Resumo: O artigo terá como objetivo principal dispor sobre a capacidade processual das pessoas casadas, sendo analisado desde a história do casamento. O casamento é considerado por muitos, uma das instituições sociais mais importantes, irá mostrar também os seus diversos efeitos que envolvem várias áreas do direito. Também mostrará um pouco da evolução do casamento na sociedade. A palavra família e casamento estão intimamente ligados, não podendo falar de uma, sem mencionar a outra. Juntamente com a evolução do casamento, surgiram também os tipos de rompimento, sendo o atual o divórcio direto. O matrimônio influencia diretamente na demarcação da legitimidade processual, tanto na ativa e passiva, conforme será mostrado neste trabalho. Irá dispor sobre a união estável especificando seus modos de como é comprovada.
Palavras-chave: casamento, capacidade processual, pessoas casadas.
1. INTRODUÇÃO
A palavra Família vem do latim, famulus, que significa escravo doméstico. Família é a organização social que constitui as bases do Estado, e merecendo a sua proteção, sendo constituída pelos pais e sua prole. Tal organização é jurídica e social e resulta do casamento ou da união estável.
São vários os conceitos de casamento, apresentados pelos doutrinadores e legisladores, desde o tempo do Direito Romano até hoje, conceitos estes que sempre estão relacionados à filosofia, religião e valores.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves: Durante a Idade Média, as relações de família regiam-se exclusivamente pelo direito canônico, sendo o casamento religioso o único conhecido. (GONÇALVES, 2010, p. 32)
Antes da República, existia apenas o casamento religioso, dessa maneira, os nãos católicos, não possuíam acesso ao matrimônio. Somente em 1891, surge o casamento civil. Uma família só era reconhecida se fosse formada pelos sagrados laços do matrimônio.
O casamento é criado com base na lei, e tem como propósito a reprodução ou a mútua assistência, ele tem caráter permanente e personalíssimo criando vários direitos e deveres entre os cônjuges. Ele possui uma enorme função social, por ser uma das maneiras mais tradicionais para a constituição de uma família. Antes era visto com uma visão completamente patriarcal, hoje, de acordo com o Código Civil, tanto o homem, quanto a mulher possuem os mesmos direito e são obrigados pelos mesmos deveres na relação conjugal. No Brasil, o casamento é provado pela sua certidão do registro civil, ocorrendo a perda da mesma será comprovado por outra prova qualquer.
Homens e mulheres atingem a idade núbil com 16 anos, sendo que até os 18 anos precisam da autorização dos pais ou de seus representantes legais. Quando os pais ou representantes não aceitam o casamento, entre os maiores de 16 e menores de 18 anos, e a razão for injusta, ela poderá ser preenchida pelo Juiz. Excepcionalmente, o código civil em seu art. 1.520. diz que será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil (art.1517) para preservar-se da imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez.
De acordo com Maria Helena Diniz, o casamento gera diversas consequências nas áreas pessoais, sociais e principalmente jurídicas:
O casamento produz várias consequências que se projetam no ambiente social, nas relações pessoais e econômicas dos cônjuges e nas relações pessoais e patrimoniais entre pais e filhos, dando origem a direitos e deveres que são disciplinados por normas jurídicas. Esses direitos e deveres constituem os efeitos do matrimonio por vincularem os esposos na suas mutuas relações, demonstrando que o casamento não significa simples convivência conjugal, mas uma plena comunhão de vida ou uma união de índole física e espiritual. (DINIZ, 2012, p. 142).
2. SOBRE A CAPACIDADE DAS PESSOAS
A capacidade das pessoas já começa sendo regulada pelo artigo 1º do Código Civil em nosso ordenamento jurídico onde afirma que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.
