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A colisão entre princípios constitucionais em casos de liminares "inaudita altera partes".

As formas de solução. Análise de casos

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Agenda 03/01/2005 às 00:00

VI – AS LIMINARES INAUDITA ALTERA PARS E OS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO – A NECESSIDADE DE PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

A partir do presente momento, mister é enfrentar o pano de fundo do presente trabalho - a análise do cabimento de decisões inaudita altera pars (medidas acautelatórias ou antecipatórias [40]) e a eventual existência colisão entre alguns princípios constitucionais do processo.

Não se deve olvidar que existem vários princípios constitucionais processuais, dentre os quais o devido processo legal [41], ampla defesa, contraditório [42] e mesmo o acesso à justiça. Por essa razão, comumente se indaga se as medidas liminares constituem violação aos princípios constitucionais do processo, principalmente em relação ao réu que, antes mesmo de ser citado para apresentar defesa, é instado a adotar determinada conduta, em atendimento à determinação judicial initio litis.

Como restou claro nos capítulos anteriores, não há que se falar em violação a princípio, e sim análise visando uma correta valoração, dentro da chamada lei de colisão.

Contudo, existem casos concretos onde se pode observar clara colisão entre princípios constitucionais, como nas hipóteses envolvendo as ‘tutelas de urgência’.

Com efeito, utilizar-se-á como exemplo uma demanda cominatória, onde o autor pretende medida liminar para obstar a publicação de matéria na imprensa, com fundamento nos arts. 287 e 461, parágrafo 3º do Código de Processo Civil. O autor será chamado hipoteticamente de José e o réu Jornal X.

O jornal, por hipótese, já possui totalmente editada e pronta para divulgação matéria jornalística que irá causar prejuízos financeiros e morais à José (suposto comerciante).

O demandante, sabedor do conteúdo da matéria e visando comprovar a falta de veracidade da reportagem, propõe demanda declaratória com base nos arts. 5º, 282, 287 e 461 do CPC, requerendo tutela antecipada para que seja determinada conduta negativa ao réu, antes mesmo de sua citação, fundamentada no parágrafo 3º do último artigo citado.

As principais questões que serão enfrentadas pelo julgador são: a liminar antes da citação do réu violará os princípios da ampla defesa e contraditório; não seria adequado e correto deixar publicar a matéria e, após, solucionar o litígio mediante indenização pelos danos eventualmente causados? Qual a saída para o julgador, proteger a liberdade de imprensa – com a publicação da reportagem, ou o direito individual do autor?

In casu, é mister observar que há clara colisão entre disposições constitucionais quando se contrapõe a liberdade de imprensa com o direito individual [43].

Mais uma vez é necessário indagar: a liminar requerida pelo autor viola os princípios da ampla defesa e contraditório, devendo apenas ser concedida (se for o caso) após a resposta do réu? Particularmente, entende-se que não, inclusive considerando os principais objetivos da tutela inibitória, os quais serão ratificados posteriormente.

Contudo, não se pode deixar de aduzir que o problema em questão também enfrenta a colisão entre os princípios do devido processo legal, efetividade da prestação jurisdicional e mesmo o acesso à justiça (considerando que de nada servirá a apreciação da tutela de urgência após a publicação da matéria jornalística) de um lado e de outro os princípios do contraditório e ampla defesa, razão pela qual merece item específico.

VI.A- As liminares e os princípios constitucionais – análise de casos concretos

Como se mencionou anteriormente, o tema tutela antecipada sempre causou profunda divergência de interpretação, inclusive quanto ao momento de cabimento. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso, na decisão a seguir transcrita, entendeu que:

"TUTELA ANTECIPATÓRIA – Pretensão de concessão da medida antes da citação do réu – Inadmissibilidade ressalvada a hipótese do art. 461, parágrafo 3º do CPC – Necessidade de preenchimento de todos os requisitos elencados no art. 273 também do CPC.

Em princípio, não existe previsão de outorga da tutela antecipada, antes da citação do réu, com exceção da hipótese prevista no art. 461, parágrafo 3º, do CPC. Não se deve confundir a tutela antecipada, que adentra no âmago da questão com as medidas cautelares, que a garantia da efetividade do processo. Em homenagem à garantia do devido processo legal, a antecipação só será viável ante o preenchimento de todos os requisitos elencados no art. 273 do CPC, em casos excepcionalíssimos, onde se faça necessária a antecipação provisória" (TJMT – 1ª Câmara – Ai n. 6.849, julgamento em 24.02.97, rel. Dês. Salvador Pompeu de Barros Filho – RT 743/97).

