Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

O enquadramento sindical das entidades de representação laboral e os princípios constitucionais da liberdade e unicidade sindical

Exibindo página 2 de 3
Agenda 21/03/2005 às 00:00

6 – Formas de Enquadramento Sindical Após a Constituição Federal de 1988.

As dificuldades para a realização de um enquadramento sindical são claras, diante de tudo o que já fora tratado até aqui. A falta de parâmetros legais para que se identifique a entidade sindical representativa, a liberdade para a criação irrestrita de novos sindicatos, e a existência de sindicatos que representam diversas categorias, são só alguns dos problemas enfrentados quando da identificação da entidade sindical.

Se faz necessário dissertarmos sobre as formas em que a doutrina e a jurisprudência vêm adotando para se fazer o enquadramento sindical, após a Constituição Federal de 1988.

A identificação da entidade sindical pode se dar, como regra, pelo ramo da atividade econômica à qual os trabalhadores estão vinculados, e, como exceção, conforme se considere a identidade da profissão, devidamente regulamentada por lei, as chamadas categorias diferenciadas.


7 – Enquadramento pelo Ramo de Atividade Econômica

Reza o entendimento predominante da doutrina, conforme visto alhures no item "Conceito Básico de Categoria Profissional", que as categorias profissionais podem caracterizar-se pela similitude de condições em situação de emprego na mesma atividade econômica, entendendo Eduardo Gabriel Saad [16] que: "do exercício do mesmo ofício ou da mesma atividade num ramo econômico surge a similitude de condições de vida. Temos, aí, as linhas mestra de uma categoria profissional".

Assim sendo, a situação de emprego em uma mesma atividade econômica, pode caracterizar a similitude de condições que os trabalhadores necessitam para compor uma categoria profissional, razão pela qual a categoria profissional está diretamente ligada a atividade econômica da empresa empregadora.

É a atividade da empregadora que caracteriza a similitude de condições de trabalho, assim sendo, a categoria dos trabalhadores será determinada pela atividade principal do empregador e não pelos atos praticados pelos trabalhadores.

Conclui-se assim que, a delimitação da atividade econômica preponderante do empregador é de extrema importância para se identificar a homogenia, similitude e conexão das profissão.

A atividade preponderante, também chamada de atividade fim, é a atividade principal do empregador. Conforme bem exemplificado pelo Dr. Cláudio Rodrigues Morales [17],em "uma universidade que possui uma pequena gráfica, a atividade preponderante no caso é o ensino e não a exploração da atividade gráfica".

A título didático-ilustrativo imaginemos:

Se por ventura comparássemos, as atividades de uma instituição beneficente e filantrópica, que presta serviços de assistência social caridosa de forma ampla à sociedade, com fornecimento de cestas-básicas aos necessitados, cursos profissionalizantes a jovens carentes, assistência médica ambulatôrial às crianças igualmente carentes; com as atividades exercidas pelas Santas Casas, existentes em todo território nacional, diríamos que: as Santas Casas têm como finalidade principal a assistência médica, e que também fazem caridade; já a Instituição Beneficente e Filantrópica em questão, têm como finalidade principal prestar assistência social em sentido amplo, pois, dentre os serviços sociais que presta, estão incluídos o lazer, a educação, a cultura, a saúde, etc.

Resumindo, poderíamos por assim dizer que, se a Santa Casa deixasse de prestar atendimento médico, esta deixaria de existir; já se a referida Instituição Beneficente em sentido amplo deixasse de prestar o serviço de saúde à população, a mesma não deixaria de existir, pois, esta não é sua atividade fim, mas atividade meio, decorrente da finalidade principal que é a filantrópica, através da assistência social.

Logo, o correto enquadramento sindical seria aquele em que os funcionários da instituição beneficente fossem representados pelo Sindicato dos Trabalhadores em Instituições Beneficentes e Filantrópicas, já, no que tange ao trabalhadores das Santas Casas, estes deveriam ser representados pelo Sindicatos dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Saúde, posto que, a atividade fim das Santas Casas é a prestação de serviços de saúde, mesmo que de forma beneficente.

É adotada assim a sindicalização por categoria – atividade preponderante, sendo esta definida como a totalidade dos trabalhadores de uma mesma atividade econômica.

A categoria profissional é substância; o sindicato, a forma.

Verifica-se na jurisprudência um combate à organização sindical por profissões, já que referida forma de organização poderia gerar a aristocracia do ofício, isolando os trabalhadores em departamentos desfavorecendo o vinculo de solidariedade entre os trabalhadores.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Já o enquadramento por atividade tem como base a idéia do trabalho em comum em uma determinada empresa, embora em diferentes profissões, caracterizando assim um enquadramento na horizontal, diferentemente do enquadramento por profissões isoladas, que caracterizam uma posição mais vertical.

