A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
Victor Hugo Gomes1
RESUMO: O presente artigo busca fazer uma análise acerca da redução da maioridade penal, analisando a questão diante da proteção constitucional conferida à criança e ao adolescente. Por se tratar de um tema de relevância social e passível de constantes discussões entre juristas, doutrinadores e ativistas sociais, há uma corrente que defende a redução da maioridade penal devido o aumento dos crimes noticiados pelas mídias e redes sociais envolvendo menores de idade; e existem os que temem reduzir a maioridade penal por se preocuparem com o tipo de estrutura prisional que irá recepcionar estas crianças e adolescentes, e também com o caráter educativo e ressocializador com que as punições serão executadas. Neste sentido, esta pesquisa tem por objetivo geral demonstrar de que forma a redução da maioridade penal, caso seja instituída, pode interferir na educação e na ressocialização do infrator durante e após o cumprimento de sentença condenatória. Utilizou-se como metodologia para o desenvolvimento deste estudo uma revisão bibliográfica em obras que tratam do tema em questão.
PALAVRAS-CHAVES: Ato Infracional; Maioridade Penal; Inimputabilidade.
ABSTRACT: The present article seeks to make an analysis about the reduction of the criminal majority, analyzing the issue before the constitutional protection granted to the child and the adolescent. Because it is a subject of social relevance and subject to constant discussions among jurists, jurists, and social activists, there is a current that advocates the reduction of the penal age due to the increase in crimes reported by the media and social networks involving minors; and there are those who fear reducing the age of criminality because they are concerned with the type of prison structure that will receive these children and adolescents, and also with the educational and resocializing character with which the punishments will be executed. In this sense, this research has as general objective to demonstrate how the reduction of the criminal majority, if it is instituted, can interfere in the education and the resocialization of the offender during and after the fulfillment of condemnatory sentence. A bibliographical review was used as a methodology for the development of this study in works that deal with the subject in question.
KEY-WORDS: Infractionary Act; Criminal majority; Incomputability.
1. Introdução
O presente artigo, cujo tema aborda “A redução da maioridade penal” busca analisar, de forma sucinta, as atuais discussões a cerca da redução da maioridade penal no intuito de diminuir os atos infracionais cometidos por menores. É importante ressaltar que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê medidas punitivas mas de caráter socioeducativo para o menor infrator, visando sua ressocialização após o cumprimento da sentença.
Contudo, parte da sociedade tem cobrado do poder público medidas mais severas para punição destes menores infratores, dentre elas a redução da maioridade penal que atualmente é de 18 anos.
Sabe-se que, desde os tempos mais remotos, algumas civilizações tratam de maneira distinta as punições aplicadas às crianças e adolescentes e aos adultos, sendo que estes últimos recebem penas mais severas. Além disso, nota-se que as estruturas de cumprimento das penas são diferentes para abrigar o adolescente e o adulto.
Dentro da Lei 8.069/1990, a qual estabelece o ECA, estão previstas medidas protetivas e socioeducativas a serem aplicadas à criança ou adolescente infrator, na busca pela sua reeducação e ressocialização após o cumprimento da sentença. Contudo, a referida legislação prevê ainda direitos garantidos às crianças e adolescentes, que se respeitados, podem contribuir para que o menor não venha a delinquir.
Insta ressaltar que a relevância deste estudo não se dá somente pela atualidade da questão da redução da maioridade penal, a qual retrata os anseios da sociedade em relação à punições mais severas ao menor infrator, como também a relevância do tema perante as propostas de governo do futuro Presidente da República, que assumirá o cargo em 2019.
Ainda, dentro deste artigo, procura-se responder a seguinte problemática: Caso seja aprovada a redução da maioridade penal no Brasil, de que forma essa medida poderá interferir na educação e na ressocialização do infrator durante e após o cumprimento de sentença condenatória?
Nesse sentido, tem-se como hipótese que os poderes executivo, legislativo e judiciário devem se atentar não somente ao delito de maior ou menor potencial ofensivo cometido pelo menor infrator, mas também o contexto social e familiar onde este menor está inserido e que o levou a delinquir, além do fato de que as punições aplicadas a esta criança e adolescente devem ter caráter educativo e ressocializador.
O objetivo geral deste estudo é demonstrar de que forma a redução da maioridade penal, caso seja instituída, pode interferir na educação e na ressocialização do infrator durante e após o cumprimento de sentença condenatória.
E, de forma a atingir este objetivo, confirmando ou não a hipótese levantada anteriormente, o presente artigo abordará as seguintes etapas: Traçar historicamente as punições aos delitos cometidos por crianças e adolescentes desde as sociedades mais antigas até os dias atuais; Analisar os direitos da criança e do adolescente previstos na Constituição Federal e no ECA; Verificar as atuais medidas protetivas e socioeducativas destinadas a tratar das infrações cometidas pelos menores; e, por fim, Demonstrar as atuais discussões a respeito da redução da maioridade penal no Brasil.