O voto do relator caminha no sentido de somente admitir a concessão da tutela de urgência inaudita altera parte em casos absolutamente excepcionais, como os ligados à vida e à saúde.

Ora, considerando que o problema colocado como paradigma envolve o direito à imagem e a proteção à honra, será que seria possível a concessão de tal medida de urgência?

Utilizando um primeiro raciocínio axiológico, a colisão entre princípios caminhará no sentido de indeferimento da tutela de urgência, sob o argumento da liberdade de imprensa e da possibilidade de ressarcimento posterior dos danos causados. O intérprete teria que enfrentar os seguintes aspectos, com a relação de precedência [44]: a) Quais os princípios envolvidos no problema? b) Quais serão os maiores prejuízos: o da empresa que já elaborou a matéria que está pronta para divulgação, o da liberdade de imprensa, o da sociedade de ser corretamente informada ou o do autor de evitar danos à sua imagem, honra, etc; c) Existe possibilidade de ressarcimento dos danos eventualmente causados ao autor após a publicação da matéria, acaso comprovada sua irregularidade?

Assim, poderá o intérprete chegar a conclusão quanto ao cabimento ou não da tutela antecipada requerida na exordial. Utilizando tal raciocínio, poderá concluir pelo seu incabimento, dando prevalência ao princípio da ampla defesa e contraditório [45], sob o argumento de que os danos eventualmente causados poderão ser ressarcidos posteriormente.

Contudo, mais uma vez é necessário ressaltar que, sob o aspecto do correto andamento processual, esta não seria a solução mais adequada à solução da questão, como se passa a demonstrar:

Com efeito, mais uma vez interpretando o problema já apresentado entre José e o Jornal X, a concessão de medidas liminares inaudita altera pars apenas poderá ocorrer em casos excepcionais, desde que comprovados os requisitos do art. 461, parágrafo 3º. Logo, para conseguir impedir a publicação da reportagem, deverá comprovar todos os requisitos ensejadores da tutela de urgência de não fazer inibitória.

Por outro lado, importante destacar que a decisão initio litis não estará violando os princípios do contraditório / ampla defesa, mas apenas fazendo o exercício de valoração, visando encontrar a correta aplicação da lei de colisão. No problema colocado, portanto, o julgador deveria verificar se os requisitos da probabilidade e da urgência estão presentes, hipótese em que deverá conceder a tutela de urgência inibitória.

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Necessário ressaltar que as tutelas antecipatórias são concedidas em regra diante de cognição sumária e são revogáveis, sendo mais uma razão que corrobora com a afirmação de que não viola o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Essa matéria não é nova no âmbito doutrinário e mesmo jurisprudencial [46]. Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco ensinam que:

"O contraditório não admite exceções: mesmo nos casos de urgência, em que o juiz, para evitar o periculum in mora, provê inaudita altera parte (CPC, arts. 929, 32, 937, 813 ss.), o demandado poderá desenvolver sucessivamente a atividade processual plena e sempre antes que o provimento se torne definitivo" [47].

Ademais, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery aduzem que:

"Liminar sem a ouvida do réu. Quando a citação d réu puder tornar ineficaz a medida, ou, também, quando a urgência indicar a necessidade de concessão imediata da tutela, o juiz poderá fazê-lo inaudita altera pars, o que não constitui ofensa, mas sim limitação imanente do contraditório, que fica diferido para momento posterior do procedimento" [48].

Com efeito, deve-se verificar, em determinado caso concreto, a presença dos requisitos da tutela de urgência. Nas hipóteses envolvendo tutela inibitória, deve o intérprete ter maior cuidado na apreciação dos requisitos, considerando o fato de que pretende o litigante evitar a ocorrência do dano, exatamente como ocorreu no exemplo discutido no presente trabalho, onde José pretende evitar a divulgação de reportagem supostamente danosa à sua imagem e honra. Logo, o direito a uma decisão justa passa, necessariamente, pela não divulgação da matéria, evitando-se um dano muito maior [49] (50) e jamais recuperável in natura.

