Considerações Iniciais
Não mentir-se-ia se afirmasse que a pretensão era tratar sob os discursos políticos lançados as massas, bem como mentes robotizadas repetindo discursos panfletários sob uma cegueira providencial e, principalmente desconsiderando e até desrespeitando um senso crítico mínimo daqueles que não acham - mas entendem – em sentido contrário. A verdade parece ter apenas um lado uma versão, e a semântica do termo “democracia” nunca variou tanto do seu eidos, destacadamente nas mãos dos relatores dos mesmos discursos panfletários.
No entanto, não fugindo do compromisso de um cientista do direito, que muito pesquisou acerca dos movimentos e ensaios lançados a grande massa, ousa-se explicar dentro de apenas uma modalidade de tantas, como a manipulação de massa é tratada a tempos e, apesar de tratar dentro da linha de pesquisa de direito consumerista, como tal mecanismo se destaca em outros segmentos, os quais têm dúvidas se realmente é política.
A Publicidade e a Propaganda
O termo ‘publicidade’ é originado do gênero ‘público’[1], seu significado, por óbvio, é tornar algo público, divulgado, difundido etc. Já o termo ‘propaganda’ tem origem na religião católica quando esta era propagada pelo mundo. Armando Sant’Anna traz uma melhor verificação histórica: “Propaganda é definida como propagação de princípios e teorias. Foi introduzida pelo Papa Clemente VII, em 1957, quando fundou a Congregação da Propaganda, com fito de propagar a fé católica pelo mundo”[2]. Uma outra teoria admite que o precursor foi o Papa Urbano VIII em 1622 para a difusão da fé cristã nos países não católicos.
A importância é apenas compreender que a publicidade visará um fim comercial, lucro mediato ou imediato. Já a propaganda seria visada a divulgarem ideais, filosofias, religiões, crenças, tendências políticas dentre outros.
A Propaganda
Inquestionável o poder da publicidade e da propaganda face as condutas e comportamentos dos seres humanos. O enfoque inicial e menos abrangente será dado na Propaganda, seus primeiros passos e suas eternas e atuais lições.
Não diferente da publicidade, a propaganda assemelha-se não só com a origem histórica, mas também o igual tratamento com a massa. Logo para se atingir a divulgação de ideais, princípios e tendências políticas no século XX, também se fazia necessário um efetivo meio de comunicação.
Lenine, ou Lênin, para instaurar seu bolchevismo e Hitler[3] com seu nazismo foram grandes mestres na prática da propaganda. Como afirma Sant’Anna foram dois gênios da propaganda, e ambos proclamaram a supremacia dessa moderna arma.
O uso pela Alemanha Nazista era tão certo, que conquistas de territórios fronteiriços se deram por força desta arma. A exemplo de técnicas e táticas de guerra, a Alemanha possuía não comissários políticos no estrangeiro, mas grupamentos de propaganda. Hoje poderia se dizer verdadeiras ‘agências’. Há de se relatar que o próprio Napoleão tinha plena consciência do poder da propaganda, e em destaque com objetivo de atingir a ‘opinião pública’, em uma de suas afirmações Napoleão pregava que: “Para ser justo, não é suficiente fazer o bem, é igualmente necessário que os administrados estejam convencidos. A força fundamenta-se na opinião. Que é governo? Nada, se não dispuser da opinião pública”. Apesar de recentes exceções, a ideia de Napoleão permanece bem atual.
A própria religião fez uso da propaganda, aliás, não fora por acaso que a origem do termo propaganda vem da igreja católica. Não seria absurdo afirmar que a igreja católica fez escola, e na verdade o fez a ‘Escola/Congregação de Propaganda’ em 1957. Tem-se um exemplo atual, apesar de marketing pessoal, do Padre Marcelo Rossi. O mesmo faz uso da fé dos cristãos católicos para vender seus shows e produtos em justificativa de uma filantropia.
Seja por política, religião, ideologia ou crença, o papel da propaganda é inserir na mente de cada indivíduo uma conduta, um comportamento, um ideal, resultando assim, uma condução involuntária, na maioria das vezes, em prol da causa em questão. Neste aspecto, a propaganda também se assemelha bastante com a publicidade no que tange a busca em atingir a mente humana.