Este artigo será desenvolvido através de uma pesquisa teórica em artigos, notícias, legislações e jurisprudências a cerca do tema, desenvolvida mediante o processo metodológico analítico-sintético de pesquisa bibliográfica. Como abordagem, será utilizado o método dedutivo.
2. Breve histórico das penas atribuídas aos menores infratores
Com relação às penas em si, entende-se que estas possuem a finalidade de resguardar as relações sociais, mantendo as pessoas seguras das ações injustas do ser humano (CUNHA et. al, 2018). De acordo com os autores, cabe ao Estado atender o clamor de justiça da sociedade, de forma que o infrator não volte a reincidir.
A responsabilização e as penas aplicadas as crianças e adolescentes perante um delito cometido são alvos de constantes discussões. De acordo com Oliveira (2003), para que uma pessoa pudesse ser responsabilizada pela prática de um ato ilícito, seria necessário que a pessoa tenha alcançado certa etapa de seu desenvolvimento mental e social.
Para Cunha et. al (2018), “o atual modelo social, o conhecimento do ilícito penal e a capacidade mental do indivíduo, teriam que ser levados em conta mensurando sua idade como diretriz para classificar se este é capaz de ter conhecimento do ilícito que cometera”.
Inclusive, o autor ressalta que os direitos da criança e do adolescente em algumas civilizações não eram sequer resguardados, e muitos menores eram submetidos a sacrifícios em vida.
Com o surgimento das sociedades civis, as punições conferidas aos menores infratores foram se distinguindo entre as nações, onde alguns países passaram a enxergar que o adolescente não deveria ser somente punido, mas também ressocializado após o cumprimento da sentença. Contudo, ressalta-se que a concepção de “menor” nem sempre é a mesma em todos os lugares do mundo.
Na antiguidade, o Direito Romano estabelecia uma legislação penal específica a ser adotada aos menores, distinguindo os seres humanos entre púberes e impúberes. Oliveira (2003) salienta que, para esses últimos, a punição era aplicada de acordo com o discernimento do juiz que deveria aplicar penas bem mais moderadas aos impúberes; sendo que os menores de 07 anos de idade deveriam ser considerados infantes absolutamente inimputáveis.
Ainda, sobre o Direito Romano, destaca-se a previsão na Lei das XII Tábuas quando se tratava dos julgamentos de furtos cometidos por menores. A referida legislação previa o castigo com varas e obrigação de reparar o dano, caso o delituoso não houvesse atingido a puberdade. Além disso, não era permitida a pena de morte para os menores infratores (OLIVEIRA, 2013).
Nesse sentido:
Observa-se, no entanto, que no tratamento das legislações de cada época, sua punibilidade e a questão da menoridade para punir o indivíduo por seus atos, circundava na questão da sua consciência ou discernimento sobre o ilícito penal junto à realidade deste e da sociedade de cada época, haja vista que, a cultura do crime e suas figuras agem conforme se comporta a sociedade, e é compreensível que no decurso do tempo com a transformação e o choque de paradigmas e valores que sofre tal sociedade, os indivíduos mudem seus comportamentos e/ou adquiram novas compreensões sobre aspectos que nela residam, daí o Estado por meio de sua legislação tem que acompanhar tais transformações para a guarda das relações sociais. (CUNHA et.al., 2018)
Com relação ao Direito Brasileiro, as Organizações Filipinas do início do século XIX dispunham sobre a responsabilidade penal a partir dos 07 anos de idade, porém isentando este menor de penas de morte, e mitigando as penas cominadas (BASTOS E MARTINS, 2000). Já os jovens entre 17 e 21 anos, os autores salientam que estes eram chamados de “jovens adultos”, os quais poderiam ter suas penas reduzidas ou mesmo condenados à pena de morte, permanecendo a imputabilidade penal plena aos maiores de 21 anos de idade.
Após a Proclamação da Independência em 1830, surgiu o primeiro Código Penal Brasileiro, denominado de Código Criminal do Império. Segundo Bastos e Martins (2000), a respeito da maioridade penal, a referida legislação adotou o critério psicológico fundamentado no discernimento, definindo em seu artigo 10 que a idade penal iniciava-se aos 14 anos.
Contudo, o artigo 13 deste código determinava o encaminhamento do menor infrator às casas de correção nos casos em que o menor tivesse consciência da ilicitude de sua ação. Assim, conforme os autores supracitados, o próprio magistrado determinava o tempo de pena que o menor iria cumprir na casa de correção, cujo prazo findava-se na data em que o menor completasse 17 anos de idade.
