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A prática do crime do colarinho branco no Brasil: uma análise segundo a visão de Sutherland e Friedrichs

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Agenda 27/04/2017 às 10:15

2. O Crime do Colarinho Branco no Brasil

No Brasil, o tema Crime de Colarinho Branco vem chamando atenção assim como no resto do mundo. Nos últimos anos algumas pessoas importantes do âmbito político foram denunciadas por esquema de corrupção, além de alguns outros escândalos envolvendo grandes corporações. A maioria da população tem acompanhado e manifestado revolta com relação a esses acontecimentos.

O primeiro escândalo que veio à tona no noticiário brasileiro foi em 2007, quanto a um esquema envolvendo políticos brasileiros denominado “Mensalão”. Tratou-se de um esquema ilegal de financiamento político organizado, principalmente, pelo Partido dos Trabalhadores (“PT”), para corromper parlamentares e garantir apoio ao governo de Luiz lnácio Lula da Silva (“Lula”), então Presidente da República, junto ao Congresso Nacional, o qual motivou, inclusive, manifestações da população brasileira.

O Supremo Tribunal Federal foi o órgão competente para julgar os delitos praticados por esses criminosos, por se tratarem de delitos praticados por políticos com foro privilegiado. Em 2012, ao julgarem a “Ação Penal 470 Minas Gerais”, os Ministros condenaram 25 dos 37 réus envolvidos no escândalo do mensalão, ação que ainda prossegue, pois pendentes julgamentos de recursos interpostos pelos réus.

Nesse contexto, em 2013, foi sancionada a Lei n. 12.846/2013, também conhecida como Lei   Anticorrupção, que representou importante avanço na legislação brasileira, por prever a responsabilização objetiva, no âmbito civil e administrativo, de empresas que praticam atos lesivos contra a administração pública nacional ou estrangeira.

Contudo, passados alguns anos após o julgamento do esquema do “Mensalão” e menos de um ano desde a sanção da Lei Anticorrupção, mais precisamente em março de 2014, iniciou-se uma nova investigação pela Polícia Federal denominada “operação Lava Jato”. A “operação Lava Jato” é a unificação de quatro investigações que tinham o objetivo de apurar a prática de crimes financeiros e desvio de recursos públicos.

Essa investigação apreendeu materiais e constatou diversos indícios de que existia uma prática de agentes públicos que promoviam e facilitavam a contratação fraudulenta de bens e serviços por meio do pagamento de propina.

Contudo, a investigação constatou indícios de envolvimento de grande parte do alto escalão do governo e parlamento, assim como de alguns dos principais empresários brasileiros, relacionados a diversas empresas empreiteiras e outras grandes empresas correlacionadas. Os processos judiciais decorrentes da “operação Lava Jato” estão em andamento, sendo que alguns processos são de competência da Justiça Federal do Paraná e o outro processo, que é relacionado aos políticos com foro privilegiado, está em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal.

Ocorre que, paralelamente ao início da investigação denominada “operação Lava Jato”, já se iniciava uma crise econômica no país, que se agravou muito com as prisões preventivas dos empresários brasileiros envolvidos na investigação e as acusações contra diversos políticos do alto escalão. Além disso, a maioria das empresas envolvidas passaram por uma imensa crise financeira e institucional, dentre elas - e, provavelmente, a principal - foi a empresa Odebrecht.

Portanto, já é constatado que os criminosos do colarinho branco não estão presentes apenas no âmbito político do país. É possível encontrá-los em todos os setores, inclusive no âmbito corporativo e no mercado financeiro, o que traz um imenso prejuízo para toda a sociedade, que não pode ser aferido, razão pela qual todos àqueles que sofreram os danos em decorrência desses atos criminosos, não possuem meios de serem ressarcidos por seu prejuízo.

Por isso, é necessário que os estudiosos do direito e de outras áreas se debrucem sobre o tema, para o fim de encontrar mecanismos aptos a, ao menos, diminuir a prática desses crimes e que a punição seja mais efetiva do que a pena atualmente aplicada, que é a restrição de liberdade.

2.1. Dados obtidos pela empresa Price Water House Coopers sobre a ocorrência de Crimes do Colarinho Branco no Brasil e ao redor do Mundo.

Com o intuito de contribuir com as pesquisas sobre os crimes econômicos globais, a empresa Price Water House Coopers (“PwC”) realiza pesquisas periódicas sobre a ocorrência de crimes econômicos no Brasil e no mundo, com o objetivo de demonstrar que os crimes econômicos que ainda afetam de forma significativa as organizações de todo o mundo, mesmo com os investimentos em ações de órgãos regulatórios e dos controles antifraudes implementados por essas organizações. Para ilustrar o exposto acima, apresentar-se-á os dados obtidos nestas pesquisas nos anos de 2014 e 2016.

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Em 2014, como metodologia de pesquisa, a PwC entrevistou 5.128 executivos de mais de 95 países, 132 deles no Brasil, sendo 45% dos brasileiros entrevistados com cargos na alta administração das empresas. Através dessas entrevistas, a PwC obteve algumas das seguintes conclusões, que abrangem o período de 24 meses anteriores a pesquisa (2012 e 2013):

1. Se comparado com a pesquisa realizada em 2011, o percentual de empresas brasileiras que relataram ter sofrido algum tipo de crime econômico caiu de 33%, em 2011, para 27%, em 2014, enquanto no mundo, ao contrário, o índice aumento de 34% em 2011, para 37% em 2014;

2. Houve um aumento significativo da prática dos crimes de corrupção passiva e ativa entre 2009 e 2014. Nesses 5 anos, estes crimes passaram a ser o terceiro tipo mais comum de fraude financeira no Brasil, saltando de 7% em 2009, 18% em 2011, e para 28% em 2014;

3. 74% dos entrevistados brasileiros afirmaram que a oportunidade é o fator principal para se cometer um crime econômico; nesse mesmo sentido, responderam 72% dos emergentes; 77% da América Latina; e 73% a nível global, conforme se verifica na Figura 1 abaixo.

