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Arbitragem e relações com o Poder Judiciário

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Agenda 27/09/2019 às 15:15

3. O ÁRBITRO

Conforme determina o art. 13, caput, da Lei de Arbitragem, o árbitro pode ser qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes. Podem ser nomeados mais de um árbitro, mas sempre em número ímpar (art. 13, §1º) e, neste caso, haverá um tribunal de arbitragem (art. 13, §§4º e 5º).

No desempenho de sua função, o árbitro é o juiz de fato e de direito. A sentença proferida pelo árbitro tem a mesma força de uma sentença judicial transitada em julgado, vez que não está sujeita a recurso.

O árbitro ao exercer suas atribuições deve agir com imparcialidade, independência (deve se manter distante das partes), competência (deve conhecer e ser experimentado na matéria), diligência (a solução do conflito deve ser pautada por cuidado e zelo) e discrição (deve ser discreto e não divulgar os conflitos que lhe são submetidos em razão do sigilo).

O descumprimento de qualquer dos deveres impostos ao árbitro, por lei ou convenção de arbitragem obriga-o a responder pelos danos que causar. Para efeito da legislação penal, os árbitros, no desempenho de suas funções, são equiparados aos funcionários públicos, estando sujeitos a crimes contra a administração pública.

O árbitro, também poderá ser substituído, caso haja suspeição ou impedimento. É dever do árbitro, antes da aceitação da função, indicar qualquer fato que evidencie dúvida justificada à sua imparcialidade e independência.


4. PROCEDIMENTO ARBITRAL

De acordo com o artigo 19da Lei de Arbitragem, o procedimento arbitral instaura-se com a aceitação do árbitro. As partes escolhem um árbitro, ou se quiserem, podem eleger um tribunal (quando a decisão será tomada por três árbitros) para decidir o conflito, sendo que o árbitro é juiz de fato e de direito e a sentença por ele proferida não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.

A teor do que determina o art. 21, § 2º. da Lei da Arbitragem, no procedimento arbitral devem ser respeitados os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento.

No procedimento arbitral, tendo em vista a informalidade e a ausência de atos judiciais, a presença de um advogado não é obrigatória, trata-se de uma faculdade. Nesse sentido o art. 21, § 3º., da Lei de Arbitragem, preceitua que:

“(...) § 3º. As partes poderão postular por intermédio de advogado, respeitada, sempre, a faculdade de designar quem as represente ou assista no procedimento arbitral. (BRASIL, 1996)

O árbitro poderá tomar o depoimento das partes, ouvir testemunhas e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias, de ofício ou mediante a requisição das partes. Como o árbitro não possui poder coercitivo, quando a convocação para prestar depoimento testemunhal, for ignorada, sem justo motivo, poderá requerer à autoridade judiciária que conduza a testemunha.

Caso a parte desobedeça ao requerimento de depoimento pessoal do árbitro, este ao proferir a sentença, levará em consideração o comportamento da parte faltosa, de modo que, a revelia da parte não impedirá que seja proferida a sentença arbitral, conforme prevê o art. 22, § 3º da lei em análise.

Durante o processo arbitral, se houver necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao Poder Judiciário, em razão da ausência do poder de império do árbitro, como estabelece o art. 22, § 4º da lei 9.307/96.


5. SENTENÇA ARBITRAL

A sentença arbitral tem as mesmas características da sentença emitida pelo juiz estatal. Deverá ser escrita e conter os seguintes requisitos indispensáveis a sua validade: o relatório, seus fundamentos, o dispositivo, data e local em que foi proferida e a assinatura do árbitro ou dos árbitros.

 No relatório deverá constar a qualificação das partes e um resumo do litígio. Na fundamentação serão demonstrados os motivos que levaram o julgador àquela decisão, esclarecendo as questões analisadas e no dispositivo os árbitros estabelecerão o preceito, resolvendo as questões que lhes foram submetidas.

Quando a arbitragem for realizada em um órgão colegiado, a decisão será tomada pela maioria e, se não houver acordo, prevalecerá o voto do presidente do tribunal arbitral. Nessa hipótese, poderá o árbitro que divergir da maioria, se quiser, declarar o seu voto em separado e também por escrito. Caso contrário, restará consignado o voto vencido, sem declaração.

