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Breve análise do processo de adoção no sistema jurídico brasileiro:

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Agenda 09/01/2018 às 13:00

4. Entraves existentes no processo de adoção

O surgimento da Lei Nacional de Adoção, embora tendente a solucionar os problemas que circundavam o processo adotivo, não aprimorou, a contento, a adoção. Vislumbrou-se um descompasso entre o referido processo e a realidade do judiciário brasileiro.

A demora excessiva no andamento da lista de adoção, bem como a política retrógrada de institucionalização da criança e do adolescente em vez da sua colocação em um lar, são causas que resultam no entrave desgastante do processo de adoção.

Tamanha a desproporcionalidade e incoerência em nosso sistema jurídico, que em matéria publicada pela BBC brasileira, a notícia jornalística emitia o seguinte questionamento: “Se o número de crianças inscritas no Cadastro Nacional de Adoção (CNA) é de 6.567, o de famílias habilitadas para adotá-las é quase seis vezes maior: 35.571. Mas se para cada criança na fila de adoção há seis adotantes, por que elas ainda estão na fila?”[4]

 A referida matéria aduziu que a demora se dava, em suma, pela restrição impostas pelos adotantes no que se refere ao perfil da criança, como também pela falta de estrutura do poder público. “Em muitas varas da Infância, não há juízes, psicólogos e assistentes sociais em número suficiente para suprir a demanda”6.

De fato, o Conselho Nacional de Justiça até dispôs de um modo mais célere para cadastrar as crianças e adolescentes, conforme demonstra o site do CNJ[5], aduzindo que “os magistrados não precisam de mais do que cinco minutos para cadastrar crianças e pretendentes no CNA”.

Contudo, a realidade encontrada nas Varas de Infância e Juventude não é bem essa. O tempo médio para iniciar o processo de adoção (desde a habilitação prévia dos pretensos adotantes até o trânsito em julgado da sentença de adoção) é de cerca de 2 anos e 3 meses (valores referentes a Região Sudeste)[6]. O processo de adoção que deveria ser encarado como a maior demonstração de amor e altruísmo, acaba se tornando uma tarefa árdua tanto para os ansiosos pais, como para os pretensos filhos.

A celeuma no processo adotivo não deve ser apenas fundamentada na morosidade existente no Judiciário, concepções retrógradas dos operadores do direito, também podem ser responsáveis pela demora na concretização da colocação do infante em uma família substituta.

Embora o Estatuto da Criança e do Adolescente seja pautado no melhor interesse do infante e no princípio da desinstitucionalização, muitos juízes e promotores insistiam em colocar os menores em programas de acolhimento institucional, em vez de possibilitá-los um convívio mais salutar e afetivo, o qual seria se fossem colocados, mesmo que provisoriamente, no seio de uma família substituta.   Não há que se discutir que a pessoa em desenvolvimento estará mais propícia a desenvolver reações e laços afetivos se estiver em um ambiente familiar do que em um programa de acolhimento institucional (antigamente chamado de abrigo).

O Juiz Federal Márcio Cavalcante preleciona em seu site de atualizações jurisprudências as seguintes informações sobre o acolhimento institucional:

Acolhimento institucional significa retirar a criança ou o adolescente de seu lar original e colocá-lo para residir, temporariamente, em uma entidade de atendimento (antigamente chamada “abrigo”) a fim de que ali ele fique protegido de situações de maus tratos, desamparo ou qualquer outra forma de violência (física ou moral) que estava sofrendo.

O acolhimento institucional é uma medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade (art. 101, § 1º).

Reitero que o acolhimento institucional somente pode ser determinado pelo magistrado.[7]

Apesar do Estatuto da Criança e do Adolescente já prever, timidamente, a colocação em famílias acolhedoras, artigos 19, §1º, 34 e outros do referido diploma legal, as inovações trazidas pela Lei nº 13.509/2017 vieram para consagrar o melhor interesse da criança, facilitando e buscando efetivar a colocação dos infantes em família substituta em detrimento dos abrigos.


5. Inovações trazidas com o advento da Lei nº 13.509/2017

Observa-se que com a publicação da Lei nº 13.509/2017 a intenção do legislador foi efetivar a proteção integral da criança e adolescente, protegendo-os de modo mais efetivo nas situações de risco e oportunizando-lhes uma convivência familiar, enaltecendo o convívio em famílias acolhedoras e colocando em última hipótese o acolhimento institucional.

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O rol de artigos que versa sobre a colocação em família substituta, os quais foram alterados no dia 23 de novembro de 2017, com a vigência da nova lei, ocasionaram as seguintes alterações: art. 19; 19-A ; 19-B 39, §3º; 46, §2º-A, §3º, §3º-A, §5º; 47,§10; 50, §10 e §15; 51, §1º, I e II; 100, X; 101, §10; 157, §1º.

 Salienta-se, que houve modificações também na Consolidação das Leis do Trabalho, no tocante ao direito do período de licença maternidade à detentora da guarda provisória. Nos casos de colocação provisória em família substitua, conferiu-se igualdade de direito à genitora que possui a guarda provisória, do mesmo modo conferido à mãe biológica ou àquela detém a guarda definitiva (Art. 391-A da CLT).

