Com a publicação da Lei 13.429/2017, em 31/03/2017, muito se tem falado que a partir de agora está autorizada a terceirização irrestrita na atividade-fim e na atividade-meio.
Essa norma legal alterou alguns artigos e incluiu outros na Lei 6.019/74 (Lei do Trabalho Temporário), que agora passa a regular, além das relações de trabalho temporário, as relações de prestação de serviços a terceiros.
O tema é de grande importância para empregados e empregadores, e como não poderia deixar de ser, vem causando amplas discussões no meio jurídico a respeito de seu alcance.
Antes de mais nada, importa relembrar que a terceirização consiste na transferência de determinada atividade para outra empresa. Através dela a empresa terceirizada assume a obrigação de realizar os serviços com empregados próprios, sendo diretamente responsável pelos encargos trabalhistas. Assim, a título exemplo, a empresa A, que se dedica à fabricação de implementos agrícolas, transfere para uma outra empresa os serviços de pintura das peças. A empresa terceirizada executará os serviços com empregados próprios, na unidade fabril da tomadora dos serviços ou em outro local estabelecido no contrato entre as empresas, sendo a responsável pelos encargos relacionados aos empregados que contratou. A tomadora dos serviços somente responderá subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas, caso a terceirizada não honre a dívida.
A legislação brasileira não previa a terceirização para todas as atividades. Havia norma legal regulando a terceirização nos serviços de vigilância (Lei 7.102/1983), além do trabalho temporário previsto na Lei 6.019/1974.
Diante da carência de regulamentação legal, a jurisprudência cuidou de suprir a lacuna com a edição da Súmula 331 pelo Tribunal Superior do Trabalho, que fixou critérios para o reconhecimento da validade da terceirização. Estabeleceu o TST que a terceirização seria viável nos serviços de vigilância e de conservação e limpeza, bem como nos serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador dos serviços. Na atividade-fim do tomador dos serviços não seria possível a terceirização.
Admitia a jurisprudência a terceirização de atividades periféricas da tomadora dos serviços (empresa mãe), como serviços de limpeza, portaria, vigilância e restaurante. Mas não reconhecia como válida a terceirização das tarefas ligadas à atividade-fim. No exemplo dado, a empresa que fabricava os implementos agrícolas não poderia terceirizar os serviços de pintura, pois estes estavam ligados a atividade-fim (fabricação de implementos, em todas as suas fases, desde a fundição até a pintura e acabamento).
Nesse cenário, sobreveio a Lei 13.429/2017 de 31/03/2017, atendendo aos anseios de muitos que viam na Súmula 331 do TST um entrave à modernidade nas relações de trabalho. Para os seus defensores, a partir de agora está autorizada a terceirização irrestrita, isto é, em qualquer tipo de atividade, tanto na atividade-fim como na atividade-meio.
Entretanto, os debates têm revelado que a questão não é tão simples como aparenta. Há uma corrente que defende ter a nova lei autorizado a terceirização irrestrita, na medida em que permitiu a transferência de serviços determinados e específicos para outra empresa. Contudo, há uma outra corrente que sustenta o contrário, ou seja, que a nova norma não prevê a terceirização irrestrita, sendo somente permitida a terceirização de atividade-fim no trabalho temporário, o que, diga-se de passagem, já era permitido.
Aqueles que sustentam que no novo cenário é possível a terceirização de qualquer atividade, invocam o artigo 4º-A da Lei 6.019/74, incluído pela Lei 13.429/2017, o qual prevê que: “Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos”.
Realmente, a norma em análise não limita a terceirização à atividade-meio e nem a proíbe quanto à atividade-fim. De outra parte, agora há previsão legal da responsabilização subsidiária da tomadora dos serviços no que respeita às obrigações trabalhistas e previdenciárias. Essa responsabilidade é secundária, vale dizer, se a empresa terceirizada não pagar seus empregados e nem recolher as contribuições previdenciárias, e, ainda, não tiver patrimônio para responder em eventual execução, a responsabilidade por esses encargos passa a ser da tomadora dos serviços (empresa-mãe).
Em razão dessa responsabilidade subsidiária, a tomadora dos serviços deverá agir com a máxima cautela quando da contratação da empresa terceirizada, certificando-se da capacidade econômica e financeira da contratada, além de acompanhar durante a execução do contrato o cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias, exigindo, periodicamente, a apresentação de controles de jornada, comprovantes de pagamentos aos empregados e recolhimentos à Previdência Social, além de acompanhar a observância das convenções ou acordos coletivos de trabalho, tudo para não ter surpresas desagradáveis no futuro.
Outro ponto que merece destaque é a obrigação imposta pela Lei 13.429/2017 no sentido de que caberá à contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores. A omissão da tomadora dos serviços nesse aspecto poderá gerar acidente de trabalho e, por consequência, obrigação de reparar os danos causados ao trabalhador, tanto no aspecto moral como material, com responsabilização solidária, nos termos da legislação civil.
Ademais, a se entender pela validade da terceirização da atividade-fim, a empresa terceirizada observará a convenção ou acordo coletivo de trabalho de sua categoria econômica, que poderá estabelecer condições inferiores àquelas estabelecidas nas normas coletivas da categoria econômica da tomadora dos serviços. No exemplo que mencionamos inicialmente, os trabalhadores receberão no mínimo o piso salarial estabelecido no acordo coletivo da terceirizada e não no acordo coletivo da empresa tomadora dos serviços.
De qualquer forma, a definição do alcance da Lei 13.429/2017, especialmente quanto à terceirização e seus efeitos, virá com o julgamento dos casos que forem apresentados ao Poder Judiciário.