3. O AGRESSOR SEXUAL INFANTIL
A violência sexual praticada contra a criança e adolescente é um assunto que gera debate e reflexão, principalmente, quando nos deparamos com o abuso sexual intrafamiliar, que por ocorrer onde menos se esperaria, no próprio lar da criança, acaba por ser uma violência camuflada, imperceptível e por conta disso, de difícil resolução.
Assim, os responsáveis por perpetrar a violência sexual contra a criança e adolescente, geralmente, são pessoas próximas da vítima, sendo membros da família, como o pai, a mãe, os irmãos, o padrasto, a madrasta, os tios, os primos, os avós, tutores ou namorados e companheiros que morem junto com a mãe ou o pai.
Embora a violência intrafamiliar seja a mais comum e preocupante por ocorrer dentro do seio familiar por pessoas próximas e com laços afetivos ou de parentesco com a vítima, pode ocorrer, ainda, a violência sexual extrafamiliar, cujo o agressor não possui laços parentais e pode ser ou não conhecido da família como os vizinhos, o pai/mãe de amigos da vítima, professores, treinadores de esporte, babás, enfim, é perpetrado por desconhecidos ou por pessoas que tenham pouca relação com a família da criança.
No entanto, as pesquisas sobre os autores da violência sexual infantil são poucas, em comparação as pesquisas com as vítimas que sofrem essa violência, abrindo discursões a respeito do agressor sexual, principalmente em relação ao termo a ser utilizado para descreve-lo. Essa definição ao termo correto resolveria, em parte, a problemática sobre qual seria a punição adequada para o agressor sexual, visto o seu reingresso à sociedade e a frequente reincidência nesse tipo de crime. Motivo esse que a privação de liberdade para alguns não é considerada a melhor medida a ser adotada.
Acontece, que em razão da falta de compreensão na diferença entre os termos a serem utilizado para os autores de violência sexual contra crianças e adolescentes, quais sejam abusadores sexuais e os pedófilos, a expressão mais comum utilizada e imposta pela mídia, sendo usada no cotidiano das famílias e instituições, é o termo “Pedófilo”, imposto, de forma geral, a todos os autores de violência sexual cujos suas vítimas são crianças e adolescentes.
Ocorre que de fato nem todo abusador é pedófilo, bem como, nem todo pedófilo é um abusador sexual. Sendo assim, se mostra necessário analisar cada indivíduo e caso concreto para a aplicação de uma punição em conjunto ou seguido de um tratamento adequado.
A pedofilia está classificada como uma doença, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é uma espécie de parafilia, e não um crime, pois não há tipificação em nosso ordenamento jurídico. As parafilias (distúrbio de cunho sexual) são práticas sexuais consideradas inofensivas e aceitas, isso quando não provocam danos a outras pessoas ou aos costumes sociais, como no caso da pedofilia.
De acordo com Vianna (2011, não paginado):
A pedofilia em si não é crime, pois uma pessoa pedófila não pode ser punida por essa condição, mas certos atos decorrentes dessa parafilia são passiveis de sanção. O crime sexual contra vulneráveis é, pois, uma das previsões legais que surgiram para o combate a pedofilia.
Desse modo, é considerado pedófilo a pessoa adulta, homem ou mulher, que possui um transtorno mental, um desvio sexual, que leva ao desejo/ atração sexual por crianças pré-púberes ou no início da puberdade (até os 13 anos). Não necessariamente praticando o ato de abusar sexualmente dessas, podendo ter só desejos e fantasias sexuais recorrentes, intensas e incontroláveis, levando, nesse último caso, à pratica da relação sexual, que pode ser heterossexual ou homossexual. Sendo assim, o pedófilo pode se tornar um agressor sexual no momento que transformar suas fantasias sexuais em atos reais.
Segundo Gouvêa (2011, não paginado), a pedofilia é:
Desvio sexual caracterizado pela atração por crianças ou adolescentes sexualmente imaturos, com os quais os portadores dão vazão ao erotismo pela prática de obscenidades ou de atos libidinosos – a pedofilia é o regresso do indivíduo adulto a curiosidade sexual e ao comportamento de exploração da criança.
