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Violência obstétrica

Agenda 14/03/2019 às 17:28

O presente artigo tem como objetivo analisar a situação de violência obstétrica, os direitos fundamentais feridos de acordo com tal prática, o fato do desconhecimento da maioria das mulheres sobre o desconhecimento de tal assunto, o que gera ainda mais casos acontecendo e saindo impunes.

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar a situação de violência obstétrica, os direitos fundamentais feridos de acordo com tal prática, o fato do desconhecimento da maioria das mulheres sobre o desconhecimento de tal assunto, o que gera ainda mais casos acontecendo e saindo impunes, salientando a responsabilidade jurídica no âmbito civil, penal, e sobre o Código de Ética Médico e sua possibilidade de punição e indicadores de violência obstétrica no Brasil.

Palavras-chave: Direito Penal. Direito Civil. Dignidade da pessoa humana. Direito à saúde. Violência. Violência Obstétrica.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.. 4

2 A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA HORA DO PARTO.. 6

3 PRÁTICAS CONSIDERADAS VIOLENTAS E VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL. 8

3.1 A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL. 9

4 RECURSOS DISPONÍVEIS PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA   11

4.1 DIREITO PENAL.. 11

4.2 DIREITO CIVIL.. 12

I.     DANO MORAL: 12

II.    RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO.. 13

4.3 RESPONSABILIDADE ÉTICA.. 13

5 CONCLUSÃO.. 14

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS. 16

1 INTRODUÇÃO

No presente artigo, trataremos sore violência obstétrica, sobre como ela aparece, que consiste em tratamentos humilhantes das mais variadas formas, como agressões verbais, em alguns casos até mesmo físicas como um empurrão ou tratamento físico bruto para com a gestante em trabalho de parto, recusa de atendimento por qualquer que seja o motivo, a privação de acompanhante na hora do parto, realização de diversas intervenções ou procedimentos médicos desnecessário.

Por procedimentos desnecessários, neste caso, entende-se desde exames de toque a todo instante, a aceleração do parto pors simples vontade do médico episotomias (que veremos mais profundamente no decorrer do presente artigo), cesáreas desnecessárias, entre outros mais diversos itens desta longa lista.

Tal violência é praticada por equipes médicas, (quem na verdade deveria fornecer todo o suporte para as mulheres que estão em condição gravídica e-ou trabalho de parto) e também,  é por muitas vezes até consentida pelas mulheres que se encontram em situação de pré-natal, trabalho de parto ou parto em si, por desconhecerem do assunto e confiarem no trabalho médico e suas habilidades na situação.

Em um estudo básico da Fundação Perseu Abramo, foi constatado que mulheres das quais tiveram filho tanto em rede pública como também nas redes privadas, têm um número alto que soma 25%  as mulheres que sofreram violência obstétrica, de algum tipo desde os mais leves, aos mais graves e difíceis de lidar.

É sabido que seja no momento do parto- pré-natal, a mulher encontra-se demasiadamente vulnerável, e também muito fragilizada, a dor de se gerar uma vida é considerada uma das maiores dores que o corpo humano pode suportar, e por assim dizer, fica extremamente difícil reagir, e até mesmo se impor em casos de violência obstétrica, sendo assim, é imprescindível algum acompanhante na hora do parto, que preferencialmente tenha algum conhecimento sobre o assunto, assunto do qual deveria ser dado mais atenção, despertar mais a curiosidade das pessoas para assegurar que a mulher não sofra física, mental ou verbalmente neste momento tão delicado, e isto é um direito assegurado pela Lei 11.108 de 2005.

Em muitas vezes a prática de violência obstétrica envolve algumas questões sociais como a raça e classe social, se trata de um ato desumano e cruel, onde traz quase que totalmente  a perda da capacidade de poder decidir livremente sobe seu corpo.

Visto isso, há algumas maneiras de se combater a prática deste tipo de violência, como por exemplo, o conhecimento de que a violência obstétrica existe, se faz muito presente em nossa realidade e um dos grandes motivos como já citado para que isso continue ocorrendo é o desconhecimento de que ela existe, achando muitos de que se tratam de procedimentos ou costumes normais de quem está passando por este momento delicado nesta fase da vida, também uma assistência pré-natal de qualidade, onde deveria envolver todos os aspectos básicos ás gestantes como o respeito, empatia, profissionalismo e compromisso com a profissão, além do compromisso com a vida que está por vir, respeito ao corpo e ao estado delicado em que a mulher se encontra,etc.

