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Extinção da apatridia: um pensamento não mais utópico

Agenda 04/11/2016 às 16:33

Com tantos casos de apatridia no âmbito do Direito Internacional, esse artigo vem mostrando que com o fim de políticas discriminatórias e novas ideias como ,por exemplo, o fim da nacionalidade é possível a extinção da apatridia.

Introdução

Um problema existente ainda hoje é a questão da apatridia no cenário internacional. De acordo com o ACNUR, órgão responsável por sedimentar à proteção desses indivíduos, existem dois tipos de apatridia: de jure e de facto. Aquela abarca as pessoas que não possuem nacionalidade de nenhum país, na de facto o sujeito possui uma nacionalidade, mas, a proteção, os direitos e deveres que deveriam dar proteção por ser nacional não funcionam, tornando-o um marginalizado. Desta forma, apátridas seriam as pessoas consideradas sem pátrias e que não possuem nenhum vínculo jurídico-politico com nenhum país. 

Critérios para ser um Apátrida e as convenções que tentam diminuir as questões da apatridia

São dois critérios que determinam a  nacionalidade ao sujeito: o do solo "jus soli" – também chamado de territorial ou o do sangue "jus sanguinis". O jus soli determina que aquele que nasce em determinado território é um nacional e o jus sanguinis considera filiação. Caso não possua nenhum desse critério ao nascer, a pessoa é considerada um apátrida. 

De acordo com Gustavo Oliveira em seu livro na página 53, "O fenômeno da apatridia geralmente ocorre em virtude da política interna discriminatória de países que retiram a cidadania de determinados seres humanos por critérios discricionários", um bom exemplo foi na Alemanha nazista quando Hitler quis dizimar os judeus e a sua primeira atitude foi então retirar a nacionalidade alemães daquele povo. Além das políticas discriminatórias, um fato que acaba por fazer com que ainda se tenha apátridas no mundo é o desrespeito aos Direitos Humanos por parte de Estados e Órgãos Internacionais que deveriam garantir os direitos e deveres e seguridade dos indivíduos. 

Na tentativa de dar alguma seguridade para os apátridas em 1954 surge a convenção dos apátridas. Essa convenção trás os direitos e deveres dos apátridas para evitar qualquer tipo de tratamento diferente  do estado em relação a pessoa e os seus nacionais. A convenção ainda traz os direitos e deveres do Estado que venha a abrigar esses apátridas. 

Depois da convenção de 1954 veio por seguinte à convenção de 1961 para reduzir os casos de apatridia, essa proposta foi estabelecida pela ONU, mas somente em 1975 que essa convenção veio a entrar em vigor. Essa convenção teve como característica fazer com que os Estados que ratificassem o tratado viesse a estabelecer em seus Estados o critério jus soli  para que dessa forma os casos de apatridia viessem a diminuir. A convenção ainda modifica as perdas de nacionalidade e diminuindo as chances de que o homem venha perder a mesma. 

Brasileirinhos Apátridas

No Brasil um episódio de apatridia que ganhou muita visibilidade foi o caso dos brasileirinhos apátridas. Os brasileirinhos apátridas seriam filhos de nacionais que nasceram em um Estado que, por exemplo, adota somente o jus sanguini e dessa forma não abarcaria essas crianças, tornando-as apátridas. O governo brasileiro só consideraria brasileiro se os pais viessem com o filho no país e o registrassem, mas essa opção se tornava onerosa e muitas vezes inviável e por isso acabaram acontecendo vários casos de apatridia. O Estado brasileiro ao perceber que essa opção de vir ao Brasil registrar o filho se tornaria inviável decidiu então por ratificar a emenda 54 mudando o art. 12 da Constituição Federal. 

A modificação possibilitou que os pais brasileiros pudessem registrar seus filhos nos países em que estavam desde que fosse ao lugar competente para que se pudessem contabilizar quantos novos brasileiros estavam residindo fora e dessa forma pudesse exercer a proteção quando necessário desses indivíduos. Essa mudança possibilitou a reversão de quase 200 mil casos de apatridia de acordo com o ACNUR.

Apatridia revogando a cidadania

Em seu livro na página 60-61, Gustavo Oliveira diz que: "O tema da apatridia obriga-nos a percorrer caminhos que os horizontes formais do direito, definitivamente, não dão conta. Pois o apátrida nega a ordem supostamente natural da vida humana. Nega, afirmando sua potência de impassibilidade de representação." E finaliza explanando que: "pensar a apatridia demanda reinventar a própria ideia de cidadania.”. 

Assim sendo, a apatridia nega o principal direito do indivíduo, o de ser nacional e, por conseguinte os direitos a proteção, seguridade e os mais que advém do fato de ser um nacional. E quando o autor fala que ela nega a suposta ordem natural da vida é porque quando se pensa que um sujeito vai nascer já se tem uma ideia formada de que o mesmo irá nascer com uma nacionalidade definida e, portanto com os seus direitos assegurados. Então no momento que surge uma questão de apatridia, para que se possa resolver é necessário que se pense em outra forma de atribuir uma nacionalidade para aquele sujeito que supostamente já deveria possuir uma nacionalidade. 

