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Aspectos destacados dos shopping centers

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Agenda 01/10/2000 às 00:00

DA RES SPERATA

Mais uma das novidades introduzidas pela expansão do mercado de Shopping centers. Não que seja criação sua, porém trata-se de uma das quais encontrava-se em desuso e que, para não destoar das características atinentes aos aspectos relativos aos Shopping, também causou muita polêmica.

Inicialmente, com fito esclarecedor, citamos Fernando Albino A. de Oliveira (in RDT 45/169), que com muita propriedade nos diz:

"Trata-se da importância paga pelo lojista como retribuição pelos estudos técnicos procedidos pelo empreendedor do shopping center, envolvendo pesquisas de mercado, estudos de viabilidade econômica, de projetos e de alocação do tenant mix, garantia de reserva de espaço e direito de participar da estrutura organizacional do shopping center."

Em face da colocação acima transcrita, claro nos resta que a Res Sperata nada mais visa do que remunerar o Empreendedor pelos estudos técnicos e pela viabilização do empreendimento, garantindo destarte o direito de participar deste e auferir dos benefícios por si criados.

Ainda para reforçar nossa visão, temos que:

"A ‘res sperata’ no caso representa verdadeira coisa incorpórea em potência, que, em breve, se traduzirá (ou já se traduziu) no fornecimento de uma estrutura, dispendiosa e dinâmica posta a disposição do locatário, já pronta: algo que acede à parcela do fundo de comércio do inquilino, pertencente ao desenvolvedor em relação à loja, durante a locação.

Essa parcela é muito conhecida nos contratos de franchising, em que o franqueado paga, a título de participação inicial, determinada importância, sem prejuízo da obrigação do pagamento das prestações em caráter periódico, matéria que será examinada no item referente à franquia.

Dito isso, verifica-se que a atividade desenvolvida pelo empreendedor na formação do tenant mix ou simplesmente mix, inclusive na pré-seleção das lojas e espaços, em função do conjunto, tem um valor do qual o lojista se beneficiará, para o qual contribuirá com a sua parcela."

Sob o ponto de vista legal, vemos que a Res Sperata se enquadra tão somente como uma garantia de participação no empreendimento e remuneração da infra estrutura, sendo pois um contrato acessório que em nada se confunde com arras, mútuo ou luvas, e que geralmente evidencia-se com o título de "Contrato de Cessão Parcial de Uso de Infra Estrutura Técnica", entre outras denominações.

Frise-se por derradeiro, que ao Empreendedor só é lícito cobrar a Res Sperata na primeira locação do espaço comercial, ou seja, no momento em que negocia pela primeira vez a "loja", eis que a partir de sua cobrança transfere-se ao lojista o direito de gestionar tais valores junto ao Empreendedor e/ou a um futuro lojista em caso de cessão ou sublocação. Não que tal valor deva ser restituído pelo empreendedor ao lojista, mas se partirmos da premissa que este corresponde à indenização devida pela fruição de toda uma infra estrutura, somada a esta toda uma clientela em potencial, justo se torna que o lojista incorpore tal valor ao seu ponto comercial.


DA AÇÃO RENOVATÓRIA

Pacificada a discussão inicialmente aventada, em torno da classificação do contrato firmado entre lojista e empreendedor no tocante a ser ou não tipicamente uma locação e, ante ao estatuído na Lei 8.245/91 (Lei de Locações) também já referido nesta dissertação, outra conclusão não há senão de que lojista e empreendedor afiguram-se também como Locatário e Locador.

Ante ao exposto, cabe então uma análise, ainda que perfunctória, do instituto da Ação Renovatória, instrumento colocado à disposição do lojista, por força expressa do artigo 51, onde vemos:

Art. 51 – Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:

I – O contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;

II – O prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos, seja de cinco anos;

III – O locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos.

No ponto anterior discutimos acerca da Res Sperata, e vimos que a mesma possui, entre outros objetivos o de remunerar, ainda que em parte, o fundo de comércio que é disponibilizado pelo empreendedor em favor do lojista. Em assim procedendo, ou seja, anuindo o lojista à Res Sperata, reverterá em favor de si o direito de, via de regra, firmar um contrato de locação em prazo mínimo de cinco anos.

Pois bem, diz o texto de lei acima transcrito que sendo o contrato firmado com prazo determinado, e tal prazo, ininterruptamente ou por somatória, alcance cinco anos, caberá ao locatário (lojista) a faculdade de pleitear judicialmente a continuidade de sua relação locatícia e, por via direta, de sua atividade comercial.

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Tal previsão legal reveste-se de proteção ao lojista, em especial ao seu fundo de comércio eis que este, não raramente, é constituído a duras penas, fruto de esforço, investimento e muito trabalho na busca da consolidação de sua loja e da clientela desta.

