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A dignidade da pessoa humana frente à cobrança vexatória no Direito do Consumidor

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6. JULGADOS

Nas pesquisas sobre o tema percebeu-se que os Tribunais têm reconhecido a prática abusiva das empresas.

As decisões são, em sua maioria, baseadas em fixação de indenizaçãopor meio de quanrias necessárias para reparar o dano e reprimir novas ocorrências.

Os magistrados enfatizam que o direito de realizar a cobrança não pode exceder os limites legais.

Nesse sentido a 23ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paul, nos autos da ação nº 1002503-59.2017.8.26.0073, julgou procedente a apelação do autor que pleitou indenização por danos morais decorrentes de cobrança vexatória.

Narra o acórdão que o banco-apelado alegou não serem abusivas ou vexatórias as cobranças efetuadas.

No entanto, foi demonstrado pelo apelante que um escritório de advocacia terceirizado pelo banco apelado enviou mensagens de “SMS” para a sua irmã e sua filha, sem que o autor tenha fornecido os números de telefones delas no contrato bancário.

Segundo o acórdão, além dos “prints” de celular acostados aos autos com conversas de whatsapp com as referidas familiares, o autor juntou “prints” de página do site “Reclame Aqui”, no qual estão registradas várias reclamações dirigidas ao escritório de advocacia contratato pela banco apelado.

O eminente desembargador entendeu que os relatos possuem extrema semelhança com a situação narrada pela parte autora, havendo queixas de mensagens enviadas com elevada frequência, de mensagens encaminhadas a familiares e, até mesmo, de ligações feitas a colegas de trabalho e a superiores.

Concluiu o ilustre desembargador que, o constrangimento provocado pelas mensagens a familiares alheios à relação jurídica era evidente.

Assim, proferiu decisão, condenando o banco apelado ao pagamento da quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) referentes a danos morais que arbitrou fundamentando que a estimativa do dano moral deve ser tal a possibilitar a reparação mais completa, considerando a conduta do réu e a repercussão na esfera íntima do autor, sempre se respeitando a proporcionalidade da situação econômica de ambas as partes.

No mesmo sentido, a 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos da ação nº 1015592-17.2017.8.26.0602, julgou procedente a apelação do autor que pleitou indenização por danos morais decorrentes de cobrança vexatória.

Narra o acórdão que a ação de cobrança de taxas condominiais promovida pela apelada já se encontrava em fase de execução quando a requerida, nomeada depositária de veículo penhorado, afixou faixas no mesmo automóvel com dados do processo e cópia do auto de apreensão do bem, permitindo a perfeita identificação do devedor, no caso, o autor.

Acrescentou que o veículo foi estacionado na portaria do condomínio, por onde passam todos os moradores, o que causou ainda mais constrangimento e humilhação ao requerente.

Segundo o acórdão, referidas alegações foram suficientemente demonstradas com fotos reproduzidas nos autos e a revelia da ré só veio colaborar para que se reputassem verdadeiras as asserções fáticas feitas pelo autor.

Na decisão o eminente desembargador aduziu que a conduta da ré caracterizou abuso de seu direito de cobrança e causou ao autor humilhação e vexame de tamanha monta que enseja o dever de indenizar.

Aduziu, ainda, que não há dúvida de que constitui exercício regular de direito a cobrança de débito inadimplido, porém, ao colocar faixas no veículo do autor, que foi penhorado nos autos da ação executiva, identificando-o perante terceiros como inadimplente, extrapolou seu direito de cobrança, causando vexame e constrangimento desnecessários ao devedor.

Ressaltou, o desembargador, que cobrar dívidas é atividade legítima, limitando-se a objeção legal aos excessos cometidos no afã de receber aquilo de se é credor.

Concluiu essa parte, asseverando que é, portanto, o abuso que torna a cobrança ilícita. Abuso que somente ocorre quando a forma como de realiza a cobrança apela para a coação moral.

Condenou a ré a pagar a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) referentes a danos morais, que arbitrou fundamentando que o montante repara de modo suficiente os prejuízos extrapatrimoniais experimentados pelo autor e não lhe acarreta enriquecimento sem causa, além de que, é apto a evitar a reiteração da conduta lesiva da ré.

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Seguindo a mesma linha, a 38ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo nos autos da ação nº 102555-68.2017.8.26.0071 negou provimento a apelação das rés e manteve a sentença proferida em 1ª instância que julgou procedente o pedido da autora de indenização por danos morais decorrentes de cobrança vexatória.

