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A mulher e o Código Civil de 2002:

a confirmação do princípio da isonomia

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Agenda 13/12/2004 às 00:00

Os Direitos e Deveres da Mulher a Luz do Novo Código Civil:

Para podermos ter uma pequena noção das modificações inseridas pelo Novo Código Civil na realidade feminina, analisaremos suas principais modificações no âmbito do Direito de Família, apesar de sabermos que muitas dessas alterações já foram instituídas por legislações especiais ou pela nossa doutrina e jurisprudência, sendo freqüentemente aplicadas em casos concretos.

1. Artigo 1º do Novo Código Civil: "toda pessoa" na acepção de todo ser humano.

O artigo primeiro do Novo Código Civil trata de matéria que no Código de 1.916 encontrava-se no artigo 2º, ambos encontrados no Livro I – Das Pessoas.

O novo codex substitui a palavra "homem" por "pessoa", e assim, sucessivamente, em todo o Código, para que se retire definitivamente deste, toda e qualquer desigualdade nas relações jurídicas, seguindo o princípio da isonomia declarado pela Carta Magna de 1.988.

No Código de 2.002, liga-se à pessoa a idéia de personalidade, exprimindo aptidões genéricas para adquirir direitos e contrair obrigações. [17]

Assim, a pessoa natural somente pode ser sujeito nas relações jurídicas, pois, possui personalidade e, portanto, toda pessoa que tem personalidade é abrangida pela legislação civil e constitucional.

A personalidade é reconhecida num sentido de universalidade no novo Código, pois quando emprega o termo "pessoa" na acepção de todo ser humano, quer dizer que não há distinções de sexo, idade, credo ou raça, em consonância com a Constituição Federal, artigos 1º, inciso III, 3º, inciso IV, 5º, incisos I, VI, XLI, XLII, e 19, inciso I. [18]

Portanto, no início do Novo Código, percebemos suas intenções quando já na ortografia ele deixa de colocar a mulher como uma "sombra" do homem, ou seja, quando se falava a palavra "homem", para se referir a todas as pessoas humanas, as mulheres tinham que se incluir na masculinidade que esta palavra determina. Antigamente, o "homem" estava colocado como o representante da população brasileira, não necessitando, com isto, que a "mulher" fosse citada diretamente.

O Novo Código Civil erradicou qualquer forma de discriminação em seus preceitos adotando a palavra "pessoa" em substituição da antigamente utilizada, "homem", que tentava, mas sem conseguir, se referir a todos os seres humanos. Hoje, esta tentativa é alcançada, pois, não há mais discriminações no conceito de ser humano, sendo ele todas as "pessoas", pois "homem" é e sempre será o masculino de "mulher", não a abrangendo.

2. Da Igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges

O princípio da isonomia entre os cônjuges, que desde 1.988 é consagrado pela Constituição Federal através do artigo 226, parágrafo quinto, vem também inserido no Novo Código Civil, da maneira como sempre foi pleiteado pelas mulheres em suas constantes lutas pela igualdade de direitos e deveres.

"Artigo 1.511 – O Casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges."(Novo Código Civil) (grifos nossos)

A adoção deste princípio visa atender a um grande anseio das mulheres – a igualdade nas decisões referentes à sociedade conjugal – pois estas deverão ser tomadas de comum acordo entre marido e mulher.

Essa igualdade, como foi visto em todo o processo histórico das lutas femininas, não existia no Código Civil de 1.916, que discriminava acentuadamente a mulher, chegando ao ponto de classifica-la como relativamente incapaz a certos atos e a maneira de os exercer.

Pode-se de certo modo afirmar que a história ocidental do Direito de Família se caracteriza por uma crescente melhoria da situação jurídica da mulher dentro do lar. [19]

Portanto, alcançamos com o advento do Novo Código Civil a perfeita adequação ao princípio constitucional da absoluta igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges, e a conseqüente preservação da dignidade das pessoas casadas.

3. Idade Nupcial: capacidade para o casamento

Ainda, em acatamento ao princípio da isonomia, encontramos no Novo Código Civil a mesma idade núbil de dezesseis anos para homens e mulheres.