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No que diz respeito ao conteúdo, a sentença arbitral deverá abranger todo o objeto do litígio, decidir sobre a responsabilidade das partes acerca das custas e despesas, bem como sobre a verba decorrente de litigância de má-fé, se for o caso.

Na hipótese de composição amigável, o árbitro ou tribunal arbitral declarará extinto o processo por meio da prolação da sentença arbitral, cujos fundamentos serão os termos do acordo ou transação ajustada entre as partes.

O prazo para emissão da sentença, conforme preconizam os arts. 11, III e 23 da Lei da Arbitragem, pode ser estipulado pelas partes na convenção de arbitragem. Quando não for estipulado, o prazo será de 06 meses. Ultrapassado o prazo, o árbitro será notificado para que profira a sentença em 10 dias e caso não seja proferida a decisão, a parte que o notificou poderá pleitear a nulidade da sentença proferida depois do prazo (art. 32, VII) em razão da extinção do compromisso arbitral (art.12, III).

A sentença emitida pelo árbitro é irrecorrível e dispensa a homologação do Poder Judiciário, possuindo, portanto, força executiva, ou seja, é um título executivo judicial. Faz coisa julgada e se não for devidamente cumprida será executada perante o Judiciário.

Importante ressaltar que a sentença arbitral, por se tratar de procedimento privado e sigiloso, não é publicada. A ciência das partes ocorrerá através de comunicação por qualquer meio idôneo que permita o recebimento de cópia da decisão, com comprovação do recebimento ou poderá ser designada audiência para leitura, intimação e publicação da sentença, momento em que o árbitro entregará pessoalmente uma cópia do julgado.

As partes, ao receberem a notificação ou ciência pessoal acerca da sentença arbitral, terão o prazo de 5 (cinco) dias para solicitar ao árbitro que corrija algum possível erro material, ou que esclareça uma obscuridade, dúvida ou contradição (art. 30 da Lei de Arbitragem). Por sua vez, o árbitro terá o prazo de 10 (dez) dias para aditar a sentença, caso seja necessário, e cientificar as partes.

A única possibilidade de impugnar a decisão arbitral é o ajuizamento de ação anulatória, no prazo de 90 dias, contados da sua prolação, nos termos do art. 33 da Lei Arbitragem. As hipóteses de anulação estão previstas no art. 32 da mencionada norma.

5.1. Sentença arbitral estrangeira

De acordo com o art. 34, parágrafo único da Lei de Arbitragem, considera-se sentença arbitral estrangeira aquela que tenha sido proferida fora do território nacional. Desse modo, a lei brasileira adotou o local onde é proferida a sentença como critério para identificar a nacionalidade da sentença.

A sentença arbitral estrangeira, para ser executada no território nacional, deverá, antes, ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça nos termos do art.105, I, i, da CF/88.

Cumpre salientar que, antes da Emenda Constitucional 45/2004, a competência para homologação da sentença arbitral estrangeira era do Supremo Tribunal Federal, até em razão do art. 35 da Lei de Arbitragem, que agora deve ser lido em conjunto com a redação constitucional.

Também devem ser observados os requisitos constantes nos artigos 37, 38 e 39, da Lei de Arbitragem. Após a homologação, a sentença estrangeira adquire eficácia em todo o território nacional, sendo título executivo.

O mérito da sentença estrangeira não pode ser apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça, pois a homologação restringe a análise dos seus requisitos formais.


6. RELAÇÕES COM O PODER JUDICIÁRIO

A Lei de Arbitragem representou um avanço no ordenamento jurídico brasileiro, na medida em que colocou a jurisdição estatal e a privada, lado a lado, à escolha do jurisdicionado, que pode optar em utilizar o que lhe parecer mais adequado, de acordo com a natureza e as particularidades do litígio a ser dirimido.

A arbitragem não surgiu para enfraquecer ou substituir o judiciário, ao contrário, apresenta-se como uma alternativa a mais à disposição das partes, solucionando conflitos de forma célere, segura e eficaz.

Como ensina Fernanda Tartuce,

[...] a adoção de técnicas não tradicionais exige uma mudança de visão dos operadores do direito e, aponta que a “cultura da sentença” instalou-se entre a sociedade, devendo ser substituída pela “cultura da pacificação. (TARTUCE, 2008, p.117)

É de suma importância que haja divulgação desta técnica, que pode ser produzida por meio de incentivo ao estudo da arbitragem nas faculdades de Direito, para ensinar os  futuros profissionais que o Judiciário não é a única via de solução de conflitos e que os métodos alternativos representam uma importante via de acesso à Justiça de forma ágil e eficaz.