Por fim, cumpre enfrentar a terceira solução envolvendo o problema posto, que passa pela afirmação de cabimento da tutela de urgência antes da citação do réu, sem que se possa falar em violação ao contraditório ou ampla defesa.

Antes de se apresentar toda a justificativa teórica do presente entendimento, deve-se transcrever a seguinte decisão:

"PROCESSUAL CIVIL – ADMINISTRATIVO – POSSIBILIDADE – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – SEM PRÉVIA AUDIÊNCIA DO RÉU – GRAU DE RECURSO – PRERROGATIVA DO PODER GERAL DO JUIZ – PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS DO ART. 273 DO CPC.

1.A lei não estabeleceu um momento preclusivo para a antecipação da tutela, podendo a mesma ser concedida a qualquer momento, mesmo em grau de recurso, bastando, para tanto, que seja necessária.

2.Antecipação parcial da tutela concedida, em razão da demonstração da prova inequívoca da verossimilhança da alegação, aliada ao receio de dano irreparável, que poderia ser causado à requerente, em ter os débitos em discussão inscritos em Dívida Ativa, bem como seu nome incluído no CADIN, passível, ainda de uma execução fiscal por parte da União Federal / Fazenda Nacional.

3.Inexiste violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, em conceder tutela antecipada, inaudita altera pars, diante da prerrogativa do poder geral do juiz de determinar as medidas provisórias que julgar adequadas.

4.Negado provimento ao agravo interno, Mantida inalterada a r. decisão agravada"(TRF 2ª. Região. Ac – Apelação Cível – 146894. Processo 9702283639 – RJ - 3ª Turma – Relator Juiz Francisco Pizzolante - Data da decisão 02/10/2002. DJU de 28.10.2002).

A grande questão que se coloca é o relacionamento entre as tutelas de urgência e o direito ao contraditório. Como destacado anteriormente, há colisão entre princípios constitucionais, devendo o intérprete utilizar as leis de colisão e aplicar aquele que deve prevalecer em determinado caso concreto.

A partir da reforma que ocorreu em 1994, no Código de Processo Civil, o tema ‘tutela antecipada’ passou a ficar democratizado em todo o processo de conhecimento, desde que presentes os requisitos presentes do art. 273. Contudo, estando presente o requisito negativo – perigo de irreversibilidade – a conduta deverá ser no sentido de negar a tutela de urgência, sob pena de violar o contraditório, conforme previsão expressa do art. 273, parágrafo segundo da legislação adjetiva.

Por outro lado, o grande objetivo da tutela antecipada foi acelerar a marcha procedimental [51],considerando que o fator tempo é um dos maiores obstáculos à efetividade do processo.

Com efeito, a sistemática da tutela antecipada objetivou exatamente, mediante pronunciamento satisfativo, enfrentar o fator tempo de duração da litispendência, permitindo a obtenção de um resultado positivo até mesmo sem a audiência da parte contrária, o que por certo diminui as frustrações e as incertezas decorrente da demora na prestação jurisdicional [52]. O raciocínio leva a uma só conclusão: a tutela antecipada tem como maior objeto o alcance da efetividade do processo e o acesso à justiça.

Aliás, cumpre nesse momento fazer breve transcrição dos Professores Mauro Cappelletti e Bryant Garth acerca do conceito de acesso à justiça:

"A expressão ‘acesso à justiça’ é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos" [53].

É no aspecto do resultado justo e breve é que se permite concessão de medidas de urgência sem a audiência da parte contrária. Aliás, dentro dos chamados novos direitos, o acesso à justiça ganha cada vez maior espaço, devendo ser observado, em cada caso concreto, se estão ou não presentes os requisitos ensejadores da tutela de urgência.

Ademais, a decisão acima transcrita também serve para se observar que não existe qualquer discricionariedade na concessão da tutela antecipada. Deve o julgador verificar se estão presentes os requisitos positivos e se há ou não o perigo de irreversibilidade (óbice à concessão da medida emergencial).