Vem a jurisprudência de forma insistente afirmando que a ATIVIDADE PREPONDERANTE/FIM é a que deve assegurar o correto enquadramento sindical, como assim julga o TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO.

JURISPRUDÊNCIA – TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO RO-DC 256.075/96.8 – Ac. SDC 202/97, 3.3.97 – Rel. Min. Antônio Fábio Ribeiro – LTr 62.06/829

A atividade preponderante da empresa é que deve assegurar o correto enquadramento sindical, caso contrário criar-se-ia representações de tantas quantas forem as atividades necessárias ao funcionamento da empresa, que teria de enfrentar o cumprimento de diversos instrumentos coletivos simultaneamente.

A exceção à regra do enquadramento pela atividade-fim do empregado, aqui exposta, são as chamadas categorias diferenciadas que passamos a estudar.


8 – Enquadramento por Categoria Diferenciada

Mesmo com a regra do enquadramento por atividade preponderante do empregador, a própria CLT prevê a existência das categorias diferenciadas, que não trazem ligação direta com a atividade do empregador.

O parágrafo 3º, do artigo 511 da CLT, define categoria profissional diferenciada como sendo:

Art. 511 - § 3º - Categoria profissional diferenciada é a que se forma dos empregados que exerçam profissões ou funções diferenciadas por força de estatuto profissional especial ou em conseqüência de condições de vida singulares.

Assim nos ensina o saudoso Valentin Carrion (4):

"Categoria profissional diferenciada é a que tem regulamentação específica do trabalho diferente da dos demais empregados da mesma empresa, o que lhes faculta convenções ou acordos coletivos próprios, diferentes dos que possam corresponder à atividade preponderante do empregador, que é a regra geral."

Conforme já exposto, as categorias diferenciadas não seguem o enquadramento pela atividade preponderante, posto que, estas têm as peculiaridades inerentes à própria profissão, sendo assim regulamentadas por lei, por meio de estatutos profissionais, ou ainda face a conseqüência de condições de vidas singulares, não tendo uma identidade com os demais trabalhadores da empresa.

Enquanto a maioria dos trabalhadores pertencem a uma categoria identificada pela atividade do empregador, a categoria diferenciada não tem qualquer ligação com a atividade mas tão somente à profissão em si.

Contudo, deve-se verificar que o aludido enquadramento devesse ao efetivo exercício da profissão e não simplesmente a condição do trabalhador, assim sendo, o advogado que exerce função de caixa em uma estabelecimento comercial deve ter seu contrato de trabalho regido pelas normas dos comerciários, sendo esta a atividade do empregador, bem como a sua atividade no dia-a-dia.

Entretanto, o mesmo não se verifica quando do efetivo exercício de atividade regulamentada, quando então um advogado empregado de estabelecimento comercial deverá ter seu contrato de trabalho regido pelas normas de sua profissão, diferentemente dos demais empregados do aludido estabelecimento, que pertencem a categoria dos comerciários face a atividade do empregador.

Podemos nos valer da lista elaborada pelo saudoso jurista Valentin Carrion [18], para identificarmos algumas das categorias diferenciadas existente, sendo elas: Aeroviários; Aeronautas; Atores teatrais, cenotécnicos e auxiliares de teatro; Cabineiros (ascensoristas); Classificadores de produtos de origem vegetal; Condutores de veículos rodoviários (motoristas); Desenhistas técnicos, artísticos, industriais, copistas, projetistas técnicos e auxiliares (empregados); Enfermagem, técnicos, duchistas, massagistas e empregados em hospitais e casas de saúde (profissionais de); Farmácia (prático de); Gráficos (oficiais); Jornalistas profissionais; Manequins e modelos; Maniquistas e foguistas (de geradores termoelétricos e congêneres, exclusive marítimos); Mercadorias em geral (trabalhadores na movimentas das); Músicos profissionais; Operadores de mesas telefônicas (telefonistas em geral); Parteiras; Professores; Propaganda (trabalhadores em agências de); Propagandistas de produtos farmacêuticos; Publicidade (agenciadores de); Publicitários; Radiocomunicações da Marinha Mercante (oficiais de); Secretárias; Segurança do trabalho (técnico de); Subaquáticas e afins (trabalhadores em atividades); Tratoristas (excetuados os rurais); Vendedores e viajantes do comércio.


9 – Reforma Sindical – Algumas das Propostas do Fórum Nacional do Trabalho

O Fórum Nacional do Trabalho (FNT), coordenado pelo ilustre Dr. José Francisco Siqueira Neto, professor da fraterna Universidade Presbiteriana Mackenzie, vem promovendo debates com o escopo de se buscar mudanças na organização estrutural dos sindicatos, bem como em sua representatividade e em seus procedimentos negociais.