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Direitos Humanos, Ideia de Nacionalidade e o Repúdio à Diferença

Um grande gestor e responsável ao combate da apatridia são os Direitos Humanos, no entanto, a função essencial dos Direitos Humanos é assegurar que o Estado proteja os seus nacionais e de tal forma garanta os direitos dos mesmos. Porém, em se tratando de um apátrida os Direitos Humanos acabam por não atuar de forma tão eficaz, uma vez que estes não possuem nacionalidade, não teria como se cobrar algo de um Estado, pois nenhum Estado tem a responsabilidade de fato de cuidar daquela pessoa. Acaba que os Direitos Humanos entram em defasagem na proteção dos indivíduos e desse modo é necessário que este juntamente com Estados e Organizações Internacionais que desejam extinguir com a apatridia vá encontrar um novo viés para buscar a mínima proteção dos sujeitos. 

Se não tem como os Direitos Humanos entrar em ação, a consequência disso é que os Estados que não se interessam pela questão da apátrida acabam por desrespeitar e transgredir os Direitos Humanos, e essas práticas podem ser feitas por meio de segregação dos indivíduos apátridas, xenofobia, ou qualquer outro tipo de violação dos Direitos Humanos. Dessa forma, ser um apátrida é estar marginalizado aos “seus direitos” que deveriam ser naturais. 

Analisando todas essas questões se verificam então que o apátrida se torna mais vulnerável que o refugiado, pois apesar de todos os riscos que os refugiados correm como a perseguição política, terrorismo, entre as outras questões eles ainda possuem uma identidade nacional, então, algum direito ele tem assegurado e os Direitos Humanos consegue atuar de forma eficaz e com politicas públicas para exercer a proteção dessas pessoas. Já os refugiados não possuem essa ideia de identidade nacional e por isso os riscos são maiores, pois não há nenhum tipo de proteção vindo de Estado e muito pouco vindo dos Direitos Humanos e por vezes não possuindo tanta eficácia quando deveria. 

A ideia de nacionalidade acaba por fazer também que haja uma disseminação de ódio, ou seja, aqueles que possuem uma nacionalidade veem o apátrida como uma  ameaça para o seu país e para si, seja o motivo por questões trabalhistas, econômicas, sociais, pureza cultural e até mesmo por questões raciais ainda hoje; por conseguinte, com essa ideia diabólica que eles têm dos apátridas e refugiados acabam por não aceitarem aquele diferente em seu Estado e começa aí uma pregação de disseminação de ódio e abominação do outro por ser diferente ou por ser de outro local. Esse fenômeno é conhecido como o repúdio à diferença. 

Com essa nova vertente de pensamento dos nacionais, o repúdio a diferença, os direitos humanos acabam por ficarem de mãos atadas na hora de tentarem buscar algum tipo de proteção para os apátridas, pois aqui na ideia de repudio à diferença não é somente o Estado conflitando com os apátridas e sim toda a nação, e uma ideia que esta sendo disseminada, mas o Estado também não faz nada para coagir ou mudar o pensamento dos nacionais, já que em muitos casos o Estado também vê o apátrida ou refugiado como aquele entre diabólico que trará o caos, uma vez que será mais um que o Estado terá que cuidar e dessa forma mais gastos para garantir todos os direitos que o seus nacionais originais tem. 

Conclusão

Gustavo Oliveira, no seu livro na página 65 propõe uma solução para evitar a apatridia, no seu ponto de vista, para que se diminua ou extinga os casos de apatridia é necessário que se acabe com a noção de cidadão, pois, quando se cria a ideia de cidadão se cria por consequência a ideia de não cidadão e é dessa maneira que surge a segregação e o surgimento da apatridia. Sem essa ideia de cidadão, não haverá mais a ideia de grupos isolados por uma nacionalidade e todos estarão em mesmo patamar de igualdade, acabando assim com quaisquer possíveis transtornos. Dessa forma também, não será apenas um Estado responsável por aquele individuo e sim todos em conjunto; assim sendo haveria a colaboração entre os Estados para cuidar e proteger todos os indivíduos e por fim o que o autor propõe o fim da ideia de nacionalidade. 

Tomando todos esses preceitos como verdadeiros para o fim da apatridia, o pensamento de que se pode acabar com a mesma não se torna mais utópico pois a proposta que se pretende fazer é uma reforma no cenário internacional e, essas mudanças abarcam o fim de politicas discriminatórias que formam a ideia de que o apátrida seria o mal para qualquer sociedade, o reforço de fundamentos dos direitos Humanos visando a proteção dos apátridas e por fim o cancelamento desse pensamento de cidadão e não-cidadão ou de nacional e não-nacional.

Deve-se então buscar um pensamento contrário, ou seja, disseminar a ideia de que o apátrida não é um mal para o Estado ou para a sociedade e difundir a pratica de aceitação desses marginalizados para que ele venha a ficar; é necessário implantar o pensamento de que eles, os apátridas, possuem os mesmos direitos como qualquer outra pessoa intitulada de nacional, pois, o fundamento dos Direitos Humanos é esse, de que todos devem ter a mesma proteção; e por fim o outro preceito que se deve tomar como fundamento é que os nacionais devem exercer a hospitalidade para os apátridas, pois não existe um não cidadão, e mais uma vez reforçar a lógica de que todos são iguais.

Destarte, pensando na reforma dessas práticas e na disseminação dessas três vertentes como fundamentos para o fim da apatridia, seria possível não mais de forma utópica se pensar na extinção da apatridia uma vez que se tornaria viável a extinção dessas práticas e o fim da marginalização dos indivíduos. 

Referências

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