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Aborto

A prática do aborto viola um direito superior a todos os outros direitos, considerado pela Carta Maior um direito indisponível, indispensável, e além de tudo, básico para a existência humana. Por esta razão, tal direito não deve ser ignorado.

  RESUMO

Discutir sobre o aborto exige uma análise minuciosa no âmbito teórico, histórico, bem como quais os efeitos produzidos a curto e longo prazo, quer sejam maléficos ou benéficos. Isto porque a prática do aborto viola um direito superior a todos os outros direitos, considerado pela Carta Maior um direito indisponível, indispensável, e além de tudo, básico para a existência humana. Desta feita, antes de simplesmente ignorar o assunto, descriminalizando-o, deve-se ponderar na balança do Direito os efeitos provocados por tal omissão estatal.

Palavras-chave: Aborto. Inconstitucionalidade. Violação. Vida.

INTRODUÇÃO

A prática do aborto, que já fora severamente punida em diversas nações na Antiguidade, atualmente é praticada de forma corriqueira, mesmo sendo ilegal, onde banalizam a vida intrauterina, tratando-a com extremo desprezo e violência. O aborto no Brasil, via de regra, é tipificado no Código Penal, ou seja, é considerado crime.

Contudo, existem hipóteses em que sua prática é considerada lícita. Esta proteção à vida embrionária e fetal é garantida, como dito anteriormente, pela Constituição Federal, em seu artigo 5°, logo, se tratando de garantia fundamental, sendo, portanto, cláusula pétrea, o que impede a emenda que visa aboli-lo. Não obstante a proteção dada pela Carta Maior, existe ainda previsão legal no ordenamento civil e penal, que garante a proteção ao nascituro, responsabilizando aqueles que praticarem o aborto.

Com esta problemática, a sociedade e os governantes devem se posicionar em defesa ao direito à vida, buscando a proteção daqueles seres que estão impossibilitados de se defenderem, dependendo do Estado, suas garantias básicas, sendo que uma possível omissão do mesmo neste sentido seria um enorme retrocesso e notório desrespeito à Constituição Federal, regredindo potencialmente, após anos de lutas em favor da dignidade humana.

CONCEITO DE ABORTO

Segundo lúcida doutrina de Maria Helena Diniz, o termo aborto é:

Originário do latim abortus, advindo de aboriri (morrer, perecer), vem sendo empregado para designar a interrupção da gravidez antes do seu termo normal, seja ela espontânea ou provocada, tenha havido ou não expulsão do feto destruído. (DINIZ, 2014, p.86)

Já a definição sintética dada pelo Novo Dicionário da Língua Portuguesa aborto é um “parto prematuro. O que nasceu antes do tempo próprio. Indivíduo que nasceu disforme”. (FIGUEIREDO, 1913, p. 10)

Em outras palavras, o aborto é o ato voluntário ou involuntário de impedir que a gravidez alcance seu fim natural, ou seja, o nascimento de um novo ser formado. Na definição médica deve haver distinção entre o aborto e o parto prematuro, entendendo que o primeiro seria a interrupção da gravidez nos seus seis primeiros meses.

A PROIBIÇÃO DO ABORTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Após a evolução histórica do tema, os defensores da proteção à vida intrauterina valem-se como fundamento, não somente do art. 5º da Constituição Federal, mas também do decreto nº 678/92 que promulga a referida convenção americana, conforme art. 1º:

Art. 1º. A Convenção Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), celebrada em São José da Costa Rica , em 22 de novembro de 1969, apensa por cópia ao presente decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém. (DECRETO, 1992)

Mesmo com a clara disposição do referido decreto e da convenção, data vênia, há disposições em contrário acerca da aplicação das ordenanças da convenção, em que pese não concordarem com a aplicação da convenção como empecilho para a descriminalização do aborto no Brasil. Vejamos a opinião de Roberto Arriada Lorea:

Sustentar que esse dispositivo impede os Estados signatários do Pacto descriminalizem o aborto, revela enorme desconhecimento sobre a construção histórica da Convenção Americana de Direitos Humanos, ou pior ainda, resvala para a esfera da desonestidade intelectual. (ARRIADA, 2006)

O artigo do nobre doutor Arriada, juiz de direito do estado do Rio Grande do Sul, traz em seu conteúdo brilhantes argumentos sobre a construção histórica do pacto, explicando que a prática abortiva não viola o artigo 4º da supramencionada convenção. No entanto, apesar do respeito devido ao magistrado, não pode-se concordar, uma vez que a bioética, explica o conceito.

