Dizia o art. 201, § 1º, da Constituição Federal de 1988 até 15.12.98: "Qualquer pessoa poderá participar dos benefícios da previdência social, mediante contribuição na forma dos planos previdenciários".
Talvez por sua obviedade gritante o dispositivo desapareceu da Carta Magna com a EC n. 20/98, mas seu espírito filosófico, inspirador e norteador continua presente. Em termos de previdência social tornou a filiação tradicionalmente representada pelo trabalho remunerado como anacrônica e abriu o caminho para a contributividade, reforçada pela EC n. 20/98 e consubstanciada pela Lei n. 9.876/99. E reafirmada pela EC n. 41/03.
I. Fundamento filosófico
A norma legal tenta dar cumprimento ao princípio da universalidade de cobertura horizontal (CF, art. 194, I,) característica da seguridade social como técnica de proteção social.
O facultativo — juntamente com o segurado especial inscrito facultativamente sem prejuízo de sua condição de segurado obrigatório (PCSS, art. 25, § 1º) — substitui o antigo contribuinte em dobro cuja origem remonta ao MONGERAL, de 10.1.1835 (sic), extinto com as suas nuanças ("O Contribuinte em Dobro e a Previdência Social", LTr Edit., SP, 1984).
Seu espectro, a partir de 24.7.91, porém, é mais amplo: abrange o anterior tipo de contribuição não obrigatória e estende-se à pessoa nunca filiada.
2. Conceito legal
O "qualquer pessoa" da Lei Maior era exagero, queria dizer a não obrigatoriamente segurada. Salvo para o referido segurado especial, as duas condições se excluem. A base material da filiação do facultativo é a vontade de ingressar no RGPS ou de nele permanecer. Curiosamente, este segurado facultativo tem de contribuir "obrigatoriamente" para não perder a sua condição e o autônomo, segurado obrigatório, na prática é um verdadeiro "facultativo"; pode entrar em inadimplência sem perder a filiação...
O art. 25, § 1º, do PCSS, faz exceção relativamente ao in fine do art. 14 e, assim, o produtor, parceiro, meeiro, arrendatários rurais, o pescador artesanal e os assemelhados podem simultaneamente inscrever-se como facultativos.
3. Generalidades técnicas
O alargamento do conceito cria situações curiosas e pode modificar um pouco a natureza do seguro social. A intenção da Carta Magna, como expressão e instrumento da universalidade da seguridade social, afetou a natureza da previdência social e o seu papel: não é mais exclusivamente retributiva em relação ao trabalho nem a prestação é inteiramente substitutiva dos rendimentos da pessoa humana. No mínimo, poderá incrementar a informalidade da economia e sugerir o não-registro como empregado, indicando-lhe a solução para inscrição facultativa, se inexistente competente fiscalização.
Quem ingressa incapaz para o trabalho não faz jus ao auxílio-doença ou à aposentadoria por invalidez, mas, mesmo sem trabalhar, poderá filiar-se como facultativo e, preenchidos os demais requisitos legais, ter direito à aposentadoria por idade. Por qualquer motivo, quem nunca trabalhou, mas contribuiu durante 30 a 35 anos, fará jus à aposentadoria por tempo de contribuição. À exceção do auxílio-acidente, só não poderá aportar durante a percepção de benefícios. Quando efetivamente o tempo de contribuição excluir o tempo de serviço, aquele que recebe auxílio-doença deverá poder contribuir como facultativo
Enfatiza-se o viés de poupança coletiva obrigatória e, no caso, individual da previdência social. Só assim se pode explicar a autorização para quaisquer pessoas poderem inscrever-se e contribuir, independentemente do trabalho.
Nesse sentido, o objetivo da Lei Maior e da própria lei ordinária é oferecer, a quem quiser, a possibilidade de contribuir e obter os benefícios correspondentes a essa filiação "especial". Desnaturando a previdência social tradicional e a transformando, em parte, em caderneta de poupança.
Anacronicamente, mas com certo sentido atuarial e tradicional, sem amparo na Carta Magna, mas também, possivelmente, sem ser inconstitucional, as Leis n. 8.212/91 e n. 8.213/91 fixam determinada capacidade etária para a filiação, falando em 14 anos, majorada para 16 anos com a EC n. 20/98 (CF, 7º, XXXIII). A idéia é igualar esses segurados aos demais, correspondendo à idade mínima para ser empregado. Não teria muita lógica o pai inscrever o filho ao nascer e 30 anos após ele se "aposentar", quando todas as demais pessoas só podem fazer a inscrição a partir dos ditos 16 anos.