Conforme bem afirma Armando Sant’Anna o efeito propagandístico tem semelhança com o efeito educacional, entretanto, a educação em regra jamais buscaria um efeito além do ensinar, ou seja, não buscaria a manipulação do aluno ou introduzir conceitos e compreensões prontos. O mesmo professor ainda considera que a propaganda não é uma ciência condensável em fórmulas, em sistemas, algo exato: “Movimenta, inicialmente, mecanismos fisiológicos, psíquicos e inconscientes bastante complexos, alguns dos quais conhecidos; ademais, seus princípios provêm tanto da estética como da ciência”[4].
Concordasse com tal afirmação, ainda mais no que tange a qualidade de ciências humanas, destacando-se a psique humana totalmente avessa a qualquer sistema exato, específico, tal como um sistema físico ou matemático. O ser humano por si já apresenta grande complexidade, totalmente contrário a qualquer previsão ou regra, falar no cérebro humano, na mente humana, sob aspecto psíquico aumenta-se mais ainda esta imprevisibilidade.
Uso da Propaganda em prol do Bolchevismo
A dialética simplificada pelo marxismo já apresentava um grande resultado perante a massa. Era defendido que a base deste ideal estava na consciência da massa, que por sua vez sustentava a consciência política. Dessa maneira, o primeiro ponto para difusão do marxismo era a busca da educação da classe, solidificada esta educação, aí sim poder-se-ia entravar as causas perante os patrões.
Esta educação da classe, com vezes de propaganda, era sustentada pelos bolchevistas tendo como ideais a palavra de ordem e a revelação política[5]. A palavra de ordem remete diretamente a ideia revolucionária, de ‘Poder’, as clássicas palavras de ordem para os bolchevistas eram: “Todo poder aos Sovietes” e “Cumprir e superar o Plano em quatro anos”.
Estas ideias eram espalhadas perante a massa como ideal da causa. Para isso o bolchevismo além dos propagandistas de ideias também contava com os agitadores da massa. A consciência da classe, sem embargo, era mais visada “Não tem valor se não repercute largamente nesta consciência e, para tanto, deve distinguir as aspirações latentes no tocante ao tema mais favorável”[6].
Interessante aspecto do movimento bolchevista era seu aparelhamento propagandístico, ou seja, seu setor de comunicação ou imprensa já diferenciava o público alvo a ser atingido. Aspecto importante que será defendido no trato da publicidade, no caso, publicidade não para massa em si, mas para grupos isolados.
Este movimento comunista por meio de jornais diferenciava seu público a ser atingido, mantinha-se a essência, mas os discursos modificavam de acordo com a região, de acordo com a classe trabalhadora. Afinal, de que adiantava um discurso mais culto para uma massa de iletrados, ou ainda, qual efeito de um discurso feito para massa de iletrados para uma classe mais favorecida?
Tanto Lenine como Trotsky tiveram grande influência na propaganda política, talvez a serem considerados pais desta. Inúmeros canais eram utilizados para divulgação do ideal político, destacando-se o rádio, o qual fazia-se atingir as regiões mais longínquas. Na pertinente observação de Sant’Anna uma verdadeira rede de “psicopolítica”.
A Propaganda no Nazismo
Não há melhor exemplo do potencial da propaganda, e mesmo da publicidade, do que a propaganda utilizada por Hitler. Bem verdade que grande parte deste mérito se deve ao Ministro da Propaganda Joseph Goebbels[7]. Houve uma verdadeira transformação na propaganda naquele tempo. Ao se dirigir a massa, Adolph Hitler invocava em seus seguidores, valores ligado a raça, a pureza do sangue. Com isso conseguia nos seus súbitos despertar ódio e sede de poder. Taticamente era insuflado, tal efeito de exaltação que Hitler conseguia atingir a mente da massa sem a menor repulsa ou resistência, obviamente que este estado provocado na massa deixava a racionalidade em planos inferiores. Era um estratagema, exacerbava um estado de espírito na massa onde se inseria os comportamentos nazistas sem qualquer resistência.
