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A outorga uxória na união estável

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Agenda 02/02/2019 às 10:00

POSICIONAMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL NA  INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1647, I, E 1725 DO CÓDIGO CIVIL  E PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL

Está pacificado no entendimento doutrinário atual que, havendo silêncio dos companheiros conviventes, o regime de comunhão parcial de bens é aplicável à união estável.

 Para DINIZ (2007) “deve exigir outorga de companheiro na alienação de imóvel adquirido onerosamente durante união estável, sob pena de anulabilidade, ou, até mesmo, um “registro de união estável” para que haja segurança nas negociações imobiliárias à terceiros de boa-fé e aos companheiros (artigo 4º e 5º, e por analogia o artigo 1647, CC)”

No entanto, discute-se se o sentido e o alcance da norma contida no art. 1725, mormente no que se refere à expressão “no que couber”, atinge a obrigatoriedade da outorga uxória para a hipótese prevista no art. 1647, I, do Código Civil. Para Azevedo (2002) no que se refere especificamente à expressão “no que couber” (art. 1725, CC), se trata de reprodução dos termos da Lei nº 9278/96, ou seja, que a união estável apenas cria verdadeiro condomínio entre os companheiros.

Alerta Paulo Nader (2005) que antes de uma análise específica mais acurada é de bom alvitre relembrar que, fixar o sentido de uma norma jurídica significa descobrir a sua finalidade, isto é, pôr a descoberto os valores consagrados pelo legislador, ou, em outros termos, aquilo que teve por mira proteger. Por sua vez, fixar o alcance é demarcar o campo de incidência da norma jurídica, conhecendo sobre que fatos sociais e em que circunstâncias ela tem aplicação.

Nessa linha de pensamento devemos ater atenção à expressão “no que couber, posto que nela há obscuridade acerca do alcance da norma em comentário. Assim, deve-se ampliar o real sentido da norma do art. 1725, CC – fazendo-a incidir as regras da comunhão parcial de bens, em sua plenitude, às relações convivenciais, salvo contrato escrito entre os companheiros.

Significa dizer, portanto, que essa ampliação atinge também a obrigatoriedade de consentimento do companheiro para alienação de bens imóveis comuns registrados apenas em nome de um deles, sob pena de invalidação do ato, conforme preconizam os arts. 1647 e 1649, CC.

Importante ressaltar quer que nos casos em que há união estável registrada em cartório, o consentimento é exigido, conforme já afirmou o Superior Tribunal de Justiça no Resp. 1.424.275/MT:

DIREITO CIVIL. ALIENAÇÃO, SEM CONSENTIMENTO DO COMPANHEIRO, DE BEM IMÓVEL ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL. A invalidação da alienação de imóvel comum, fundada na falta de consentimento do companheiro, dependerá da publicidade conferida à união estável, mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência de união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, ou da demonstração de má-fé do adquirente. A Lei 9.278/1996, em seu art. 5º, ao dispor acerca dos bens adquiridos na constância da união estável, estabeleceu serem eles considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos os conviventes, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito. Dispôs, ainda, que a administração do patrimônio comum dos conviventes compete a ambos, questão também submetida ao poder de disposição dos conviventes. Nessa perspectiva, conforme entendimento doutrinário, a alienação de bem co-titularizado por ambos os conviventes, na esteira do citado artigo, sem a anuência de um dos condôminos, representaria alienação – pelo menos em parte – de coisa alheia, caracterizando uma venda “a non domino”, ou seja, um ato ilícito. Por outro lado, inolvidável a aplicabilidade, em regra, da comunhão parcial de bens à união estável, consoante o disposto no caput do art. 1.725 do CC. E, especialmente acerca da disponibilidade dos bens, em se tratando de regime que não o da separação absoluta, consoante disciplinou o CC no seu art. 1.647, nenhum dos cônjuges poderá, sem autorização do outro, alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis. A interpretação dessas normas, ou seja, do art. 5º da Lei 9.278/1996 e dos já referidos arts. 1.725 e 1.647 do CC, fazendo-as alcançar a união estável, não fosse pela subsunção mesma, esteia-se, ainda, no fato de que a mesma ratio– que indisfarçavelmente imbuiu o legislador a estabelecer a outorga uxória e marital em relação ao casamento – mostra-se presente em relação à união estável; ou seja, a proteção da família (com a qual, aliás, compromete-se o Estado, seja legal, seja constitucionalmente). Todavia, levando-se em consideração os interesses de terceiros de boa-fé, bem como a segurança jurídica necessária para o fomento do comércio jurídico, os efeitos da inobservância da autorização conjugal em sede de união estável dependerão, para a sua produção (ou seja, para a eventual anulação da alienação do imóvel que integra o patrimônio comum) da existência de uma prévia e ampla notoriedade dessa união estável. No casamento, ante a sua peculiar conformação registral, até mesmo porque dele decorre a automática alteração de estado de pessoa e, assim, dos documentos de identificação dos indivíduos, é ínsita essa ampla e irrestrita publicidade. Projetando-se tal publicidade à união estável, a anulação da alienação do imóvel dependerá da averbação do contrato de convivência ou do ato decisório que declara a união no Registro Imobiliário em que inscritos os imóveis adquiridos na constância da união. A necessidade de segurança jurídica, tão cara à dinâmica dos negócios na sociedade contemporânea, exige que os atos jurídicos celebrados de boa-fé sejam preservados. Em outras palavras, nas hipóteses em que os conviventes tornem pública e notória a sua relação, mediante averbação, no registro de imóveis em que cadastrados os bens comuns, do contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência da união estável, não se poderá considerar o terceiro adquirente do bem como de boa-fé, assim como não seria considerado caso se estivesse diante da venda de bem imóvel no curso do casamento. Contrariamente, não havendo o referido registro da relação na matrícula dos imóveis comuns, ou não se demonstrando a má-fé do adquirente, deve-se presumir a sua boa-fé, não sendo possível a invalidação do negócio que, à aparência, foi higidamente celebrado. Por fim, não se olvide que o direito do companheiro prejudicado pela alienação de bem que integrava o patrimônio comum remanesce sobre o valor obtido com a alienação, o que deverá ser objeto de análise em ação própria em que se discuta acerca da partilha do patrimônio do casal. REsp 1.424.275-MT, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 4/12/2014, DJe 16/12/2014. (STJ – Informativo n. 554).