Portanto, se no caso concreto houver a comprovação dos requisitos previstos na legislação adjetiva, a tutela antecipada deve ser concedida, inexistindo qualquer juízo de discricionariedade ao julgador. Nesse sentido, vale mais uma vez citar Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:

"Concessão da liminar. Embora a expressão ‘poderá’, constante no CPC 273, caput, possa indicar faculdade e discricionariedade do juiz, na verdade constitui obrigação, sendo dever do magistrado conceder a tutela antecipatória, desde que preenchidos os pressupostos legais para tanto, não sendo lícito concedê-la ou negá-la pura e simplesmente" [54].

No mesmo sentido, entende José Carlos Baptista Puoli:

"A contrário do que sugere a utilização do verbo poderá no caput do art. 273 do Código de Processo Civil, a decisão a respeito da concessão da tutela antecipada nada tem de discricionária, pois, como visto quando se tratou de forma genérica da questão dos conceitos indeterminados, o ato de preenchimento dos conceitos de prova inequívoca, verossimilhança, etc., não corresponde a ato integralmente livre do juiz, o qual deverá, à luz das circunstâncias do caso concreto, e dos elementos extraídos da doutrina e dos precedentes jurisprudenciais dizer o direito no caso concreto (lembrando-se que o direito não admite a indicação de duas soluções para o caso concreto, entre as quais o juiz poderia livremente escolher uma" (55).

Já José Roberto dos Santos Bedaque ensina que:

"Não tem o juiz, portanto, mera faculdade de antecipar a tutela. Caso se verifiquem os pressupostos legais, é seu dever fazê-lo. Existe, é verdade, maior liberdade no exame desses requisitos, dada a imprecisão dos conceitos legais. Mas essa circunstância não torna discricionário o ato judicial" [56].

Pois bem. A partir da observação da presença dos requisitos da concessão das tutelas de urgência, sem a audiência da parte contrária, deve o julgador ponderar os princípios constitucionais em colisão: efetividade (rapidez – brevidade) do processo, devido processo legal e acesso à justiça, de um lado, e contraditório e ampla defesa, de outro.

Hodiernamente, várias decisões vêm reconhecendo que as medidas liminares não violam, mas simplesmente adiam o exercício do contraditório. Além da citada anteriormente, vale mencionar mais algumas, deixando claro que o assunto em questão é atual e condiz com a necessidade de ponderação entre princípios constitucionais:

"ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REAJUSTE DE 11,98%. NÃO CABIMENTO. PRELIMINAR DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. REJEITADA.

1.A possibilidade de concessão de liminar, inaudita altera parte, não atenta contra as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Preliminar rejeitada.

2.É partir o entendimento, das Primeira e Segunda Turmas deste Tribunal, de que, em hipóteses como a em causa, além de não se fazerem presentes os requisitos estabelecidos pelo art. 273 do Código de Processo Civil, obsta a antecipação da tutela a norma inscrita no art. 1º da Medida Provisória nº 1.570/97, convertida na Lei nº 9.494/97.

3.Agravo provido"(Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Agravo de Instrumento 01000649650 – Processo 199701000649650/MG – 2ª Turma – Relator José Carlos Moreira Alves – DJ de 01.02.1999).

Em seu voto, corretamente registrou o relator que:

"O instituto da tutela antecipada não atenta contra a garantia de acesso ao Poder Judiciário, nem contra o princípio do contraditório e da ampla defesa. Nos termos em que foi introduzida no Código de Processo Civil a tutela antecipada pode ser pleiteada no processo de conhecimento e para sua concessão, no caso do inciso I do art. 273 do CPC, inclusive inaudita altera parte, devem estar presentes três requisitos indispensáveis: prova inequívoca, verossimilhança da alegação; e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Esse último requisito, a me ver, é que determinará ou não a possibilidade e, conseqüentemente, a legitimidade da concessão in limine da medida.

O argumento de que a antecipação de tutela sem oitiva da parte contrária é inconstitucional, por ofensa ao princípio do contraditório, soa desarrazoada, porquanto, a admitir-se sua procedência, ter-se-ia de entender coactada, no próprio ordenamento jurídico, a possibilidade de existência de medida dessa natureza".

Em outra decisão, assim entendeu o Tribunal Regional Federal da 3ª. Região:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. FGTS. SAQUE. PRELIMINAR DE LEGITIMIDADE AD CAUSA E INFRINGÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. LEI 8036/90. PERDA DO OBJETO.

1.Preliminar de legitimidade `ad causam` rejeitada tendo em vista que a mesma deverá ser analisada nos autos da ação principal, não cabendo fazê-lo em recurso de agravo de instrumento.