A técnica utilizada por Hitler, posteriormente seguida por Mussolini no Fascismo, desconsiderava totalmente o fator respeito humano, mais longe ainda da dignidade da pessoa humana. Não cabia a massa refletir as ideias, questionar, entrar no mínimo campo da racionalidade. Como bem afirmava Mussolini caberia apenas a massa crer.
No desenvolvimento da propaganda nazista acreditou-se que a massa unida se assemelha sentimentalmente a uma mulher, tanto que Adolf Hitler afirmava: “O povo, em grande sua maioria, está numa disposição e num estado de espírito a tal ponto feminino, que as suas opiniões e os seus atos são determinados muito mais pela impressão produzida nos sentidos que na reflexão pura”. É o que se conclui compartilhando do entendimento de Armando Sant’Anna que: “Essa a razão efetiva do êxito da propaganda nazista em relação às massas alemãs: predomínio da imagem sobre a explicação, da sensível brutal sobre o racional”[8].
Pode ser afirmado que certos anúncios publicitários atuais fazem uso desta técnica, ou seja, racionalidade do consumidor sempre às margens. Obviamente também que a técnica está atualizada, aperfeiçoada.
Com isso, desde a época do nazismo, o objetivo é buscar a implantação da conduta ou comportamento (sem questionamentos) na mente humana. Era uma eterna busca ao estado irracional, propenso a fixação de ideias. O domínio nazista através da propaganda não ocorria por acaso, para se ter uma ideia até os momentos dos discursos dirigidos à massa eram analisados criteriosamente. Goebbels e Hitler concluíram, por exemplo, que o momento no dia mais propenso a assimilar um discurso era ao entardecer[9].
Ao escrever Mein Kampf no presídio militar de Landsberg sobre o Lech, no tratar do tema ‘A Propaganda e a Guerra’, Adolf Hitler relata como aprendeu com os ingleses o poder e o uso da propaganda na guerra. Reconhece inclusive que seu interesse a esta ‘arte’ se deu justamente pela sua carência e nas lições tiradas com o exército oposto. Note-se que Hitler também aprendeu com os erros dos outros.
Afirma Hitler que: “A propaganda durante a guerra era um meio para um determinado fim, esse fim era a luta pela existência do povo alemão”[10]. Lições estas já concluídas por Hitler totalmente cabíveis atualmente, principalmente na direção das propagandas à grande massa. O que é atualmente utilizado pelos fornecedores anunciantes.
Hitler ainda questionava sempre onde deveria ser dirigida a propaganda, ou seja, a grande massa ou as mentes mais cultas, mais instruídas. A resposta tanto na Alemanha como em todo mundo nos dias atuais é óbvia que na grande massa. Para o ditador a função da propaganda era de: “... despertar a atenção da massa e não ensinar aos cultos ou aqueles que procuram cultivar seu espírito, a sua ação deve ser cada vez mais dirigida para o sentimento e só muito condicionalmente para chamar a razão”[11]. A defesa feita que a publicidade/propaganda trabalha em nicho soma mais um fundamento com esta técnica nazista.
Com certeza, o argumento e a ideia de ‘homem médio’ não teria lugar também na técnica propagandística. A propaganda nazista sempre buscara atingir o mais ignorante da grande massa. Se fosse dirigida aos mais instruídos, obviamente barreiras e questionamentos seriam criados, não sendo atingido o objetivo de incutir as ideias e comportamentos na massa. Os sentimentos e a compreensão da mentalidade da massa sempre foram o alvo principal da propaganda nazista. Por estas razões é que havia e há diferentes mensagens para diferentes públicos.
Ocorre um real contra sensu neste aspecto. Tanto os fornecedores de serviços e produtos sabem exatamente como atingir o consumidor, como inserir a mensagem com os respectivos efeitos em prol do consumo. Entretanto, no que se trata da informação como obrigação, um dever sobre aquilo que se estar adquirindo a conversa muda.
Quando se parte para o campo sentimental a razão perde espaço. Como já afirmado devido ao sentimento a grande massa possui uma índole feminina.