Verificarmos, historicamente, que mesmo antes da edição do Decreto nº 181 de 1.890, as idades nupciais para homens e mulheres já não se equiparavam. Nessa época, a idade nupcial era de 12 (doze) anos para a mulher e de 14 (quatorze) anos para o homem. Já com o advento desse decreto a idade nupcial aumentou para 14 (quatorze) anos para a mulher e 16 (dezesseis) anos para o homem, mas mantendo sempre a desigualdade. Outra alteração na idade núbil foi possível somente com a entrada em vigor do Código de 1.916, porém, este, como já narrado, continuou mantendo as desigualdades entre homens e mulheres – e a conseqüente discriminação à mulher – assim sendo, a idade mínima para o casamento era de 16 (dezesseis) anos para a mulher e de 18 (dezoito) anos para o homem. Tal erro foi "consertado" somente agora pelo Código Civil de 2002, que unificou as idades mínimas para o casamento.

"Artigo 1.517 – O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil."(Novo Código Civil)

"No projeto do Código Civil, em sua redação anterior, havia desigualdade entre os sexos, sendo, então, a idade núbil de dezesseis anos para a mulher e de dezoito para o homem. Em sugestões anteriormente feitas (...) mostramos a necessidade de fixação do mesmo limite de idade para o casamento de homens e mulheres, em face da igualdade entre os sexos, imposta pelo art. 5º, inciso I, da Constituição Federal"(Regina Beatriz Tavares da Silva, Novo Código Civil Comentado, Coord. Ricardo Fiuza, São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p. 1357)

No mesmo sentido encontramos o texto de Débora Vanessa Caús Brandão "Reflexões sobre os impedimentos matrimoniais e a união estável no Novo Código Civil" (RT, 805/11).

Na verdade, esse dispositivo foi desenvolvido com base nas aptidões físicas das pessoas, pois com a puberdade que é alcançada aos 16 (dezesseis) anos, os seres humanos estão aptos a procriar, portanto – em tese – podem se casar. Mas é sempre importante observar que quanto maior for o desenvolvimento intelectual do ser humano, mais fácil será seu relacionamento e a conseqüente mantença dessa sociedade conjugal. Dessa forma, a idade mínima é de dezesseis anos, porém, para o bom desenvolvimento do relacionamento se faz mister que os cônjuges possuam uma certa maturidade.

Afinal de contas o casamento é um ato de seriedade, do qual defluem grandes repercussões na vida social.

Há exceções a essa regra, quando permite-se que o casamento seja realizado antes da idade legal ser alcançada, de acordo com o artigo 1.520 do Novo Código Civil, com o intuito de evitar a imposição ou o cumprimento de pena criminal, ou em caso de gravidez. [20]

4. Supressão da Nulidade do Casamento por Defloramento da Mulher

O defloramento da mulher ignorado pelo marido sempre caracterizou "erro essencial" por indicar a desonestidade e a falta de recato da mulher desposada, podendo o homem, que ainda exercia o poder marital, presumir que a mesma tivesse um procedimento leviano.

O Código Civil de 1.916 o mantinha por entender ser insuportável ao homem a vida conjugal com uma mulher que ele pensava ser pura, mas não era. [21]

"Anulava-se dentro de dez dias, também contados do casamento, se se tratasse de matrimônio contraído com mulher já deflorada (CC de 1916, art. 178, parágrafo primeiro)."(W. Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, Vol.02, São Paulo: Editora Saraiva, 1980, p. 91-92)

No mesmo sentido, discordando da posição machista do Código de 1916, encontramos pareceres dos mestres Caio Mário Silva Pereira, em suas obras "Instituições de Direito Civil" e "Concubinato, seu conceito atual" [22], Silvio Rodrigues, na obra "Direito Civil: Direito de Família" [23], e ainda os julgados: RT, 185:185, 248:139; RF, 133:454.

"Artigo 219 - Considera-se erro essencial sob a pessoa do outro cônjuge:

...

IV – o defloramento da mulher ignorado pelo marido;"(Código Civil de 1.916)

Desde a Constituição Federal de 1.988, onde as mulheres alcançaram grande liberdade de costumes e igualdade entre os sexos, esse preceito não é mais aceito. Porém, agora, também o novo Código Civil exclui tal possibilidade de anulação de casamento em razão de defloramento da mulher ignorado pelo marido, pois, tal fato há muito tempo não é consentâneo com a realidade.

