Segundo Santos (2017), “Planejar é pensar antecipadamente em objetivos e ações, devendo os atos administrativos serem baseados em algum método, plano ou lógica e não em suposições. São os planos que organizam e definem o melhor procedimento para alcançá-los”. Andrade et al (2005), apontam que o planejamento das aquisições de materiais e contratações de serviços é o marco incial para realização de uma gestão efetiva dos recursos públicos, na qual a qualidade deste planejamento indicará a obtenção de uma boa ou má execução.
A importância dada ao planejamento na Administração Pública é evidenciada através de diversas evidências que englobam a temática de emprego de recursos públicos. Inicialmente, cabe destacar a previsão legal, em três distintos dispositivos jurídicos, da realização de um planejamento prévio e adequado. Em consonância com o princípio da eficiência, a Constituição Federal de 1988, prevê em seu artigo 174: “Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado” (grifo nosso). Já no artigo 14, da lei 8.666/93, aponta-se que “Nenhuma compra será feita sem a adequada caracterização de seu objeto e indicação dos recursos orçamentários para seu pagamento, sob pena de nulidade do ato e responsabilidade de quem lhe tiver dado causa”. Já na Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei 101 de 2000, além do assunto planejamento ter destaque em capítulo distinto (capítulo II – artigos do 3° a 10), destaca-se o previsto no §1° do artigo 1°:
§ 1o A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.- grifo nosso (BRASIL, 2000)
Outro aspecto que identifica a importância da ênfaze no planejamento se dá nas frequentes orientações encontradas nos relatórios dos relatores, nos votos dos Ministros e nas decisões acordadas do Tribunal de Contas da União. Em consulta a base de dados do TCU, a palavra “planejamento” aparece em 27.784 acórdãos realizados pela distinta Corte, número este que indica o quão valorizada é esta etapa das licitações. Decerto, a jurisprudência do Tribunal supracitado já deliberou indicando a necessidade da realização de planejamento prévio dos gastos anuais, visando evitar o fracionamento das despesas e de realização de procedimentos licitatórios dentro das modalidades adequadas, levando-se em consideração o valor total da aquisição no exercício financeiro (Acórdãos TCU 743/2009-Plenário, 2195/2008-Plenário e 665/2008-Plenário).
No que tange à aquisição de bens, o Acórdão 2221/2012-Plenário apontou para que as mesmas devem estar baseadas em estudos prévios que comprovam a necessidade e viabilidade das aquisições, visando evitar o mau uso do dinheiro público e a frustação dos objetivos que se pleiteam. Ratifica-se o delineamento na indicação de que os planejamentos de aquisições devem ser planejados com base no histórico de registro e consumo dos materiais e da provável utilização (Acórdãos TCU 1380/2011- Plenário e 1281/2010-Plenário).
O elemento básico indispensável à deflagração dos procedimentos licitatórios é figurado no Projeto Básico (Acórdão 2346/2007-Plenário). A lei 8.666/97, em seu artigo 6°, inciso IX, define como projeto básico:
IX - Projeto Básico - conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os seguintes elementos:
a) desenvolvimento da solução escolhida de forma a fornecer visão global da obra e identificar todos os seus elementos constitutivos com clareza;
b) soluções técnicas globais e localizadas, suficientemente detalhadas, de forma a minimizar a necessidade de reformulação ou de variantes durante as fases de elaboração do projeto executivo e de realização das obras e montagem;
c) identificação dos tipos de serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorporar à obra, bem como suas especificações que assegurem os melhores resultados para o empreendimento, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
d) informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos, instalações provisórias e condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
e) subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendendo a sua programação, a estratégia de suprimentos, as normas de fiscalização e outros dados necessários em cada caso;
f) orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados; - grifo nosso (BRASIL,1993)
Tendo o pregão como modalidade prevista na lei 10.520, de 17 de julho de 2002, para aquisição de bens e serviços comuns, o projeto básico recebe a nomenclatura de termo de referência (nome iuris específico da modalidade pregão), como definido no §2°, do artigo 9° do Decreto 5.450, de 31 de maio de 2005, define termo de referência como:
§ 2o O termo de referência é o documento que deverá conter elementos capazes de propiciar avaliação do custo pela administração diante de orçamento detalhado, definição dos métodos, estratégia de suprimento, valor estimado em planilhas de acordo com o preço de mercado, cronograma físico-financeiro, se for o caso, critério de aceitação do objeto, deveres do contratado e do contratante, procedimentos de fiscalização e gerenciamento do contrato, prazo de execução e sanções, de forma clara, concisa e objetiva. - grifo nosso (BRASIL, 2005)
Embora a terminologia distinta possa pressupor distintos documentos, a similaridade de ambas as designações podem ser verificadas em suas definições supracitadas. Na prática, utiliza-se projeto básico no planejamento das licitações e processos prescritos da lei de licitações (8.666 de 1993) e termo de referência no que tange ao pregão, seja eletrônico ou presencial.
