto constitucional. Em outras palavras, a Constituição estabelece a unidade e a incindibilidade da apenação (...).
Essa interpretação (...) coincide com a lógica e a razão de ser do instituto do impeachment, que é lograr o afastamento da autoridade acusada, e igualmente se concilia com as raízes históricas do instituto.
(...)
Parece lógico, portanto, que a inabilitação é consequência, segundo a lei, de uma prévia condenação, condenação, logicamente, à perda do cargo (...).
12. Observe-se que mesmo os quatro ministros que deferiam o MS entendiam que não era passível de “fatiamento” e que as penas de afastamento/cassação do mandato e de inabilitação por oito anos para o exercício de função pública eram indissociáveis, incindíveis, intrinsicamente ligadas, o que se pode resumir no que disseram o Min. Moreira Alves (“evidentemente, seria um dispautério”) e o presidente da Corte, Min. Octávio Gallotti (“A mim, parece mais do que patente a relação de simultaneidade e de acessoriedade entre as duas cominações – acessoriedade, naturalmente, da segunda em relação à primeira. (...). A Constituição diz “com”, e, quando se usa essa preposição, quer estabelecer, ou a cominação das duas penas, ou a de nenhuma. Não uma pena sem a outra (...), e seria, penso eu, a inversão do sentido do texto constitucional. Em outras palavras, a Constituição estabelece a unidade e a incindibilidade da apenação (...). Essa interpretação (...) coincide com a lógica e a razão de ser do instituto do impeachment, que é lograr o afastamento da autoridade acusada, e igualmente se concilia com as raízes históricas do instituto. (...). Parece lógico, portanto, que a inabilitação é consequência, segundo a lei, de uma prévia condenação, condenação, logicamente, à perda do cargo“).
Cada um dos oito ministros lastreou sua posição em extensa doutrina, transcrevendo as teses (inclusive algumas contrárias a seu entendimento) e em jurisprudência da própria Corte ao longo de sua existência, desde o séc. XIX, ainda no tempo do Império e, sobretudo no tempo da chamada República Velha. O levantamento histórico da legislação traz referências a decisões da Suprema Corte norte-americana, as diferenças entre a legislação daquele país e a nossa, e também a evolução (ou mudanças) verificadas no nosso ordenamento jurídico, constitucional e infraconstitucional.