Com isso, ninguém pode ser punido criminalmente por apresentar essa doença de pedofilia, só se falando em crime quando o pedófilo exterioriza essa patologia praticando condutas que se amoldam em alguma tipicidade penal, tanto no Código Penal, quanto no Estatuto da Criança e do Adolescente, como o caso do crime de estupro de vulnerável, dentre outros.
Além disso, a pedofilia é provavelmente incurável, pois se trata de uma condição psicologia, tendo ainda poucas alternativas para um tratamento seguro e correto, considerando que esse tratamento deve ser clínico e não criminal, sendo assim um aumento de pena em nada resolve já que a pessoa privada de sua liberdade permanece a mesma dentro ou fora da prisão.
Ademais o chamado abusador sexual é a pessoa que comete a violência sexual contra crianças de forma impulsiva ou oportunista, independentemente de sofrer da patologia pedofilia. Pode ser alguém muito próximo da vítima ou pessoas de seu convívio, com quem mantém uma relação de poder, confiança, afeto e subordinação, bem como uma pessoa que devido as drogas, o álcool e o estresse em suas vidas, praticam tal relação.
Em virtude da relação de poder que o agressor tem com a vítima, essa fica em silêncio, por medo de ser dada como mentirosa ou por simples vergonha da situação ocorrida, podendo, em caso de denúncia, voltar algumas vezes atrás em suas palavras, pela repressão da própria família.
O abusador, assim como o pedófilo, é um indivíduo tido como “normal”, tendo como parte de sua perversão a enganação, estabelecendo, normalmente, uma vida dupla, adquirindo assim a confiança e o respeito da criança para conseguir envolvê-la em atividades de cunho sexuais, sendo de forma sutil a passagem da uma mera afeição física normal, como um abraço, por exemplo, para os atos sexuais.
Além do mais, essas pessoas costumam escolher crianças fáceis de serem manipuladas, emocionalmente perturbadas, carentes, crianças com histórico de mentir, que não tenham uma vida familiar feliz ou com falta de confiança e autoestima. Sendo manipuladas por meio de subornos, presentes e jogos.
Conforme estabelece Salter (2009, p. 74) resta claro que a prisão não faz nada para mudar o padrão de interesse sexual de tais agressores. Eles passam a vida pensando, fantasiando, se masturbando, planejando o ato e abusando de crianças. A prisão os impede de abusar sexualmente na maior parte do tempo. Mas, com certeza, a prisão ao menos diminui a quantidade de abusos. Por si mesma, no entanto, a prisão não faz nada quanto às fantasias e ao planejamento. A obsessão é mantida pela constante masturbação em cima de fantasias com crianças. O presidiário emerge do encarceramento ao menos tão depravado quanto quando entrou.
4. A (IN) EFICÁCIA DA PENA DIANTE DO AGRESSOR SEXUAL INFANTIL
Com o transcorrer do tempo e a evolução da civilização a pena sofreu grandes transformações, sendo a primeira e mais usada a pena de morte, em seguida as penas de castigos corporais, e, na idade média, através do direito canônico surgiu a pena de prisão, servindo apenas como local provisório para posterior condenação, todas impostas com requintes de crueldade, além de não haver qualquer preocupação no sentido de recuperar o criminoso.
A partir do século XIX, devido ao progresso cultural da humanidade o homem passou a ser respeitado, ocorrendo uma modificação da pena de prisão, para melhor, passando a ser considerada além de retributiva, também recuperatória. De acordo com a escola positiva admitiu-se a função recuperatória da pena, para tratar aqueles indivíduos que se revelavam inadequados para viver a vida em sociedade.
Com a abolição dos castigos violentos, ainda hoje, as principais formas para punir o indivíduo é através do encarceramento e/ou multa, tendo por fundamento a recuperação social do delinquente.