O defloramento não tem mais lugar no ordenamento jurídico civil brasileiro, ou seja, a possibilidade de o marido anular o matrimônio alegando ignorância de defloramento de sua mulher, pois, tal pedido, hoje, seria considerado juridicamente impossível. [24]

Este dispositivo jamais poderia ter sido mantido pelo Novo Código, primeiramente, porque ele retira da mulher a própria condição de pessoa, de ser humano, colocando-a em uma situação de inferioridade, pois, alegava que sua liberdade pessoal devia ser preservada para um futuro marido, que muitas vezes não se sabia nem se existiria. Porém, ao homem nunca foram impostas tais restrições. Este artigo era uma grave violação do princípio da dignidade da pessoa humana. E depois, diante das inúmeras reformas procedidas em vários institutos do Código Civil, não poderia o legislador ter mantido o dispositivo em questão, pois, ele se confronta com o princípio da igualdade jurídica entre o homem e a mulher imposta pela Constituição.

Na realidade, a Constituição Federal através de seu artigo 5º, inciso I, já havia revogado tal preceito.

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5. A Adoção do Sobrenome: direito de ambos os cônjuges

O Novo Código Civil traz no bojo do parágrafo primeiro do seu artigo 1.565, que qualquer dos cônjuges poderá acrescer ao seu nome o sobrenome do outro, aplicando mais uma vez o princípio da isonomia, igualando os direitos dos cônjuges, assim, tanto o homem pode adotar o sobrenome da mulher, quanto a mulher acrescer ao seu nome o sobrenome do marido.

"As alterações objetivaram seguir o princípio constitucional do direito ao planejamento familiar no corpo do Código, a despeito de já encontrar-se expresso no texto constitucional, e consagrar em todos os dispositivos a plena e absoluta igualdade entre os cônjuges (...) por essa razão, qualquer dos nubentes, querendo, pode assumir o sobrenome do outro." (Regina Beatriz Tavares da Silva, Novo Código Civil Comentado, Coord. Ricardo Fiuza, São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p. 1407)

A tradição de nosso Direito de Família impunha-se de forma diversa, por se tratar de uma família patriarcal, a regra era a esposa adotar o patronímico do marido, pois a idéia desse conceito de família é que a mulher com o casamento, ingressava na família do homem que ela desposava, deixando de fazer parte de sua família para fazer parte da família de seu marido – tal como um bem.

Tanto o era, que o artigo 240 do Código Civil de 1.916 impunha a obrigatoriedade da adoção do patronímico do marido, apesar da doutrina majoritária defender a eletividade. Esse entendimento permaneceu mesmo após a edição da Lei do Divórcio em 1.977, que adotou expressamente a forma optativa da adoção do patronímico do marido para as mulheres, podendo estas acrescerem ou não aos seus nomes os sobrenomes do marido, porém, as mulheres sentiam-se constrangidas com tal direito de "opção" adquirido pela nova legislação, e na maioria das vezes não o utilizavam.

O novo Código veio mais uma vez, para igualar os direitos dos cônjuges dentro da vida conjugal. Observe que, hoje, através desse novo preceito qualquer dos nubentes pode acrescer ao próprio apelido o sobrenome do consorte, ou então, pode conservar seu nome de solteiro.

Conservar o nome de solteira (o) sempre foi e sempre será questão a ser ponderada e julgada como direito à identidade.Nada tem a ver com amor, nem com possível caracterização de "injúria" ao marido. [25]

"Artigo 1.565 – Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.

§1º Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro.

§2º O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício deste direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas."(Novo Código Civil)(grifos nossos)

A possibilidade do marido adotar o sobrenome da mulher, não parece que terá repercussão prática, tendo em vista a ignomínia que maridos têm em adotar o patronímico da esposa. Assim, é um direito, não exercido por preconceito. E quando raríssimos maridos decidem adotar o sobrenome da esposa, encontram ainda, o preconceito de alguns julgadores.

"O acréscimo de sobrenome deverá constar do assento matrimonial (art. 1571, parágrafo primeiro); poderá ser mantido em caso de divórcio ou conversão de separação em divórcio (art. 1578)."(Theotonio Negrão, Código Civil e legislação Civil em vigor, São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 279)

Um problema que ainda persiste no Novo Código Civil é a penalização da mulher pela culpa, desprezando-lhe a identidade, ou seja, a sua própria personalidade.