Abaixo serão arroladas e destacadas as mudanças introduzidas no ECA, as quais relacionam-se com o processo de adoção:

5.1 Permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional, antes eram 2 (dois) anos,  agora são 18 meses (Art. 19, §2º)

Não é saudável que a criança ou adolescente fique muito tempo no acolhimento institucional, sendo essa uma medida provisória e excepcional. Em razão disso, o ECA estipula um prazo máximo no qual a criança ou adolescente pode permanecer em programa de acolhimento institucional.

5.2 Convivência integral da mãe adolescente com seu filho(a) (Art. 19, §5º e 6º)

Fora acrescentado dois parágrafos ao art. 19 aduzindo que se uma adolescente estiver em programa de acolhimento institucional e ela for mãe, deverá ser assegurado que tenha convivência integral com seu(sua) filho(a), além de ter apoio de uma equipe especializada (exs: psicóloga, assistente social etc.).

5.3 Facilitações para mulher que deseja entregar seu filho para adoção (Art. 19-A Caput, §1º, §2º)

Os entraves para entrega dos filhos pelas mães que desejavam colocá-los para adoção era uma das problemáticas que desgastavam e complicavam, na prática, o processo adotivo. Na tentativa de facilitar essa entrega, estabeleceu-se o encaminhamento ao juizado da mãe, acompanhamento especializado, tratamento, mediante sua vontade na rede pública de saúde.

5.4 Preferência que a criança fique com o pai ou com alguma representante da família extensa (Art. 19-A, §3º)

A manutenção na sua própria família biológica também é uma das diretrizes centrais do Estatuto, diante desse pressuposto estabeleceu-se que:

Se a mãe indicar quem é o pai da criança, deve-se tentar fazer com que este assuma a guarda e suas responsabilidades como genitor. Se não houver indicação de quem é o pai ou se este não manifestar interesse na criança, deve-se tentar acolher a criança em sua “família extensa”.

Família extensa ou ampliada é aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade (art. 25, parágrafo único do ECA). Ex: tios.[8]

É demasiadamente importante destacar que a busca pela família extensa não deve procrastinar desarrazoadamente a colocação do infante em família substituta, e, por isso, deverá durar, no máximo, 90 dias, prorrogável por igual período.

5.5. Não sendo possível ficar com o pai nem com a família extensa (Art. 19-A, §4º)

Se a mãe não indicar quem é o genitor e se não houver representante da família extensa apto a receber a guarda, o juiz deverá: decretar a extinção do poder familiar e determinar a colocação da criança sob a guarda provisória de quem estiver habilitado a adotá-la ou de entidade que desenvolva programa de acolhimento familiar ou institucional.

5.6 Desistência da entrega para adoção e sigilo do procedimento (Art. 19-A, §8º e §9º e art. 166, §5º)

Antes da vigência da Lei nº 13.509/2017, nos termos do artigo 166, parágrafo 5º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, o consentimento da entrega de menor para adoção é retratável até a data da publicação da sentença constitutiva da adoção.

A legislação agora estabelece que o momento adequado para retratação dos genitores será a audiência estabelecida no art. 19-A, §8º:

Art. 166. (..) § 5o  O consentimento é retratável até a data da realização da audiência especificada no § 1o deste artigo, e os pais podem exercer o arrependimento no prazo de 10 (dez) dias, contado da data de prolação da sentença de extinção do poder familiar

Art. 19-A. (...) §8o  Na hipótese de desistência pelos genitores - manifestada em audiência ou perante a equipe interprofissional - da entrega da criança após o nascimento, a criança será mantida com os genitores, e será determinado pela Justiça da Infância e da Juventude o acompanhamento familiar pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias.  (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017)

§ 9o  É garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nascimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei. 

Quem receber a guarda da criança terá o prazo de15 dias para propor a adoção. No tocante à desistência da entrega da criança, o pai ou a mãe deverá manifestar esta desistência em audiência ou perante a equipe interprofissional. A criança será, então, mantida com o(s) genitor(es) e será determinado pela Justiça da Infância e da Juventude o acompanhamento familiar pelo prazo de 180 dias.

5.7 Sistema de apadrinhamento (Art. 19-B)

O sistema de apadrinhamento é uma forma alternativa e eficaz para desinstitucionalização do infante em situação de risco, proporcionando um ambiente familiar e afetivo à criança e ao adolescente, tudo em conformidade e sintonia com o princípio da proteção integral e melhor interesse da criança que regem o Estatuto.

Preleciona o Juiz Federal Márcio Cavalcante sobre  o tema:

O ECA prevê que se a criança ou o adolescente estiver em situação de risco (art. 98), o juiz da infância e juventude poderá determinar medidas protetivas que estão elencadas no art. 101.  Destacam-se duas importantes e frequentes medidas de proteção:  o acolhimento institucional (art. 101, VII); e o acolhimento familiar (inciso VIII).