Neste sentido, Caio Mário muito bem nos leciona:

"O que não se pode perder de vista é que a renovação compulsória da locação não se compraz com a intervenção judicial no sentido de mudar a estrutura original do contrato. Em termos de shopping center o princípio é relevante, no sentido de que deve ser respeitada a idéia central da predominância do maior valor entre o percentual sobre o faturamento bruto e a parte fixa." (Shopping Centers – Aspectos Jurídicos – pág. 86)

Assim, evidencia-se que, em sede de shopping center, o cerne a ser discutido por meio de Ação Renovatória é tão somente a dilação do prazo de validade dos contratos firmados e não a alteração de suas cláusulas. Importante frisar também, que nesta mesma ação, dado o caráter peculiar do objeto da ação, alteram-se unicamente os valores dos aluguéis mínimos, permanecendo inalteradas as estipulações relativas ao aluguel percentual, eis que este não sofrerá por corrosão inflacionaria ou supervalorização.

Por fim, destacamos ainda os questionamentos oriundos da inserção nos contratos de shopping center de cláusula direcionada a inibir o direito à renovatória nos casos de não atingimento de certos patamares de faturamento preestabelecidos.

Neste tema, comungamos do pensamento de Cláudio Santos, que diz:

"Manifesto minhas reservas à eficácia desta condição. Pode parecer ‘in fraudem legis’. Aparenta cláusula com o intuito de anular um benefício conferido pela lei ao locatário, e, que, no caso, é reconhecido ao lojista, segundo o escrito no artigo 52, § 2o , e do artigo 54, este a conferir o exercício das ações, cujos procedimentos estão regulados pela lei 8.245/91".


FUNDO DE COMÉRCIO

Buscando definir qual seja o melhor conceito para Fundo de Comércio, vemo-nos obrigados a inicialmente discorrer, ainda que não com o detimento que gostaríamos, acerca de suas características, sua constituição, suas peculiaridades.

Quando uma determinada pessoa objetiva exercer o ofício de intermediador entre a produção e o consumo, característica inerente ao comerciante, mister se faz que reuna em torno de si toda uma infra estrutura a ser empregada na consecução de seu intento. A esta infra estrutura Amador Paes de Almeida muito bem conceitua de Fundos Econômicos.

Assim, quando no efetivo deslinde de suas atividades o Comerciante vê-se obrigado a agregar outras necessidades, que vão além da infra estrutura nominada anteriormente e, quando finalmente, da conjugação de todas as medidas, providências, necessidades e atividades o comerciante abre portas ao público, estará por criar, pois, o seu Fundo de Comércio.

Ora, de tudo o que fora transcrito até aqui, nada mais simples do que conceituar Fundo de Comércio como: "conjunto de bens materiais e imateriais, corpóreos e incorpóreos, que constituem o estabelecimento comercial".

Agora, diante das afirmações acima transcritas, necessário se faz que tracemos um paralelo que as una aos shopping centers. Desta feita, veremos que nos deparamos então com um grande fundo de comércio, construído e projetado a partir da intenção do Empreendedor e levada a termo com a somatória de esforços com os lojistas.

Desta análise, surge uma grande indagação. A quem pertence, afinal, o fundo de comércio de um shopping center ?

Para responder tal questionamento nos valemos do ensinamento de Fernando A. Albino de Oliveira que escreve:

"Portanto não há como negar a existência de um fundo de comércio tanto do empreendedor como do comerciante.

O shopping tem o seu fundo de comércio consubstanciado na própria concepção do empreendimento, na distribuição inteligente e eficaz dos vários ramos de negócio (tenant mix), na estrutura organizacional, na administração, na idealização constante de campanhas promocionais. O comerciante lojista detém a boa imagem do seu nome, marca e sinal distintivo, a especialização no ramo de negócio, o saber promover e vender aqueles produtos, o que lhe proporciona faturamento adequado, do qual o empreendedor participará.

Pode-se dizer que o shopping nada seria sem os bons lojistas; e estes devem parte de seu faturamento ao fato de estarem em um shopping bem concebido e administrado. Há, portanto, uma convergência de interesses."

Evidente, pois, que o fundo de comércio dever ser analisado distintamente, ressalvada a premissa de que ao lojista coube, antecipadamente, o pagamento de determinado valor – denominado res sperata – o qual tinha o objetivo de indenizar o empreendedor pela cessão de parte de seu fundo.


DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Por fim, encerrando a análise dos aspectos que mais tem se destacado em termos de Contratos de Shopping Center, e mais que nesta sede, mas em todos os campos do direito, em função da necessidade de prover-se a necessária segurança jurídica à intrincada vida que leva-se nos dias atuais. Falamos pois da Responsabilidade Civil.

Num simples artigo, especificamente o artigo 159 de nosso código civil, o qual trazemos abaixo, vemos encerrada toda uma capacidade de análises, discussões e probabilidades quanto à sua aplicação.

