Resumo: O crime é algo que inquieta e desestabiliza a paz social. O estudo e compreensão de suas várias vertentes e classificações, agrega e amplia uma visão crítica dos seus desdobramentos sociais em busca de justiça.
Palavras-chave: crimes de colarinho azul; crimes de colarinho branco; Lava Jato.
Sem dúvida a Operação Lava Jato revelou o maior escândalo de corrupção brasileiro, bem como é um dos assuntos mais comentados pela mídia e rodas de conversas país afora. Ainda no ano de 2014 tiveram início as investigações e a cada mês novas descobertas vêm à tona. Ainda não se chegou ao montante desviado dos cofres públicos, mas se estima que ultrapasse algumas dezenas de bilhões. O que se denota nessa operação é que os investigados sua maioria serem da classe política, grandes empreiteiros, empresários e autoridades de diversas esferas, remetendo aos crimes do colarinho branco.
A expressão “colarinho branco ou white collor”, faz menção aos sujeitos com prestígio social e capacidade intelectual acima da média, que utilizam dessas especializações ou de seus cargos públicos, para se enriquecerem sem qualquer ponderação em relação a valores deontológicos. Realça também, que em razão da ascensão social usarem vestimentas exuberantes, habitualmente composta por ternos, camisas e sapatos luxuosos.
Edwin Sutherland (1853-1950) autor da Teoria da Associação Diferencial, no final da década de 30, tratou pela primeira vez sobre a expressão ao se referir que em determinados crimes os agentes delituosos possuem grandes diferenciações dos criminosos comuns. Em sua tese, afirma que o comportamento criminoso é desenvolvido e rejeita a premissa de predisposição genética, contrapondo-se à teoria lombrosiana. Assim, o modus operandi é assimilado da mesma forma para pequenos afanadores e grandes empresários que cometem lavagem de dinheiro ou sonegação de impostos. Porém, crimes do colarinho azul: o leitor sabe o que significa?
Diferentemente dos crimes do colarinho branco, esses delitos são cometidos por agentes menos afortunados, com pouco desenvolvimento intelectual e que giram em torno dos crimes patrimoniais como pequenos furtos, roubo, receptação e estelionato. O termo é antagônico ao white collor, visto que faz referência aos macacões azuis usados nas indústrias americanas décadas atrás como forma de diferenciar os empregados braçais de diretores e encarregados.
Relevante essa análise porque denota que todas as classes sociais são atingidas pelo mal, não sendo restrito apenas aos pobres o comportamento criminoso. A série de crimes cometidos por pessoas de grande saber e condições sociais extremamente favoráveis e que acabam, mesmo assim, optando em incidir nas condutas criminosas em busca de poder ou mais dinheiro.
Os criminosos comuns são estigmatizados pela sociedade e a mídia, sofrendo as consequências de suas condutas dentro e fora dos muros do sistema prisional. A condição de criminoso passa a atuar por toda a vida do indivíduo, que muita das vezes poderá não ter outro meio de sobrevivência em função do estereótipo de egresso, ausência de estudo e estruturas social e familiar.
Por sua vez, os criminosos do colarinho branco não padecem dos reflexos amargos da estigmatização, visto que sua condição social confere um grau de respeito no meio social, de modo que não é visto como um criminoso em potencial. Além do mais, possuem profissões qualificadas que os favorecem a reinserção no mercado de trabalho e condições econômicas de se socorrer dos melhores escritórios de advocacia em sua defesa. Em caso de condenação, muitas das vezes suas penas são mitigadas em razão do seu perfil e de colaborações premiadas, em relevo com a Operação Lava Jato.
Apesar dos delitos não serem cometidos mediante grave ameaça ou violência, seus efeitos são tão nefastos quanto um homicídio, por exemplo. Os empresários e agentes públicos quando agem sonegando ou saqueando os cofres públicos, puxam um gatilho diariamente, mas sua vítima é toda a coletividade. Sim, são tão criminosos quanto qualquer outro homicida, pois os reflexos dos prejuízos afetam o sistema econômico, os investimentos em saúde, a educação e saneamento básico.
Tristemente há uma falta de reflexão quanto aos efeitos desses delitos pela sociedade em geral. Acarretam em mortes nos hospitais por falta de medicamentos ou tratamento adequado, parcos investimentos em saneamento básico, educação de qualidade e segurança pública, fatores condicionantes sociais que contribuem com a desigualdade e propagação da criminalidade.
Neste sentido, Maurice Cusson arremata o pensamento:
“As práticas passíveis de contestação dos miseráveis e das minorias são mais facilmente proibidas e punidas do que as dos ricos e poderosos. Ao longo da história, a vagabundagem foi mais vezes objeto de punição do que as práticas monopolistas. Os crimes cometidos pelos pobres, como o assalto, são mais sistematicamente punidos, e punidos com prisão, do que os crimes dos ricos, como o abuso de confiança” CUSSON (2006, p. 100).
Os breves apontamentos aqui feitos denotam que independente da classificação social, alguns não respeitam leis e princípios axiológicos, quando há a possibilidade de serem favorecidos. A vocação para o crime pode afetar desde o mais pobre ao detentor de farto patrimônio ou poder. O infeliz hábito popular de levar vantagem acima de tudo, mostram suas consequências mediatas e imediatas, uma vez que os criminosos do colarinho branco não necessitam desse subterfugio para sua sobrevivência.
É notória a desproporção entre crime-pena nas condutas tidas como do colarinho azul, que em sua grande maioria são cometidos por pessoas menos afortunadas, moradoras de comunidades e com pouca aprendizagem escolar, ostentarem condenações muito mais rigorosas dos que os antagonizam.
Aliás, o jargão após quatro décadas ainda permanece bem atual: "Por que pagar mais caro se o Vila me dá tudo aquilo de um bom cigarro? Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também, leve Vila Rica!".
REFERÊNCIA
CUSSON, Maurice (2006), Criminologia, Coleção Comportamentos, Ed, Casa das letras.