O desprezo a essa identidade dos cônjuges é causado porque a um deles deve ser imputável a causa pelo término do casamento, e em conseqüência da culpa por este rompimento, o cônjuge culpado perde o direito de utilizar o sobrenome do outro cônjuge, se isto for requerido pelo, então, cônjuge "inocente".

Essa regra da culpabilidade, ou seja, da exclusão do sobrenome do cônjuge "inocente" do nome do cônjuge "culpado", possui algumas exceções, assim, será mantido o sobrenome:

- quando a ausência do patronímico do cônjuge "inocente" não acarretar evidente prejuízo para identificação do outro cônjuge; e

- quando houver manifesta distinção entre o nome de família do cônjuge "culpado" e dos filhos havidos da união dissolvida;

- quando decorrer dano grave reconhecido na decisão judicial.

Essa imposição do Estado de se delegar a culpa pelo término do casamento a um dos cônjuges confronta o princípio da dignidade da pessoa humana que é o cânone maior do Estado Democrático de Direito em que vivemos. Por isso, é que observamos que nossa jurisprudência, mesmo antes da entrada em vigor do Novo Código Civil, já vinha desprezando tal posição, e considerando que essa intromissão do Estado na intimidade das pessoas é inconstitucional e indevida, pois, como podemos impor a um dos cônjuges que ele revele a postura do outro dentro de um relacionamento.

"Voltando à sensibilidade de Vinícius: "o amor é eterno enquanto dura". Realmente, ninguém pode ser responsabilizado quando se apaga a chama da paixão."(Maria Berenice Dias. "O fim do amor sem fim...". In: Jornal O Correio, de Cachoeira do Sul, 21-22/12/2002, p. 03 e no site www.migalhas.com.br)

O Novo Código Civil trata de maneira tímida esses direitos de personalidade, cuidando especificamente do nome da mulher casada, quando da separação e do divórcio (artigo 1.578 C.C.), isto porque, o nome da mulher casada sempre esteve ligado à submissão da esposa ao marido.

"Artigo 1.578 – O cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial, perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente, e se a alteração não acarretar:

I – evidente prejuízo para sua identificação;

II – manifesta distinção entre seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida;

III – dano grave reconhecido em decisão judicial.

§1º O cônjuge declarado inocente na ação de separação judicial poderá renunciar, a qualquer momento, ao direito de usar o sobrenome do outro.

§2º Nos demais casos caberá a opção pela conservação do nome de casado."(Código Civil de 2002)(grifos nossos)

Há uma perplexidade com referência a necessidade da identificação de um culpado para o término do casamento, pois tal postura mostra-se nitidamente punitiva, impondo uma pena ao cônjuge culpado pelo "fim do amor".

Mas como o juiz pode identificar o culpado pelo fim do amor? Quando e quem deu causa a ele?

O estudo da doutrina nacional revela que, quando da separação e do divórcio, a perda do patronímico da mulher que incorporou ao de sua família de origem, o do marido, agora também patronímico dela, estará sempre – e ainda – relacionada à culpa sem considerar o direito à identidade, tônica primordial da questão. [26]

O fato de um consorte adquirir o nome do outro não importa em ficar a sua personalidade absorvida. [27]

O ideal seria que o Código Civil de 2002 tivesse previsto apenas que a mulher e o homem, como regra, conservassem o patronímico adquirido, podendo renunciá-lo se e quando este não tiver se incorporado à sua identidade, excluindo por completo as palavras "inocente" e "culpado" do artigo 1.578.

Outro ponto a ser considerado é o nome da viúva, pois não há lei que trate especificamente deste assunto, somente do nome da mulher, quando do casamento ou da separação ou divórcio. Se analisarmos, portanto, o nome com base nos direitos de personalidade veremos que cabe somente a viúva decidir se quer ou não manter o sobrenome do marido, conforme suas necessidades para manutenção de seu direito à identidade, sendo um direito personalíssimo.

A doutrina e a jurisprudência admitem a mutabilidade, não havendo fundamentação legal para a manutenção ao do patronímico do marido ao nome da viúva.