Figura 1 – Fatores que contribuíram para o crime econômico

4. Para 64% dos entrevistados brasileiros e 56% dos entrevistados totais, o responsável pelos crimes econômicos é interno à empresa;

5. As razões para as empresas não avaliarem o risco de fraude, segundo os entrevistados, são: a falta de conhecimento exato sobre a avaliação do risco de fraude; aparente falta de necessidade; custo; e outros; alguns afirmaram não saber as razões, conforme demonstra a Figura 2, abaixo;

Figura 2 – Razões para não avaliar o risco de fraude

6. Os principais tipos de crimes econômicos praticados em 2014, à nível global, de acordo com os entrevistados, foram: roubo de ativos; fraude em compras; suborno e corrupção; crimes digitais; fraude contábil; fraude de recursos humanos; lavagem de dinheiro; violação de propriedade intelectual; fraude na hipoteca; fraude fiscal; insider trading; concorrência desleal/lei antitruste; espionagem; e outros; conforme apresentados na Figura 3;

Figura 3 – Tipos de fraude no mundo

7. Especificamente no Brasil, os tipos de fraude indicados pelos entrevistados foram os mesmos indicados pelos entrevistados à nível global, com exceção de fraude na hipoteca, conforme Figura 4.

Figura 4 – Tipos de fraude no Brasil

8. Apesar de ter havido queda nas ocorrências de crimes econômicos no Brasil, a pesquisa constatou que o custo das fraudes aumentou desde 2011, para valores entre U$101 mil a 5 mi, conforme se verifica na Figura 5.

Figura 5 – Evolução do custo dos cries econômicos no Brasil

9. Além disso, eles constaram que o prejuízo econômico não é a única preocupação que as empresas devem ter com relação às fraudes, pois existem outros danos que esse tipo de prática pode acarretar às empresas. Na Figura 6 são apresentados os principais impactos dos crimes econômicos nas organizações.

Figura 6 – Principal impacto dos crimes econômicos nas organizações

10. Quanto ao perfil do fraudador, a PwC concluiu que se tratam de homens de meia-idade, com ensino médio ou superior, com três a dez anos de trabalho na empresa. Na Figura 7 é possível visualizar o perfil do fraudador pelos critérios de tempo de serviço e grau de escolaridade;

Figura 7 – Perfil do fraudador

Ao se analisar os resultados da pesquisa realizada pela PwC, constata-se que os resultados são semelhantes às conclusões e ponderações de Sutherland e Friedrichs. Estes afirmam que o Criminoso do Colarinho Branco era uma pessoa com status social, com formação e vida estável, o que também foi constatado pela PwC, conforme se verifica no subitem X, acima.

Ademais, a PwC concluiu que o principal fator que leva os Criminosos do Colarinho Branco a praticarem crimes é a oportunidade, conforme subitem III, acima. Nesse mesmo sentido, Friedrichs afirma que o Criminoso do Colarinho Branco pratica o crime quando vê oportunidade, analisando questões como a dimensão do ganho, a dimensão do risco, a compatibilidade com seus ideais e valores.

Além de tratar sobre as oportunidades, Friedrichs também afirma que muitos desses criminosos não se incomodam com a prática de seus crimes por estarem dentro do seu próprio ambiente de trabalho e no mesmo sentido foram os resultados da empresa PwC, que constataram que a maioria dos Criminosos do Colarinho Branco são internos (vide subitem IV, acima).

Por fim, Friedrichs também relaciona a prática desses crimes com crises econômicas, por conta da degradação no sistema democrático. Apesar da pesquisa da PwC não tratar diretamente sobre esse tema, a partir dos dados obtidos em sua pesquisa é possível perceber que os prejuízos econômicos e colaterais dos crimes praticados por criminosos do Colarinho Branco são imensos e não se pode mensurar o nível do dano que eles causam às empresas em que são praticados e à população, como um todo.

Além da pesquisa acima exposta, em 2016, a PwC realizou nova pesquisa, com o mesmo objetivo da exposta acima, em que foi constatada a redução da prática de crimes econômicos do Brasil.

Em função dessa redução, o Brasil passou a integrar o grupo de países com índices mais baixos de crimes econômicos do mundo. Apenas 12% dos entrevistados relataram terem sido vítimas de algum tipo de crime econômico nos 24 meses anteriores à pesquisa (2014 e 2015).

Os pesquisadores atribuem essa redução às investigações ocorridas no país (“operação Lava Jato”), além da pressão crescente dos reguladores e da entrada em vigor da Lei Anticorrupção citada no item 2, acima. Na Figura 8, é possível visualizar a queda vertiginosa da prática desses tipos criminais no Brasil:

Figura 8 – Evolução dos crimes econômicos

Esta redução é apenas uma das demonstrações de que o aprofundamento da pesquisa sobre o tema, com as consequentes alterações legislativas para a criação de punições específicas e efetivas para esses tipos penais, assim como a prevenção deste tipo de crimes dentro das empresas, são necessários para que esses crimes diminuam ao redor de todo mundo.

Sobre a autora
Marina de Campos Pinheiro da Silveira

Advogada formada na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVEIRA, Marina Campos Pinheiro. A prática do crime do colarinho branco no Brasil: uma análise segundo a visão de Sutherland e Friedrichs. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5048, 27 abr. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/57329. Acesso em: 22 nov. 2024.

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