Com o advento do Código Penal Brasileiro de 1890, as crianças poderiam ser levadas aos tribunais a partir dos 09 anos de idade, recebendo, o mesmo tratamento dispensado aos criminosos adultos (WESTIN, 2015). Contudo, Saraiva (2003) salienta que no final do século XIX, a imputabilidade penal era alcançada aos quatorze anos, podendo ainda retroagir aos 9, conforme o grau de discernimento do infrator.
Vale lembrar, conforme Westin (2015), que na história das punições às crianças e adolescentes brasileiros já durante o século XX, o caso do menino Bernardino de 12 anos que, em 1926, trabalhava nas ruas do Rio de Janeiro como engraxate. Conforme o autor, o adolescente foi preso após atirar tinta em um cliente que se recusou a pagar pelo serviço, ficando preso junto com 20 adultos durante 04 semanas, onde sofreu todo tipo de violência.
Em 1927 o presidente Washington Luiz instituiu no Brasil o Código de Menores, considerada a primeira lei brasileira dedicada a proteger a criança e o adolescente. De acordo com Westin (2015), a referida legislação estabeleceu ser penalmente inimputável o jovem de até 17 anos, o qual só poderá responder pelos seus atos a partir dos 18.
Ainda, a respeito do Código acima mencionado:
Em 1922, uma reforma do Código Penal elevou a maioridade de 9 para 14 anos. Com o Código de Menores de 1927, chegou-se aos 18 e a prisão de crianças e adolescentes ficou proibida. Em seu lugar, teriam de ser aplicadas medidas socioeducativas, como se chamam hoje. (WESTIN, 2015)
Quando se tratava de adolescentes com idade entre 14 e 17 anos, os mesmos eram enviados para uma espécie de “reformatório”, onde tinham a oportunidade de trabalhar e estudar. Já os menores de 14 anos que não tivessem família, o autor supracitado ressalta que deveriam ser enviados a uma escola de preservação.
O Código de Menores, de acordo com Mattos (2015), estabeleceu ainda três divisões que classificam os menores infratores da seguinte forma: a primeira abarca os menores de 14 anos, que não eram submetidos a qualquer processo; a segunda se refere aos maiores de 14 e menores de 18 anos, que eram sujeitos a um processo especial onde se impunha uma medida de internação que perdurava entre 03 a 07 anos ou até a reeducação do delinqüente; e a última era a terceira divisão, imposta aos maiores de 16 e menores de 18 anos, que haviam cometido crime grave ou que eram considerados indivíduos perigosos.
Contudo, o autor salienta que, nesta última divisão, ficava a cargo do magistrado encaminhar o infrator a um estabelecimento próprio para menores, e na falta deste, o mesmo seria remetido à prisão comum, porém separado dos adultos.
Anos depois, foi estabelecida a Lei nº 6697 de 10 de outubro de 1979, a qual estabeleceu um novo Código de Menores, que referenciava não somente o menor infrator, mas aquele em situação de abandono, vítima de mãos tratos, em perigo moral ou com desvio de conduta na falta de adaptação familiar ou comunitária, não havendo distinção entre eles (MATTOS, 2015).
De acordo com o autor, a referida legislação estabelecia ainda medidas de advertência como “a colocação do menor em lar substituto, a liberdade assistida, e ainda, a entrega do menor aos pais ou responsáveis” (MATTOS, 2015). Além disso, este novo código dispunha sobre medidas de advertência aos pais e, inclusive, a perda ou suspensão do pátrio poder.
Em 1988, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, os direitos da criança e do adolescente foram sendo regulamentados de acordo com a Doutrina da Proteção Integral da Criança, oriunda da Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1989.
Nesse sentido, a referida Carga Magna de 88 estabeleceu em seu artigo 228 a inimputabilidade dos menores de 18 anos como direito e garantia fundamental, estabelecendo que estas pessoas estão sujeitas às normas da legislação especial.
Foi fixado este limite de idade com base no artigo 1º da Convenção sobre o Direito das Crianças, adotada pela ONU em 20 de novembro de 1989, onde dispõe: “Nos termos da 16 presente Convenção, criança é todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo”. Tal convenção não impede que a imputabilidade seja determinada abaixo dos 18 (dezoito) anos, visto que não traz normas a respeito do assunto, e ainda, traz a possibilidade da imposição de penas privativas de liberdade para as crianças, conforme determinado em seu artigo 37, ficando assim, a critério dos países signatários desta convenção a fixação da idade penal e o tipo de pena a ser aplicada. (MATTOS, 2015)
Atualmente, países como Portugal, México, Colômbia, Peru, Croácia, Alemanha e Brasil aplicam medidas corretivas ao adolescente que ainda não atingiu a maioridade penal (SILVA E CALIXTO, 2015).
Outros países como França, Venezuela, Irlanda e Inglaterra adotam um sistema de penas menores a criança e ao adolescente infrator, quando comparadas às penas recebidas pelos adultos. China, Colômbia e Rússia, conforme os autores acima mencionados utilizam punições mais severas considerando a gravidade do crime.