As lições que são utilizadas na publicidade não param. A mentira era bastante utilizada nos comícios e propagandas nazistas. Após uma inicial resistência ao Tratado de Brest-Litowsk em face do Tratado de Versalhes, Hitler por meio do seu chamado “mitigues” conseguiu por meio da oratória e propaganda (com vezes de retórica), repetidas inúmeras vezes conseguiu alterar a opinião de seus compatriotas. Obviamente que o ditador não contrariava de imediato seus iniciais opositores, ia conquistando e convencendo, solidificando a ideia aos poucos, com novos argumentos e muito trabalho. Nas lições atuais de Reinaldo Polito é comer pelas bordas.
A importância da oratória teve um grande papel, Hitler gostava de afirmar que nunca soube de revolução alguma por meio da palavra escrita, sempre as revoluções se desencadeavam pela palavra falada, pelo discurso, pelos gestos, pela imagem.
Isto se deve ao fato que a massa em sua quase totalidade é preguiçosa para ler algo, interpretar e consequentemente formar uma opinião. Daí a manipulação pelos discursos, a ideia já chega mastigada, pronta sem resistências. “Releva notar ainda que as massas humanas são naturalmente preguiçosas, e, por isso, inclinadas a conservar os seus antigos hábitos. Raramente, por impulso próprio, procuram ler qualquer coisa que não corresponda as ideias que já possuem ou que não encerre aquilo que esperam encontrar”[12]. É bastante simplificado, ao invés de receber uma mensagem e ainda ter que interpretar, a técnica nazista já fazia o trabalho de interpretação e apenas alocava-a na mente da massa.
Ora, corresponde tal afirmativa o que os políticos atualmente fazem aqui no Brasil. A publicidade também faz uso da técnica com um plus que é o efeito da imagem[13].
Na luta pela causa nazista seus militantes se dividiam perante funções de ‘propaganda’ e ‘organização’. Cabendo a propaganda angariar novos adesistas à causa nazista em meio da massa. Já a organização caberia selecionar dentre os novos aderentes que lutam pela causa, aqueles que se destacavam para se tornarem os novos combatentes e defensor desta. A organização também exercia um papel de evitar possíveis resistências e questionamentos que pudesse virar-se contra a causa.
Entendimentos Finais
Diante de tantas modalidades de prática de marketing, ou principalmente de estratégias de comunicações que permeiam estratégia de guerras, de movimentos sociais requintados, demostrou-se que tal arte vem sendo desenvolvida não de hoje. Óbvio que grande destaque é o nazismo. Lições deste movimento que até hoje é estudado nos bancos acadêmicos de diversas cátedras. Até o desrespeito a uma opinião contrária, um entendimento contrário a tal discurso massificado – nesta versão de quem não estar no poder - poderia vislumbrar o que Jürgen Habermas já pregava como uma desconfiança inconsistente em face da teoria de Adorno e Horkheimer a despeito da ‘indústria cultural’.
Enfim, se é algo para se preocupar ou não cabe a cada um tirar sua própria conclusão, ou melhor, deve ter a liberdade de tirar sua própria conclusão. Interessante de tudo é que a história se repete, as técnicas se repetem e se aperfeiçoam e os atores apenas mudam.
Referências:
BERTRAND, Claude-Jean. A Deontologia das Mídias. Tradução Maria Leonor Loureiro, EDUSC, Bauru -SP, 1999.
GADE, Christiane. Psicologia do Consumidor e da Propaganda. Edição revista e ampliada, EPU – Editora Pedagógica e Universitária LTDA., São Paulo, 1998.
HITLER Adolf. Mein Kampf. Editora Moraes, São Paulo 1983.
NAVES, Márcio Bilharinho. Direito, Circulação Mercantil e Luta Social - Direito, Sociedade e Economia “Leituras Marxistas”. Ed. Manole, São Paulo 2005.
QUESSADA, Dominique. O Poder da Publicidade na Sociedade Consumida pelas Marcas – Como a globalização impõe produtos sonhos e ilusões.[ tradução Joana Angélica D’Avila Melo], São Paulo, Ed. Futura, 2003.
ROCHER, Guy. Sociologia Geral – A Acção Social Editora Presença, 5ª ed., Lisboa – Portugal, 1989.
SANT’ANNA, Armando. Propaganda: Teoria, Técnica e Prática.7ª Edição, revista e atualizada, Editora Pioneira 1998; 2 ª Tiragem, São Paulo.