Artigo 159 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

O próprio doutrinador Caio Mário destaca a dificuldade de que se estabeleça um conceito abrangente e preciso o suficiente para a Responsabilidade Civil, e, para corroborar tal observação basta que se consulta nossos ementários de jurisprudência onde uma gama imensurável de decisões baseiam-se em tão simples artigo para garantir à parte considerada lesada o seu direito de ressarcimento.

Dada sua amplitude, também em sede de shopping center, buscaremos nos ater mais especificamente a quatro hipóteses de ocorrência, quais sejam: furtos em estacionamentos de veículos; furtos ocorridos no interior das lojas; pela qualidade dos produtos e pela má administração do empreendimento.

Antônio Lindberg Montenegro com muita propriedade nos alerta para a deficiência de normas tradicionais de nosso direito para situar e posicionar a responsabilidade de cada componente do empreendimento, e continua:

"... seja como for, em caso de dúvida, o prejudicado dever acionar diretamente o empreendedor. Sua figura, com efeito, está por trás de tudo quanto acontece na organização, da qual ele é o criador e o mais interessado no sucesso, por ser seu beneficiário direto."

No tocante à qualidade do produto comercializado pelo lojista participante do empreendimento não há maiores dúvidas a serem suscitadas, uma vez que em sendo ele o profissional, o "entendido" no assunto, estando tal produto inserto no metier do lojista, resta por óbvio que a este caberá a responsabilização por eventuais danos advindos destes, ainda que o lesado acione diretamente o empreendedor este tratará de redirecionar responsabilidades à quem devida, no caso o lojista.

Quanto a furtos ocorridos no interior do shopping ou das suas lojas podemos estabelecer algumas diferenciações. Em primeira análise, cabe ao empreendedor prover a segurança do shopping como um todo, mesmo porque, via de regra, cabe ao lojista participar no rateio de seus custos. Em segundo plano surgem casos onde além da segurança provida pelo empreendedor, existem cláusulas insertas nos instrumentos firmados com os lojistas, prevendo a obrigatoriedade de acautelar-se (o lojista) através da contratação de seguro específico contra roubos. Assim, em sede de roubos e/ou furtos no interior do shopping, há que se analisar a situação ocorrida e suas previsões contratuais.

Com relação a furtos ocorridos no interior de estacionamentos dos shopping centers muita controvérsia viu-se até um passado recente. Se por um lado o usuário lesado pugnava por ressarcimento, por outro o empreendedor alegava não ser o responsável ante a gratuidade da utilização. Muito se discutiu, até que pacificado restou tal tema, pelo que colamos algumas decisões recentes que refletem a tendência atual de nossa doutrina e jurisprudência.

"DANOS EMERGENCIAIS – Furto de veículo em estacionamento – Responsabilidade aquiliana – Indenização – Embargos Rejeitados.

Se o conglomerado econômico atrai o consumidor para seu centro de compras, deve arcar com a correspondente responsabilidade da preservação do patrimônio do particular que ali estaciona seu veículo. (ementa). (8a CC do TJSP – EI 115.853-1)"

"ESTACIONAMENTO – Furto de Objetos em veículo estacionado – Responsabilidade Civil – Recurso Improvido.

O relacionamento existente entre cliente, usuário do estacionamento e a administração do shopping center não se caracteriza como contrato de depósito típico, posto há, a desnaturá-lo, prestação de serviço que podem ser definidos como de segurança.(ementa) (7a CC do TJSP – Ap. Cível 77.285-1).

Por derradeiro, cabe destacar, ainda, a responsabilidade civil advinda da má administração do empreendimento por parte de seus mentores (empreendedores). Levando-se em conta que todo empreendimento visa o lucro, este deve ser o objetivo maior, porém com os devidos cuidados e a atenção aos preceitos da ordem jurídica. Assim, toda e qualquer manifestação contrária à ordem jurídica que possa reverter em prejuízo aos lojistas, bem como a inoperância de seus administradores devem ser suportados por que a eles der causa, sob pena de, em havendo o repasse de prejuízos aos lojistas, estar havendo o locupletamento ilícito do empreendedor.


BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, Amador Paes de – Locação Comercial – Editora Saraiva - 9a Edição – 1997

KARPAT, Ladislau – Shopping Centers Manual Jurídico – Editora Hemus – 1a Edição – 1993

VERRI, Maria Elisa Gualandi – Shopping Center Aspectos Jurídicos e Suas Origens – Editora Del Rey – 1a Edição – 1996

COMBRE, Nilton da Silva – Teoria e Prática da Locação de Imóveis – Editora Saraiva – 4a Edição – 1997

BUSHATSKY, Jaques – Shopping Center visto pelos Tribunais – Editora Edipro – 1a Edição – 1993

PINTO, Roberto W. Renaut (e outros) – Shopping Centers Questões Jurídicas – Editora Saraiva - 1991

      
Sobre o autor
Paulo Henrique Wendt

advogado da Martinelli Advocacia Empresarial, em Joinville (SC)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WENDT, Paulo Henrique. Aspectos destacados dos shopping centers. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/611. Acesso em: 22 nov. 2024.

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