Com esteio nas lições de Humberto Theodoro Júnior (2017, p. 1.107-1.109), pondere-se que a prova se destina a promover a certeza ou convicção do julgador a respeito de determinados fatos litigiosos. Entretanto, ao escrutinar e coligir os meios de prova para formar seu convencimento, o juiz não pode atuar arbitrariamente. Deve, opostamente, vislumbrar um método ou sistema.
De fato, aludia o CPC/1973 que o juiz deveria “apreciar livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos”, competindo-lhe, todavia, “indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento” (art. 131).
Nessa senda, tal critério legal recebia da doutrina a denominação de sistema da persuasão racional” ou de “livre convencimento motivado”. Reconhecia-se, por meio dele, a inexistência de hierarquia entre as provas, que por isso poderiam ser “livremente avaliadas”, conforme a força de convencimento gerada sobre o juiz (destinatário de todas as provas produzidas no processo).
Não se tratava, contudo, de um poder discricionário, já que, a par da liberdade de elencar as provas que melhor se destinariam à solução da lide, a lei exprimia o dever de balizar a sua escolha, que somente poderia ser executada mediante prévio contraditório entre as partes, aliada à posterior possibilidade de impugnação recursal.
Noutro viés, o CPC/2015 adota o o princípio democrático da participação efetiva das partes na preparação e formação do provimento, pelo qual haverá de ser editado pelo juiz para se chegar à justa composição do litígio, e o legislador optou por suprimir a menção ao “livre convencimento do juiz” na apreciação do lastro probatório.
Assim, na exegese do art. 371 do NCPC, “o juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”.
Por consequência, determinou-se a prerrogativa de apreciar não a prova que livremente escolher, mas todo o conjunto probatório existente nos autos, ou seja, repeliu-se a tendência esboçada em certa corrente jurisprudencial que reconhecia ao juiz o dever de justificar a conclusão ultimada, desde que expressasse razões capazes de sustentá-la.
Conclui-se, outrossim, que no sistema processual brasileiro não há propriamente hierarquia de provas, de modo que o juiz examina o conjunto dos elementos instrutórios do processo, formando seu convencimento com liberdade (NCPC, art. 371). Ou seja, não mais se possibilita que a confissão, a prova pericial e até mesmo a testemunhal possa sobrepujar, em determinado caso concreto, a prova documental, se for o caso.
Por outro lado, excepcionalmente, pode haver antecipação de tais provas, conforme preconiza o art. 381, CPC/2015, pelo que, nesse sentido, opera-se a antecipação de prova propriamente quando a parte não possui condições de aguardar o momento processual reservado à coleta dos elementos de convicção necessários à instrução da causa pendente ou por ajuizar. São hipóteses em que o litigante exerce a “pretensão à segurança da prova”, sem contudo antecipar o julgamento da pretensão de direito substancial (THEODORO JR., 2017, p. 1.157).
Acerca do procedimento, cumpre esclarecer que a produção antecipada de prova, permitida pelo NCPC, tem cabimento qualquer que seja a natureza da demanda visada – que pode ser contenciosa, ou mesmo de jurisdição voluntária –, e tanto pode ser manejada por quem pretenda agir como por quem queira defender-se, como ainda por quem apenas queira certificar a ocorrência de determinado fato, documentando-a judicialmente.
Sua admissibilidade, entretanto, não fica subordinada à liberalidade do interessado promovente, posto que é primordial que esteja presente a necessidade de antecipar-se a prova para alguns dos objetivos traçados pelo art. 381 do NCPC, ou seja:
(a) para evitar a impossibilidade de sua realização futura (inciso I);
(b) para viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito (inciso II); ou
(c) para conhecimento prévio dos fatos que possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação (inciso III).
Ressalte-se, outrossim, que antecipação de prova pode dar-se antes do ajuizamento da ação principal, em caráter cautelar, ou no curso desta. No curso da ação principal, a coleta antecipada de elemento de convicção é fruto de simples deliberação do juiz da causa, que importa apenas inversão de atos processuais e que integra a própria atividade instrutória do processo.
Ademais, se a antecipação ocorrer antes do ajuizamento da ação principal, será procedimento antecedente que, contudo, não ensejará a prevenção da competência do juízo para o processo futuro, se vier a ser proposto (NCPC, art. 381, § 3º).
Referências bibliográficas
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. I. 58. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017.