IV. Métodos de Interpretação Constitucional
1. Método Tópico
Este método da hermenêutica jurídica é reconduzido por Theodor Viehweg, de forma renovadora através de sua obra Topik and Jurisprudenz. Este fora resultado de indagações diante os conceitos e funções do Direito, o Estado e a Constituição.
Este método também foi utilizado por Aristóteles, que resumia seu método através do consenso da maioria e verdade evidente, "o que a todos, ou a grande maioria ou aos doutos se lhes afigurava verdadeiro" [19]. Esta também fora defendida contra o ideal dos cartesianos e seus métodos matemáticos através de Vico na Idade Moderna, o que não durara muito, não resistindo e caindo no esquecimento devido ao domínio filosófico e cartesiano.
No entanto o método tópico, como já dito, retorna devida a grande descrença do positivismo racionalista, o Professor Bonavides acrescenta que:
"Ocorreu, porém a exaustão posterior do positivismo racionalista, a para da descrença generalizada em suas soluções, fez inevitável a ressurreição da tópica como método. Tal se verificou na esfera do Direito há mais de vinte anos, graças a Theodor Viehweg, em razão justamente da insuficiência do método ‘científico’ dos naturalistas e também do malogro das correntes idealistas que procuraram por outras vias resolver com exclusividade o problema do método, afastando-se dos esquemas clássicos de inspiração objetiva" (20).
Assim, através do lema ‘O pensamento jurídico é tópico’ toda a discussão de métodos contemporânea do Direito iria ter seus critérios revistos. Desta maneira a obra de Viehweg trouxe uma carga de renovação e questionamentos dos métodos interpretativos.
Na Alemanha a metodologia de interpretação pelos tópicos foi muito bem aceita em destaque por parte dos famosos civilistas Wieacker, Esser e Coing, porém não foram só os civilistas que aderiram, mas também os constitucionalistas Schneider e Ehmke, através do tema "Princípios de Interpretação Constitucional" seguido de outros eminentes juristas como Martin Kriele, Peter Haberle, Friedrich Muller e Konrad Hesse.
O método se vislumbra principalmente em ‘pensar o problema’, trata-se de um estilo de argumentação e acesso ao objeto a ser interpretado, diferente de que muitos pensam, este método não de encontro a lógica, este apenas procura diversificar um outro meio de uma busca racional além do argumento dedutivo.
Ao contrário da tópica, o pensamento sistêmico manifesta-se pelo método dedutivo, sendo a tópica sempre a buscar do mais justo através de pensamento de um problema em toda sua complexidade. No dizeres de Esser: "A situação – diz Esser – devem ser compreendida em toda sua complexidade, a fim de problematizar-se o ideal de uma solução." [21].
Assim fazia-se necessário identificar os topoi ou loci, determinado por Esser como ‘pontos de vista pragmáticos de justiça material’, ou ainda de ‘estabelecimento de fins jurídico-político’ e na acepção clássica ‘pontos retóricos de partida para argumentação do problema’.
Por Viehweg a tópica traduzia-se numa maneira de pensar o problema, através de uma técnica mental que focaria aquele. Já a clássica, ou seja, a antiga tópica não passaria de uma mera técnica de argumentação. Assim a idéia de Viehweg era tratar e conhecer o problema através de debates e da descoberta de argumentos e métodos de argumentação procura solucionar o problema.
Bonavides acrescenta de acordo com a situação da Ciência do Direito na década de 50 que:
"A investigação crítica das causas e origens da tópica dificilmente pode ignorar o estado que se encontrava a Ciência do Direito na década de 50. A surpreendente renovação das reflexões jusnaturalistas, desde a conversão de Radbrunch ao direito natural, produzia resultados aquém das expectativas" [22].