LEIS E JURISPRUDÊNCIAS BRASILEIRAS QUE TRATAM SOBRE O ABORTO

A Constituição Federal de 1988 define como fundamental o direito à vida, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade de tal direito. (BRASIL, 1988)

Nesta perspectiva, visando regulamentar a efetividade da proteção a este direito, o Código Penal Brasileiro, no título I, capítulo I, trata dos crimes contra a vida, incriminando em seus artigos 124, 125 e 126 a prática do aborto (BRASIL, 1940). Não obstante o regramento pelo ordenamento mais repressivo do Estado, a prática abortiva também é mencionada na Convenção Americana de Direitos Humanos, que determina que “toda pessoa tem o direito que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente” (CONVENÇÃO, 1969). Cumpre citar ainda o Decreto 678/92 que promulga a convenção supramencionada, também conhecido como o Pacto de São José da Costa Rica.

No âmbito jurisprudencial, existe a discussão no Supremo Tribunal Federal, através da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental n° 54, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde, onde se discute a descriminalização da prática de aborto no caso de fetos vítimas de anencefalia. A ação teve por base três argumentos, conforme mencionado por Marcelo Novelino (2008):

1º) antecipação terapêutica do parto não é aborto (atipicidade da conduta): “a morte do feto, nesses casos, decorre da má formação congênita, sendo certa e inevitável, ainda que decorridos os nove meses normais de gestação. Falta à hipótese o suporte fático exigido pelo tipo penal”; 2º) ainda que se considerasse a antecipação terapêutica como aborto, ela não seria punível (interpretação evolutiva do Código Penal): “a hipótese aqui em exame só não foi expressamente abrigada no art. 128 do Código Penal como excludente de punibilidade porque em 1940, quando editada sua Parte Especial, a tecnologia existente não possibilitava o diagnóstico preciso de anomalias fetais incompatíveis com a vida”; 3º) dignidade da pessoa humana, analogia à tortura e interpretação conforme a Constituição: “impor à mulher o dever de carregar por nove meses um feto que sabe, com plenitude de certeza, não sobreviverá, causando-lhe dor, angústia e frustração, importa violação de ambas as vertentes da dignidade humana (...)”. (NOVELINO, 2008, p. 267).

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 Importante frisar que a ADPF supramencionada foi julgada procedente em 2012, declarando inconstitucional a interpretação de que a gravidez interrompida nos casos de fetos anencéfalos se enquadre nos tipos penais dos artigos 124, 126, 128 incisos I e II do CP. A justificativa para tal decisão foi que o feto sem cérebro, mesmo que biologicamente vivo, é juridicamente morto, não gozando assim de proteção jurídica, tampouco ser abarcada pelo Direito Penal.

DISTINÇÃO ENTRE INFANTICÍDIO E ABORTO

O crime de infanticídio, conforme conceito dado pelo nobre doutrinador Guilherme de Souza Nucci “é o homicídio cometido pela mãe contra seu filho, nascente ou recém-nascido, sob a influência do estado puerperal” (NUCCI, 2014). Já o aborto, conforme já conceituado, é a interrupção da gravidez com a morte do feto. Percebe-se então que a diferença entre os dois crimes está no parto, isto porque, é considerado infanticídio caso tenha iniciado o parto ou após ele. Vejamos o tipo penal que narra a conduta denominada na própria rubrica como infanticídio:

Art.123 Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após.

Pena – detenção, de 02 (dois) a 06 (seis) anos

Conforme pode ser absorvido pelo próprio tipo em tela, é configurado o crime de infanticídio quando a morte do produto da concepção ocorre durante o parto ou logo após. Diferente do crime de aborto, que ocorre antes de iniciar o parto. Ivair Nogueira Itagiba fala que no aborto, há a criminosa expulsão do feto; no infanticídio, a expulsão é espontânea.

A ATUAÇÃO DO ESTADO NA TEMÁTICA ABORTO

O Estado sempre buscou meios para reduzir a taxa de mortandade das mulheres por causas consideradas preveníveis e evitáveis (BRASIL, 2003). Considerando a saúde da mulher uma prioridade para o governo, o Ministério da Saúde elaborou em conjunto com diversos setores da sociedade, o documento “Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher – Princípios e Diretrizes”, que possui dentre outros objetivos, a promoção da saúde da mulher.