Importante também salientar que se sentindo a mulher violada diante destas experiências, na esfera penal, constitucional existem acolhimento para com esta situação e serão abordados os principais, de modo que ao saber se defender ou o modo correto de ser tratada em situação gravídica ou de parto, sabendo quais direitos estão sendo violados, seria possível reverter o quadro que está hoje em nossa realidade.

Diante o exposto e considerando a extrema relevância do tema, será também abordado neste presente artigo, algumas evidências acerca dos casos e sobre a repercussão do tema, levando em conta principalmente o desconhecimento desta prática no pré-natal, trabalho de parto e parto, incluindo fatos geradores e os principais e diversos modos em que a violência obstétrica aparece, muitas vezes disfarçada de ‘’procedimentos’’, além dos direitos fundamentais como a saúde, e dignidade da pessoa humana, especificamente da mulher.

2 A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA HORA DO PARTO

Observa- se em nossa Constituição Federal, conhecida como ‘’Constituição cidadã’’, traz um extenso rol de direitos que também são garantias do Estado para todos os cidadãos e obviamente, tendem a ser aplicáveis ás mulheres em momento de trabalho obstétrico, dos quais será destacado no presente artigo o Direito à Dignidade da pessoa humana, além do Direito a Saúde.

Da dignidade da pessoa humana:

Temos o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana na Constituição Federal.  Delgado (2010, p.39): “A Constituição democrática de 1988 alçou o princípio da dignidade da pessoa humana, na qualidade de princípio próprio, ao núcleo do sistema constitucional do país e ao núcleo de seu sistema jurídico, político e social”.

O princípio da dignidade da pessoa humana, passou então, a ser o princípio basilar do nosso sistema jurídico brasileiro, é considerado o direito acima de qualquer outro princípio por ser nato ao ser humano, ligado aos Direitos e Deveres do cidadão, envolve requisitos para que o cidadão tenha uma vida digna com relação a tais direitos e deveres instituídos pela Constituição Federal de 1998:

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana.

Do Direito a Saúde:

Este está interligado ao direito à vida e a dignidade, também como um direito fundamental no Brasil, é considerado uma garantia para todo e qualquer cidadão, bem como é obrigação do Estado, sendo plenamente assegurado pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 6º:

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Art. 6 - São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

O Direito a Saúde também se encontra consubstanciado nos artigos 196 ao artigo 200 da Constituição Federal. O artigo 196 dispõe:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Sendo assim, entende-se que o Direito a Saúde é de cunho social e é obrigação do Estado a garantia de serviços de saúde suficientemente capaz de atender a população sem distinção alguma. Igualmente importante, o artigo 197, dispõe:

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Observa-se que também é obrigação do Estado garantir remédios e tratamentos de saúde tanto quanto informações a respeito de doenças.

Diante o exposto sobre dignidade da pessoa humana e o direito a saúde, vale salientar, que no artigo 6º da Constituição Federal no tocante a saúde, um dos destaques mencionados no caput é a proteção à maternidade, onde assegura-se alguns direitos ás mulheres no tocante a maternidade, alguns deles seriam:

  1. Garantia de emprego a contar da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10, inciso II, alínea b do ADCT); 2. Licença maternidade de 120 dias, sem prejuízo do salário (art. 392 da CLT); dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e outros exames complementares (§ 4º, inciso II do art. 392 da CLT); intervalos para a amamentação, até que a criança complete 6 meses de idade (art. 396 da CLT); licença para levar o filho ao médico (art. 473XI da CLT). (MEROLA, 2017)

A violência obstétrica, pode deixar marcas, traumas, ser um tanto desagradável um momento que deveria ser repleto de cuidados.

Parir é um ato com muito desgaste e dor física, carregado de diversas emoções ao longo do estado gravídico, deve ser realizado com dignidade, direito a saúde, tendo em vista também a dignidade da mulher como alguém mais vulnerável e com mais necessidade de compreensão e empatia, é uma atenção mínima para com as mulheres que se encontram vivendo este momento, não deveria ocorrer em casos excepcionais, dar à luz com dignidade é um direito.

3 PRÁTICAS CONSIDERADAS VIOLENTAS, E A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL

 Existe um longo conjunto destas práticas das quais são danosas para mulheres, que podem ser violências verbais, institucionais, procedimentos invasivos ou desnecessários.

No tocante a violência institucional, compreende as atuações dos profissionais de saúde onde atrela de alguma maneira a sua função médica com condições físicas.

