Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Pressupostos caracterizadores do estado de falência: importância, definição e instrumentos de comprovação

Exibindo página 3 de 3
Agenda 17/03/2018 às 11:15

4 Sentença

4.1 Denegação da falência

Basicamente, são dois os motivos que podem levar a denegação da falência: a improcedência do pedido ou a realização do depósito elisivo.

Na hipótese de denegação por improcedência do pedido, é o autor deste que arca com os ônus da sucumbência (custas e honorários advocatícios). Além disso, o autor ainda pode ser condenado a pagar indenização ao devedor, caso o juiz entenda que a ação falimentar foi requerida por aquele com a intenção de causar constrangimento ao réu. Nesse caso, dispõe o art. 101 da Lei 11.101/2005 que “quem por dolo requerer a falência de outrem será condenado, na sentença que julgar improcedente o pedido, a indenizar o devedor, apurando-se as perdas e danos em liquidação de sentença”.

Essa regra tem o objetivo de evitar a litigância de má-fé, visando tão somente prejudicar o devedor. Acrescenta o § 1º que “havendo mais de 1 (um) autor do pedido de falência, serão solidariamente responsáveis aqueles que se conduziram na forma prevista no caput deste artigo”. Por fim, diz ainda o § 2º que “por ação própria, o terceiro prejudicado também pode reclamar indenização dos responsáveis”. O requerimento de terceiro deve ser feito em ação própria porque, não sendo o terceiro parte no processo, o juiz não pode condenar o autor na própria sentença que denega a falência.

Já no caso da realização de depósito elisivo, o pedido do autor foi julgado procedente, e, por isso, é o devedor quem deve arcar com o ônus da sucumbência e levantar a quantia depositada, de acordo com o determinado pelo juiz na sentença. Contudo, não obstante a procedência do pedido, a falência será denegada. Feito o depósito, o devedor ainda tem a possibilidade de contestar. Se o juiz acolher seus argumentos, ele terá sua falência denegada não em razão do depósito elisivo, mas sim da improcedência do pedido do autor.

4.2 Sentença declaratória da falência

Caso o pedido de falência seja julgado procedente e não tinha sido realizado o depósito elisivo, o juiz proferirá sentença que decreta a falência o devedor, instaurando, com isso, o processo de execução concursal do falido.

De acordo com o art. 203, § 1º, do Código de Processo Civil, “sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”. Diante disso, há discussões na doutrina acerca de se a decisão que decreta a falência de fato se encaixa na categoria de “sentença”, uma vez que ela não põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, nem extingue a execução. Ela, na verdade, dá início ao processo falimentar. Embora possamos considerar que a decisão que decreta a falência não seja, tecnicamente, uma sentença, ela possui a forma de sentença, com relatório, fundamentação e dispositivo (art. 489, CPC)[7].

É possível também questionar sua natureza jurídica. Não obstante boa parte da doutrina comercial refira-se a ela como sentença declaratória, a consideração majoritária é de que, tecnicamente, sua natureza é constitutiva. Isso porque as sentenças declaratórias apenas declaram a existência de determinada relação jurídica, com efeitos retroativos. As sentenças constitutivas, por outro lado, criam, modificam ou extinguem certa relação jurídica – justamente o que ocorre na decretação da falência, que constitui o devedor em estado falimentar e instaura o regime de execução concursal de seu patrimônio.

O conteúdo específico da decisão que decreta a falência está disposto no art. 99 da Lei 11.101/2005:

Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações:

I – conterá a síntese do pedido, a identificação do falido e os nomes dos que forem a esse tempo seus administradores;

II – fixará o termo legal da falência, sem poder retrotraí-lo por mais de 90 (noventa) dias contados do pedido de falência, do pedido de recuperação judicial ou do 1.º (primeiro) protesto por falta de pagamento, excluindo-se, para esta finalidade, os protestos que tenham sido cancelados;

III – ordenará ao falido que apresente, no prazo máximo de 5 (cinco) dias, relação nominal dos credores, indicando endereço, importância, natureza e classificação dos respectivos créditos, se esta já não se encontrar nos autos, sob pena de desobediência.

IV – explicitará o prazo para as habilitações de crédito, observado o disposto no § 1.º do art. 7º desta Lei;

V – ordenará a suspensão de todas as ações ou execuções contra o falido, ressalvadas as hipóteses previstas nos §§ 1.º e 2.º do art. 6º desta Lei;

VI – proibirá a prática de qualquer ato de disposição ou oneração de bens do falido, submetendo-os preliminarmente à autorização judicial e do Comitê, se houver, ressalvados os bens cuja venda faça parte das atividades normais do devedor se autorizada a continuação provisória nos termos do inciso XI do caput deste artigo;

VII – determinará as diligências necessárias para salvaguardar os interesses das partes envolvidas, podendo ordenar a prisão preventiva do falido ou de seus administradores quando requerida com fundamento em provas da prática de crime definido nesta Lei;

VIII – ordenará ao Registro Público de Empresas que proceda à anotação da falência no registro do devedor, para que consta a expressão “Falido”, a data da decretação da falência e a inabilitação de que trata o art. 102 desta Lei;

