Um dos efeitos colaterais do processo de ampliação dos meios de acesso à justiça, sobretudo com a popularização da judicialização de demandas junto aos juizados especiais, se dá com a ocorrência, cada vez mais frequente, do uso da engrenagem jurídica para fins alheios ao tão almejado anseio de injustiça.
Cientes de que a presença em ambiente forense ou policial ainda causa desconforto a muitos cidadãos, certos indivíduos costumam abusar do direito de ação, movendo ações infundadas, seja de natureza criminal ou mesmo cível, com o único e ardiloso propósito de provocar situações embaraçosas para eventuais desafetos.
Antes de adentrarmos no mérito do que se substanciam as práticas do crime de denunciação caluniosa e da prática da litigância de ma-fé, faz-se de suma importância o alerta ao cidadão que se encontrar em uma dessas situações, no sentido de que a primeira providência a ser tomada é procurar um profissional qualificado para adotar as providências cabíveis, notadamente um advogado ou um defensor público, a fito de que, por exemplo, pereça seu direito pelo decurso de prazo.
O ato de imputar a alguém a prática de uma conduta criminosa, como não raramente se observa no âmbito dos Juizados Especiais Criminais (JECRIM), frequentemente por meio de Queixas-Crimes noticiando, por exemplo, a falsa prática de crimes contra a honra ou de ameaça, configura crime de denunciação caluniosa, nos termos do art. 339 do Código Penal.
“Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente”
A pena prevista para esse crime é de reclusão, de dois a oito anos, e multa.
Comprovada a prática do crime de denunciação caluniosa, além da repercussão penal a qual está sujeito o infrator, este ainda pode ser condenado à reparação cível dos danos causados ao acusado.
Já na esfera cível, o uso temerário do direito de ação tem seu reflexo mais intenso no fenômeno denominado litigância de má-fé. Nos termos do art. 80 doCPC,
Considera-se litigante de má-fé aquele que:
I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;
II - alterar a verdade dos fatos;
III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;
IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;
VI - provocar incidente manifestamente infundado;
VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Conforme se nota, o uso do processo para fins de provocar constrangimento ou situação de embaraço para o réu, por exemplo, é prática vedada pelo ordenamento, devendo o magistrado, de ofício ou a requerimento, condenar o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou, nos termos do Art. 81 do CPC.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto-Lei 2.448, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848.htm >. Acesso: 24 jan. 2017.
_______. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art319 >. Acesso: 24 jan. 2017.