Na Alemanha, de acordo Figueiras (2016), criou-se uma faixa etária especial, que compreende os jovens adultos entre 18 a 21 anos, que ainda poderão responder como adolescentes no caso de cometerem crimes, ficando a cargo do judiciário a análise no caso em concreto.
O autor ressalta ainda que, em Cingapura, o jovem infrator poderá sofrer sanções especiais a partir dos 10 anos, pois a criminalidade neste Estado é considerada mínima, não sendo esta questão muito tratada.
3. A criança e do adolescente na Constituição Federal e no ECA
No Brasil, considera-se criança a pessoa com até doze anos de idade incompletos, e adolescentes aquela entre doze e dezoito anos (BRASIL, 1990). Com o advento da Constituição Federal de 1988, as crianças e adolescentes brasileiros passaram a ser reconhecidos como sujeitos detentores de direitos, protegidos pela Lei Maior através do artigo 227:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988)
Assim, entende-se que toda criança e adolescente deve receber tratamento diferenciado do adulto; e, conforme o dispositivo supracitado, ser protegido de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Segundo Mattos (2015), “a imputabilidade penal é a qualidade atribuída ao agente que possui condição intelectual para determinar a sua conduta e, mentalmente capaz de compreender a ilicitude dos seus atos”. Assim, entende-se a imputabilidade penal como a capacidade que o indivíduo tem em discernir sobre a licitude de sua conduta e agir em conformidade com esse entendimento.
O autor supracitado salienta ainda que a imputabilidade baseia-se no fato de o homem ser livre e possuir inteligência a ponto de ser responsabilizado por todas as suas condutas. Neste entendimento, o ser humano sabendo optar entre o bem e o mal, quando opta por se comportar ao contrário das leis e da harmonia social, o mesmo deverá arcar com as consequências de suas ações (MATTOS, 2015).
Para Muller (2011), uma vez que a criança e o adolescente estão na condição de pessoas humanas em desenvolvimento, a Constituição Federal trouxe esta previsão para amparar legalmente o status de prioridade atribuído ao menor, conforme artigos 227 e 228 citados anteriormente.
Além disso, insta salientar que nossa legislação adotou o critério biológico de inimputabilidade em razão da idade, considerando inimputável o menor de 18 anos, disposição inclusive do artigo 27 do Código Penal Brasileiro em vigência.
Ao atribuir caráter protetivo e prioritário à criança e ao adolescente, o legislador entende que os mesmos cometem infrações por terem se tornado vítimas da marginalização, do abandono familiar e do assédio de grandes traficantes (LOPES JÚNIOR, 2005).
Através da Lei nº 8069 de 13 de Julho de 1990, foi instituído o Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelecendo transformações substanciais no tratamento empregado às crianças e adolescentes. De acordo com Mattos (2015), a referida legislação abarca as pessoas com idade inferior a 18 anos, tendo como fundamento os princípios constitucionais descritos nos artigos 227 e 228 da Constituição Federal de 88 e nos pilares da Doutrina da Proteção Integral e Convenção das Nações Unidas de Direito da Criança.
Ao resguardar os menores de 18 anos, proibindo a aplicação de punições equivalentes às impostas aos adultos, o ECA contribuiu com a proteção da criança e do adolescente infrator, para que a pena a ele imposta não prejudique o seu desenvolvimento e reinserção na sociedade.
Assim, a legislação supracitada dispõe como sanções aplicadas ao menor infrator as Medidas Socioeducativas; e, conforme Matos (2015), estas medidas são aplicadas aos menores por serem pessoas incapazes de discernir sobre a gravidade e ilicitude dos fatos, não possuindo ainda capacidade suficiente de desenvolvimento psíquico.
De acordo com Fernandes (1988, p.73), a previsão legal das medidas socioeducativas no ECA tratou-se de uma sanção educativa, substituindo a sanção de castigo, objetivando-se que o adolescente cumpra a medida de maneira satisfatória, reinserindo na sociedade como um adulto apto para conviver em sociedade de maneira produtiva em âmbito sócio-familiar.
Lacerda (2014) entende que a principal finalidade da aplicação de medidas socioeducativas é buscar a reabilitação do menor infrator, mesmo que este ainda não tenha alcançado plena capacidade de responder criminalmente por suas ações, espera-se, com a aplicação de tais medidas, que ele retorne a sociedade já recuperado, evitando sua reincidência.
Neste caso, a utilidade é tentar evitar a impunidade do menor que cometeu o “crime” antes de completar 18 anos, portanto ele será punido segundo o ECA. Como há um choque legal, na conceituação de adolescente e jovem (entre 15 e 18 anos), o próprio Estatuto da Juventude tratou de estabelecer que só em caso excepcionais, ele será aplicado, como dispõe no § 2º do art. 1º, ou seja, prevalece o ECA. (COUTO, 2015)
De acordo com Silva (2001), um dos objetivos da instituição do ECA é limitar as ações do Estado e da Polícia nas questões relativas a atos infracionais cometidos por crianças ou adolescentes, para que as sanções sejam aplicadas com caráter educativo e ressocializador.