A violência verbal incita qualquer tipo de expressão considerada ofensiva a mulher, como por exemplo ‘’Pare de fazer escândalo, não é para tanto! ’’, ‘’você está exagerando, se entrou vai sair! ’’, ‘’seu marido não deveria estar presente na hora do parto, ele teria nojo disto! ’’

Quaisquer destas expressões desrespeitosas, além de ofender, sendo emitidas á mulheres em trabalho de parto são formas graves de violência psicológica, além de suprimir o direito de o pai entrar na sala de parto para vero nascimento de seu filho.

Em um estudo sobre o assunto, Silva (2014) elencou uma série de expressões médicas das quais apontam este tipo de violência, além do que aponta um fato muito conhecido, do qual diz que por motivos financeiros e interesse pessoal dos médicos, em grande maioria, os partos acontecem não de forma natural, e sim pelo modo de cirurgia cesariana.

A violência obstétrica, segundo o mesmo autor, Silva (2014, p.819) ‘’ ainda há os procedimentos desnecessários, que seriam episiotomia e ‘’ponto do marido’’

  1. Episiotomia é uma mutilação genital efetuada para ampliar o canal de parto. Nem sempre o uso deste procedimento é justificável, e também não é sempre que a paciente é informada quando este procedimento é aplicado em seu próprio corpo.
  2. ‘’Ponto do marido’’ é uma sutura em que o médico fecha um pouco mais a vagina para que o prazer sexual do marido seja preservado ou aumentado, é feito após a episiotomia normalmente, e é considerado um ato de machismo muito invasivo ao corpo da mulher, além de claro uma nítida violência obstétrica pelo motivo de também quase nunca conscientizar a paciente do procedimento aplicado.

O exame de toque quando desnecessário e doloroso, negar qualquer tipo de ajuda para alívio da dor quando solicitado, humilhar, não conscientizar a paciente de procedimentos realizados em seu próprio corpo, assediar, empurrar, tratar a paciente física ou verbalmente de forma bruta também são alguns casos frequentemente acontecidos e conhecidos desta prática de violência.

Ciello (2012), elencou dois exemplos de violência contra a mulher que podem ser considerados como forma de violência obstétrica de caráter formal e mediático:

Caráter material: ações e condutas ativas e passivas com o fim de obter recursos financeiros de mulheres em processos reprodutivos, violando seus direitos já garantidos por lei, em benefício de pessoa física ou jurídica. Exemplos: cobranças indevidas por planos e profissionais de saúde, indução à contratação de plano de saúde na modalidade privativa, sob argumentação de ser a única alternativa que viabilize o acompanhante. Caráter midiático: são as ações praticadas por profissionais através de meios de comunicação, dirigidas a violar psicologicamente mulheres em processos reprodutivos, bem como denegrir seus direitos mediante mensagens, imagens ou outros signos difundidos publicamente; apologia às práticas cientificamente contra-indicadas, com fins sociais, econômicos ou de dominação. Exemplos: apologia à cirurgia cesariana por motivos vulgarizados e sem indicação científica, ridicularização do parto normal, merchandising de fórmulas de substituição em detrimento ao aleitamento materno, incentivo ao desmame precoce (p. 61).

3.1 VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL.

Existe uma visível e grande dificuldade para realizar pesquisa sobre os indicadores de violência obstétrica pelos motivos de que existe muito poucos pesquisadores que se interessam pelo presente tema, o que torna escasso os materiais utilizados para estudos estatísticos, além do que muitas mulheres pelas quais já passaram ou passam por tais situações têm vergonha de expor o que já sofreram passando por situação de violência obstétrica, ou até mesmo desconhecem o fator ‘’violência’’ por trás de atitudes médicas como as citadas anteriormente, acreditando ser conduta médica comum, vendo com normalidade tais comportamentos.

Sena (2012), em um quadro ilustra detalhadamente sobre mulheres que realizaram partos normais e alguns modos de violência mais comuns sofridos durante o trabalho de parto tanto em redes públicas como privadas:

DESCRIÇÃO

PORCENTAGEM

SOFRERAM ALGUM TIPO DE VIOLÊNCIA NO ATENDIMENTO AO PARTO

25%

FEZ EXAME DE TOQUE DE FORMA DOLOROSA

10%

NEGOU OU DEIXOU DE OFERECER ALGUM TIPO DE ALÍVIO PARA DOR

            10%

O PROFISSIONAL GRITOU COM A MULHER

9%

NÃO INFORMOU SOBRE O PROCEDIMENTO QUE ESTAVA REALIZANDO

9%

O PROFISSIONAL HUMILHOU OU XINGOU

7%

O PROFISSIONAL EMPURROU

1%

O PROFISSIONAL BATEU NA PACIENTE

1%

O PROFISSIONAL ASSEDIOU SEXUALMENTE

1%

Fonte: SENA, Ligia Moreira. Violência obstétrica é violência contra a mulher – avaliação das mulheres sobre os cuidados recebidos durante a internação para o parto e nascimento. Curitiba: BC, 2012, p. 73.

