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Responsabilidade civil do Estado

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4. Responsabilidade por Ação do Estado

O estado com fim de satisfazer um interessa público, pode causar um dano, lesando um bem jurídico de terceiro. Essa conduta lesiva, através de um ato comissivo, enseja a responsabilidade objetiva do Estado, a qual consiste na reparação do dano que atingiu direito tutelado pelo ordenamento jurídico.

A responsabilidade objetiva encontra sustentação no Princípio da Igualdade. Esse preceito indica que o cidadão lesado não deve suportar sozinho o dano causado pelo estado em prol da coletividade. Nesse caso, não é necessário demonstrar o elemento subjetivo, isto é, aferir culpa ou dolo, pois tais hipóteses fogem da noção de responsabilidade objetiva, refletindo na responsabilidade subjetiva que exige sempre um comportamento ilícito.

Nesse sentido:

É verdade que em muitos casos a conduta estatal geradora do dano não haverá sido legítima, mas, pelo contrário, ilegítima. Sem embargo, não haverá razão, ainda aqui, para variar as condições de engajamento da responsabilidade estatal. Deveras, se a conduta legítima produtora de dano enseja responsabilidade objetiva, a fortiori deverá ensejá-la a conduta ilegítima causadora de lesão jurídica. É que tanto numa como noutra hipótese o administrado não tem como evadir à ação estatal. Fica à sua mercê, sujeito a um poder que investe sobre uma situação juridicamente protegida e a agrava. Saber-se, pois, se o Estado agiu ou não culposamente (ou dolosamente) é questão irrelevante. Relevante é a perda da situação jurídica protegida. Este só fato já é bastante para postular a reparação patrimonial (MELLO, 2014, p. 1030).

Assim, observa-se que, tratando-se de conduta comissiva, é necessário analisar a questão pelo polo passivo da relação, neste caso, em face do sujeito lesado em sua esfera juridicamente protegida.

Quando o Estado realiza obras de nivelamento de rua, naturalmente, algumas residências podem ficar em níveis mais elevados ou rebaixados em relação à via, o que gera uma desvalorização de imóveis. Essa desvalorização consiste em um dano gerado através de uma ação positiva do Estado. Do mesmo modo, quando procedimentos de apreensão de mercadorias são realizados fora das hipóteses legais, há lesão a terceiros ensejadora de reparação.

Ainda consistem em exemplos de condutas lesivas por ação do Estado que reclamam a responsabilidade objetiva a bala perdida de um policial, a transmissão do vírus HIV através de transfusão de sangue em hospital público e um acidente envolvendo carro oficial dirigido de modo imprudente. Tais ações encontram amparo legal no art. 37, §6º da Constituição Federa onde estabelece que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Também se aplica o princípio da responsabilidade objetiva aos danos causados por situações propiciadas pelo Estado. Nesse caso, o Estado não é o agente causador do dano, no entanto, este só ocorreu devido a uma situação criada por ele. Assim, assemelham-se àqueles produzidos pelo próprio Estado.

Bandeiro de Mello (2014, p. 1036) explica que:

O caso mais comum, embora não único [...], é o que deriva da guarda, pelo Estado, de pessoas ou coisas perigosas, em face do quê o Poder Público expõe terceiros a risco. Servem de exemplos o assassinato de um presidiário por outro presidiário; os danos nas vizinhanças oriundos de explosão em depósito militar em decorrência de um raio; lesões radioativas oriundas de vazamento em central nuclear cujo equipamento protetor derrocou por avalancha ou qualquer outro fenômeno da natureza etc.

[...] os danos eventualmente surgidos em decorrência desta situação de risco e por força da proximidade de tais locais ensejarão responsabilidade objetiva do Estado. Com efeito, esta é a maneira de a comunidade social absorver os prejuízos que incidiram apenas sobre alguns, os lesados, mas que foram propiciados por organizações constituídas em prol de todos (BANDEIRA DE MELLO, 2014, p. 1037).

Nesses casos, é irrelevante se a ação estatal é comissiva ou omissiva, isto é, se reclama conduta culposa ou dolosa para que o Estado responda civilmente. Consistem em atividade de risco, logo há obrigação de indenizar de acordo com o disposto no Código Civil:

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Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de repara o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por natureza, risco para os direitos de outrem (grifo nosso).


