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Directum: construindo uma sociedade justa

O que é o Direito? O que é a Justiça? Qual a origem do Direito? Teoria Juscongruente do Direito

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Agenda 21/01/2019 às 07:40

Qual a origem do Direito?

É Nader (2012, p. 191) quem oferece a definição de Direito Natural, “ordem não escrita, não promulgada pelos homens”.  Para os gregos antigos, “as leis humanas fundavam-se naquela lei única, acessível ao conhecimento pela via da razão”. Na literatura grega, encontra-se um registro da existência de um Direito superior ao positivo. Sófocles afirma, na Antígona, que “as ordens que o rei ditava não eram superiores às leis não escritas e imutáveis [...], existentes de longa data”.

Nos termos precisos de Nader (2012, p. 192),

O Direito Natural é referência para o legislador e para as consciências individuais. O homem médio da sociedade, além de orientar-se socialmente pelo conhecimento vulgar do Direito, guia-se também pelos princípios do Direito Natural. Se o apurado conhecimento desta ordem se obtém pela reflexão, certo é, que a simples experiência de vida à percepção de seus princípios mais fundamentais. Estes configuram verdadeira fonte ordenadora da conduta  e não se reduzem à ordem moral. Direito Natural e Moral, por seus princípios, estão presentes na consciência humana. Conquanto não se circunscrevam no mundo da cultura, a percepção mais ampla das duas esferas pressupõe espírito adaptado ao meio civilizado. [...]

Aduz ainda o autor que o Direito natural “tem como objetivo o resguardo das condições essenciais da convivência.” Entende o pensador que o Direito Natural é uma tutela de fins, informando que seus princípios consideram a natureza humana e os fins que os homens buscam.

A segunda corrente objeto deste estudo defende que a origem do Direito reside na própria norma positiva emanada pelo estado. Trata-se do Positivismo Jurídico que, não obstante sua ramificação, é possível divisar dois tipos essenciais. O primeiro, o Juspositivismo Puro, que conduz às últimas consequências o caráter normativo do Direito, identificando-o com as normas. Esta corrente positivista tem no austríaco Hans Kelsen seu mais destacado expoente.

O segundo segmento desta corrente é representado pelo Positivismo Eclético, corrente que busca mitigar o caráter estritamente normativo do Direito, matizando-o com abordagens de ordem sociais, filosóficas, históricas e culturais, expandindo a sua abordagem para pô-la em sintonia com realidade sócio-histórica em que está inserida.

O principal expoente do Positivismo Eclético é o saudoso professor brasileiro Miguel Reale, formulador da Teoria Tridimensional do Direito, em que esta vinculação com a realidade sócio-histórica sobressai-se sobremodo.


O que é a Justiça?

O conceito de justiça é ínsito ao Direito. No entanto, não se confunde com este, uma vez que é possível haver apenas arcabouço jurídico sem que haja justiça.

De outro ponto de vista, sempre que houver justiça, estar-se-á diante do Direito, tendo em vista que o que é justo é sempre Direito. A justiça, portanto, é passível de conceituação autônoma, como é o objetivo deste estudo.

Segundo Montalvão (apud Kelsen, 2017, p. 17), a questão sobre o que é a justiça representa uma destas temáticas para as quais o homem nunca encontrará uma resposta definitiva. Nos precisos termos da sua declaração,

Nenhuma outra questão foi tão passionalmente discutida; por nenhuma outra foram derramadas tantas lágrimas amargas, tanto sangue precioso; sobre nenhuma outra, ainda, as mentes mais ilustres - de Platão a Kant – meditaram tão profundamente. E, no entanto, ela continua até hoje sem resposta. Talvez por se tratar de uma dessas questões para as quais vale o resignado saber de que o homem nunca encontrará uma resposta definitiva; deverá apenas tentar perguntar melhor. KELSEN (apud MONTALVÃO, 2017, p. 17)               

O professor Montalvão (2017, p. 19) insiste em que a palavra definitiva sobre o que é a justiça não é possível, acrescenta o professor que “o máximo que se pode dizer é que ela é um conceito fundamental, irredutível, da ética, da filosofia social e jurídica”. Sem embargo das respeitáveis opiniões, este estudo pretende responder a esta questão sob o ponto de vista da filosofia, como vem-se de afirmar.

O sentimento de justiça existe desde o início da vida gregária. A prática do justo sempre foi necessária, mesmo quando se tinha de justiça uma ideia equivocada, a partir da sensibilidade ética vigente em cada época.

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Com efeito, Nader (2012, p. 67) ensina que “o instituto da escravidão, a discriminação contra a mulher e os estrangeiros, a Lei de Talião correspondiam ao ideário do justo”. Esta realidade corrobora a afirmativa de que o Direito acompanha a evolução da sociedade e que, nem sempre, anda em harmonia com a justiça.

A justiça pressupõe a alteridade, uma vez que se pratica o justo em face de alguém. Na terminologia jurídica, o termo justiça é empregado em dois sentidos. De um lado, como valor a ser realizado nas relações interindividuais sob o comando da lei. De outro, como órgão público responsável pela aplicação da lei aos casos concretos.

Também se afirma com propriedade que o tema justiça é inexaurível, sempre atual e que, ao longo dos tempos, desafia as reflexões e assertivas dos filósofos. Para o ser humano comum, prevalece o sentimento do justo, embora do ponto de vista filosófico, o mesmo não teça reflexões acerca da justiça. O sentimento do justo é intuitivo e espontâneo, enquanto a ideia de justiça constitui-se em resultado de reflexão, para as quais contribuem a experiência e a razão.