Segundo Marcos Vinicius Rios Gonçalves:
Dentre as pessoas físicas, nem todas terão aptidão para estar em juízo pessoalmente. O art. 70. do CPC a atribui apenas àquelas pessoas que se acham no exercício dos seus direitos, que, de acordo com a lei civil, têm a chamada capacidade de fato ou exercício. Em outras palavras, á pessoas capazes. (GONÇALVES, 2016, p.195)
Maria Helena Diniz sustenta que:
Da análise do art. 1º do Código Civil surge a noção de capacidade, que é a maior ou menor extensão dos direitos e dos deveres de uma pessoa. De modo que a esta aptidão, oriunda da personalidade, para adquirir direitos e contrair deveres na vida civil, dá-se o nome de capacidade de gozo ou de direito. A capacidade de direito não pode ser recusada ao individuo, sob pena de se negar sua qualidade de pessoa, despindo-o dos atributos da personalidade. (DINIZ, 2012, p.167)
Para Silvio Venosa:
Todo ser humano é sujeito de direitos, portanto, podendo agir pessoalmente ou por meio de outra pessoa que o represente. Nem todos os homens são detentores da capacidade de fato. Essa assim chamada capacidade de fato ou de exercício é a aptidão para pessoalmente o individuo adquirir direitos e contrair obrigações. (VENOSA, 2012, p. 135)
As consequências da vida matrimonial também envolvem a área processual, pois passam a possuir o estado civil de casadas. Segundo Didier Jr, “O casamento é fato jurídico que repercute de forma bastante significativa no processo civil, mais especificamente em relação á capacidade processual das pessoas casadas”. (2017, p.361). Em regra, os cônjuges separadamente podem propor ação judicial sem o consentimento do outro, porém essa regra não é absoluta.
Compreende-se assim que a capacidade equivale na habilidade de por em prática os atos da vida civil. Habilidade esta, que deverá ser apurada na relação processual, manifestando assim a capacidade processual, em seu próprio nome ou alheio.
Concluímos que os de incapazes, sem plena capacidade de gerir a própria vida, não possuem capacidade processual. Eles têm capacidade de ser parte, porém para estar em juízo, precisam de um representante legal ou de assistência. Os entes despersonalizados podem figurar como partes em demandas, mesmo que não tenham personalidade jurídica.
3. O CONSENTIMENTO EM CASOS DE AÇÕES REAIS IMOBILIÁRIAS E PROVAS
Primeiramente, é importante saber que o código de processo civil prevê que os cônjuges deverão ser necessariamente citados para as ações que versem sobre direitos reais imobiliários, salvo quando casados sob regime de separação absoluta de bens, resultados de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou de atos praticados por eles; fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem de família e que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóveis de um ou ambos os cônjuges, nos termos do 73 do mesmo.
De acordo com o Código Civil de 2002, no art. 1647, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I- alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II- pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos, onde este ultimo possui caráter processual. A respeito deste ultimo inciso Didier Jr afirma que: “O inciso também se aplica ás causas que versam sobre direitos reais imobiliários sobre a coisa alheia, por força do inciso I, deste mesmo artigo, que a eles faz referência (“gravar de ônus real”) (2017, p. 361)
Para Didier Jr:
Nada impede, por exemplo, que a autorização para a propositura de ação real imobiliária (art.1647, II, Código Civil) seja dada na própria petição inicial, eis que, em relação á prova do consentimento, se aplica a regra do art. 220. do Código Civil, segundo a qual “a anuência ou a autorização de outrem, necessária á validade de um ato, provar-se-á do mesmo modo que este, e constará, sempre que se possa, o próprio instrumento”. (DIDIER JR, 2017,p. 364)
Não há forma estipulada para que um ato como esse seja praticado, em relação as provas, Didier Jr. comenta: “Há, porém, outros meios de prova, por exemplo: a) assinatura da procuração para o advogado que atuará na causa; b) documento criado com essa exclusiva finalidade, que será anexado á petição inicial.” (2017, p. 364)
Em relação ao casamento com regime de separação absoluta de bens, existe uma súmula 377 do stf, que não tem um efeito vinculante, que diz : “No regime da separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.
Essa súmula do STF gera descontentamento de muitos, pois sua aplicabilidade a comprovação de que o nubente contribuiu para a aquisição dos bens adquiridos na constância do matrimônio.
O objetivo das ações possessórias é a proteção jurídica da posse, nessas ações não se compete a propriedade, e sim a efetiva posse daquele que a detém, se discute a defesa da posse. Em alguns casos de ações possessórias os dois têm que estar presentes no processo, quando se tratar de composse e de ato praticado por ambos.