5. Responsabilidade por Omissão do Estado

Ao contrário da responsabilidade objetiva, quando o Estado não é o autor do dano, mas este acontece em virtude de sua omissão, isto é, quando obrigado a evitá-lo, se ausentou, é necessária a demonstração de culpa ou dolo para motivar a responsabilidade.

Tal demonstração ocorre nas hipóteses em que o Estado, embora tenha o dever legal de agir, atua com negligência, imprudência ou imperícia, ou viola uma norma intencionalmente. Trata-se, portanto, de responsabilidade subjetiva.

Nesse caso, a omissão ou deficiência da atuação é causa do dano. Na primeira hipótese, admiti-se uma presunção de culpa do Poder Público, ocorrendo a inversão do ônus da prova, em que compete a ele provar que não houve omissão culposa ou dolosa. A doutrina de Bandeira de Melo (2014, p. 1034) ensina que:

Com efeito, nos casos de “falta de serviço” é de admitir-se uma presunção de culpa do Poder Público, sem o quê o administrado ficaria em posição extremante frágil ou até mesmo desprotegida ante a dificuldade ou até mesmo impossibilidade de demonstrar que o serviço não se desempenhou como deveria. O administrado não pode conhecer toda a intimidade do aparelho estatal, seus recursos, suas ordens internas de serviço, os meios financeiros e técnicos de que dispõe ou necessita dispor para estar ajustado às possibilidades econômico-administrativas do Estado. Ora, quem quer os fins não pode negar os necessários meios. Se a ordem jurídica quer a responsabilização do Estado – o que, na verdade, só ocorrerá eficientemente com o reconhecimento de uma presunção juris tantum de culpa do Poder Público, pois, como regra, seria notavelmente difícil para o lesado dispor dos meios que permitiriam colocá-lo em jogo. Razoável, portanto, que nestas hipóteses ocorra inversão do ônus da prova.

Há responsabilidade subjetiva quando chuvas provocam enchentes, alagando e destruindo casas em razão da ausência de limpeza de bueiros e galerias; quando uma vítima de assalto, apesar de avisar aos policiais a tempo de evitá-lo, estes não adotam nenhuma medida cautelar. Em tais situações, o dano não é obra do Estado, todavia, este não agiu para impedi-lo, apesar de juridicamente obrigado a fazê-lo, ou, se tendo agido, atuou de forma insuficiente.

Outras hipóteses de responsabilidade civil do Estado por omissão ocorrem quando um detento mata outro detento; em acidentes causados pelo não recapeamento de ruas, por animais soltos na estrada ou por falhas no semáforo. Nesse contexto, observa-se que a responsabilidade objetiva baseia-se na culpa administrativa, ocorrendo em três modalidades: quando o serviço público não funciona; quando funcionou atrasado; e, quando funciona de modo insuficiente.

Assim, observa-se que, tratando-se de conduta omissiva, é necessário analisar a questão pelo polo ativo da relação, neste caso, em face dos “caracteres da omissão estatal que indicarão se há ou não responsabilidade" (MELLO, 2014, p. 1034).


6. Responsabilidade Civil do Estado por Ato do Poder Legislativo

A Constituição Federal de 1988, no art. 1º § único, estabelece que todo o poder emana do povo, podendo exercer através de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição. Sabe-se, porém, que o modo mais comum é tal poder seja exercido por meio dos representantes eleitos, ou seja, os legisladores.

Diante disso, em via de regra o Estado não responde por danos decorrentes da atividade legislativa, visto que a vontade emanada do parlamento representa a vontade do povo, ademais, a lei é geral não causando, geralmente, um dano específico a terceiro.

Contudo, a doutrina tem admitido três hipóteses de como causa de responsabilidade civil por ato legislativo, são eles: aprovação de lei inconstitucional; dano causado por lei de efeito concreto; omissão legislativa.