O nome, como direito da personalidade, opera a "ligação entre o indivíduo e a sociedade em geral", identificando a pessoa em suas relações profissionais e sociais. [28]

6. Chefia da Sociedade Conjugal

O exercício dos direitos e deveres conjugais pertence igualmente a ambos os cônjuges, pois, lhes foi conferido conjuntamente o exercício da direção da sociedade conjugal, não colocando qualquer dos cônjuges em posição inferior, preocupando-se somente em harmonizar os interesses comuns da família.

"Artigo 1.567 – A direção da sociedade conjugal será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos.

Parágrafo único – havendo divergências, qualquer dos cônjuges poderá recorrer ao juiz, que decidirá tendo em consideração aqueles interesses."(Novo Código Civil)

Desaparece, assim, a idéia de chefe de família, indicada pelo artigo 233 do Código Civil de 1.916, que colocava a mulher em posição subalterna, e que somente foi atenuado pelo artigo 240 do mesmo codex, com redação da Lei nº 6.515/77, pelo qual a mulher passava a ser, com o casamento, companheira, consorte e colaboradora do marido nos encargos da família, cumprindo-lhe velar pela direção material e moral desta.

"Artigo 233 – O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a colaboração da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos...." (Código Civil de 1.916)

"Artigo 240 – A mulher, com o casamento, assume a condição de companheira, consorte e colaboradora do marido nos encargos de família cumprindo-lhe velar pela direção material e moral desta."(Código Civil de 1.916)

Portanto, o novo Código Civil ao conferir à esposa o direito de decidir conjuntamente com o marido sobre as questões essenciais de interesse familiar, substitui o poder decisório do marido pela autoridade conjunta dos cônjuges, e instaura efetivamente a isonomia conjugal tanto nos direitos e deveres do marido e da mulher, como no exercício desses direitos.

Agora, o marido não exerce mais sozinho a direção da sociedade conjugal, devendo, por lei, ouvir a mulher antes de tomar uma decisão que envolva os interesses familiares, e se essa decisão for tomada de forma unilateral ou/e contrariar os interesses de um dos cônjuges ou da família, o cônjuge que se sentir prejudicado poderá recorrer ao Judiciário para solucionar o conflito.

Porém, devemos ter sempre em mente que entre esses poderes de direção da sociedade conjugal não se encontram incluídos os poderes de intervir nos assuntos particulares (de índole pessoal) do outro cônjuge, devendo cada pessoa ter seu livre-arbítrio mesmo dentro do casamento.

Convém deixar bem claro que o cônjuge é representante legal da unidade familiar, mas não de seu consorte; para tanto seria imprescindível um mandato regular. [29]

Os cônjuges são defensores da família no que atina aos direitos e interesses comuns na órbita cível ou criminal.

7. Subsistência da Família: dever de ambos os cônjuges

No Código Civil de 1.916 o artigo 240, com redação da Lei nº 6.515/77, trazia que a mulher com o casamento passaria a ser "companheira, consorte e colaboradora do marido nos encargos da família, cumprindo-lhe velar pela direção material e moral desta". Com isso, a esposa passou a ter a condição de sócia e não de submissa ao marido. Este preceito foi mantido pelo Novo Código Civil equiparando os direitos e deveres dos cônjuges, neste caso, principalmente os deveres:

"Artigo 1.565 – Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família... ."(Código Civil)(grifos nossos)

"Artigo 1.568 – Os cônjuges são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família e a educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial."(Código Civil de 2002)

Assim, o dever de sustento cabe a ambos os cônjuges, que serão obrigados a contribuir para as despesas feitas no interesse do casal e dos filhos na proporção dos recursos e rendimentos de cada um.

Portanto, impõe-se tanto a mulher como ao homem o ônus de manter a família, mais uma vez coroando o princípio da igualdade entre os cônjuges.

Na vigência do Código Civil de 1.916, o marido era o chefe da sociedade conjugal e devido a este status lhe cabia o encargo de prover a família, tendo como única exceção a essa imposição, a concorrência dos rendimentos dos bens particulares da mulher, isto se nada estivesse estipulado em pacto antenupcial.

Porém, a evolução da sociedade e as lutas emancipatórias acabaram por tirar a mulher de dentro do lar, e por conduzindo-la à atividades remuneradas. Por esse motivo não se justificar mais que a mulher somente auxiliasse o marido com os rendimentos de seus bens particulares, pois tal situação não condiz com a realidade moderna, sendo que esses fatos figuravam em 1.916, quando, ainda vigia a separação dos bens particulares da mulher.