                           

Conforme apresentado pelo próprio documento:

Este documento incorpora, num enfoque de gênero, a integralidade e a promoção da saúde como princípios norteadores e busca consolidar os avanços no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, com ênfase na melhoria da atenção obstétrica, no planejamento familiar, na atenção ao abortamento inseguro e no combate à violência doméstica e sexual. Agrega, também, a prevenção e o tratamento de mulheres vivendo com HIV/AIDS e as portadoras de doenças crônicas não transmissíveis e de câncer ginecológico. (BRASIL, 2003)

Percebe-se com a breve explanação que o objetivo precípuo do referido documento é a humanização e a qualidade do atendimento de saúde à mulher. Esta atenção derivou do elevado número de mortes de mulheres registrados nos últimos anos, em especial, cita-se o número de óbitos maternos. Nas capitais brasileiras, para o ano de 2001, a RMM (Razões de Mortalidade Materna) corrigida, foi de 74,5 óbitos maternos por 100 mil nascidos vivos. As principais causas da mortalidade materna são a hipertensão arterial, as hemorragias, a infecção puerperal e o aborto, todas evitáveis (BRASIL, 2003). Dentre estas causas, estima-se que a maior causa de mortes maternas derivam da prática insegura do aborto. As complicações mais frequentes ocasionadas por tal prática é a perfuração do útero, a hemorragia e a infecção. O mais agravante é que em razão do medo em ser punida pelo Estado por ter praticado um aborto criminoso, as mulheres nesta situação não procuram atendimento médico a tempo, gerando sérios riscos para suas vidas.

Outro meio de conscientização utilizado pelo Estado, que tem demonstrado ser bastante eficaz é a assistência do planejamento familiar. Com tal planejamento, as mulheres evitam as famigeradas “gestações indesejadas”, e, por consequência, diminui o número de abortos cometidos. Este planejamento familiar ensina as mulheres a valerem-se de todos meios eficazes para evitar a gravidez não planejada. Cumpre ressaltar que não apenas ensina, mas fornece a elas, leia-se mulheres, tais meios, obtendo grande impacto positivo na saúde das mulheres com tais ações.

Os métodos contraceptivos pode-se dizer que é a efetividade de todas as políticas públicas voltadas para a temática aborto. Isto por que, através dos métodos contraceptivos fornecidos pelo SUS, haverá efetivamente a proteção dos pacientes que fizerem seu uso, prevenindo não somente a gravidez indesejada, mas também proliferação de doenças sexualmente transmissíveis, assim, por consequência, evita-se a prática clandestina de abortamentos, reduzindo também o número de óbitos maternos.

São métodos contraceptivos fornecidos pelo SUS: os preservativos masculino e feminino; a pílula combinada; anticoncepcional injetável mensal e trimestral; o dispositivo intrauterino com cobre (DIU T Cu); o diafragma; a anticoncepção de emergência e a minipílula. Cumpre frisar que o Sistema Único de Saúde não fornece apenas os meios, mas também a assistência médica necessária para a recomendação e o uso de cada um dos métodos citados, todos custeados pelo Estado.

O aborto é questão de saúde pública, na verdade é um grande problema social vivido atualmente, mas que por ser bastante polêmico, muitas vezes é ignorado. Tendo por base somente o território nacional, a estimativa é que ocorra anualmente mais de um milhão de abortamentos induzidos – uma das principais causas de morte materna no país (SANTOS, 2013). Isso demonstra a necessidade imperial do Estado em priorizar a saúde da mulher, com todos os esforços cabíveis.

 

DISCUSSÕES SOBRE A PRÁTICA ABORTIVA

A vida é sem dúvidas o bem de maior valor a ser protegido pelo ordenamento jurídico, não somente no ordenamento pátrio, mas na maioria dos ordenamentos jurídicos dos países ocidentais. Para ser respeitado como devidamente merece, o direito à vida passou por um longo e lento progresso nas leis. Não é novidade se dizer que a vida já fora banalizada em tempos remotos, não recebendo o devido valor, sendo tratada como mero objeto ou mero patrimônio, do qual poderia se dispor em relações patrimonialistas, dentre outros absurdos.

Neste sentido, os opositores à descriminalização da prática do aborto nas hipóteses previstas em lei alegam que haveria um enorme retrocesso por parte dos legisladores caso abolissem a punição estatal para os autores do aborto. De acordo com Sandi (2010):

O princípio da sacralidade da vida humana fundamenta-se na premissa de que a vida é um bem e sempre digna de ser vivida, portanto, deve ser protegida, não podendo ser interrompida nem mesmo por vontade da própria pessoa.