4. Início da filiação
O dealbar da filiação do facultativo se dá com a exteriorização material e formal do seu desejo de ingressar na previdência social (ou manter-se) e, conseqüentemente, de recolher mensalmente, valendo como demonstração da vontade essa inscrição e pagamento. O pressuposto material é a inscrição promovida no INSS (NIT).
E, é óbvio, pode acontecer no dia seguinte ao fim do contrato de trabalho de ou outra condição filiativa.
5. Qualidade de segurado
Trata-se de segurado atípico, com qualidade de segurado como qualquer outro, mantida por seis meses após a cessação das contribuições (PBPS, art. 15, VI) mais 45 dias (§ 4°), e com todos os direitos inerentes a sua situação de ocioso, computando o tempo de filiação/contribuição iniciado no seu regime (a despeito do disposto na redação original do art. 55, III e V, do PBPS).
Para ele, a data de filiação é a da inscrição. Nesse momento, para tornar efetivo o animus de se filiar, a pessoa deve fazer o primeiro recolhimento, coincidindo o mês de competência com o de pagamento. A partir do dia do desembolso dessa contribuição inicial, nasce a filiação e, também, computa-se o período de carência. In casu, não pode haver retroação da DIC, exceto se, de alguma forma tivesse requerido por escrito, ou registrada em cartório, a vontade de ser esse tipo de segurado.
Se perder a qualidade de segurado (PBPS, art. 15, VI e § 4°), pensando em retornar, terá de se refiliar, ou seja, reiniciar as contribuições sem poder pagar os atrasados. Mas, se parar de pagar pelo tempo inferior a esses sete meses e quinze dias ficará obrigado a recolher as mensalidades atrasadas.
Diferentemente do art. 9º da CLPS, o facultativo pode deixar de contribuir, afastando-se do regime previdenciário a qualquer momento, e a ele retornar sem imperiosa necessidade de recolher as contribuições não recolhidas excluídas do período de manutenção da qualidade.
6. Alíquota e base de cálculo
Afastado do regime contributivo do salário-base desde 1°.4.03 (ex vi da Lei n. 10.666/03), a alíquota é de 20% e a base de cálculo, qualquer valor compreendido entre o salário mínimo e o limite do salário-de-contribuição, em 2005, por exemplo será 20% x R$ 500,00 = R$ 100,00.
Do ponto de vista individual é difícil sustentar porque o empregado contribui, no máximo, com 11% (agora não importando os 20% da empresa, que interessa apenas ao INSS) e o facultativo pague quase o dobro (20%). Se o Governo Federal deseja a formalização da economia terá de fixar alíquotas menores e progressivas.
7. Arrependimento eficaz
A contribuição vence-se no dia 15 do mês subsequente, que é o mês de competência (PCSS, art. 30, II, na redação da Lei n. 9.876/99).
Depois do vencimento não é possível arrepender-se da base de cálculo, exceto se com demonstração persuasória convincente, mas até o dia 15 do mês subseqüente tem permissão legal para: a) aumentar a base de cálculo e reforçar a contribuição ou b) pedir restituição do que considerou excessivo. Tendo em vista o novo período básico de cálculo da Lei n. 9.876/99, também poderá reduzir a contribuição no mesmo seguinte que o resultado, com vistas à renda mensal inicial, será o mesmo.
8. Substituição da filiação
Enquanto permanecer a anacrônica exigência de o segurador só poder computar o tempo de serviço comprovando o exercício da atividade, com o pagamento da contribuição ao tempo dos fatos é perfeitamente válido substituir a (difícil, inútil e onerosa) prova do trabalho pela condição de facultativo (promovidos os necessários ajustes).
Quer dizer, quem trabalhou e não pode provar o fato, mas contribuiu terá de ser entendido como quem recolheu como facultativo.
9. Distinção necessária
O art. 14 do PCSS disciplina o facultativo, abrangendo, como dito, o antigo contribuinte em dobro e o segurado especial do art. 12, VII (este último, inscrito, ao mesmo tempo, como facultativo e obrigatório), bem como, e especialmente, qualquer segurado não obrigatório, admitido no RGPS.
Em virtude do disposto nos incisos III e V do art. 55 do PBPS, era preciso estabelecer certa distinção quanto ao facultativo: 1) quem nunca exerceu atividades sujeitas à filiação obrigatória do RGPS e nele desejava ingressar, poderia filiar-se facultativamente e, a princípio, sem contar o tempo de contribuição para a aposentadoria por tempo de serviço; 2) o segurado especial, para ter benefícios calculados com base na contribuição, a par da filiação obrigatória, está autorizado a filiar-se facultativamente, contando o tempo de serviço em razão da atividade exercida; 3) quem deixar de exercer atividade sujeita ao RGPS preservará a qualidade de segurado e computará o tempo de serviço, para todos os fins da previdência social (como o antigo contribuinte em dobro).