O referido Estatuto prevê medidas protetivas às crianças, dispostas no artigo 101:
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII - abrigo em entidade; VIII - colocação em família substituta. (BRASIL, 1990)
Assim, caso a criança pratique algum ato infracional, será encaminhada ao Conselho Tutelar e estará sujeita às medidas de proteção acima. Já o adolescente estará ainda sujeito ao processo contraditório, com ampla defesa; e, após o devido processo legal, poderá receber uma sanção denominada medida socioeducativa, previstas no art. 112 do ECA, quais sejam: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semiliberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. (BRASIL, 1990).
Com relação à medida socioeducativa de internação, Lacerda (2014) ressalta que o prazo máximo de detenção deve ser de 03 anos, sendo que o menor interno será avaliado a cada 06 meses. Contudo, o autor salienta que antes da sentença, o juiz poderá determinar a internação provisória do menor infrator, desde que haja indícios suficientes de autoria e materialidade do fato, ou em casos de descumprimento de ordem judicial aplicada anteriormente.
As medidas socioeducativas podem ou não serem cumuladas com alguma medida protetiva, caso o adolescente esteja em situação de risco, conforme dispõe o inciso VII do artigo 112.
Nesse sentido, considera-se de acordo com o artigo 103 do ECA, que o ato infracional é “a conduta da criança e do adolescente que pode ser descrita como crime ou contravenção penal” (BRASIL, 1990). Ressalta-se que, quando se trata de pessoa maior de 18 anos de idade, o termo adotado é crime, delito ou contravenção penal.
Para Lacerda (2014), “ato infracional é o ato reprovável, de desrespeito às normas, à ordem pública, ao patrimônio ou ao direito dos cidadãos, cometidos por menores de idade”. Assim:
No caso do art. 103, embora a prática do ato seja descrita como criminosa, o fato de não existir a culpa, em razão da imputabilidade penal, a qual somente se inicia aos 18 anos, não será aplicada a pena às crianças e aos adolescentes, mas apenas medidas socioeducativas. Dessa forma, a conduta delituosa da criança ou adolescente será denominada tecnicamente de ato infracional, abrangendo tanto o crime como as contravenções penais, as quais constituem um elenco de infrações penais de menor porte, a critério do legislador e se encontram elencadas na Lei das Contravenções Penais (AQUINO, 2012).
O ECA está fundamentado ainda, essencialmente, em três princípios: o da Proteção Integral, disposto no artigo 1º, no qual as crianças e adolescentes têm direito à proteção em todos os setores de sua vida; o Princípio da Garantia de Absoluta Prioridade, previsto no artigo 4º, o qual dispõe que as crianças e adolescentes têm direito a serem protegidos e atendidos em suas necessidades em quaisquer circunstâncias, com prioridade no recebimento de socorro, de atendimento nos serviços públicos e na destinação de verbas e políticas sociais públicas; e Princípio da Condição de Pessoa em Desenvolvimento, conforme artigo 6º, o qual dispõe que as crianças e adolescentes são considerados pessoas em formação que necessitam de cuidados especiais para que tenham um desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência (BRASIL, 1990).
4. A atual discussão sobre a redução da maioridade penal
No âmbito das discussões sobre a redução da maioridade penal no Brasil, há correntes que defendem que a imputabilidade deve ocorrer a partir dos 16 anos; e outros defendem que a maioridade penal deve começar somente aos 18 anos, levando-se em consideração os aspectos sociais que levam a criança e o adolescente a delinquir, bem como o pós cumprimento de sentença condenatória se o menor ficar detido junto a adultos criminosos.
Antes de adentrar ao tema do presente artigo, importante se faz traçar um paradoxo a respeito da delinquência infanto-juvenil e o perfil dos jovens e adolescentes infratores.
De acordo com Adorno (2017), “entre 1996 e 2014, o número de jovens entre 12 e 17 anos que foram apreendidos no Brasil pela prática de crimes aumentou em quase seis vezes”. Além disso, o autor salienta que, conforme o 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, houve uma crescente no encarceramento de adolescentes no país, que aumentou de 4.245 para 24.628 neste período.
Em 2016, dobrou-se o número de adolescentes cumprindo medida socioeducativa no país, aponta Fariello (2016), pois em novembro de 2015 havia 96 mil menores nessa condição, e neste mesmo mês do ano seguinte o número ultrapassa os 192 mil.
Segundo com o autor supracitado, o tráfico de drogas é o crime mais frequente entre os menores infratores. Já o crime de estupro entre os menores de 18 anos aumentou de 1.811, em novembro de 2015, para 3.763, em novembro de 2016. Outro dado importante apontado pelo autor diz respeito ao sexo dos jovens que cumprem medida socioeducativa, onde 90% são do sexo masculino (FARIELLO, 2016).