O princípio da sacralidade da vida humana originou-se das tradições religiosas orientais e na judaico-cristã, e, mesmo após a separação da religião e do estado, ele continua sendo respeitado. Prova disto é a importância dada à vida pela Constituição Federal em seu art. 5°, tratando-a como direito fundamental e inviolável.

Com um critério de julgamento que exige imprescindivelmente uma análise médica, há quem defenda que a prática abortiva deve ser a ultima ratio até mesmo em situações onde a vida da gestante está em risco. Segundo estas pessoas, não é possível se ter a certeza de que a gestante iria à óbito caso não interrompesse a gestação voluntariamente. Afirmam ainda que em razão do aborto ser um procedimento contra a “ordem natural das coisas”, poderá causar um risco maior à vida da gestante. Data vênia, como dito anteriormente, tudo depende de uma análise médica da real situação da gestante, e não meramente de critérios morais defendidos pela sociedade.

Outro argumento bastante utilizado pelos defensores da vida intrauterina é sobre a absoluta impossibilidade da legalização do aborto no Brasil em virtude do Pacto de São José da Costa Rica, do qual é signatário, uma vez que os tratados internacionais de direitos humanos internacionalizados no país mediante decreto possuem natureza hierárquica de norma supralegal. Isto significa dizer que os tratados internacionais estão hierarquicamente inferiores à Constituição, porém, superiores às normas infraconstitucionais. Logo, uma lei ordinária ou complementar não poderia ser utilizada para legalizar o aborto, já que o Pacto de São José da Costa Rica, com natureza supralegal, defende a inviolabilidade da vida desde a concepção (DUTRA, 2011).

Em sentido contrário, aqueles que se opõem à punição estatal daqueles que praticam o aborto, fundamentam seus ideais no princípio da qualidade de vida da mulher. Tal princípio se contrapõe ao principio da sacralidade da vida no sentido de determinar um valor para a vida humana, ou seja, para ser digna de ser vivida deve possuir qualidades históricas e socioculturais (SANDI, 2010). Significa dizer que a mulher merece maior respeito que o feto uma vez que já possui relações formadas na sociedade, diferentemente do feto ou embrião que sequer teve a primeira relação que poderia lhe ser atribuída, ou seja, com sua mãe. Conforme explicado pela nobre Dra. Sandi, “a vida da mulher agrega graus maiores de qualidade a serem preservados do que a dos embriões ou fetos” (SANDI, 2010).

Um fato importante a ser citado é o julgamento da ADPF n. 54, mencionada anteriormente. No julgamento, a Corte reconheceu que as mulheres são proprietárias de seus direitos reprodutivos. Segundo o advogado Luís Roberto Barroso, que representava a parte autora na ação, “o direito de não ser um útero à disposição da sociedade, mas de ser uma pessoa plena, com liberdade de ser, pensar e escolher” (HAIDAR, 2012).

Inúmeras são as justificativas para se cometer o aborto, podendo-se citar também a título de esclarecimento o caráter econômico e social da gravidez indesejada, uma vez que os pais não poderão custear os gastos mínimos para uma sobrevivência digna do futuro ser, bem como comprometerá o cuidado exercido aos outros filhos. Não obstante, cogitam sobre uma possível rejeição do filho advindo de uma concepção não planejada, podendo este ser futuramente maltratado ou abandonado pelos genitores, causando um impacto social relevante e negativo.

O elevado número de mortes maternas acarretadas por procedimentos abortivos clandestinos e inseguros têm se mostrado um argumento bastante forte para a legalização do aborto, pois, visando à redução do número de mortandade materna e de sequelas geradas pelo aborto efetuado de maneira incorreta, defendem a implantação deste procedimento no órgão público de saúde, para ser feito por profissionais capacitados, de maneira correta.

Por último, e não menos importante, um dos argumentos mais utilizados pelos simpatizantes da causa - descriminalização do aborto, é a liberdade da mulher sobre seu próprio corpo. Os defensores de tal argumento alegam que o feto é parte do organismo da mulher gestante, e por isso, ela pode dispor livremente de seu corpo. A mulher possui a liberdade em relação à sua vida sexual e reprodutiva, podendo escolher o momento oportuno para gerar uma vida, ou sequer gerar, se assim escolher. Com base nestes argumentos, as pessoas que são a favor da prática do aborto consideram a interferência estatal neste sentido abusiva e ilegal, por adentrarem a um ramo da vida privada de maneira arbitrária. Acrescenta-se ainda a afirmação de Anjos (2013):

No Brasil é ilegal abortar, mas é desumano abortar em condições inseguras pelo fato de a mulher não ter legalmente o direito sobre o próprio corpo e não lhe serem assegurados os seus direitos humanos. (ANJOS, 2013)