Conforme artigo escrito pelo próprio Dr. José Francisco Siqueira Neto [19], "os objetivos do Fórum são: A) do ponto de vista das reformas, identificar e esclarecer a posição dos mais relevantes atores sociais sobre os institutos essenciais à democratização do sistema brasileiro de relações de trabalho, para possibilitar a elaboração por consenso ou por iniciativa do Governo Federal, de projetos de alteração constitucional ou de legislação infraconstitucional; B) do ponto de vista do diálogo social, consolidar um canal tripartite permanente de discussão pública sobre as relações de trabalho, como também, de discussão prévia sobre projetos legislativos da área".

Assim sendo, a mídia vem veiculando, até a presente data, algum dos pontos discutidos no FNT de maior consenso, quando as mudanças a serem propostas, sendo eles:

i)o fim da unicidade sindical

;

ii)o fortalecimento das centrais sindicais;

iii)a eliminação do conceito de categorias profissionais

ou econômicas; e

iiii)a extinção da contribuição sindical

compulsória.

O primeiro item, o qual refere-se ao fim da unicidade sindical, busca acabar com a regra de que a representação da categoria deva ocorrer por uma entidade sindical específica.

A aludida proposta busca acabar com existência de entidades sindicais ditas de "fachada", que não exercem de forma efetiva a defesa dos interesses da categoria, escondendo-se na impossibilidade jurídica de haver outra entidade representando sua categoria.

A proposta de extinção da unicidade sindical, se complementa com a intenção de se buscar o fortalecimento das centras sindicais, dando à estas instituições poderes para negociar acordos e convenções coletivas de trabalho, o que hoje em dia é atribuição dos entes que compõem o sistema sindical, ou seja, os sindicatos e na ausência destes, as federações e confederações.

Conforme já visto anteriormente, as centrais sindicais até o presente momento não fazem parte do sistema sindical, deixando assim de ter uma natureza sindical. "Elas são associações civis, previstas nos incisos XVII e XXI, do art. 5º, da Constituição Federal, podendo, inclusive, impetrar mandado de segurança coletivo, nos termos do inciso LXX, alínea b, do mesmo dispositivo constitucional" [20], mas não detêm a prerrogativa de negociar acordos ou convenções coletivas, ou mesmo participar de dissídios coletivos de trabalho, o que com a reforma proposta pode vir a ocorrer.

Contudo, necessário se faz destacar que, "para serem reconhecidas, as centrais sindicais precisarão ter representação em 18 (dezoito) Estados de 05 (cinco) Regiões do país, filiar ao menos 15% (quinze por cento) dos trabalhadores de 12 (doze) Estados e 15% (quinze por cento) dos trabalhadores de 07 (sete) setores econômicos" [21].

Além disso, a reforma sindical, proposta pelo FNT, visa a eliminação do conceito de categorias profissionais ou econômicas, fazendo com que a representação sindical fique adstrita aos seus filiados, bem como e a extinção da contribuição sindical compulsória, vez que tal contribuição seria exigível apenas dos filiados ao sindicato, fortalecendo assim com ambas propostas o princípio da liberdade de associação profissional ou sindical insculpido no artigo 8º, caput, da Constituição Federal.

Vale ainda apontar outras proposta do FNT, indicadas pelo Dr. Antônio Carlos Magalhães Leite [22], em matéria veiculada no periódico Gazeta Mercantil, edição n° 846, sendo estas: possibilidade de acordos de diferentes níveis; fim da data-base e de dissídios; obrigatoriedade da negociação, sob pena de multa; possibilidade de validades diferentes em cláusulas de um mesmo acordo; fim do julgamento de greve legal ou abusiva; fim de distinção entre trabalhadores e lideres de greves; criação da liberdade sindical; sindicatos poderão manter exclusividade por vontade dos trabalhadores atendendo critérios; fim do imposto sindical e de contribuições compulsórias; criação da contribuição negocial, cobrada quando houver acordo; e, o fim do poder normativo da Justiça do Trabalho.

Sobre o autor
Márcio Eduardo Riego Cots

Advogado e Professor Universitário. Mestre em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito - FADISP; Pós-graduado em Direito Empresarial pela Universidade Mackenzie. Com Extensão universitária em Direito Contratual pela Fundação Getúlio Vargas - FGV/EDESP. Extrensão universitária em Direito da Tecnologia da Informação pela FGV/ESEPGD e participação no Ilaw Program, na Harvard Law School - EUA. Master of Business Administration pela Faculdade de Informática e Administração Paulista - FIAP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COTS, Márcio Eduardo Riego. O enquadramento sindical das entidades de representação laboral e os princípios constitucionais da liberdade e unicidade sindical. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 621, 21 mar. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6474. Acesso em: 20 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!