Bittar (2005, p. 445) ressalta que, de todas as correntes que procuraram encontrar uma resposta para a pergunta o que é justiça,

as correntes e doutrinas ocidentais sofreram profundas e diretas influências das seguintes ideias:

  1. De Platão, advém uma herança segundo a qual a justiça é uma virtude suprema;
  2. De Aristóteles advém uma herança segundo a qual a justiça é igualdade/proporcionalidade;
  3. Dos juristas romanos advém uma herança segundo a qual a justiça é vontade de dar a cada um o seu [...]

Na esteira destas conceituações, o pensamento positivista considera a conceituação do que é justiça um absurdo, considerando que justiça é um conceito impossível de ser definido.

Nos ensinamentos de Bittar (2005, p. 447)

A questão da justiça, quando vista como elemento fundante do ordenamento jurídico, pode ser considerada como algo relacionado com a doação de sentido. [...] O Direito, [...], se desprovido de essência e de finalidade, serve a qualquer finalidade, independentemente de qualquer valor, [...] A justiça, nesse sentido, passa a ser a ratio essendi do Direito que, por si e em si, sem esse parâmetro valorativo, não possui sentido. [...] De qualquer forma, o que se percebe é que direito e justiça são conceitos diferentes que às vezes andam em sintonia, às vezes em dissintonia. [...] nem sempre o Direito caminha pari passu com a justiça, ainda assim, ele a busca e nela deposita sua finalidade de existir e operar na vida social. O Direito deve ser o veículo para a realização da justiça.

Esta visão coloca a justiça como parâmetro de realização do justo, servindo de norte para a aplicação do Direito. A valoração do Direito quanto ao critério da justiça coloca em evidência a possibilidade de manifestações jurídicas que não sejam justas, por não guardarem correlação com os imperativos da justiça e, assim, constituírem apenas manifestações jurídicas. É direito, mas não corresponde à manifestação do justo, sendo a justiça um parâmetro de aferição do Direito, constituindo seu objetivo.

Por fim, defende o autor que a dignidade da pessoa humana constitui-se em valor que informa todo o sistema jurídico, desempenhando papel de fundamento do Estado Democrático de Direito, sendo a pessoa humana tanto princípio quanto fim do Estado e do Direito.

Nader (2012, p. 75) defende que “para bem conhecer a missão do Estado e do Direito, mister se faz conhecer a pessoa humana, a dignidade que lhe é inerente”.

Pelo pressuposto da dignidade da pessoa humana, a ideia de justiça pugna pela sua essencialidade, tanto quanto o Direito, a Justiça constitui-se em tema basilar para a pacificação e o sucesso da vida em sociedade, nos precisos termos de Nader (2012, p. 72), “Pode-se afirmar que a justiça constitui condição essencial para o bem estar das pessoas, daí a necessidade de se envidarem todos os esforços, intelectuais e práticos, para a sua prevalência.


CONCLUSÕES

O que é o Direito?

Teoria Juscongruente do Direito

A partir da reflexão acerca do quanto aqui debatido, chega-se à conclusão de que o Direito é a realização do dever ser.

Se algo deve ser de determinada forma e acontece desta forma, tem-se o Direito.

Esta abordagem permite uma análise em dois aspectos: o dever ser mais imediato e o dever ser mais filosófico. Do ponto de vista mais imediato, este conceito coincide com a noção de Direito do homem comum, vez que considera que fazer o que deve ser feito é algo direito e que pessoas que fazem o que deve ser feito são pessoas ‘direitas’.

Do ponto de vista mais filosófico, tem-se que o dever ser do Direito é uma sociedade justa. Neste sentido, é Direito tudo o que contribui para uma sociedade justa. Esta noção remete ao termo latino Directum. Também faz referência ao termo alemão Recht, que significa reto como uma régua. Em ambos os termos, apresentam significados idênticos, ou seja, sem rodeios.

Qual a origem do Direito?

Vistas as correntes jusnaturalista e juspositivista, havendo mesmo dicotomia entre as mesmas, inspirando divisões e discussões acaloradas e tendo em vista o quanto aqui discutido, chega-se à conclusão de que a origem do direito é o próprio ser humano, haja vista que a correção é uma necessidade do espírito. Em outros termos, o sentido de que as coisas sejam corretas é uma necessidade humana. Disso decorre a unificação das duas correntes, uma vez que nasce de uma necessidade humana tanto o agir como se deve quanto a positivação do direito.

O que é a Justiça

Quanto à definição do conceito filosófico de Justiça, este estudo chega à conclusão de que Justiça é a equivalência entre o ser e o dever ser. Sempre que o que acontece for equivalente ao que deve acontecer, sempre que uma lei, uma decisão ou qualquer fato jurídico se amoldar às necessidades do dever ser, sempre que se observar esta equivalência, estar-se-á, seguramente, diante da Justiça.

A título de arremate, sempre que alguém fala em Justiça, está se referindo à ‘justeza’ entre estes dois aspectos: o ser e o dever ser.           


REFERÊNCIAS

BITTAR, Eduardo C. B., ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de Filosofia do Direito. 4.ª Edição. São Paulo: Atlas, 2005

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6.ª Edição. São Paulo: Martins Fontes, 1999

MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do Direito. 5.ª Paulo: Edição. São Atlas, 2016

MONTALVÃO, Bernardo. Resolução 75 do CNJ: Descomplicando a Filosofia do Direito. 1.ª Edição. Salvador: Jus Podium, 2017

NADER, Paulo. Filosofia do Direito. 21.ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2012

REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 19.ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2002

SKINNER, Quentin. As Fundações do Pensamento Político Moderno. 1.ª Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 1996

VILLEY, Michel. Formação do Pensamento Jurídico Moderno. 1.ª Edição. São Paulo: Martins Fontes, 2005

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