O legislador, sensível a essa necessidade, reconhecendo a importância da arbitragem como instrumento de resolução de conflitos e com o intuito de aperfeiçoar a Lei de Arbitragem, propôs o Projeto de Lei do Senado n°. 406, de 2013, que trata de diversos aspectos relevantes, bem como aborda o incentivo à inclusão da disciplina da arbitragem como método de resolução de conflitos nas instituições de ensino superior e no conteúdo programático de concursos públicos para ingresso nas carreiras do Poder Judiciário e do Ministério Público, previstos nos artigos 40-A e 40-B.

A inserção dos artigos acima referidos merece destaque, posto que, certamente, contribuirá para o avanço e propagação da arbitragem, bem como para mudança de mentalidade dos profissionais do direito e da sociedade, a fim de que o instituto da arbitragem e o Poder Judiciário possam coexistir em perfeita sintonia.

O Poder Judiciário tem grande importância no processo arbitral brasileiro, já que contribui com a arbitragem em vários momentos, agindo de maneira a garantir a efetividade do juízo arbitral, como por exemplo, a execução de medidas no sentido de forçar as partes para o cumprimento de algumas decisões emitidas pelo árbitro, o qual não detém o poder de império.

É o que se verifica no caso das medidas cautelares, antecipação de tutela e execução da própria sentença arbitral. Há vários artigos da Lei de Arbitragem que fazem menção à parceria do árbitro com o juiz estatal, dentre eles estão: instituição forçada da arbitragem quando uma das partes se recusa a cumprir o convencionado na cláusula compromissória (art. 7°); fixação de honorários dos árbitros (art.11, parágrafo único); nomeação de terceiro árbitro (art. 13, § 2°); substituição de árbitro suspeito (art. 20, §§1º. e 2º.); depoimento de testemunhas (art. 22, §2º.); resolução de questão incidental sobre direito indisponível (art.25); hipóteses em que pode ser arguida a nulidade da sentença arbitral (art.33); reconhecimento de sentença arbitral estrangeira no Brasil (art. 35).

Por outro lado, a arbitragem também merece destaque na medida em que se apresenta como uma ferramenta eficiente capaz de auxiliar no desafogamento do Poder Judiciário.


7. CONCLUSÃO

A arbitragem se revela um importante mecanismo de solução de conflitos à disposição dos jurisdicionados, uma alternativa adicional, que com a mudança de mentalidade dos operadores do direito e da própria sociedade, se mostra hábil na desobstrução do Judiciário e, ao lado deste, em uma relação de parceria, pode caminhar de mãos dadas pela estrada do acesso à justiça rumo à tão almejada pacificação social.


Referências Bibliográficas

ALVIM, José Eduardo Carreira. Comentários à Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307, de 23/9/1996). Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2004.

BERNARDES, Camila Fernandes Santos. Aplicação da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em <http://www.publicadireito.com.br/artigos/htm>. Acesso em maio de 2014.

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CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1988.

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. Um comentário à lei 9.307/96. 3ª. ed. - São Paulo: Atlas, 2009.

MARDEGAN, Maria Beatriz Espirito Santo. Arbitragem: Um meio de acesso à ordem jurídica justa. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos>. Acesso em junho de 2014.

TASP – Tribunal Arbitral de São Paulo. Arbitragem no Brasil. Disponível em: <http://www.arbitragem.com.br/index.php>. Acesso em maio de 2014.

TARTUCE, Fernanda. Mediação nos Conflitos Cíveis. São Paulo: Método, 2008.

TORRE, Riccardo Giuliano Figueira. Controle Judicial do Processo Arbitral? Revista de Arbitragem e Mediação, ano 10. vol. 38. Jul.-set/2013. p.283.

SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio, Manual de Arbitragem – 4ª ed. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

WATANABE, Kazuo. Modalidade de mediação. Disponível em:<http://cjf.jus.br/revista/seriecadernos/vol22/artigo04.pdf>. Acesso em junho de 2014.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Wender Rodrigues. Arbitragem e relações com o Poder Judiciário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5931, 27 set. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67258. Acesso em: 22 dez. 2024.

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