Narra o acórdão que as rés realizaram procedimento abusivo para realizar a cobrança de dívida realizando sucessivas e incontáveis ligações tanto para a autora quanto para a conhecida da autora.

Segundo a decisão, o levantamento apresentado pela parte autora, e não impugnado, demonstram que foram realizadas cinco chamadas no dia 01 de setembro, uma chamada no dia 31 de agosto, cinco chamadas no dia 30 de agosto e uma e uma chamada no dia 29 de agosto para o telefone fixo da conhecida da autora, muitas dela num intervalo de alguns minutos.

O eminente desembargador asseverou que, embora as rés tivessem o direito de realizar a cobrança, elas o fizeram de forma abusiva e vexatória, com o escopo evidente de prejudicar o sossego e as atividades da autora.

Assim, manteve a sentença que julgou procedente o pedido da autora, condenando às rés ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais.

Também, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais nos autos da ação nº 1.0106.15.001266-9/001 negou provimento a apelação do réu e manteve a sentença proferida em 1ª instância que julgou procedente o pedido da autora de indenização por danos morais decorrentes de cobrança vexatória.

Narra o acórdão que o banco réu realizou procedimento abusivo para realizar a cobrança de dívida realizando ligações de cobrança no local de trabalho da autora, perante diversas pesssoas.

Segundo a decisão, a cobrança vexatória foi corroborada ela oitiva de diversas testemunhas.

O eminente desembargador asseverou que, mesmo com o atraso no pagamento, não se justificava a cobrança abusiva realizada pelo apelante que sispõe de diversas medidas legais para tanto.

Assim, manteve a sentença que julgou procedente o pedido da autora, condenando o reu ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais.

Para encerrar, colaciono outro julgado referente a cobrança vexatória e, desta feita, o acordão é 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul nos autos da ação nº 70074370685 negou provimento a apelação do réu e manteve a sentença proferida em 1ª instância que julgou procedente o pedido da autora de indenização por danos morais decorrentes de cobrança vexatória.

Narra o acórdão que o banco réu realizou procedimento abusivo ao realizar cobrança de dívida por meio de constantes ligações para a autora em seu local de trabalho. Ressaltou que na ação anterior foi reconhecido a inexistencia da dívida.

Segundo a decisão, a cobrança vexatória foi corroborada ela oitiva de diversas testemunhas.

O eminente desembargador asseverou que, as ofensas à honra e a personalidade da suplicante foram reiteradas, tendo ela, ainda, sido cobrada de forma ostensiva, pública e constrangedora perante seus colegas de trabalho no posto de gasolina.

Assim, manteve a sentença que julgou procedente o pedido da autora, condenando o réu ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O consumidor é parte vulnerável nas relações de consumo e está sim protegido por mormas.

A Constituição Federal protege o consumidor por meio de diversos princípios nela insculpidos, dentre eles, um dos mais importantes principícios que o da dignidade da pessoa humana.

De outra parte, temos o Código de Defesa do Consumidor que consagra este como parte vulnerável nas relações de consumo, impondo sanções a quem afrontar seus dispositivos.

Não ostante, os consumidores precisam conhecer seus direitos e procurar os órgãos de poteção e até o mesmo o judiciário quando estiverem diante de uma cobrança abusiva ou vexatória.

A jurisprudência, analisada neste artigo, é assente no sentido de que a cobrança abuviva e vexatória geram direito à indenização por causar constrangimento, ofensa direta e pessoal.

Na maior parte dos casos as empresas terceirizam o setor de cobrança para “evitar” transtornos, desgates e até despesas, considerando que quem pagará a conta desse serviço será o próprio consumidor.

Ocorre que a maior parte dessas empresas especializadas efetuam cobranças que extrapolam os limites da legalidade, chegando a configurar crime tipificado no Código de Defesa do Consumidor.

Além disso, ferem a dignidade do consumidor, assim como as normas e os princípios insculpidos do Código de Defesa do Consumidor e na Constituição Federal.

A conclusão a que podemos chegar nesse artigo é de a inadimplência do consumidor, seja por dificuldades financeiras ou por qualquer outro motivo, não dá direito ao fornecedor de efetuar cobranças abusivas ou vexatórias, adifinal existem diversas medidas legais para o recebimento do valor devido, sem que seja infringido a dignidade da pessoa.