Importante asseverar, que a missão do direito penal é a proteção de bens jurídicos mais relevantes para a sociedade, devido a isso é considerado um direito de ultima ratio, aplicando-se somente quando os outros ramos do direito se mostrarem insuficientes para controlar a situação.
O direito de punir se baseia na ordem e no equilíbrio da sociedade, havendo, consequentemente, a necessidade de punição. A pena imposta pelo Estado quando o indivíduo pratica uma infração penal, faz valer, o ius puniendi do Estado. Ademais, o que traz a eficiência do direito penal é o não precisar punir, então quanto menos for utilizado na vida das pessoas, quanto mais excepcional for, mais força ele terá, não sendo a punição a grande força do direito penal.
Como já mencionado, no Brasil, com a falta de outras alternativas de controle social, a resposta dada pelo Estado para a criminalidade é o aprisionamento. Ocorre que o criminoso só não delinqui enquanto estiver privado de sua liberdade. Ao sair da prisão estará mais pobre, dificilmente encontrará uma pessoa que lhe ofereça um emprego e provavelmente terá rompido seus laços familiares, voltando, provavelmente, a delinquir.
Isso se dá devido ao caos no sistema carcerário brasileiro, em razão da superlotação que faz com que surjam rebeliões e greves, gerando um sentimento de revolta e efeitos negativos aos presos, além das precárias condições de higiene e a má alimentação que causam efeitos nefastos a saúde desses delinquentes, bem como, o abandono da família e a violência que ocorre dentro da prisão, devendo os presos serem obrigados a respeitar a lei imposta pelos “chefões da máfia carcerária”, onde sua violação acarreta penalidades, através de espancamento, violência sexual e/ou morte, sendo a prática de violência sexual comum dentro das prisões, principalmente para aqueles que foram presos por cometerem esse mesmo ilícito, fazendo valer a frase “quem entra no presidio por estupro deve ser estuprado”.
Em vista disso, se torna impossível alcançar a real finalidade da pena que é dar ao indivíduo o suporte necessário para se reintegrar à sociedade, ajudando-o a compreender os motivos que o levaram a praticar o delito. Assim, pela falta de um tratamento adequado e humanizado, o criminoso acaba não se readaptando a sociedade, tendendo a mais uma vez retornar ao sistema prisional, se tornando um círculo vicioso.
A conclusão que se chega é que a prisão, por si só, não é apta para corrigir o indivíduo, não elimina a motivação do comportamento criminoso, retira o sentimento de dignidade e, ainda, aproxima aquelas pessoas que cometeram crimes menores ou que são suspeitas de praticar um crime, de pessoas marginalizadas e de alta periculosidade.
Nesse sentido, no caso do agressor sexual infantil, a prisão não faz nada para mudar o padrão de interesse sexual de tais agressores, suas fantasias e seus planejamentos, pelo contrário, o abusador de crianças por ser sexualmente atraído por elas, emergem do encarceramento ao menos mais depravado do que quando entrou.
Entretanto, nem todo abusador de crianças se sente sexualmente atraído por elas, podendo cometer o abuso por diversos fatores como, por ingerir bebidas alcoólicas, ter usado determinadas drogas, ser antissocial ou psicótico, sendo uma pessoa tímida, para obter intimidade quando os adultos não dão, pela desestrutura familiar e, ainda por terem sido vitimados sexualmente quando crianças.
Por essa razão, se faz necessário um exame criminológico no indivíduo que comete esses tipos de crime, para que possa ser determinada a pena e o tratamento adequado de acordo com a real necessidade do agressor.
Antes de mais nada, é de extrema relevância compreender que a pedofilia é considerada uma doença, por essa razão muitos pesquisadores acreditam que não exista tratamento, pois, provavelmente, esse indivíduo por não conseguir controlar o seu instinto volta a praticar o ato delituoso.