Assim, resta claro que a outorga exigida aos cônjuges não deve ser exigida aos companheiros, salvo exista contrato de convivência devidamente registrado.

Ademais, alerta Fiuza, Lima e Junior (2016) que exigir do contratante a busca por informações referentes a União Estável do fiador, é conferir a ele tarefa quase impossível que além de prejudicar os atos contratuais, irá prejudica-lo demasiadamente no âmbito econômico, posto que, dessa maneira, estar-se-ia criando uma maneira pela qual é possível agir de má fé e beneficiar-se, utilizando-se da lei.

Ainda Fiuza, Lima e Junior (2016), a tendência é de a União Estável aproximar-se cada vez mais do casamento até que se chegue a uma simetria quase igualável. Enquanto isso não ocorre, conforme exposto ao longo deste estudo, o Estado precisa criar meios para garantir os direitos advindos dessa modalidade de família que espelha uma parte da sociedade que convive a muitos anos sem a proteção devida.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo o exposto, é possível concluir que a outorga uxória é de suma importância no regime de união estável quando há alienação de bens adquiridos conjuntamente e a conscientização deve ser clara caso um dos companheiros venha prestar aval ou fiança, não acarretando prejuízos ao companheiro ou terceiro de boa-fé.

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É possível concluir também que sua ampla utilização no meio social aponta para uma maior regulamentação legislativa, de forma que esse assunto não acarrete mais dúvidas nos processos judiciais, pois embora boa parte da doutrina e jurisprudência entenda que não há a necessidade de autorização de ambos os conviventes em união estável, existe a corrente que acredita e defende a ideia de que a união estável se compara com o casamento civil, tendo assim a mesma proteção jurídica quanto ao patrimônio familiar, sendo então um direito real e não simplesmente pessoal, necessitando de maior regulamentação.

O ideal seria  ampliar o alcance da regra contida no art. 1725 CC, interpretando-o conforme a Constituição Federal de 1988, pois, ao equiparar a união estável ao casamento, a lei maior vedou qualquer espécie de discriminação protetiva entre essas entidades familiares.

Por fim, à norma que regula os efeitos patrimoniais da união estável (art. 1725 CC) devem incidir, na sua totalidade, os preceitos que disciplinam o regime da comunhão parcial de bens, incluindo a obrigatoriedade do consentimento do companheiro para os atos que importem venda de bens imóveis comuns, bem como as consequentes sanções previstas em caso de violação desse dispositivo.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BENEDITO, Luiza Machado Farhat e OLIVEIRA,  Juliana Aparecida Gomes Oliveira. A Outorga Conjugal e a União Estável no Novo Código de Processo Civil. Revista Meritum – Belo Horizonte – v. 12 – n. 2 – p. 269-284 – jul./dez. 2017. Disponível em: < http://www.fumec.br/revistas/meritum/article/view/5258/pdf> . Data do Acesso: 05/10/2018.

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DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias; 10. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias; 10. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015

DINIZ, Maria Helena. As lacunas do Direito. 8º ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

GUIMARÃES, Luís Paulo Cotrim. Negócios Jurídicos sem a Outorga do Cônjuge ou Convivente. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

JUNIOR, Otavio Luiz Rodrigues, FIUZA, César Augusto De Castro e LIMA , Renata Albuquerque.

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TARTUCE, Fernando; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 5: Direito de Família. São Paulo: Método, 2011.


Notas

[3]              é necessária em diversos atos potencialmente lesivos, como no caso do cônjuge que vai prestar fiança ou aval, por exemplo. Quando a outorga uxória é exigida por lei, a falta dessa autorização pode repercutir na validade do ato praticado pelo outro cônjuge.

[4]              Expressão corrente na doutrina, que, no entanto, não dispõe ele previsão legal. Nada mais significa do que propriedade em "mão comum", ou seja, pertencente a ambos os cônjuges ou companheiros.

[5]           É a efetivação do direito à metade do patrimônio compartilhado com alguém, caso haja este direito. É o caso de casamentos onde não há divisão total de bens, por exemplos.

[6]           (STJ, REsp 861.058/MG, 4." T., Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, p. 2 1/11/2013)

Sobre os autores
Raquel de Melo

Aluna do 10º período de Direito da Católica do Tocantins.

Antonio Cesar Mello

Professor Doutor do Curso de Direito da Católica do Tocantins. E-mail: antonio.cesar@catolica-to.edu.br

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Raquel; MELLO, Antonio Cesar. A outorga uxória na união estável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5694, 2 fev. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70221. Acesso em: 25 dez. 2024.

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