A primeira conclusão defluía do art. 55, II, do PBPS. Ao contrário e corrigindo o cochilo do legislador, o art. 58, VI, do RBPS, manda contar "o período de contribuição efetuado como segurado facultativo".
10. Desaparecimento do dobrista
O contribuinte em dobro, cuja identidade desapareceu, após a cessação da atividade, o trabalhador podia manter a qualidade de segurado, conservando a filiação por vontade própria e preservando, indefinidamente, enquanto contribuinte (e mais o período de graça), os direitos inerentes à condição de filiado, além de contar o tempo correspondente à contribuição. Tal cômputo foi originariamente autorizado pela Lei n. 5.610/70 ("Diversos aspectos da situação do Contribuinte em Dobro", in Supl. Trab. LTr n. 30/78).
11. Fim do salário-base
Até o advento da Lei n. 9.876/99, nos termos dos arts. 14 e 21 do PCSS, o facultativo igualava-se aos segurados sujeitos à escala de salários-base, submetendo-se, destarte, às regras do regime contributivo da Lei n. 5.890/73. Se nunca exerceu atividade sujeita ao art. 12 do PCSS, enquadrava-se na Classe 1 — um salário mínimo (PCSS, art. 29, § 2º). Se o fez, nos termos do art. 29, § 8º, o posicionamento podia ser na classe mais próxima da média aritmética simples corrigida dos últimos seis salários-de-contribuição ou abaixo dela, mas, diferentemente do antigo contribuinte em dobro, sempre em uma das dez classes (cuja extinção gradual foi programada pela Lei n. 9. 876/99).
A contar da referida Lei n. 9.876/99, ainda bastante assemelhado aos contribuintes individuais, quem se filiou como facultativo, sujeitou-se à alíquota de 20%, escolhendo, como base de cálculo, qualquer valor compreendido entre o salário mínimo e o limite do salário-de-contribuição (nos anos de 2005/06, de R$ 300,00 a R$ 2.668,15).
12. Generalidades
O alargamento do conceito cria situações curiosas e pode modificar a natureza do seguro social. A intenção da Carta Magna, como expressão e instrumento da universalidade da seguridade social, afetou a natureza da previdência social e seu papel: não é mais exclusivamente retributiva em relação ao trabalho nem a prestação é inteiramente substitutiva dos rendimentos da pessoa humana. No mínimo, vai incrementar a informalidade da economia e sugerir o não-registro como empregado, indicando-lhe a solução para inscrição facultativa se inexistente competente fiscalização.
Quem ingressa incapaz para o trabalho não faz jus ao auxílio-doença ou à aposentadoria por invalidez, mas, mesmo sem trabalhar, poderá filiar-se como facultativo e, preenchidos os demais requisitos legais, ter direito à aposentadoria por idade. Quem nunca trabalhou, por qualquer motivo, mas contribuiu durante 30 a 35 anos, fará jus à aposentadoria por tempo de contribuição. À exceção do auxílio-acidente, só não poderá pagar durante a percepção de benefícios. Quando efetivamente o tempo de contribuição excluir o tempo de serviço, aquele que recebe de auxílio-doença deverá poder contribuir como facultativo
Enfatiza-se o viés de poupança coletiva obrigatória e, no caso, individual da previdência social. Só assim se pode explicar a autorização para quaisquer pessoas poderem inscrever-se e contribuir, independentemente do trabalho.
Nesse sentido, o objetivo da Lei Maior e da própria lei ordinária é oferecer, a quem quiser, a possibilidade de contribuir e obter os benefícios correspondentes a essa filiação "especial".
Anacronicamente, mas com certo sentido atuarial e tradicional, sem amparo na Carta Magna, mas também, possivelmente, sem ser inconstitucional, as Leis n. 8.212/91 e n. 8.213/91 fixam determinada capacidade etária para a filiação, falando em 14 anos, majorada para 16 anos com a EC n. 20/98 (CF, 7º, XXXIII). A idéia é igualar esses segurados aos demais, correspondendo à idade mínima para ser empregado. Não teria muita lógica o pai inscrever o filho ao nascer e 30 anos após ele se "aposentar", quando todas as demais pessoas só podem fazer a inscrição a partir dos ditos 16 anos.
