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Do esquecimento à perda de prazo: a troca de condutor infrator na seara judicial frente ao excesso de velocidade

Agenda 28/02/2018 às 15:40

Somos multados pelo DNIT por excesso de velocidade. Imaginemos: o que acontece se a multa vier a somar na CNH de pessoa diversa da que, efetivamente, infringiu as leis? Podemos repassá-la?

1. DA CONDUTA ILÍCITA E DA PUNIÇÃO: O PRAZO PARA NOTIFICAÇÃO.

Pela lei, do momento da conduta ilícita até chegar a notificação em nossos lares, não pode-se passar mais de 30 dias, sob pena de nulidade. (In)felizmente, as autoridades cada vez mais estão primando pelo apregoado princípio da eficiência administrativa e, não menos raro, as notificações chegam tempestivamente.

Por vezes, é possível questionar a atribuição da multa se não houver fotos e/ou provas verossímeis, ou, ainda, questionar se o procedimento adotado foi legítimo e adequado perante as formas legais: local de instalação das câmaras, visibilidade perante os motoristas, lei regulamentar da via, dentre outros fatores.


2.  DNIT APLICANDO MULTA POR EXCESSO DE VELOCIDADE?

Uma das discussões que geram grandes considerações em nossos tribunais pátrios é a possibilidade, ou não, do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (DNIT) multar por excesso de velocidade.

O TRF4, por exemplo, abarcou em decisão que o DNIT não tem competência para aplicar multa por excesso de velocidade, limitando-se a multar por excesso de peso, dimensão e lotações de veículos (art. 21, VIII, CTB); e nível de emissão de poluentes e ruídos produzidos pelos veículos automotores ou pela sua carga (art. 21,inc XIII, CTB).

Os julgados desta corte entendem que, por não haver previsão expressa previsto, tais multas devem ser canceladas.

De outra banda, o STJ, por meio do voto do Ministro Sérgio Kunina, absorvendo a lei 10.233/01 e o CTB, entende que é possível a aplicação de multa pelo DNIT por excesso de velocidade.

A lacuna ainda está em pauta no STJ, vez que a decisão de afetar um recurso especial (RESP 1588.969) ajuizado pelo próprio DNIT é da ministra Assusete Magalhães. Para ela, a questão revela caráter representativo de controvérsia de natureza repetitiva e deve ser julgada de acordo com o que prevê o artigo 1.036 e seguintes, do novo Código de Processo Civil.

Por conseguinte, em razão do afetamento, há a suspensão dos processos individuais e coletivos sobre o tema, devendo, muito em breve, haver uma decisão que servirá de paradigma e uniformização para as mesmas ações.


3. DO PRAZO PARA INDICAÇÃO DE TROCA DE INFRATOR.

Consoante o Código de Trânsito Brasileiro, vide art. 257, e incisos, há responsabilidades entre condutas: proprietário do veículo, embarcador e transportador. Trazemos à baila tal artigo:

Art. 257. As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código.

§ 1º Aos proprietários e condutores de veículos serão impostas concomitantemente as penalidades de que trata este Código toda vez que houver responsabilidade solidária em infração dos preceitos que lhes couber observar, respondendo cada um de per si pela falta em comum que lhes for atribuída.

§ 2º Ao proprietário caberá sempre a responsabilidade pela infração referente à prévia regularização e preenchimento das formalidades e condições exigidas para o trânsito do veículo na via terrestre, conservação e inalterabilidade de suas características, componentes, agregados, habilitação legal e compatível de seus condutores, quando esta for exigida, e outras disposições que deva observar.

§ 3º Ao condutor caberá a responsabilidade pelas infrações decorrentes de atos praticados na direção do veículo.

§ 4º O embarcador é responsável pela infração relativa ao transporte de carga com excesso de peso nos eixos ou no peso bruto total, quando simultaneamente for o único remetente da carga e o peso declarado na nota fiscal, fatura ou manifesto for inferior àquele aferido.

§ 5º O transportador é o responsável pela infração relativa ao transporte de carga com excesso de peso nos eixos ou quando a carga proveniente de mais de um embarcador ultrapassar o peso bruto total.

§ 6º O transportador e o embarcador são solidariamente responsáveis pela infração relativa ao excesso de peso bruto total, se o peso declarado na nota fiscal, fatura ou manifesto for superior ao limite legal.