Houve esperança para que o movimento vingasse, pois o positivismo jurídico e suas escolas não se encontravam numa boa situação de crença por parte de sua metodologia e doutrina. Há aqueles que diziam que a descrença do positivismo justificaria o advento da tópica na medida em que lhe foi possível abranger toda a realidade do direito, o que fora salientado por Kriele ‘de normas positivas, escritas ou não escritas, em vinculação com as regras de interpretação e os elementos lógicos disponíveis’ [23].
A metodologia já vinha sendo desenvolvida na Europa Continental através da jurisprudência dos interesses e na escola livre do direito. A retomada por Viehweg da tópica deram maior ensejo para estas escolas diante suas variantes da hermenêutica e do Direito Constitucional.
Já no direito anglo-americano revelaria o método, o qual faltava no direito codificado europeu. O que teoricamente através de Ihering já havia, segundo Viehweg pela jurisprudência dos interesses.
Apesar das objeções de Diedrichsen sobre a técnica, através de argumentos que através da tópica não se exauria por inteiro a substância da jurisprudência, ou seja, o que sempre era visto pelos juristas em todas as épocas; e ainda que: "... seríamos injustos com a jurisprudência se estreitássemos, de modo unilateral seu conceito de sistema e, enfim, a tópica nenhum método representa em condições de fazer mais segura a aplicação do direito" [24], entendia Canaris que esta seria válida em casos específicos, como lacunas na lei onde inexistisse valoração do direito positivo.
Enfim, críticas e apoios ao método da tópica sempre existiram, importando, no entanto que todos os meios interpretativos poderiam ser utilizados desde que convenham ao esclarecimento e solução do problema. A abertura metodológica é completa e argumentação persuasiva terá por ponto de apoio essencial o consenso, e por ponto de partida uma espécie de ‘compreensão prévia’ (Vorvestandnis), tanto do problema como da Constituição [25].
Devendo ficar entendido sobre o Método Interpretativo dos Tópicos que este se trata de uma tendência metodológica que surge da Alemanha com intuito de implementar novos meios e métodos interpretativos para as Constituições.
2. Método Racionalista de Concretização
Ciente de que a tópica, a exemplo da jurisprudência dos interesses e a escola livre do direito iria entrar em crise, surgem os juristas comprometido com a matéria da constituição desenvolver um método que tivesse uma maior potência teórica e alicerces mais seguros através da teoria material do Direito, aliado também a uma busca de um conceito mais flexível e dinâmico do Direito Constitucional atinentes as exigências da época e a crescente fluidez da realidade social.
Há de se intitular como pai do método racionalista de interpretação constitucional o Professor Friedrich Muller da Universidade de Heidelberg na Alemanha. O Professor através de seu método racionalista de interpretação objetiva deixar estruturada uma hermenêutica que traduza o conteúdo da constitucional sem perder um mínimo de eficácia, apresentando-se de maneira concreta e com seus vínculos indissolúveis fora da própria antinomia tradicional por onde se operava a separação entre a Constituição formal e material [26].
3. Método Concretista de Inspiração Tópica
Como fora já exposto, o método de interpretação constitucional concretista tem como idealizador o Professor Muller, este utilizou como base de seu método o método dos tópicos, logicamente procurando consertar as possíveis falhas diante das criticas.
O Professor procurou estruturar e racionalizar a concretização da norma, "... de modo que a atividade interpretativa, deixada aberta pela tópica, possa com a racionalização metodológica ficar vinculada, não se dissolvendo por conseguinte o teor de obrigatoriedade ou normatividade da regra constitucional" [27].
A norma jurídica é tida pelos concretistas como algo além do enunciado normativo, cabendo a concretização, como método de interpretação decifrar seu objetivo, diferente do que ocorria com os métodos tradicionais de hermenêutica jurídica.
O método do concretismo tem sua base fixada em críticas e reflexões da jurisprudência do Tribunal Constitucional de Karlsruche. As decisões deste tribunal apresentavam um perfil pragmático e concretista além de que um pouco eivada ao dogma pandectista e voluntarista [28] do século XIX da Alemanha, Muller considerava isto inaceitável para sua metodologia como instrumento de interpretação e compreensão das Constituições.