13. Admissão do juridicamente incapaz
Inexistindo qualquer obstáculo para a filiação de pessoa incapaz para o trabalho, com vistas a outros benefícios (aposentadorias por idade ou tempo de contribuição), questiona-se a possibilidade do absolutamente incapaz para os atos da vida civil promovê-la e, por meio de curador, tomar as providências necessárias para a inscrição e conseqüente contribuição mensal. O dispositivo constitucional (art. 201, § 1º) era claramente protetivo, devendo ser interpretado extensivamente. Não há na lei óbice, salvo o limite etário mínimo, a ser observado. Pode, pois, o dito curador cuidar da ligação dessa pessoa, substituindo a vontade dela no enquadramento como facultativo e, a final, requerimento do benefício decorrente dessa situação particular.
14. Vedação ao servidor
Reportando-se ao Prejulgado n. 3-c, aprovado quando vigentes as regras da LOPS, e aos arts. 7º/8º do Regulamento do Custeio (Decreto n. 612/92), o CRPS, através de Enunciado de 2.12.93, entendeu o seguinte: "O ingresso do segurado em regime próprio de previdência pelo mesmo emprego, importa na sua exclusão automática da Previdência Social para o qual não pode contribuir como facultativo".
O Enunciado faz remissão à Portaria MTPS n. 3.286/73, baixada em outras circunstâncias e época, tratando do contribuinte em dobro, figura não coincidente com a do facultativo, perdendo, pois imprescindível fundamento.
Em seu art. 201, § 1º, a Constituição Federal, além de abarcar os obrigatórios, permitia o ingresso dos facultativos do RGPS. Em seu art. 13, o Plano de Benefícios, e no seu art. 8º, o Regulamento dos Benefícios, acordes, mantiveram-se na linha de pensamento do art. 14 do PCSS e do art. 13 do RCPS: se a pessoa não está filiada ao RGPS pode contribuir como facultativo.
Assim, diferentemente do Enunciado do CRPS, não há impedimento de o servidor público, sujeito a regime próprio de previdência social, independentemente de sua filiação obrigatória, filiar-se facultativamente ao RGPS. As referências ao "mesmo emprego", objeto do Prejulgado citado, induziram o CRPS ao equívoco; a partir de 1º.11.91, qualquer pessoa, mesmo nunca tendo sido segurada, pode iniciar-se como contribuinte. Lá, cuidava-se de outra situação; de quem, em razão do mesmo emprego, antes submetido ao então INPS, transformou-se em estatutário, obrigando-se ao regime próprio.
15. Facultativo no exterior
A Portaria MPAS n. 4.198/97 dispôs sobre a filiação de facultativo residente no exterior.
16. Clientela protegida
Esmiuçada, a clientela de tais segurados é vasta: a) qualquer pessoa não exercente das atividades descritas no art. 12 do PCSS (normalmente remuneradas); b) quem deixou de exercer atividade submetida à filiação obrigatória; c) qualquer não exercente de atividade; d) servidor federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal; e) brasileiro residente no exterior ou estrangeiro; f) quem exerceu mandato eletivo estadual, distrital ou municipal até janeiro de 1998; g) ocupante de cargo de Ministro de Estado, de Secretário de Estado, secretário distrital ou municipal, até fevereiro de 2000; h) síndico de condomínio ou administrador eleito para exercer atividade de administração condominial, mesmo quando remunerado, até fevereiro de 1997 (art. 14, I/III, da IN INSS/DC n. 100/03); i) percipiente do auxílio-acidente ou do antigo auxílio-suplementar, desde que simultaneamente não esteja exercendo atividade que o filie obrigatoriamente ao RGPS; j) bolsista e estagiário, inclusive o de advocacia, que prestem serviços à empresa, de acordo com a Lei n. 6.494/77; k) brasileiro que acompanha cônjuge para prestar serviços no exterior (IN INSS/DC n. 118/05, art. 10, a/d, e §1°); l) a dona-de-casa; m) estudante; n) membro do Conselho Tutelar (art. 132 da Lei n. 8.069/90; p) bolsista com dedicação integral à pesquisa; o presidiário que não exerça atividade remunerada; q) brasileiro residente ou domiciliado no exterior, salvo se filiado a regime previdenciário de País com o qual o Brasil mantenha acordo internacional (RPS, art. 11); r) pertencente a outro regime próprio de previdência social, na hipótese de afastamento sem vencimento e sem poder ser facultativo nesse regime próprio; s) ex-empregador rural não sujeito a outro regime de previdência social (INSS/DC n. 57/01, art. 2°, VI, b/d); t) categorias anteriormente excluídas da Previdência Social ("Uma classificação de segurados da Previdência Social", in Supl. Trab. LTr n. 26/10), em que compreendido o estagiário da Portaria MTPS n. 1.002/67.