§ 7º Não sendo imediata a identificação do infrator, o proprietário do veículo terá quinze dias de prazo, após a notificação da autuação, para apresentá-lo, na forma em que dispuser o CONTRAN, ao fim do qual, não o fazendo, será considerado responsável pela infração

Tratando-se de excesso de velocidade, abarcado pelo art. 218, do CTB, há grandes e reais chances de aquele que cometer o ilícito não ser o efetivo condutor na hora do fato, tampouco o proprietário do veículo. Dessa forma, vide acima, o proprietário possui 15 dias para defender-se e apresentar o real responsável.

O problema começa a se formar quando, por acontecimento alheio à vontade e/ou não conhecimento da lei, não é feito a troca de condutor infrator e, com isso, é alguém punido por algo que não fez ou, quando descobre, já havia passado o prazo legal.


 4. DA INTEMPESTIVIDADE RECURSAL: DEFESA ADMINISTRATIVA OU AÇÃO JUDICIAL?

Passado o prazo, o agente que viu lesado seus direitos pode pleitear a defesa administrativa. Infelizmente, pelo que se vê na prática, seja em ato de defesa prévia, ou no JARI ou em defesa ao CONTRAN, o entendimento é de que, precluindo o prazo, cessa o direito.

Imaginemos, por exemplo, se já fomos punidos pela lei corretamente, estamos já em reciclagem, com a carteira suspensa e surge uma multa ilicitamente em nosso nome. Pasme: pode-se ficar até 02 anos com a carteira caçada injustamente.

Nessa esteira, há o poder judiciário que socorre, inclusive, "aqueles que dormem", já que há o princípio insculpido na Constituição Federal de inafastabilidade de jurisdição: a lei não excluirá da apreciação do judiciário lesão ou ameaça de direito.

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Ficando comprovado que o que dirigia era pessoa diversa do proprietário e, assumindo o culpado o erro e pagando o valor atinente à multa, entendemos ser legítima a propositura da ação obrigacional de troca de agente infrator.

O intérprete, ao analisar o peticionamento feito pelo advogado, deve, invariavelmente, analisar os reais motivos da celeuma e, coadunando com a Constituição Federal, que está hierarquicamente superior às demais normais, aplicar uma análise sistemática-teleológica do direito, não podendo alguém que não cometeu o ato suportar os prejuízos atinentes ao fato.

Tolher alguém de um direito cristalino é ir contra o que todo cidadão busca no Poder Judiciário: justiça. Como há independência de instâncias e, por analogia lógica, o prazo se adequa tão somente aos atos administrativos, o judiciário é livre para apreciação e decisão do mérito.

Nestes termos, o STJ, pelo RESP 765.970/RS posicionou-se no sentido de que, mesmo fora do prazo para a indicação do infrator, o proprietário tem direito de demonstrar em sede judicial que não conduzia o veículo no momento da infração de trânsito, sob pena de configurar ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF).

Para o Julgador, a preclusão temporal do art. 257, § 7º, do CTB é meramente administrativa, tratando-se de medida instituída unicamente para obstar a busca incessante pela verdade material no âmbito administrativo e compatibilizá-la com a necessidade de andamento dos procedimentos desenvolvidos pela Administração Pública.

Em julgado similar, os magistrados reconheceram a existência de prova inequívoca de que o proprietário não era o condutor do automóvel, sobretudo diante da declaração assinada pelo infrator, em que reconhece sua responsabilidade. Desse modo, afastando a presunção de autoria criada na esfera administrativa, o Colegiado confirmou a ordem de transferência da pontuação para a CNH do verdadeiro infrator. (20080110926839APC, Rel. Des. FLAVIO ROSTIROLA. Data do Julgamento 01/02/2012).


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do exposto, entende-se que o prazo aludido em sede administrativa não pode se sobrepor aos ditames e princípios constitucionais, vez que o julgador não fica adstrito a números e, sim, ao direito.

Em outra linha, temos ainda que, como outra forma de defesa, pode-se requerer a anulação da notificação de excesso de velocidade, se esta for feita pelo DNIT, diante da incerteza da possibilidade de imposição de multas desta estirpe por esta autarquia federal.

Em ambos os casos, o Poder Judiciário será o balizador das nuances em exame, mediante o devido processo legal.

Sobre o autor
Rodrigo Zarpelão

Advogado, graduado pela PUCRS. pós graduado em direito público IMED; pós graduando em direito constitucional aplicado e direito previdenciário. Já autou como monitor do curso de delegado de polícia, faculdade IDC, RS.página profissional: https://www.facebook.com/zarpelaoadv/?ref=bookmarks

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ZARPELÃO, Rodrigo. Do esquecimento à perda de prazo: a troca de condutor infrator na seara judicial frente ao excesso de velocidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5355, 28 fev. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56249. Acesso em: 19 dez. 2024.

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