IX – nomeará o administrador judicial, que desempenhará suas funções na forma do inciso III do caput do art. 22 desta Lei sem prejuízo do disposto na alínea a do inciso II do caput do art. 35 desta Lei;

X – determinará a expedição de ofícios aos órgãos e repartições públicas e outras entidades para que informem a existência de bens e direitos do falido;

XI – pronunciar-se-á a respeito da continuação provisória das atividades do falido com o administrador judicial ou da lacração dos estabelecimentos, observado o disposto no art. 109 desta Lei;

XII – determinará, quando entender conveniente, a convocação da assembleia geral de credores para a constituição de Comitê de Credores, podendo ainda autorizar a manutenção do Comitê eventualmente em funcionamento na recuperação judicial quando da decretação da falência;

XIII – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento, para que tomem conhecimento da falência.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Acerca dos efeitos da decretação da falência, afirma André Luiz Santa Cruz Ramos (2016, p. 728) que, sendo decretada a falência, “instaura-se um novo regime jurídico aplicável ao devedor, que repercutirá em toda a sua esfera jurídica e patrimonial. A falência produz efeitos, pois, quanto à pessoa do falido, quanto aos seus bens, quanto aos seus contratos, quanto aos seus credores etc”.

4.3 Recurso contra a sentença que julga o pedido de falência

Nos recursos estabelecidos na legislação falimentar, o procedimento é o do Processo Civil, conforme dispõe o art. 189 da referida lei:

Art. 189. Aplica-se a Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973[8] – Código de Processo Civil, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei.

A previsão expressa da Lei 11.101/2005, em seu artigo 100, é de que “da decisão que decreta a falência cabe agravo, e da sentença que julga a improcedência do pedido cabe apelação”. O agravo aqui referido é o agravo de instrumento.

Considera-se ainda que tanto contra a sentença que decreta quanto a que denega a falência são oponíveis embargos de declaração, ainda que a Lei 11.101/2005 não traga expressamente essa previsão, pois este recurso é cabível contra qualquer decisão eu contenha omissão, obscuridade ou contração, conforme dispõe o caput do art. 1.022 do Código de Processo Civil.


5 Conclusão

Essencialmente, levando em conta seus objetivos e fundamentos, a falência não deve ser vista como um mal. Há certos casos em que o encerramento das atividades de uma empresa é, de fato, a melhor alternativa para a economia como um todo, tendo em vista o seu baixo grau de rendimento e produtividade. Procedendo desse modo, os recursos empregados em tal atividade podem ser realocados, de modo a otimizar a capacidade de produção de riqueza.

No entanto, como anteriormente asseverado, a falência somente deve ser aplicada aos casos em que não se enxerga perspectivas na viabilidade de recuperação da empresa em crise, pois, se de modo contrário se verificar, deve-se priorizar a recuperação, em atendimento aos princípios da função social e da preservação da empresa, os quais se mostram como princípios basilares na nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas (Lei n. 11.101/2005).

Nesse contexto, do exposto no presente trabalho, podemos concluir que a delimitação de pressupostos necessários à caracterização do estado de falência é fundamental para que se evite o recurso excessivo, indiscriminado e desnecessário a esse instrumento. Além disso, podemos perceber que as informações trazidas a cabo no momento pré-falimentar de verificação dos pressupostos mostram-se essenciais para o bom andamento do processo de falência que pode vir a se seguir.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Recuperação de Empresa: de acordo com a Lei n. 11.101/2005. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BRASIL, Lei nº 11.101, de 9 de Fevereiro de 2005. Lei de Recuperação e Falências. Diário Oficial da União. Brasília, 2005. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 06 de maio de 2017.

_____. Lei nº 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da União. Brasília, 2002. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em 06 de maio de 2017.

_____. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União. Brasília, 2015. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 06 de maio de 2017.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial: direito de empresa. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de Falência e Recuperação de Empresas. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro: falência e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2006.

NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa: Recuperação de Empresas e Falência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Grupo Editora Nacional, 2016.


Notas

[1] Art. 982. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa.

[2] Art. 966, parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

[3] Art. 967. É obrigatória a inscrição do empresário do Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade.

[4] Art. 23. Os termos dos protestos lavrados, inclusive para fins especiais, por falta de pagamento, de aceite ou de devolução serão registrados em um único livro e conterão as anotações do tipo e do motivo do protesto, além dos requisitos previstos no artigo anterior.

[5] Art. 5º. Não são exigíveis do devedor, na recuperação judicial ou na falência: I – as obrigações a título gratuito;

[6] Art. 94, § 2º. Ainda que líquidos, não legitimam o pedido de falência os créditos que nela não se possam reclamar.

[7] Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

I – o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.

[8] A Lei n. 5.869, de 11-1-1973, foi revogada pela Lei n. 13.105, de 16-3-2015.

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SENCADES, Larissa. Pressupostos caracterizadores do estado de falência: importância, definição e instrumentos de comprovação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5372, 17 mar. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58607. Acesso em: 23 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!