Concluímos que pessoas casadas que almejam ajuizar ação real imobiliária para uma assistência em relação aos direitos reias, que se encontram presente no art. 1225. do CC,( propriedade, superfície, servidão, usufruto, uso, habilitação, direito do promitente comprador, penhor, hipoteca, anticrese, a concessão de uso especial para fins de moradia a concessão de direito real de uso, a laje) necessitam do consentimento do seu consorte, quando o regime patrimonial for o da separação de bens.
4. SUPRIMENTO JUDICIAL DO CONSENTIMENTO
Nos casos de ajuizamento de ação real imobiliária, sabemos que pode acontecer de um dos cônjuges se negar a conferir a permissão ao consorte, por um motivo que não é considerado justo, nesse fato, o magistrado é autorizado para que supra tal consentimento. É importante deixar claro, que não existe nenhuma regra ou principio para definir o quê seria um motivo justo, só podendo ser avaliado, diretamente de um caso concreto, analisando a razoabilidade e proporcionalidade, papel este que pertence também ao magistrado.
Ocorrendo a impossibilidade do cônjuge em dar o consentimento, Didier Jr diz o seguinte:
A impossibilidade de concessão de consentimento, no entanto, é situação objetiva: toda vez que um cônjuge não puder dar o consentimento, em razão de impossibilidade física, permanente ou temporária, poderá o magistrado suprir a outorga. É o que pode ocorrer quando um dos cônjuges estiver gravemente enfermo ou desaparecido, ou quando um deles estiver servindo o pais em uma guerra. (DIDIER JR, 2017, p. 366)
Percebemos que em um caso houve a renuncia e no outro o impedimento do consentimento, ficando o cônjuge assim impossibilitado de exercer o seu direito de ação não poderia ficar refém situação, pois iria ferir o principio do acesso à justiça que está previsto no artigo 5º, XXXV da Constituição Federal: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciária lesão ou ameaça de direito.” E é chamado também de princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional ou princípio do direito de ação.
O inciso significa que todos têm acesso à justiça para demandar tutela jurisdicional preventiva ou reparatória relativa a um direito, contemplando os direitos individuais, os difusos e coletivos e que a Constituição achou por bem tutelar não só a lesão a direito como também a ameaça de lesão, englobando aí a tutela preventiva.
É importante salientar que o pedido de suprimento já venha na petição inicial, conforme Didier Jr:
Esse pedido de suprimento deve ser feito antes do ajuizamento do processo, normalmente; em caso de urgência , é possível o ajuizamento sem o suprimento, pedindo ao juiz da causa prazo para comprová-lo. Se juízo competente para a causa também o for para suprir o consentimento, nada impede que, já na petição inicial, se peça o suprimento da outorga. Neste caso, imprescindível, a instauração de um incidente processual, em que seja ouvido o outro cônjuge – quando isso for possível. Esse incidente deve suspender o processo. (DIDIER JR, 2017, p.367)
Por outro lado, caso o juiz competente para a causa principal também o for para o suprimento da outorga, nada impede que já na petição inicial se peça o suprimento, não sendo, portanto, necessária a instauração de um procedimento especifico para tanto.
5. EM RELAÇÃO A UNIÃO ESTÁVEL
Vale ressaltar que os artigos 73 e 74 do Código Civil também são aplicados em união estável desde quando registrada de acordo com o Conselho Nacional de Justiça, trazendo diversos benefícios aos companheiros.
O documento que oficializa a união estável é chamado de declaração de união estável ou de certidão de união estável que afirma a situação jurídica e estabelece normas aplicáveis á referida união: regime de bens, cláusulas, pagamento de pensão, titularidade de bens e entre outros, contribuindo para controlar as várias situações de acordo com a vontade dos companheiros, e ajuda a evitar as desavenças que possam vim a acontecer entre os companheiros ou solicitação envolvendo terceiros.