Hoje, ao contrário, a mulher percebe seus rendimentos e é justo que participe do sustento da família.

Mas na prática, o sistema antigo em muitos casos ainda prevalece, onde o homem é o arrimo da família, ou seja, somente o cônjuge varão exerce profissão fora do lar e a esposa se ocupa dos afazeres domésticos e da criação dos filhos, neste caso, realmente, só o marido possui meios econômicos para manter a esposa e filhos, já que está não percebe rendimentos.

8. Domicílio Conjugal

A liberdade para fixação do domicílio conjugal sempre foi uma batalha das mulheres, pois este sempre foi determinado e imposto pelo marido, sem que a esposa pudesse se opor ou mesmo argumentar sobre o assunto, como consta no artigo 233, inciso III, e artigo 36, parágrafo único, do Código Civil de 1.916:

"Artigo 233 – O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a colaboração da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos. Compete-lhe:

...

III – o direito de fixar o domicílio da família, ressalvada a possibilidade de recorrer a mulher ao juiz, no caso de deliberação que a prejudique;"(grifos nossos)

Artigo 36 – Os incapazes têm por domicílio o dos seus representantes.

Parágrafo único – A mulher casada tem por domicílio o do marido, salvo se estiver desquitada (art. 315), ou lhe competir a administração do casal (art. 251)"(Código Civil de 1.916)

Como se pode observar, competia somente ao marido fixar o domicílio do casal, bem como, modifica-lo sem qualquer restrição, e o pior, conforme a legislação antiga os cônjuges tinham o dever de viverem no mesmo domicílio. Desta forma, cada vez que ao marido aprouvesse altera-lo a mulher tinha a obrigação de acompanha-lo.

Antes da Lei do Divórcio, de 1.977, o fato da mulher injustificadamente se recusar a acompanhar o marido caracterizava abandono de lar, desde que transcorresse dois anos da data da recusa, e se essa recusa datasse de menos tempo, caracterizaria injúria grave, ou seja, em ambos os casos a mulher era penalizada por tentar exercer sua liberdade, sua própria vontade, pois ambos os casos eram pressupostos suficientes para o pedido de desquite (art. 317 do Código Civil).

Mesmo com a Lei do Divórcio, que revogou tais artigos do Código de 1.916, continuava o problema, porém, agora devendo se apurar se a recusa da mulher em acompanhar o esposo era justa ou não.

O Estatuto da Mulher Casada estabeleceu apenas que o domicílio continuaria sendo fixado pelo marido, ressalvada a possibilidade de recorrer a mulher ao juiz, no caso de deliberação que a prejudique, portanto, seguiu apenas a jurisprudência já aplicada na época.

A harmonia com relação a esta desigualdade e discriminação somente foi alcançada com a Constituição Federal de 1.988, que através do princípio da isonomia, revogou tal preceito, que foi corrigido e corretamente elaborado no Código Civil de 2002.

"Artigo 1.569 – O domicílio do casal será escolhido por ambos os cônjuges, mas um e outro podem ausentar-se do domicílio conjugal para atender a encargos públicos, ao exercício de sua profissão, ou a interesses particulares relevantes."(Código Civil novo)

Desta forma, o domicílio do casal será escolhido pelos cônjuges de comum acordo, sendo que se houver divergências, o juiz decidirá qual das partes desfruta das melhores razões. Há também a possibilidade de qualquer dos cônjuges se afastar do domicílio conjugal, o que diminui as causas de divergências.

9. Guarda dos Filhos: extinção da prevalência da mãe

Neste tópico, a evolução do nosso Direito de Família é nítida, principalmente, se observarmos que a solução encontrada no Código Civil de 1.916 chega a ser traumatizante para as crianças, pois trazia em seu artigo 326, como regra geral, que quando do desquite judicial, os filhos menores ficariam com o cônjuge "inocente", mais uma vez utilizando-se arcaica concepção de "inocência", e, pelo parágrafo primeiro deste dispositivo, em caso de culpa de ambos os cônjuges, a mãe teria o direito de ficar com as filhas enquanto menores e com os filhos até seis anos de idade, sendo que, ao completarem esta fase, os meninos deveriam ser entregues aos cuidados do pai.

Um completo absurdo!