Dentre as medidas socioeducativas mais aplicadas aos menores, destaca-se a liberdade assistida:
A liberdade assistida consiste no acompanhamento, auxílio e orientação do adolescente em conflito com a lei por equipes multidisciplinares, por período mínimo de seis meses, com o objetivo de oferecer atendimento nas diversas áreas de políticas públicas e a inserção no mercado de trabalho. A segunda medida mais aplicada é a prestação de serviços à comunidade, abarcando 81.700 jovens atualmente, que devem realizar tarefas gratuitas e de interesse comunitário durante período máximo de seis meses e oito horas semanais. (FARIELLO, 2016).
É importante ressaltar que “o Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei (CNACL) foi instituído com o objetivo de permitir aos magistrados brasileiros o acompanhamento efetivo dos adolescentes que cometeram atos infracionais” (FARIELLO, 2016). Este cadastro é de preenchimento obrigatório para a internação provisória de adolescentes ou execução das medidas socioeducativas.
Para Mediavilla (2018), a primeira idade do crime começa entre os 8 e os 14 anos, alcançando seu auge entre os 15 e os 19; e termina progressivamente entre os 20 e os 29. De acordo com a opinião da autora, uma maioria dos jovens só irá delinquir durante a adolescência, e uma minoria irá adentrar a idade adulta cometendo crimes.
Na maioria dos casos, os jovens vão deixar de delinquir de uma forma natural pelo amadurecimento cerebral que acontece entre os 18 e os 22 anos, ajudados pela inserção na vida adulta, pela universidade, por um trabalho ou por um relacionamento afetivo, muitos interesses que atraem o jovem e são incompatíveis com uma vida de infração. Em alguns casos, quando se aplicam medidas muito duras, esse afastamento [do crime] se paralisa, e esses jovens podem ver sua delinquência prolongada. (MEDIAVILLA, 2018)
Rodrigues (2015) salienta que a delinqüência juvenil é um problema de comportamento, no qual o jovem se expressa através de atos criminosos, tendo como principais fundamentos a ordem socioeconômica, o fraco relacionamento com os pais e familiares, os problemas escolares, e, ainda, a disposição para problemas psicopatológicos ou transtorno de conduta.
Nesse sentido, Paini (2015) define o delinquente como aquele que sofre perturbações afetivas. Contudo, a autora ressalta que não se deve julgar um delito sem antes analisar os aspectos de vivências e experiências, conhecendo os fatores determinantes que o infrator possui quanto ao ambiente familiar e social.
No viés das discussões para se reduzir a maioridade penal, um dos argumentos utilizados por juristas, doutrinadores e ativistas sociais é a presunção de que são ineficientes as medidas protetivas e socioeducativas dispostas no ECA, visto o crescente número de delitos praticados por menores inclusive reincidentes (RODRIGUES, 2015).
Conforme Lacerda (2014), existem ainda muitas divergências doutrinárias a respeito da redução da maioridade penal, relacionada com o caráter punitivo das medidas socioeducativas presentes no ECA. De acordo com o autor, estas medidas tem caráter educativo e ressocializador para o menor, e caráter protetivo para a sociedade.
Pelo fato do Estatuto da Criança e do Adolescente conter medidas mais brandas, não intimida o infrator e nem demais criminosos que se utilizam daqueles para contribuir na criminalidade. A título de exemplo temos o artigo 121, parágrafo terceiro da referida lei, que faz previsão quanto ao adolescente em conflito com a lei, “Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos”. Vale ressaltar que esta medida corresponde a cada ato infracional grave. (LACERDA, 2014)
Ainda, dentre os que defendem a redução da maioridade penal, há os que afirmam que os jovens atualmente não são mais aqueles ingênuos da década de noventa. Assim, acreditam que o adolescente deve ser tratado como pessoa capaz de discernir sobre as consequências de seus atos; e, se for o caso, se submeter às leis penais, por terem capacidade de compreender a as leis que regulam a sociedade (ROCHA, 2013).
Cumpre observar que o acesso à informação contribui para que o jovem se desenvolva de maneira precoce, sendo capaz de reconhecer e ter consciência de um ilícito penal em crimes comuns, como homicídios, lesões corporais, roubos, furtos entre outros (CUNHA et.al, 2018).
Contudo, os autores apontam que, ainda assim, o menor de 18 anos continua inimputável, deixando uma sensação de impunidade à sociedade vítima destes jovens, pois evidencia-se que os mesmos não praticam atos infracionais por desconhecimento de sua natureza proibitiva, principalmente quando se tratam de crimes mais conhecidos, como homicídio, estupro, roubo, furto, sequestro, dentre outros; diferentemente dos crimes especiais de ordem pública, financeira, meio ambiente.