A união estável pode ser comprovada através de duas maneiras: escritura pública ou contrato particular. A escritura pública é feita no Cartório de Notas com a presença do tabelião. Nela não é preciso a presença de testemunhas, apenas são necessário alguns documentos: identidade original, CPF, comprovante de endereço, certidão de Estado Civil emitida em até 90 dias (certidão de nascimento ou casamento).No contrato particular, o casal pode designar a data de inicio da convivência, o tipo de regime de bens, às regras se vierem a ocorrer dissolução da união estável. Dentre os requisitos necessários, destaca-se: a inexistência de impedimentos matrimoniais, testemunhas maiores e capazes, registro do contrato de união estável em cartório. Esse contrato só gera efeitos, depois de ser levado á registro. Quando registrado, nenhum terceiro pode apontar que não conhece relação jurídica de união estável.
Didier Jr fala um pouco nos casos onde não existe o registro da união:
É que, se não há registro da existência da união estável, embora a publicidade da relação seja um requisito para a configuração desta entidade familiar, realmente torna-se difícil ao terceiro proteger-se de eventuais prejuízos, não se podendo aplicar esse regime processual especial aos companheiros. O problema aumenta de tamanho quando se percebem as dificuldades de estabelecer, com precisão, os limites temporais da união estável – desde quando a relação pode ser considerada como juridicamente tutelada, a exigir a participação do companheiro na pratica dos mencionados atos? A segurança jurídica fica sobremodo comprometida. Nesse caso, assegura-se ao companheiro (a) prejudicado o direito de regresso contra a sua companheira (o). (DIDIER JR, 2017, p. 365)
6. DO CONTROLE DA ILEGITIMIDADE PROCESSUAL DO CÔNJUGE
Sabemos que legitimidade processual das pessoas casadas, em alguns casos possui regramento especifico. A indagação gira em torno da presença ou não de ambos os cônjuges no polo ativo e passivo. Só o cônjuge preterido tem legitimidade para pleitear a invalidação do ato praticado sem o seu consentimento, de acordo com o código civil de 2002. Vale lembrar que o Juiz não pode invalidar a demanda sem a provocação do cônjuge preterido.
Didier Jr. discorre sobre esse assunto:
Não provado o consentimento, deve o juiz intimar pessoalmente o cônjuge supostamente preterido para, querendo, manifestar-se sobre a questão. O silêncio do cônjuge importa consentimento se não respondida essa intimação (art.111 do Código Civil) (DIDIER JR, 2017, p.366)
Ainda que o juiz não possa invalidar ex officio o ato, tem o dever de provocar o cônjuge supostamente preterido, onde o silencio será interpretado como sendo um consentimento tácito. O cônjuge poderá, ainda confirmar os atos praticados ou negar expressamente o consentimento, quando então o processo poderá ser eliminado sem exame do mérito, em virtude da sua anulação.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O casamento é uma das grandes instituições civis que sofreu algumas evoluções e mudanças nas ultimas décadas, ele repercute em diversas esferas do direito. Dessa maneira, as pessoas casadas passaram a ter regramento próprio para estar em juízo dependendo do tipo de demanda. Essas pessoas podem demandar livremente, sendo que existem as exceções principalmente quando o regime escolhido pelo casal não foi o da separação bens. O tratamento diferenciado aos cônjuges busca preservar o direito constitucional de ação que cada um deles possui. Concluímos também, que a união estável desde que registrada segundo o Conselho Nacional aplica-se os artigos 73 e 74 do Código de Processo Civil.
REFERÊNCIAS
CUNHA, Mariana Swerts. A participação das pessoas casadas no processo civil. Disponível em: https://revistapensar.com.br/direito/pasta_upload/artigos/a204.pdf. Acesso em: 05. Nov. 2017
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 17. ed. Salvador: JusPodivm, 2015. Acesso em: 06. Nov. 2017
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. Acesso em: 05. Nov. 2017
DINIZ, Maria Helena. Sistemas de Registros de Imóveis. 8. ed. São Paulo:Saraiva, 2009. Acesso em: 04. Nov. 2017
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. Acesso em: 05. Nov. 2017
GONÇALVES, Marcos Vinicius Rios. Direito Processual Civil. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2016 Acesso em: 06. Nov. 2017
MERCEDES, Rafaela. Declaração de União Estável – Aprenda como oficializar sua união. Disponível em: https://rafaellamercedes.jusbrasil.com.br/noticias/440131877/declaracao-de-uniao-estavel-aprenda-como-oficializar-a-sua-uniao.Acesso em : 06. Nov. 2017
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2012. Acesso em: 05. Nov. 2017