Na prática era desumano e inconveniente arrancar o filho da companhia da mãe, na qual ele se encontrava bem, apenas porque a legislação assim determinava, pois o mesmo havia completado seis anos de idade.

Ademais, como proferiu o ilustre mestre Silvio Rodrigues "...filho não é gado, que se separa com base na idade, na compleição e no peso, sendo talvez conveniente criar a família unida." [30]

Tanto que com o advento do Estatuto da Mulher Casada, em caso de culpa de ambos os cônjuges, os filhos deveriam ficar com a mãe, salvo se o juiz verificasse que de tal solução poderia advir prejuízos para as crianças, principalmente de ordem moral.

Tal preceito prevaleceu até a vigência do Novo Código Civil que trouxe no bojo do artigo 1.584, mais uma vez utilizando-se do princípio constitucional da isonomia entre os cônjuges, que na hipótese acima referida, a guarda dos filhos será atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.

"Artigo 1.584 – Decretada a separação ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições de exercê-la.

Parágrafo único – Verificando que os filhos não devem permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, o juiz deferirá sua guarda a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, de preferência levando em conta o grau de parentesco e a afinidade e afetividade, de acordo com o disposto na lei específica."(Código Civil de 2002)(grifos nossos)

Atualmente, grande parte das mulheres trabalha fora do lar, alteraram-se os costumes, ambos os cônjuges exercem profissões e dividem as tarefas e os cuidados com os filhos, de modo que devem ser tidos, a princípio, em iguais condições de guarda-los, cabendo ao juiz, no caso concreto, avaliar qual deles está mais habilitado ao exercício da guarda, sem qualquer prevalência feminina. [31]

Assim, o princípio da isonomia, neste aspecto vale também para igualar pai e mãe, que com o advento do Novo Código devem ser tratados pela lei em absoluta igualdade de condições, excluindo completamente o fator "culpa na separação" como razão determinante da perda da guarda. A guarda dos filhos deve ser estabelecida com base no princípio da prevalência dos interesses dos menores, observando que nem sempre o cônjuge "inocente" pode preservar tais interesses.

O Novo Código Civil atende aos princípios constitucionais da plena igualdade entre homens e mulheres e da proteção à criança e ao adolescente, excluindo a prevalência da mãe na atribuição da guarda dos filhos, bem como, eliminou o regime de perda da guarda por culpa na separação judicial, valorizando, sobretudo, as relações de afinidade e afetividade para sua fixação, de modo que preserve a dignidade dos filhos.

Mas, na prática, devemos observar como saliente Silvio Rodrigues que esta decisão de quem melhor condições apresenta para exercer a guarda dos filhos "pode envolver uma investigação demorada, que parece-me, não está no propósito do legislador, pois o problema reclama uma solução rápida. O juiz deve concluir com relativa celeridade a quem compete a guarda dos menores. Sua decisão, contudo, é suscetível de recurso." [32]

10. A Substituição do "Pátrio Poder" pelo "Poder Familiar"

Como podemos observar o Novo Código Civil, principalmente na área do Direito de Família muito se respaldou na Constituição Federal, pois, mais uma vez atendeu os princípios constitucionais, interagindo para que haja mais equilíbrio entre os cônjuges, na relação familiar, protegendo mais os filhos, e para tanto, estabelecendo, em lugar do "pátrio poder", o poder familiar, conferido-o, conjuntamente ao pai e à mãe.

"Poder Familiar" é a expressão adequada, visto que os pais têm esse poder em função dos interesses do casal e da prole. Todavia, há quem ache que seria preferível a locução poder parental por ser prerrogativa dos genitores e não da família. [33]

Na verdade, o poder familiar pode ser definido segundo José Virgílio Castelo Branco Rocha, "como um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido, em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho." [34]. Assim, os cônjuges têm igualdade de condições e o mesmo poder decisório sobre a pessoa e bens dos filhos menores e não emancipados.

O poder familiar encontra-se disposto no Capítulo V, do Subtítulo II – Relações de Parentesco, do Título I – Do Direito Pessoal, do Livro IV – Do Direito de Família, do Novo Código Civil, ou seja, do artigo 1.630 a 1.638.

"Artigo 1.630 – Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores."