Rocha (2013) reforça ainda o sentido de estes jovens terem convicção da ilicitude do ato praticado, e muitos se utilizam de maneira voluntária e consciente da sua condição de menor inimputável para praticar crimes.
Para Rocha (2013), este tem sido um dos principais argumentos a favor da redução da maioridade penal, estabelecendo a idade de 16 anos como ideal. Além disso, deve ser levada em consideração a questão do adolescente de 16 anos ser considerado cidadão sujeito do direito político ao voto, com capacidade para decidir o destino político do país.
De acordo com Lenza (2008, p.763), “a sociedade evoluiu, e, atualmente, uma pessoa com 16 anos de idade tem total consciência de seus atos, tanto é que exerce os direitos de cidadania, podendo propor a ação popular e votar”. O autor salienta que considera constitucional a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, pois este último está sendo o parâmetro de idade para o exercício do voto.
Dentre os que criticam a redução da maioridade pena, Barros (2014) salienta que:
Aprisionar jovens menores de 18 anos em carcerárias precárias existentes em nosso país, que misturam presos com vasta experiência no mundo do crime, com aqueles inexperientes, sendo estes primários ou não, é o mesmo que graduar estes jovens no amplo universo criminoso existente.
O autor entende ainda que o jovem infrator não pode ser considerado uma pessoa sem recuperação, e nem se deve afastá-lo da sociedade detendo-o em uma penitenciária com outros presos adultos sentenciados por crimes graves contra a sociedade.
Conforme Moura (2016), ao estabelecer a imputabilidade penal no artigo 228 da Constituição Federal de 88, o legislador entendeu que a pessoa menor de 18 anos não possui desenvolvimento mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos, devendo possuir um tratamento diferente dos adultos quando, viessem a delinquir.
Para Rocha (2013), outro argumento contrário a reduzir a maioridade penal é o fato de que isto não resolveria o problema da violência cometida pelos jovens infratores, e que torna-se passível a redução da idade paulatinamente até que se atinja a criança, considerada incapaz de compreender a ilicitude do ato.
Blume (2017) defende que educar o jovem com qualidade seria mais eficiente na redução da criminalidade cometida por menores, além do fato das penitenciárias brasileiras não oferecerem estrutura suficiente para recuperar estes jovens e reinseri-los de volta a sociedade. De acordo com o autor, a superlotação dos presídios, que já é um problema enfrentado atualmente pelos sistemas prisionais brasileiros, seria agravada com a inclusão dos condenados entre 16 e 18 anos.
Com relação às condições precárias dos estabelecimentos prisionais brasileiros, Moura (2016) aponta que não há uma fiscalização eficiente para garantir que os direitos dos presos não sejam violados, tampouco podem atribuir caráter educativo e ressocializador aos jovens infratores que ficarão em contato com os demais condenados.
Além disso, de acordo com o autor:
O sistema prisional brasileiro não suporta mais pessoas. Dados indicam que em Minas Gerais o número de detentos supera em 13 mil (treze mil) a capacidade nas penitenciárias. Nota-se, portanto, que o sistema penitenciário mineiro não suporta a capacidade da demanda recebida ao passo que, caso haja a redução da maioridade penal o número de presos irá aumentar consideravelmente, instalando-se um verdadeiro caos. O jovem de dezesseis anos que for condenado a passar um ano dentro de uma prisão sai de lá́, sem dúvida alguma, muito mais perigoso que entrou, pelo contato com criminosos de alta periculosidade, aumentando, ai sim, o seu potencial agressivo. (MOURA, 2016)
Alguns estudiosos no âmbito da psicologia se posicionam contra a redução da maioridade penal por entenderem que a adolescência é uma fase de transição e amadurecimento do ser humano, portanto, estes jovens deveriam ser protegidos através da promoção de políticas públicas relacionadas à saúde, educação e lazer (BLUME, 2017).
O autor defende que, ao enviar para a prisão um jovem que ainda pode modificar o seu comportamento através de medidas socioeducativas, retira-se dele qualquer condição de se ressocializar.
Diante deste cenário, vários projetos tramitam no legislativo para redução da maioridade penal, principalmente em casos de crimes hediondos. Conforme aponta Sardinha (2014) foi elaborada a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) de nº 171 pelo ex-deputado Benedito Domingos, o qual solicitou a alteração do artigo 228 da Constituição Federal de 88, propondo que as pessoas acima de 16 anos sejam consideradas imputáveis penalmente.
O ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda foi responsável pela autoria da PEC nº 20, a qual estabelece que os maiores de 16 anos sejam responsabilizados pelos crimes cometidos, exceto quando se tratar de pessoa incapaz mentalmente, comprovada por laudo técnico (SARDINHA, 2014).