A dignidade da pesssoa humana e as leis devem ser respeitadas pois o direito de cobrança não pode se afastar da ética e de sua finalidade.


REFERÊNCIAS

Livro

BENJAMIN, ANTONIO HERMAN V. Manual de Direito do Consumidor / Antonio Herman V. Bnjamin, Claudia Lima Marques, Leonardo Roscoe Bessa. – 5. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

DENSA, ROBERTA. Direito do Consumidor. 9º ed. – São Paulo: Atlas, 2014.

GRINOVER, ADA PELLEGRINI et al. Código de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

NISHIYAMA, ADOLFO MAMORU. A proteção constitucional do consumidor, 2ª edição. Atlas, 12/2009. [Minha Biblioteca].

SOARES, RICARDO MAURÍCIO FREIRE. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, 1ª edição. Saraiva, 10/2009. [Minha Biblioteca].

TARTUCE, FLÁVIO. Manual de direito do consumidor: direito material e processual / Flávio Tartuce, Daniel Amorim Assumpção Neves.– 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: MÉTODO, 2014.

Lei

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acessado em: 10/03/2018.

________. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm Acessado em: 10/03/2018.

Jurisprudência

BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Cível nº 1.0106.15.001266-9/001. Apelante: Banco Santander. Apelado: Milena Ferreira da Silva. Relator: Desembargador Pedro Bernades. Belo Horizonte, 26 de abril de 2018. Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.

________. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70074370685. Apelante: Banco do Estado do Rio Grande do Sul S/A. Apelado: Elisangela Aparecida da Silva D’Avila. Relator: Desembargador Marcelo Cezar Muller. Porto Alegre, 24 de agosto de 2017. Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado Do Rio Grande do Sul.

________. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível nº 1002503-59.2017.8.26.0073. Apelado: Itaú Unibanco S/A. Apelante: Luiz Carlos Aleixo. Relator: Desembargador Francisco de Godoi. São Paulo, 26 de abril de 2018. Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

________. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível nº 1015592-17.2017.8.26.0602. Apelada: Associação doa Sitiantes da Fazenda Amadeu – ASIFA. Apelante: Ricardo Llicínio Rangel. Relator: Desembargador Francisco Loureiro. São Paulo, 22 de maio de 2018. Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

________. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível nº 1025550-68.2017.8.26.0071. Apelado: Elizabete Aparecida Gomes e Toledo e Piza Advogados Associados. Apelante: BV Financeira S/A Crédito, Financiamento e Investimento. Relator: Desembargador Eduardo Siqueira. São Paulo, 21 de agosto de 2018. Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Revista

MORAES, MARIANA RODRIGUES LOPES. A inconstitucionalidade da suspensão do serviço de energia elétrica de consumidor hipervulnerável em face do princípio da dignidade da pessoa humana. REVISTA ESMAT, [S.l.], v. 6, n. 7, p. 79-112, jun. 2015. ISSN 2447-9896. Disponível em: http://www.esmat.tjto.jus.br/publicacoes/index.php/revista_esmat/article/view/4/6 Acesso em: 24 mar. 2018.


FONTES DE INFORMAÇÕES

AUTORREGULAÇÃO BANCÁRIA http://portal.autorregulacaobancaria.com.br/pagina/14/5/pt-br/conteaqui Acessado em: 05.09.2018.

CONSUMIDOR https://www.consumidor.gov.br/pages/principal/?1536182713458 Acessado em: 05.09.2018.

EXAME https://www.exame.abril.com.br/economia/numero-de-inadimplentes-no-brasil-em-maio-bate-recorde. Acessado em: 24.03.2018

FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS – FEBRABAN https://portal.febraban.org.br/ Acessado em: 24.03.2018.

PROCON http://www.procon.sp.gov.br/categoria.asp?id=1254 Acessado em: 05.09.2018.

Sobre as autoras
Luci Mendes de Melo Bonini

Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, Professora de Filosofia e Pesquisadora no Mestrado em Políticas Públicas da Universidade de Mogi das Cruzes. Área de interesse: Direitos Humanos e Políticas Públicas.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade de Mogi das Cruzes – Curso de Direito como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Profª Orientadora Dra. Luci Mendes de Melo Bonini, Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP e pesquisadora em políticas públicas, Universidade de Mogi das Cruzes, lucibonini@gmail.com

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