Ou seja, não caberia para o método da concretização através de métodos voluntaristas, o que resultava através da hermenêutica clássica uma interpretação que resultaria na vontade objetiva da lei. Além de que Bonavides comentando o método de Muller afirmava que:
"O erro se agravava na medida que o Tribunal contraditoriamente se arreda dos esquemas tradicionais e introduz, nos arestos de seus juízes, componentes extraídos da teoria material da Constituição e das vias concretistas, quais por exemplos alguns topoi ou ponto de vista, como princípio da unidade da Constituição e a chamada ‘natureza das coisas’, estes ainda compatíveis com as regras interpretativas formuladas por Savigny. Mas há outros inteiramente afastados dessa hermenêutica, conforme os que Muller a seguir declina: a necessidade de um resultado conforme a coisa, a possibilidade da mudança de importância de uma norma constitucional com base na matéria a ser regulada pela norma e pela decisão, a consideração de concatenações históricas, políticas e científico-sociais reputadas as mais importantes para alcançar afinal a decisão" [29].
A intenção de Muller sempre foi evitar a possibilidade da separação entre as Constituições Formal e a Material. Além da eterna discussão do confronto da realidade como norma jurídica. Reflete a problemática da metodologia concretista ao interpretar e aplicar a norma, ou seja, evitar sempre a separação o caráter material e formal da constituição.
A identificação do método é de extrema relevância para o controle de constitucionalidade das leis e aplicação desta, através de seus meios interpretativos tornando-se uma eficaz meio para o judiciário com fito de evitar a declaração de nulidades destas. Salientando ser frisado que este método, não diminui o mérito do legislativo que elaborou aquela norma, nem o judiciário que interpreta, conhece e aplica a lei diante sua constitucionalidade.
V. A Organização dos Poderes na Constituição Brasileira
No Ordenamento Jurídico Brasileiro através da Constituição Federal de 1988 a organização dos poderes se dá através do Título IV. Apesar de existir uma presunção de variados Poderes, boa parte da doutrina prefere entender que o Poder político do Estado é uno e indivisível.
Sendo falando em divisão as funções básicas, as quais são atribuídas aos órgãos com suas respectivas especificações. Cada órgão deste teria atribuições diferenciadas, fazendo o todo que é o Estado funcional.
Como já visto, o momento histórico que retrata a fundamentação para a separação dos poderes é a passagem do Estado Absolutista para o Estado Liberal, o que vem influenciar também como em vários países, a Constituição Brasileira.
O Brasil atualmente é uma República Federativa, isto reflete dizer que além das divisões de poderes, há a repartição de competências entre o governo central e os Estados-Membros. Podendo se afirmar como muito doutrinadores que:
"O grau de centralização ou de descentralização política de um Estado Federal é medido pela quantidade e qualidade de atribuições concedidas às entidades federativas. Quanto maior a centralização política, maiores serão as atribuições feitas ao governo central. Dentro dessa perspectiva é evidente o grau de centralização do Estado Federal brasileiro " [30].
Dentre as funções básicas estatais, não diferem da maioria dos outros países, o Brasil também faz sua divisão de poderes entre o poder executivo, poder legislativo e o poder judiciário. Cabendo ao Legislativo a elaboração de leis, de normas gerais e abstratas, impostas perante todos. Ao Executivo cabe a administração do Estado, baseadas nas lei elaboradas pelo legislativo. Já ao Judiciário, cabe obviamente, cabe a função judicial do Estado distribuindo a justiça e aplicando a lei.
O sistema de freios e contrapesos é previsto também na Carta Magna. Há ciência que a separação de poderes não rígida tendo sempre a possibilidade de interferência recíproca, dando margem que além de cada poder exercer suas competências, estes fiscalizariam as competências dos outros.