Contudo, em fevereiro de 2016 a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado julgou a PEC nº 33/2012, proposta pelo ex-senador Aloysio Nunes Ferreira, que visava reduzir a maioridade penal para 16 anos em casos como homicídio qualificado, extorsão mediante sequestro, e estupro; e a rejeitou por 11 votos a 8 (MOURA, 2016).
De acordo com a PEC 33/2012, os jovens entre 16 e 18 anos condenados começariam a cumprir pena em estabelecimento distinto daquele destinado aos maiores de 18 anos. O prazo para a contagem da prescrição do crime ficaria suspenso até que a decisão sobre a imputabilidade penal fosse julgada em última instância. (SARDINHA, 2014)
Para o autor supracitado, deve-se levar em consideração que o ECA prevê que as crianças e os adolescentes desfrutam dos mesmos direitos, sujeitando-se a obrigações de acordo com sua condição de desenvolvimento, não podendo ser tratados como adultos.
Neste sentido, é importante salientar que:
A ideia de julgar e condenar um adolescente infrator é muito limitada, devendo-se levar em conta que, por estar em desenvolvimento, ainda é possível regenerar esse indivíduo. Essa é a ideia das medidas socioeducativas que se prestam a educar o jovem infrator a fim de que ele se torne um adulto cumpridor de suas obrigações, agindo sempre dentro da lei e preocupado com o bem estar da sociedade. (MOURA, 2016)
Neste viés, Mirabete (2007, p.217) acredita que reduzir a maioridade penal não acabaria com o problema da criminalidade infantil, o qual decorre das condições sociais por vezes degradantes e opressivas que expõe enorme as crianças e os adolescentes no Brasil a uma injusta marginalidade social.
Em janeiro de 2018, o instituto Datafolha divulgou pesquisa apontando que a maioria dos brasileiros é favorável à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, em casos de crimes mais graves (O GLOBO, 2018).
Para os próximos anos, uma das propostas do Governo brasileiro que assumirá a presidência entre 2019 e 2022, é a redução da maioridade penal de 18 para 16 ou 17 anos, atendendo ao pedido da sociedade de reduzir a criminalidade e a violência praticada por menores de idade, que se sentem inatingíveis pelo Código Penal e por medidas mais severas, deixando uma sensação de impunidade.
Considerações Finais
O presente artigo, cujo tema abordou sobre “A Redução da Maioridade Penal”, buscou analisar as discussões e contradições sobre se reduzir ou não o limite de idade para aplicação do Código Penal a crianças e adolescentes de 18 para 16 anos, de acordo com várias propostas que tramitam no legislativo a respeito deste tema.
Para tanto, foi importante estudar desde os primórdios como eram tratadas as crianças e adolescentes que cometiam crimes nas antigas sociedades, até os dias atuais. Verificou-se que, mesmo atribuindo penas aos menores infratores, os legisladores sempre se preocuparam no caráter de pessoa em desenvolvimento destes menores, julgando seus atos de acordo com a sua capacidade de discernir sobre a ilicitude e gravidade dos delitos cometidos.
No Brasil, esta preocupação ficou mais evidente no início do século XX, com o advento do Código de Menores e, posteriormente, do Código Penal de 1940 o qual vigora até dias atuais. Nesse sentido, observa-se que o legislador tinha a preocupação de salvaguardar os direitos da criança e do adolescente, não permitindo que fossem julgados como adultos, e tampouco que fossem detidos junto à eles.
Além disso, cumpre ressaltar que houve também uma preocupação em como este jovem iria ser reinserido de volta a sociedade, após o cumprimento de sentença, dando às punições caráter educativo. Assim, criou-se na década de 90 o Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual passou a dispor sobre quais medidas deveriam ser aplicadas aos menores, em consonância com a Constituição Federal de 1988 que considera inimputáveis as pessoas com idade inferior a 18 anos.
No decorrer das pesquisas, pode-se perceber que um dos principais motivos argumentados por quem deseja reduzir a maioridade penal é a sensação de impunidade demonstrada pelos jovens infratores, e por julgarem ineficazes as medidas socioeducativas aplicadas pelo ECA; onde, de maneira voluntária, estes jovens e adolescentes cometem atos sabendo de sua ilicitude, por terem ciência de que não serão punidos com sanções mais graves, como as do Código Penal aplicado aos adultos.
O constituinte brasileiro, antes de analisar a questão, deve primar pelos direitos e garantias constitucionais da criança e do adolescente, levando em consideração o caráter de pessoa em desenvolvimento, e a falta de estrutura física e organizacional dos sistemas prisionais para receber estes jovens infratores junto com os demais presos; para que não devolva à sociedade um jovem que irá reincidir.
Contudo, se faz necessário na atual sociedade que o critério de imputabilidade sofra alterações, julgando de forma proporcional o ato infracional em relação à punição aplicada, de acordo com o discernimento do jovem com relação a ilicitude do fato.
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