2.Preliminar de infringência aos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa rejeitada pois é discrição do magistrado conceder a liminar inaudita altera pars, não constituindo desrespeito aos princípios citados.

3.O art. 20, inciso VIII da Lei 8036/90 autoriza o saque quando a conta vinculada do trabalhador no FGTS permanecer sem crédito de depósito por 03 anos ininterruptos.

4.A concessão ou não de medida liminar é ato que fica ao prudente arbítrio do magistrado, encontrando-se dentro de seu poder geral de cautela.

5.Preliminares rejeitadas. Agravo prejudicado pela manifesta perda do objeto"(Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Agravo de Instrumento – Processo 94031062940 – Relator Roberto Haddad – DJ de 21.01.1997).

Já o Tribunal Regional Federal da 1ª Região tem o seguinte precedente:

"ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA.

1. A antecipação, inaudita altera parte, dos efeitos da tutela não atenta contra os princípios constitucionais assecuratórios da ampla defesa e do contraditório, podendo ser deferida, sem a audiência da parte contrária, sempre que seja a providência para evitar a ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação.

2. É verossímil, no caso, a alegação de que a previsão editalícia sobre ser inadmissível recurso contra o resultado do exame psicotécnico não se compatibiliza com a garantia de contraditório e ampla defesa, podendo, ademais, advir aos ora agravados dano irreparável ou de difícil reparação se não lhes for assegurado prosseguir no concurso público, diante da inexorável e definitiva eliminação daí conseqüente.

3. Agravo de instrumento a que se nega provimento, prejudicado o agravo regimental. (TRF - PRIMEIRA REGIÃO - Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO – 01000071430 - Processo: 199901000071430 UF: MT Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA - Data da decisão: 25/04/2000 Documento: TRF100099478 - DJ DATA: 10/08/2000 PAGINA: 17 – Rel. Juiz JUIZ CARLOS MOREIRA ALVES).

ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REAJUSTE DE 11,98%. NÃO CABIMENTO. PRELIMINAR DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA REJEITADA.

1. A possibilidade de concessão liminar, inaudita altera parte, não atenta contra as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Preliminar rejeitada.

2. É partir o entendimento, das Primeira e Segunda Turmas deste Tribunal, de que, em hipótese como a em causa, além de não se fazerem presentes os requisitos estabelecidos pelo artigo 273 do Código de Processo Civil, obsta a antecipação da tutela a norma inscrita no art. 1º da Medida Provisória nº 1.570/97, convertida na Lei nº 9.494/97.

3. Agravo provido "(Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO - Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO – 01000649650 - Processo: 199701000649650 UF: MG Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA - Data da decisão: 20/10/1998 Documento: TRF100071717 - DJ DATA: 01/02/1999 PAGINA: 623 – Rel. JUIZ CARLOS MOREIRA ALVES).

As decisões em questão bem expressam o tratamento que deve ser dado à colisão entre princípios. Mais uma vez é mister ressaltar que não se está, com isso, afirmando que haverá qualquer violação ao contraditório, mas apenas seu adiamento, inclusive pelo fato de que a decisão initio litis é provisória e poderá ser alterada ou mesmo revogada após o exercício do contraditório. Se acaso fosse outro o entendimento, praticamente se iria retirar toda a eficácia da tutela antecipada, transformando-a em verdadeira letra morta dentro do sistema processual.

Com efeito, no caso em questão o problema resolve-se interpretando o peso de cada princípio, prevalecendo o que mais se adequar à realidade discutida nos autos. Se no caso concreto restar comprovada a necessidade de prestação da tutela de urgência em atendimento ao princípio do devido processo legal e visando assegurar o acesso à justiça, assim deverá proceder o intérprete, assegurando em seguida o atendimento ao princípio do contraditório. Também Luiz Guilherme Marinoni enfrenta a questão envolvendo a colisão entre princípios, aduzindo que:

"No caso de conflito de regras, o problema é de validade, enquanto, na hipótese de colisão de princípios, a questão é de peso. Quando há colisão de princípios, um deve ceder diante do outro, conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso significa que, aí, não há como declarar a invalidade do princípio de menor peso, uma vez que ele prossegue íntegro e válido no ordenamento, podendo merecer prevalência, em face do princípio que o precedeu, diante de outro caso concreto.