Alguns exemplos deste sistema checks and balances da Constituição Brasileira podem ser citados, é o caso da previsão da CF que permite ao executivo editar normas com força de lei, no caso as Medidas Provisórias; possibilidades de veto as leis do legislativo; os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de leis e normas do executivo e legislativo; opção do chefe do poder do executivo escolher os ministros dos tribunais superiores além da possibilidade de impeachment do chefe do executivo através do legislativo.
A divisão dos poderes políticos pressupõe elementos como a especialização funcional e a independência orgânica, devendo cada função ser atribuída a um órgão independente.
A Constituição Brasileira através de seu artigo 2º estabelece que os Poderes devam ser independentes e harmônicos entre si. O que deve ser visto de forma que os poderes devem atuar de forma independente sem conflitos ou subordinação com a finalidade de assegurar o bem comum de todos.
Nesta configuração é que Montesquieu procurou através de sua teoria que de modo algum, para se ter uma democracia deva existir a separação dos poderes, sem concentrar, diferente de uma realidade, os poderes nas mãos de um só.
VI. Conclusão
De grande pertinência e apesar de ser discutido desde Aristóteles, o tema estudado apresenta discussões do presente. É eterna a discussão entre a separação dos poderes, numa verdadeira queda de braço de quem pode mais.
Argumentos em que a busca de uma democracia e a liberdade individual sempre servirão de fachada para os interesses daqueles que detém o poder, seja exercendo determinada função e posição o interesse individual e de grupos isolados prevalecerão.
Cientificamente a idéia de Montesquieu era perfeita. Era buscado derrubar o absolutismo, a concentração de poderes, o que no papel apresentava-se perfeitamente como uma máquina, ou seja, estampada a Concepção Mecanicista que nunca falharia.
De início Kelsen questionava este sistema de separação dos poderes, não sendo nem um pouco a favor, este não admitia que uma decisão do parlamento, este que apenas representaria o povo e nada mais, fosse questionada. Fácil de entender tal entendimento vislumbrado numa pureza científica. O que futuramente vem a ser modificado tal entendimento.
Logicamente que a Concepção Mecanicista através de seus métodos de analise, não seria totalmente eficaz. A visão mecânica do século XVIII era muito boa para ramos das ciências exatas, das engenharias e mecânicas. O que muda totalmente ao tratarmos das ciências humanas, da vida em sociedade. Neste contexto a Concepção Normativa completava a Mecanicista, o objeto normativo era as inter-relações humanas face sua obrigatoriedade como norma.
Ao longo do tempo vem se tentado estabelecer meios e métodos interpretativos e de aplicação das normas, em destaque as constitucionais. Grandes nomes da ciência do Direito e da filosofia jurídica estabelecem seus métodos, os quais sempre serão questionados e criticados.
De outro lado, através da prática de um sistema, os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e alguns ainda inominados, tentam sobrepor-se sobre os demais. A idéia de independência e harmonia entre si é retratada de maneira perfeita no papel, entretanto como modelo eficácia emperra-se diante de disputas de valores e interesses.
A tentativa de manter-se no campo científico é árdua, não é almejado penetrar em campos filosóficos, axiológicos e pré-conceituosos, entretanto surge a falha do ser humano.
Como um sistema, a constituição feita por serem passíveis de erro, através do constituinte originário, refletia um cenário político, econômico e social diferente a cada época. Valores eram e são considerados. O caráter estático por algum lado e dinâmico por outro, continua e tentará acompanhar a evolução da sociedade pelas margens. A eterna indagação de saber que aquele que tinha competência e autoridade para decidir por último diante a constitucionalidade sempre existirá.
O interessante não é continuar com discursos críticos, sem nenhuma busca construtiva. A Ciência Jurídica deve continuar tentado buscar não uma perfeição teórica, mas instrumentos e métodos eficazes também no campo prático. A liberdade individual e a democracia sempre serão almejadas, entretanto sendo necessário mesmo que pequena uma intervenção do Estado, buscando quase que sempre como a doutrina Alemã tratar os desiguais desigualmente.