Específicamente para o pregão eletrônico, o artigo 9 do Decreto 5.450, enumera as necessidade alusivas à fase de planejamento/preparatória:
Art. 9o Na fase preparatória do pregão, na forma eletrônica, será observado o seguinte:
I - elaboração de termo de referência pelo órgão requisitante, com indicação do objeto de forma precisa, suficiente e clara, vedadas especificações que, por excessivas, irrelevantes ou desnecessárias, limitem ou frustrem a competição ou sua realização;
II - aprovação do termo de referência pela autoridade competente;
III - apresentação de justificativa da necessidade da contratação;
IV - elaboração do edital, estabelecendo critérios de aceitação das propostas;
V - definição das exigências de habilitação, das sanções aplicáveis, inclusive no que se refere aos prazos e às condições que, pelas suas particularidades, sejam consideradas relevantes para a celebração e execução do contrato e o atendimento das necessidades da administração; e
VI - designação do pregoeiro e de sua equipe de apoio.
Merece destaque ainda, a preocupação constante dos pareceres jurídicos de licitações emitidos pela AGU e suas unidades subordinadas de uma completa e robusta justificativa da contratação. Não se pode olvidar do emprego de critérios técnico objetivos, elaborados por especialistas responsáveis, que apontem quantitativa e qualitativamente a especificação do objeto a ser contratado. Ideal que seja realizada sob a ótica de cada item, para que seja melhor visualizado ao parecerista, o devido enquadramento do pleito com a justificativa. Conforme inciso I, do artigo 15 da Instrução Normativa 02/2008, de 30 de abril de 2008, a justificativa deverá conter:
a) motivação da contratação; b) benefícios diretos e indiretos que resultarão da contratação; c) conexão entre a contratação e o planejamento existente, sempre que possível; (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009) d) agrupamento de itens em lotes, quando houver; (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009) e) critérios ambientais adotados, se houver; f) natureza do serviço, se continuado ou não; g) inexigibilidade ou dispensa de licitação, se for o caso; e h) referências a estudos preliminares, se houver.
Segundo Frota (2017), é fundamental e determinante a devida motivação da contratação, caracterizando-se como instrumento de legalidade e legitimidade do procedimento, a qual caso seja ausente ou composta de forma deficiente pode gerar a nulidade do ato. O Acórdão TCU 1330/2008-Plenário ressalta a preocupação da elaboração de um plano de trabalho prévio aos processos licitatórios, contendo a justificativa da necessidade dos serviços a serem contratados, o demonstrativo de resultados a serem alcançados em termos de economicidade e de aproveitamento dos recursos humanos, financeiros ou materiais disponíveis.
Assim sendo, fica evidenciada a importância de um planejamento adequado e viável para as contratações nos órgãos públicos em qualquer de suas esferas. Além da exigência legal de dedicação a esta importante etapa, cabe a todos àqueles que gerem a coisa pública zelar pela correta aplicação das verbas oriundas da sociedade e que deverão ser empregadas com muita cautela e transparência.
REFERÊNCIAS:
ANDRADE, N. A. et al. Planejamento governamental para municípios: plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias e lei orçamentária anual. São Paulo: Atlas, 2005.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Atualizada até a Emenda Constitucional nº 73 de 06 de abril de 2013. Brasília, DF, 05 de outubro de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 31 de maio de 2013.
_______. Decreto nº 5.450, de 31 de maio de 2005. Regulamenta o pregão, na forma eletrônica, para aquisição de bens e serviços comuns, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5450.htm>. Acesso em: 14 de fevereiro de 2013.
_______. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e dá outras providências, 16 ª edição revisada e atualizada – Curitiba: Zênite, 2015.
_______. Lei nº 10.520, de 17 de Julho de 2002.Institui, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de licitação denominada pregão, para aquisição de bens e serviços comuns, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10520.htm>. Acesso em: 14 de fevereiro de 2013.
_______. Tribunal de Contas da União. Acórdãos e Decisões. Disponível em: <htpp://www.tcu.gov.br>.
FROTA, David Augusto Souza Lopes. Procedimento licitatórios sem a devida justificativa de necessidade de contratação dos serviços ou aquisição de bens. Demonstração da necessidade de contratar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5137, 25 jul. 2017. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/59277>. Acesso em: 18 nov. 2017.
SANTOS, Lucimar Rizzo Lopes dos. A importância do planejamento na contratação pública. Jus Navegandi Eletrônica, jan. 2017. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/55532/a-importancia-do-planejamento-na-contratacao-publica/1>. Acesso em: 17 nov. 2017.