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A principiologia do novo direito das famílias à luz da Constituição Federal de 1988

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7 OS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DO DIREITO ÀS DIFERENÇAS

O princípio da igualdade cinde-se em igualdade formal e material, o que pode ser sintetizado a partir da máxima “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades”. Como adverte Celso Antônio Bandeira de Mello (2004), em sua dimensão negativa, a igualdade veda a criação ou manutenção de distinções arbitrárias ou detrimentosas, e, no seu aspecto positivo, impõe que o tratamento equitativo considere a efetiva equivalência das situações fáticas apreciadas.

Ademais, o princípio da igualdade pode ser especificado no princípio do reconhecimento, que impõe o respeito às minorias, às suas identidades e diferenças, assegurando-lhes os mecanismos jurídicos e fáticos para a realização de seus projetos existenciais (MADALENO, 2013).

Em relação ao Direito das Famílias, mencionado princípio se expressa na igualdade entre homens e mulheres, vedando qualquer distinção entre os cônjuges ou companheiros em razão do gênero. Conforme Carlos Alberto Bittar (1989), a consequência imediata de tal prescrição é a eliminação de todas as normas de tratamento diferenciado entre homens e mulheres. Assim, não subsistem a odiosa chefia masculina da família, a administração dos bens do casal pelo homem, bem como sua exclusiva representação familiar. Há, entretanto, a assunção de novas responsabilidades pela mulher, como a de contribuir financeiramente para a manutenção da família, quando exerce atividade remunerada. Isso não impede, todavia, que, ante a histórica discriminação enfrentada pelas mulheres, seja-lhes concedido tratamento jurídico compensatório, porquanto em conformidade com a isonomia material (MADALENO, 2013).

Também a disciplina da filiação é alcançada pelo princípio constitucional da igualdade, observada a vedação de tratamento jurídico distinto entre os filhos, sejam estes naturais, adotivos, havidos no seio ou fora da unidade matrimonial.

Tanto o legislador quanto o intérprete são vinculados pelo princípio da igualdade. Daí derivou, portanto, o reconhecimento das uniões homoafetivas, concretização, a um só tempo, da isonomia formal e material, visto que veda discriminações arbitrárias e afirma a legitimidade jurídica e cultural da luta por reconhecimento travada pelos casais homoafetivos (DIAS, 2016).


8 PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR

A solidariedade possui induvidoso conteúdo ético, que transita entre os valores da fraternidade e da reciprocidade. Gera deveres entre os membros da entidade familiar, desonerando parcialmente o Estado de fornecer as prestações positivas dessumidas dos direitos sociais (DIAS, 2016).

Referido princípio se manifesta, exemplificativamente, na mútua assistência entre os cônjuges, prevista no art. 1.566, inc. III, do Código Civil (CC). Assim também a obrigação familiar, constante do art. 1.694 do CC. Nesse passo, tem-se que os integrantes da família são, a um só tempo, credores e devedores de alimentos entre si. A obrigação alimentar representa, portanto, evidente concretização do princípio da solidariedade. Ressalte-se que os alimentos compensatórios, objeto do presente estudo monográfico, igualmente decorrem do dever de assistência, consectário do princípio em tela.


9 PRINCÍPIO DA DIVERSIDADE FAMILIAR

A Constituição da República promulgada em 1988 rompe com a exclusividade do casamento como a única forma juridicamente aceita de constituição da entidade familiar. Até seu advento, nenhum outro modelo era capaz de dar azo à instituição de uma família, sendo exemplo notório disso a pretérita conformação do concubinato (DIAS, 2016).

Ao conferir à família a especial proteção do Estado, à vista de seu estatuto de base da sociedade, o art. 226 reconhece expressamente como modelos de família o casamento, a união estável e a família monoparental. Inconteste que, tendo em vista o princípio da unidade da Constituição, o rol especificado não é taxativo, mormente perante a igual consideração e respeito albergada pela dignidade humana. A esse respeito, lapidar o escólio de Rodrigo da Cunha Pereira: “a família não se constitui apenas de pai, mãe e filho, mas é antes uma estruturação psíquica em que cada um de seus membros ocupa um lugar, uma função, sem estarem necessariamente ligados biologicamente” (PEREIRA, 2006, p. 166).

Nessas razões, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a juridicidade das uniões homoafetivas, por meio de posicionamento esposado na ADPF nº 132 e na ADI nº 4.277.


10 PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE

O afeto corporifica a base jurídica primordial das entidades familiares. Porquanto derivados de um ato de escolha individual, os vínculos decorrentes da afetividade se sobrepõem àqueles meramente sanguíneos. O reconhecimento da paternidade socioafetiva, ao lado da biológica, a garantia da igualdade entre filhos adotivos e biológicos, a condenação ao pagamento de indenização por abandono afetivo, entre outros regramentos, correspondem a emanações deste princípio (DIAS, 2016).

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Vincula-se o princípio da afetividade a uma concepção eudemonista de família, a qual se contrapõe à família patrimonial, própria ao regime jurídico anterior. O direito fundamental à felicidade, cujo conteúdo normativo se assenta sobre a dignidade da pessoa humana, encontra no vislumbre afetivo da entidade familiar um elemento indispensável à sua plena efetivação (MADALENO, 2013).


11 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 obrou verdadeira guinada paradigmática na interpretação e aplicação das normas do Direito das Famílias.

De seu plexo normativo, dessumiram-se os princípios anteriormente expostos, os quais, para além de enunciados impactantes, determinam decisões cogentes nos casos concretos, afastando qualquer comando sentencial que resvale em seus limites protetivos.

Espera-se, portanto, que, com a breve exposição acima encartada, o intérprete-aplicador possa se municiar do necessário cabedal hermenêutico para uma aplicação constitucionalmente adequada dos dispositivos familiaristas, cujo norte, como se viu, radica-se no pluralismo e no respeito à diversidade.


REFERÊNCIAS

ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008.

BARROS, Sérgio Resende de. A ideologia do afeto. Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre: IBDFAM/Síntese, n. 14, p. 5-10, jul.-set. 2002.

BEVILÁQUA, Clovis. Direito da família. Recife: Livraria Contemporânea, 1905. 

BITTAR, Carlos Alberto (Coord.). Os novos rumos do Direito de Família. In: O Direito de Família e a Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989.


BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 1997.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. 6: Direito de Família. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil – Vol. V. Atual. Tânia da Silva Pereira. 25. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições  eficácia. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito de Famíia – Vol. 5. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

Sobre o autor
Gladston Bethônico Bernardes Rocha Macedo

Doutorando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sendo Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG). Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACEDO, Gladston Bethônico Bernardes Rocha. A principiologia do novo direito das famílias à luz da Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5611, 11 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/62686. Acesso em: 22 dez. 2024.

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