Refutando com maestria o argumento ora mencionado, Maria Helena Diniz (2014) assevera:

É demagógico justificar o aborto com base na liberdade da mulher, por ser dona de seu corpo. Será que ela teria mesmo o “direito de abortar”, em face da comprovação científica de que o feto possui vida autônoma desde a concepção? Não se pode considerar apenas a vontade da mulher de fazer o que quiser com seu corpo se uma outra vida humana, protegida constitucionalmente está em jogo. (DINIZ, 2014, p. 91)

Nota-se que seria utópica a afirmação de que a discussão sobre o tema está perto do fim, tendo em vista que “por trás” de toda esta problemática existem diversas classes de pessoas com ideologias, crenças e costumes divergentes, envolvendo muito mais que meras opiniões, vez que ao discutir sobre este assunto deve se levar em conta critérios históricos, médicos, religiosos, morais, sociais e éticos. Se o problema em tese fosse de fácil solução, esta discussão não permaneceria tão ativa nos dias atuais.

CONCLUSÃO

A vida humana é inviolável. Sem este direito não faz sentido a proteção de nenhum outro, dada sua impossibilidade. Sendo assim, a raiz de todas as outras garantias, deve ser protegida com maior zelo e efetividade.

Desta feita, qualquer violação à tal direito precípuo deve ser objeto de grande estudo e discussão, como é o caso do aborto, uma vez que existem diversos fatores que sobrepesam na temática, fatores estes favoráveis ou desfavoráveis à prática que põe termo à gestação. Cumpre frisar que nenhum destes fatores devem ser descartados de plano, devendo ser respeitadas as opiniões e argumentos acerca do aborto, almejando assim o exercício da liberdade de expressão e, principalmente, uma conclusão pautada sob vários pontos de vista, acarretando a mais correta decisão sobre um assunto nada pacífico.

Tal análise pode ser percebida no presente trabalho, que buscou analisar sob várias perspectivas o assunto tratado, para que a opinião do leitor fosse formada mediante estudo detalhado e não por mera imposição moral do senso comum. Para tanto, foram demonstrados diversos argumentos que defendem a vida acima de qualquer direito, fundamentados no princípio da sacralidade da vida humana, bem como aqueles argumentos contrários, que defendem a liberdade da mulher sobre seu próprio corpo, ainda que para exercer tal direito haja o sacrifício da vida.

Após um aprofundado estudo, com o devido respeito à todas opiniões em contrário, nota-se que é plenamente inviável a completa descriminalização da prática abortiva, no sentido moral e legal da questão. Conforme apresentado, a Constituição Federal, lei suprema do Estado, impede que tal mudança no ordenamento ocorra, uma vez que protege a vida com uma cláusula pétrea, bem como dá ao Pacto São José de Costa Rica a natureza de norma supralegal. Logo, a não ser com um notório desrespeito à Lei Suprema, a prática do aborto não poderá ser considerada em conformidade com o direito quando feita por mera liberalidade da gestante.

REFERÊNCIAS

 

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CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS. Assinada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969.

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NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Método, 2008.

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SANDI, Stella de Faro, Braz M. As mulheres brasileiras e o aborto: uma abordagem bioética na saúde pública. [Internet]. Rev. Bioét. (Impr.). 2010;18 (1):131-53 Disponível em: http://revistabioetica. Cfm. Org. Br/index. Php/revista_bioetica/article/viewArticle/54>Acesso 14 de abril de 2017

SANTOS, Vanessa Cruz. Criminalização do aborto no Brasil e implicações à saúde pública. Rev. Bioética. (Impr.). 2013; 21 (3): 494-508

SEGATTO, Cristiane. STF decide que o aborto até o terceiro mês não é crime: o que isso significa. Época. [Internet] 2016. Disponível em: HTTP://epoca.globo.com/saúde/cristiane-segatto/noticia/2016/11/stf-decide-queoaborto-ateoterceiro-mes-naoecrimeoque-isso-significa.html > Acesso em 14 de abril de 2017

 

Sobre os autores
Geison Esquarcio Soares

Acadêmico de Direito da Faculdade Pitágoras Kelly Rodrigues da Silva Vilela Acadêmica de Direito da Faculdade Pitágoras Geison Soares Esquarcio Acadêmico de Direito da Faculdade Pitágoras

Kelly Rodrigues da Silva Vilela

Acadêmica de Direito na Faculdade Pitágoras de Betim

Informações sobre o texto

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