O apadrinhamento consiste, portanto, em proporcionar (estimular) que a criança e o adolescente que estejam em “abrigos” (acolhimento institucional) ou em acolhimento familiar possam formar vínculos afetivos com pessoas de fora da instituição ou da família acolhedora onde vivem e que se dispõem a ser “padrinhos”. (...)

As crianças ou adolescentes têm encontros com seus “padrinhos”, fazem passeios, frequentam a casa, participam de aniversários, datas especiais, como Dia das Crianças, Natal, Ano Novo etc.

A intenção do programa de apadrinhamento é fazer com que a criança ou adolescente receba afeto e possa conhecer como funciona uma saudável vida em família, com carinho e amor.

O sistema de apadrinhamento pode ser realizado por pessoa física ou jurídica e tem por principal escopo introduzir o menor em um ambiente aconchegante e essencial para seu desenvolvimento psíquico social.

5.8 Estágio de Convivência

Anteriormente, o estágio de convivência era fixado pela autoridade judiciária, observadas as peculiaridades do caso concreto. Com a redação atual do art. 46, estabeleceu-se um prazo de no máximo 90 dias para a concretização do referido estágio.

Desse modo, restringiu-se a discricionariedade do magistrado, pois com a nova redação, não se poderá estabelecer períodos muito longos, que acabavam por diminuir a celeridade da concretização do processo de adoção. Ademais, o §2º-A, estabelece que esse período de 90 dias poderá ser prorrogado por igual período, desde que por fundamentada decisão.

Além das inovações supramencionadas, outras mudanças foram introduzidas no Estatuto da Criança e do Adolescente, como por exemplo, o procedimento de habilitação para adoção (novo § 2º do art. 197-E). Destaca-se, que quando o adotante candidatar-se a uma nova adoção, será dispensável a renovação da habilitação, bastando a avaliação por equipe interprofissional (novo § 3º do art. 197-E);

Alterou-se também a contagem dos prazos, de acordo com art. 152. §2º, esta contagem deve ser feita em dias corridos, não se aplicando aos procedimentos judicias do ECA, a contagem do prazo em dias úteis, como ocorre no Processo Civil.

Ademais, a figura do curador especial recebeu nova interpretação coadunando-se o que entendimento já sedimentando na nossa jurisprudência, de que não haverá necessidade de nomeação de curador especial quando o processo de adoção for iniciado pelo Ministério Público. Inovou-se, também, que o prazo máximo de conclusão do processo de destituição do poder familiar será de 120 dias. Por fim, no caso de notória inviabilidade de manutenção do poder familiar, caberá ao juiz dirigir esforços para preparar a criança ou o adolescente com vistas à colocação em família substituta (nova redação do art. 163).

Essas alterações também trouxeram consequências mais severas para os adotantes habilitados no cadastro que desistirem do processo ou que recusarem as crianças postas para lhe serem adotadas:

Se o postulante habilitado recusar, por três vezes, adotar as crianças/adolescentes disponíveis, após as 3 recusas injustificadas, pelo habilitado, à adoção de crianças ou adolescentes indicados dentro do perfil escolhido, haverá reavaliação da habilitação concedida (novo § 4º do art. 197-E) e também, a desistência do pretendente em relação à guarda para fins de adoção ou a devolução da criança ou do adolescente depois do trânsito em julgado da sentença de adoção importará na sua exclusão dos cadastros de adoção e na vedação de renovação da habilitação, salvo decisão judicial fundamentada, sem prejuízo das demais sanções previstas na legislação vigente (novo § 5º do art. 197-E)[9].

A essência da inovação legislativa trazida pela Lei nº 13.509/ 2017 é dar mais celeridade ao processo de extinção do poder familiar e colocação em família substituta, bem como propiciar um lar familiar para aquela criança/adolescente destituído do afeto necessário para o seu bem-estar. Nesse sentido, preleciona o artigo o art. 50, §10: “Enquanto não localizada pessoa ou casal interessado em sua adoção, a criança ou o adolescente, sempre que possível e recomendável, será colocado sob guarda de família cadastrada em programa de acolhimento familiar”.

Sobre o autor
Raissa Barbosa Assis

Assessora Jurídica do Ministério Público do Estado da Paraíba. Pós Graduada pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus curso de pós graduação lato sensu em Direito Processual Civil. Graduada pela Universidade Estadual da Paraíba. .Aprovada no concurso da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte. Aprovada no concurso da Procuradoria Estadual da Bahia. Aprovada para o Cargo de Advogado da Dataprev/2012. Aprovada para o Cargo de Advogado da Caixa Econômica Federal Região Nordeste.Aprovada para o cargo de Procurador do Município de Maceió. Aprovada no concurso de Juiz Leigo do Estado da Paraíba.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ASSIS, Raissa Barbosa. Breve análise do processo de adoção no sistema jurídico brasileiro:: enfoque nas inovações legislativas advindas da Lei nº 13.509/2017. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5305, 9 jan. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63335. Acesso em: 21 dez. 2024.

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