Não há mais a prevalência do pai sobre a prole, ficando igualado o direito aos cônjuges de administrarem a vida dos filhos menores, modificando o preceito do artigo 379 e seguintes do Código Civil de 1.976, que traziam:

"Artigo 379 – Os filhos legítimos, os legitimados, os legalmente reconhecidos e os adotivos estão sujeitos ao pátrio poder, enquanto menores."

"Artigo 380 – Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores passará o outro a exerce-lo com exclusividade."(grifos nossos)

Portanto, fica claro que nossa antiga legislação civil não somente concedia ao pai o pátrio poder, podendo a mulher apenas auxilia-lo, o que demonstra a desigualdade completa entre homens e mulheres imposta pelo legislador, como também, faz questão de enumerar as classes de filhos, o que também é uma forma de discriminação, mesmo que lhes concedendo tais direitos.

Hoje, no entanto, na constância do casamento ou da união estável cabe o poder familiar "aos pais", a ambos. E, em caso de divergências entre os pais, qualquer um deles poderá recorrer ao Judiciário para solucioná-las.

No caso de separação ou divórcio, e até mesmo de rompimento da união estável, a titularidade do poder familiar não se alterará, porém, o seu exercício ficará com aquele que detiver a guarda dos filhos menores do casal, não significando que se o outro detentor do poder familiar não concordar com qualquer atitude do possuidor da guarda dos filhos, não poderá recorrer ao magistrado para solucionar o problema.

Ainda, no caso de guarda compartilhada o exercício do poder familiar competirá ao casal parental, visto que o casal conjugal deixou de existir. [35]

11. Pensão Alimentícia para Todos

As mulheres conquistaram direitos legítimos de igualdade jurídica, e essa igualdade trouxe para as mesmas não só direitos, mas também deveres e julgamentos afinados com a modernidade. Esse é o caso dos alimentos que decorrem da mútua assistência, um dever que persiste diante da isonomia consagrada pelo artigo 226, parágrafo quinto, da Constituição Federal.

O dever de alimentos aos filhos menores cabe a ambos os pais, subordinando-se a necessidade do alimentando e a capacidade econômica do alimentante, sendo que este dever de sustento se encerra com a maioridade civil dos filhos.

"Artigo 1.703 – Para a manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente contribuirão na proporção de seus recursos."(Novo Código Civil)

Já o Novo Código Civil traz em seus artigos 1.694 e 1.702, que um dos cônjuges também pode requerer alimentos ao outro no caso de separação do casal, desde que o requerente seja considerado "inocente" na ação de separação e que o requerido possua possibilidades financeiras para tanto. Mais uma vez, o problema da "inocência" do cônjuge na separação, se apresenta como forma de discriminação, já que na maioria dos casos não há como o juiz verificar qual o culpado pelo término do casamento, e muitas vezes, não importa em nada tal verificação.

E também foi fixado pelo nosso novo codex, que se na separação houver "culpa recíproca" dos cônjuges, ambos perderão o direito aos alimentos.

"Artigo 1.694 – Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

§1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

§2º Os alimentos são apenas os indispensáveis para à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia."(Código Civil)

"Artigo 1.702 – Na separação judicial litigiosa, sendo um dos cônjuges inocente e desprovido de recursos, prestar-lhe-á o outro a pensão alimentícia que o juiz fixar, obedecidos os critérios estabelecidos no artigo 1.694.

Esse dever de sustento do marido à esposa já havia desaparecido mesmo antes da promulgação da Constituição Federal de 1.988 – desde que a esposa pudesse prover sua própria subsistência – tendo essa alteração sido operada por força da Lei nº 4.121 de 1.962, e mais tardiamente com o advento da Lei nº 6.515, de 1.977, Lei do Divórcio. Ademais, as mulheres casadas alcançaram um patamar de independência econômica e jurídica que possibilitava essa alteração. E para apaziguar o ânimo dos que não concordavam com a conquista desse dever feminino, veio a CF/88 que estatuiu a perfeita igualdade jurídica entre marido e mulher e que foi mantida pelo Novo Código Civil, assim, os deveres conjugais passaram a poder ser exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

O dever de prestar alimentos fundamenta-se na solidariedade familiar, no dever legal de assistência em relação ao cônjuge ou companheiro necessitado. [36]

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CABRAL, Karina Melissa. A mulher e o Código Civil de 2002:: a confirmação do princípio da isonomia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 524, 13 dez. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6028. Acesso em: 23 dez. 2024.

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