Diante disso e, ainda, devido à falta de entendimento dos aplicadores do direito, o pedófilo acaba sendo encarcerado, sem direito, muitas vezes, a uma avaliação por um profissional competente que possa comprovar através de um laudo pericial a sua sanidade mental, acabando por receber o mesmo tratamento que um abusador merece, sendo assim, acaba saindo da prisão pior do que entrou.
Quando esse grupo de agressores sexuais não são encarcerados por meio de pena privativa de liberdade, em casos excepcionais estão sujeitos a medidas de segurança. Entretanto, essa medida seria eficaz para o Pedófilo?
Vejamos, a medida de segurança é uma sanção penal imposta pelo Estado e aplicada aos sujeitos inimputáveis ou semi-imputáveis, portadores de distúrbio mental que cometeram o ilícito penal e que são considerados de altíssima periculosidade.
Segundo Nucci (2011, p.576), a medida de segurança é uma forma de sanção penal, com caráter preventivo e curativo, visando evitar que o autor de um fato havido como infração penal, inimputável ou semi-imputável, mostrando periculosidade, torne a cometer outro injusto e receba tratamento adequado.
É relevante saber que a pessoa inimputável é inteiramente incapaz de entender a ilicitude do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento e, o indivíduo semi-imputável é aquele que não tem plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
O Código Penal Brasileiro em seu artigo 26 define que esses sujeitos, não tem plena consciência de suas ações delitivas.
Art.26 é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Portanto esses indivíduos são isentos da aplicação da pena, cabendo ao juiz embasado pelo laudo pericial instituir a Medida de Segurança ao agente delituoso, seguindo, ainda, três requisitos básicos, que são: a prática do fato ilícito, a periculosidade do agente e a ausência de imputabilidade plena.
Essas pessoas podem ser internadas em hospitais de custódia e submetidas a tratamento psiquiátrico, podendo a pena de privação de liberdade ser ainda substituída por internação e tratamento ambulatorial, conforme preceitua o art.96 do Código Penal Brasileiro.
Art.96 As medidas de segurança são:
I- internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado;
II-sujeição a tratamento ambulatorial.
Art. 98. Necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena de privação de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial.
Entretanto, apesar do determinado em lei, no Brasil as aplicações das medidas de segurança são diversas, tendo em vista a situação degradante que se encontram essas instituições, a falta de um tratamento efetivo e humano para todos os indivíduos que ali se encontrem e a precária visão de um tratamento multidisciplinar, com falta de profissionais capacitados para a recuperação desses infratores.
Acontece, que apesar do pedófilo sofrer de um desvio mental, não pode ser considerado um inimputável ou semi-imputavel, devido ele possuir consciência do todos os atos ilícitos praticados, mesmo isso se dando em razão de sua compulsão doentia de praticar atividade sexual com crianças, podendo então ser incriminado por suas ações. Vejamos:
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES SEXUAIS. CRIMES PREVISTOS NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ARTIGOS 240, 241-D, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO I E 244-B, DO ECA. ARTIGOS 147 E 217-A DO CP. NEGATIVA DE AUTORIA SUPERADA PELA PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO DA TENTATIVA NO CRIME DE ATO LIBIDINOSO DIVERSO DA CONJUNÇÃO CARNAL. REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE. MANUTENÇÃO DA FRAÇÃO UTILIZADA EM FACE DA SEMI-IMPUTABILIDADE DO RÉU. INVIÁVEL RECONHECER A CONTINUIDADE DELITIVA. Consoante se verifica da prova produzida nos autos, especialmente através da palavra dos meninos que foram vítima dos crimes, de crucial importância em delitos deste jaez, não subsiste qualquer dúvida quanto à existência dos fatos e de seu autor. Não há falar em estupro de vulnerável consumado, mas, sim, tentado, se os atos libidinosos diversos da conjunção carnal se restringiram a passadas de mãos pelas nádegas de uma das vítimas, ainda que esta seja criança de 10 (dez) anos de idade. Hipótese de aplicação do princípio da proporcionalidade, sob a feição da proibição de excesso. Situação dos autos que recomenda a redução da pena-base, porquanto verificado que apenas três vetores do art. 59. do CP são negativos. Embora o réu não fosse inteiramente capaz de se "auto-determinar", era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito de suas ações, conforme laudo psiquiátrico acostado aos autos, motivo pelo qual não há alteração a ser realizada na fração utilizada para reduzir a pena em face da semi-imputabilidade APELAÇÃO PROVIDA, EM PARTE.