Responsabilidade Civil por Leis Inconstitucionais

A edição de uma lei inconstitucional representa a edição de ato ilícito. Nesse sentido, o STF admite a responsabilização civil do Estado, contudo é necessário que primeiramente a lei seja declarada inconstitucional, uma vez que as mesmas quando publicadas possuem presunção de constitucionalidade. Cabe ressaltar ainda, que não basta a mera declaração de inconstitucionalidade para obrigar a responsabilização estatal, mas é indispensável a ocorrência de dano a terceiro como resultado da criação de tal ato legislativo.

Nesse sentido:                                                                         

ADMINISTRATIVO. CRUZADOS NOVOS BLOQUEADOS. MP N. 168/90. LEI N. 8.024/90. CORREÇÃO MONETÁRIA. BTNF. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO LEGISLATIVO. AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI. NÃO-CABIMENTO.1. Consolidado está, no âmbito do STJ, o entendimento de que a correção dos saldos bloqueados transferidos ao Bacen deve ser feita com base no BTNF. Precedentes.2. Apenas se admite a responsabilidade civil por ato legislativo na hipótese de haver sido declarada a inconstitucionalidade de lei pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado.3. Recurso especial provido. (STJ, REsp nº 571.645, Relator Min. João Otávio de Noronha, julgado em 21/09/06).

Além disso, conforme o atual entendimento do STJ, o Estado responde civilmente por leis inconstitucionais somente caso a inconstitucionalidade seja declarada pelo STF em sede de controle concentrado.

 Esse entendimento do STJ surgiu em virtude da grande demanda de ações de indenização ajuizadas no período do Plano Collor (que acarretou o confisco da poupança de inúmeros brasileiros), quando o STF em sede de recurso extraordinário reconheceu a inconstitucionalidade da lei 8.024/90 e declarou que os que tiverem sido prejudicados poderiam buscar o Judiciário para pleitear uma indenização. Desse modo, o STJ visando evitar a indenização por parte do Estado a todos prejudicados com essa lei, fixou entendimento que a responsabilidade civil do Estado decorrente de uma lei inconstitucional só caberá se a lei for declarada inconstitucional pelo STF em sede de controle concentrado.

Responsabilidade Civil do Estado por Leis de Efeito Concreto

Na modalidade de responsabilidade civil do estado por lei de efeito concreto, verifica-se que tal ato se apresenta apenas formalmente como lei, pois na realidade prática trata-se de um ato administrativo que estabelece algum tipo de encargo para determinada pessoa, caso esse encargo cause dano específico, o estado responderá objetivamente por ele. Nesse sentido, o STF entendeu que as leis que introduziram planos econômicos, apesar de serem gerais, afetaram mais intensamente a Varig, por isso, responsabilizou a União. 

Outro exemplo comum ocorre com a criação de uma fundação por lei, prevendo a transferência de bens de uma pessoa jurídica (União) para outra (fundação) ou no caso de uma lei que cria reserva florestal, interferindo em propriedade privada.

Responsabilidade civil do Estado por Omissões Inconstitucionais Quanto ao Dever de Legislar

A responsabilidade civil do Estado por omissão acontece na hipótese em que o Estado devendo legislar omite-se de seu dever, gerando dano ao particular. Tal situação ocorre com certa frequência, um exemplo claro está na ação que tramita no STF em que os servidores públicos pedem que seja suprida a omissão sobre revisão de salários prevista no artigo 37, X, da Constituição Federal.

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)  (Regulamento). 

Cabe ressaltar que a omissão do Estado decorrente de ato legislativo deve ser apurada conforme os critérios de responsabilidade subjetiva. Nesse sentido dispõe o STF:

(...) se ultrapassado o prazo acima, sem que esteja promulgada a lei, reconhecer ao impetrante a faculdade de obter, contra a União, pela via processual adequada, sentença liquida de condenação a reparação constitucional devida, pelas perdas e danos que se arbitrem (STF, MI 283/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 14.11.1991).

Sobre as autoras
Ana Dulce Fonseca Oliveira Araújo

Graduada em Direito pela Universidade Federal do Maranhão

Lorena Costa Silva

Graduanda de Direito da Universidade Federal do Maranhão

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Ana Dulce Fonseca Oliveira Araújo; SILVA, Lorena Costa et al. Responsabilidade civil do Estado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4921, 21 dez. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/54662. Acesso em: 26 dez. 2024.

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