Esse juízo, pertinente ao peso dos princípios, é um juízo de ponderação, que assim permite que os direitos fundamentais tenham efetividade diante de qualquer caso concreto, considerandos os princípios que com eles possam colidir" [57].

Portanto, estando presentes os requisitos, deverá o magistrado conceder a tutela de urgência, inclusive com a utilização das chamadas `medidas de apoio` e os meios de coerção existentes no sistema [58]. Haverá, nesses casos, limitação imanente ao princípio do contraditório, permitindo ao demandado exercê-lo logo após a concessão da tutela de urgência [59]. Nesse aspecto, vale ressaltar as lições de José Roberto dos Santos Bedaque:

"Se já presentes os pressupostos legais no momento da propositura da ação, nada impede seja a antecipação concedida antes mesmo do ingresso do réu no processo.

Nem mesmo a exigência do contraditório constitui empecilho insuperável à posição ora adotada. São inúmeras as hipóteses de liminar inaudita no sistema processual. Tal solução, excepcional evidentemente, não viola o contraditório, pois a parte contrária, ao tomar conhecimento da medida, possui meios prontos e eficazes para alterá-la. E o princípio em questão, como, de resto, todos os demais, deve ser analisado em conformidade com os escopos maiores do sistema processual" (60).

Percebe-se, portanto, que tanto a doutrina quanto a jurisprudência caminham no sentido de indicar que as medidas liminares sem a audiência da parte contrária não configuram qualquer violação ao princípio do contraditório. Aliás, no exemplo que vem sendo discutido diversas vezes - liminar inibitória evitando divulgação de matéria jornalística – deverá ocorrer a necessária ponderação entre os princípios constitucionais.

Deve-se ressaltar, por oportuno, que entre a tutela inibitória [61] e a ressarcitória, deve-se dar preferência à primeira, justamente pelo fato de que possui como móvel evitar a ocorrência do ato ilícito.

Logo, como se mencionou anteriormente, seria discutível quanto a efetividade da tutela jurisdicional se acaso não fosse concedida medida liminar visando obstar a veiculação da reportagem, resolvendo-se os danos supostamente causados no campo financeiro. Entre ‘apagar o incêndio’ e ‘evitar que ele ocorra’ deve o intérprete buscar a segunda solução; logo, deve ser concedida a tutela de urgência, adiando-se o atendimento ao contraditório e evitando-se que os danos à vida privada possam ocorrer.

Ademais, como mencionado anteriormente, o dano individual eventualmente sofrido em virtude da divulgação da matéria jornalística, jamais poderá ser ressarcido in natura. Sobre o assunto, cumpre destacar as lições de Sérgio Cruz Arenhart, ainda sobre a concessão de liminar inaudita altera pars:

"De qualquer forma, é bom advertir-se: na dúvida, o privilégio sempre há de ser da vida privada. Diante da impossibilidade concreta de se encontrar a fronteira entre os conceitos, sempre é preferível tutelar a vida privada, em detrimento da liberdade de informação. Isto por uma razão óbvia: este direito, se lesado, jamais poderá ser recomposto em forma específica; ao contrário, o exercício do direito à informação sempre será possível a posteriori, ainda que, então, a notícia não tenha mais o mesmo impacto" [62].

Contudo, não se pode deixar de afirmar que a questão realmente é delicada, tendo em vista que enfrenta os limites da liberdade de imprensa. A colisão existe e deve ser analisada pelo intérprete visando alcançar a melhor solução.

Em face de todo o exposto, havendo colisão de princípios nos casos de liminares sem a audiência da parte contrária, as regras de colisão devem ser aplicadas, prevalecendo, sob esse aspecto, a possibilidade de concessão de liminar inaudita altera pars, sem que se possa falar em violação a ampla defesa / contraditório.

Sobre o autor
José Henrique Mouta Araújo

mestre e doutor em Direito Processual Civil pela Universidade Federal do Pará_UFPA, procurador do Estado do Pará, professor da Universidade da Amazônia, do Centro Universitário do Estado do Pará e da Faculdade Ideal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, José Henrique Mouta. A colisão entre princípios constitucionais em casos de liminares "inaudita altera partes".: As formas de solução. Análise de casos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 545, 3 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6133. Acesso em: 4 nov. 2024.

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