(TJ-RS - ACR: 70050844448 RS, Relator: José Conrado Kurtz de Souza, Data de Julgamento: 18/12/2012, Sétima Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 22/01/2013)
Na maioria das vezes, o pedófilo ameaça a criança para que não revele os seus atos, não considera estranha a sua conduta, procura ocultar seu comportamento, omitindo sempre que se sente emboscado, pois tem noção de que esse comportamento é reprovado e repudiado socialmente e legalmente. Senão vejamos:
PENAL. APELAÇÃO. ACUSADO CONDENADO À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE CORRESPONDENTE A 25 (vinte e cinco) ANOS DE RECLUSÃO, EM REGIME INICIAL FECHADO, PELA PRÁTICA DO DELITO PREVISTO NO ART. ART. 217-A, caput, DO CP, c/c arts. 226, inciso II, e 71, caput, todos do CP - ESTUPRO DE VULNERÁVEL PRATICADO PELO PADASTRO DA VÍTIMA, EM CONTINUIDADE DELITIVA (FLS.170-179). FATO: No dia 27/04/2015, por volta das 22h00min, e ao longo dos três últimos anos, nesta cidade, o denunciado, por várias vezes, em condições semelhantes de lugar, tempo e modo de execução, praticou atos libidinosos com a menor JORDANA LIMA DE JESUS […], hoje com cinco anos de idade. Segundo restou apurado, o denunciado, padastro da vítima, para consumar os atos libidinosos, ameaçava a vítima de morte, caso não cedesse ao sustento. Os atos consistiam em 'passar' o pênis na vítima; beijos na boca; colocar o pênis, a língua e os dedos na vagina da vítima; colocar o pênis no ânus da vítima; apalpar a vagina e seios da vítima. Os atos sempre eram praticados no interior da residência do denunciado, onde também reside a vítima, aproveitando-se este dos momentos em que ficava a sós com ela ou então à noite, quando todos já estavam dormindo. Durante a execução, o denunciado dizia para a vítima ficar quieta, não gritar e não contar nada para ninguém, caso contrário iria matá-la, bem como a sua genitora, gerando, assim, um grande temor na vítima.
(TJ-BA - APL: 03007037020158050112, Relator: Jefferson Alves de Assis, Segunda Câmara Criminal - Primeira Turma, Data de Publicação: 09/10/2017)
Nesse sentido, os pedófilos possuem plena consciência de seus atos, sendo inteiramente responsável por suas ações, por ter conhecimento das proibições de práticas sexuais contra crianças, ou seja, sabe perfeitamente da ilicitude de seus atos, não se mostrando arrependido ao pratica-los, procuram cometer o crime longe de pessoas, interrompendo seus atos ao perceber a aproximação de um terceiro. Não cabe, assim, aplicar a esses sujeitos medidas de segurança, por ser ineficaz, tanto pela capacidade do agente ao praticar tal delito, quanto pela precariedade dos estabelecimentos e a falta de um tratamento adequado para esses indivíduos, caso fossem considerados semi-imputáveis, o que não faz sentido.
Tendo em vista a ineficácia da prisão e também das medidas de segurança para o pedófilo e devido ao elevado índice de casos de prática sexual contra crianças e adolescentes, está sendo analisada na câmara sob o projeto de Lei nº 5398/13, a aplicação da castração química para esses agressores, como alternativa para tentar controlar esse crime que destrói tantas vidas.
A castração química, já adotada em alguns países, reduz temporariamente o libido e os impulsos sexuais, através do uso de medicamentos hormonais ministrados a esse sujeito, que controlam a produção de esperma e testosterona, inibindo o desejo sexual desse agressor.
Ocorre que, sem dúvida, essa também não seria uma melhor solução para a problemática da pedofilia, pois apesar do agressor sexual ter o seu impulso sexual reduzido, seus desejos continuam, não o impedindo de praticar novamente o delito. Muitas vezes a motivação para a prática do abuso sexual é a violência e mesmo sem ereção pode praticar esses atos de violência através da introdução de objetos na vítima, além de outras maneiras, sem precisar usar seu órgão genital.
Ademais, a castração química constitui uma pena cruel, um tratamento desumano e degradante, se assemelhando a tortura, por causar dor física e psicológica, interferindo na integridade física e moral do agressor sexual. Nesse sentido, por se tratar de um castigo físico é uma medida vedada constitucionalmente por ferir os direitos fundamentais estabelecidos pela nossa Constituição Federal de 1988, não podendo esses direitos serem modificados nem por meio de Lei, nem por emenda constitucional, por serem cláusulas pétreas.
Art.5º (...)
III- ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
X- são invioláveis a intimidade, à vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
XLIX- é assegurado aos presos, o respeito à integridade física e moral;
Verifica-se, que não se resolve uma violência com outra, além desse tratamento ferir o princípio da dignidade da pessoa humana e afronta seus direitos fundamentais, pode não ser um método seguro e eficaz para o combate à reincidência nesses crimes, pois, ainda que diminua o libido, pode deixar o indivíduo mais agressivo e mesmo não consumando o ato sexual pela penetração, poderia inserir objetos, além de outras formas de agressão.
Ainda, no Brasil, como já exposto, o indivíduo que pratica conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso, como sexo oral, anal, beijo e toque lascivo, com um menor de 14 (quatorze) anos de idade sofre pena de prisão de 8 (oito) à 15 (quinze) anos, sendo cumprido, inicialmente, em regime fechado.
Nesse sentido é importante saber que o ato libidinoso é aquele com a finalidade diversa da conjunção carnal, podendo ser de maior gravidade, como o coito anal, sexo oral, ou pode ser mais leve, como o beijo e o toque lascivo, podendo causar uma menor lesão ao bem jurídico da vítima.
Ocorre que o legislador deixou de analisar esses parâmetros, aplicando ao indivíduo que pratique qualquer ato libidinoso uma pena de 8(oito) à 15 (quinze) anos, mesmo que não exista violência real ou grave ameaça. Ficando, assim, a encargo do Juiz decidir, dentro dos limites mínimo e máximo, previsto no crime, qual a pena adequada para o agressor sexual.
Importante asseverar que não se fala em flexibilização da pena, e, sim em punição adequada, não devendo ser aplicada uma pena elevada, por ferir os princípios da proporcionalidade e dignidade da pessoa humana, e nem uma pena muito leve, devido o bem jurídico da vítima ficar totalmente desprotegido, não coibindo o agente de reincidir em suas condutas.
Portanto, não é através de medidas drásticas que o Estado deve punir para tentar solucionar os crimes de abuso sexual. Somente através de políticas públicas e de um tratamento adequado e humanizado para o agressor, poderia modificar a criminalidade e a reincidência nesses crimes. Se faz necessário, um tratamento psicológico durante e após o cumprimento da pena, para suprimir sua dependência psíquica, bem como, um tratamento em grupos de apoio com a família ou com outros agressores para que possam compartilhar suas aflições e lutar juntos contra seus desejos sexuais por crianças, visando sua reintegração na sociedade.
Desse modo, o agressor sexual infantil deve ser punido com pena de prisão, mas na proporção de seu delito, além de ser assegurado um tratamento psicológico durante e após a prisão. Havendo, ainda, à necessidade de punir de forma justa a conduta do agente de acordo com o grau de ofensividade ao bem jurídico, sendo respeitados os direitos fundamentais inerentes aos agressores sexuais, bem como, os princípios constitucionalmente previstos.