Com este informativo, pode-se observar que no contexto brasileiro, os números relacionados a violência obstétrica são altos, no entanto acredita-se que tais números são ainda maiores pelo fato de apenas constarem informações de partos normais e o fato de nem todas as mulheres das quais já passaram pelas situações elencadas terem conforto em tocar no assunto.

4 RECURSOS DISPONÍVEIS PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

4.1 DIREITO PENAL

Existem algumas sanções enquadradas para a conduta de violência obstétrica, algumas normas na codificação penal e codificação civil, além do Código de Ética Médica.

Dentro do Código Penal existem previsões sobre violência obstétricas no artigo 146 que aborda o constrangimento ilegal, o qual dependendo da forma exercida pode-se considerar prática violenta, artigo 61, inciso II, alínea H ‘’são circunstâncias que sempre agravam a pena quando constituam ou qualifiquem o crime: h. ‘’contra criança, velho, enfermo ou mulher grávida’’, o artigo 129 em seu parágrafo 1º, inciso IV ‘’ lesão corporal de natureza grave: Acelerar o parto. ’’

Nota-se que dentro do Direito Penal, existe um tratamento para violência obstétrica como um agravante dos direitos.

Sendo assim, cita-se um julgado do Supremo Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. PENAL. ROUBO. SUJEITO PASSIVO. PROPRIETÁRIO, POSSUIDOR OU PESSOA QUE SOFRE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. TUTELA DO PATRIMÔNIO, BEM COMO DA LIBERDADE E DA INTEGRIDADE FÍSICA. INCIDÊNCIA DA AGRAVANTE GENÉRICA PREVISTA NO ARTIGO 61, ALÍNEA H, DO CÓDIGO PENAL. CRIME PRATICADO CONTRA MULHER GRÁVIDA. APLICAÇÃO DA AGRAVANTE DO ARTIGO 157, § 2º, INCISO IV, DO CÓDIGO PENAL. TRANSPORTE DO BEM SUBTRAÍDO (VEÍCULO AUTOMOTOR) ENTRE ESTADOS DA FEDERAÇÃO. 1. Não apenas o proprietário ou o possuidor 31 da coisa subtraída é sujeito passivo do delito de roubo, mas também aquele que sofre a violência, direta ou indireta, ou a grave ameaça, considerando que o objeto jurídico protegido não é apenas o patrimônio, mas também a liberdade e a integridade física da vítima. Incidência da agravante genérica prevista no artigo 61, alínea h, do Código Penal, pois o crime foi praticado contra mulher grávida que sofrera grave ameaça. 2. Tendo sido o veículo automotor subtraído no Distrito Federal e, após transportado para o Estado de Goiás, encaminhado para o Estado de Tocantins, de rigor a aplicação da qualificadora de que trata o artigo 157, § 2º, inciso IV, do Código Penal. 3. Recurso especial improvido. (STJ - REsp: 1248800 DF 2011/0090944-0, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 17/12/2013, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/02/2014).

Em tal decisão, o STJ entende que ao cometer crime de roubo segundo o artigo 157 no Código Penal, o agente do crime havia cometido um ato de violência contra mulher grávida o que levou ao agravo de pena do mesmo.

No entanto, no Direito Penal, não está tipificado a conduta dos agentes de saúde no tratamento obstétrico, mas no Direito Civil, há disposições variadas a título de indenização por condutas contra mulheres em situação obstétrica que são lesivas.

4.2 DIREITO CIVIL

No Direito Civil brasileiro, dispõe-se sobre danos morais pelas ações dos profissionais de medicina e enfermagem para com as mulheres em tratamento obstétrico, tais disposições vão desde indenizações por dano moral a respeito de erros médicos, responsabilidade ética e responsabilidade civil.

  1. DANO MORAL: O agente causador deverá reparar o dano moral causado à mulher por violência obstétrica ou pelo fato do não cumprimento de suas obrigações no exercício da função.

De acordo com Maria Helena Diniz: (2003 p.153)

O fundamento primário da reparação está no erro de conduta do agente, no seu procedimento contrário à pré-determinação da norma, que atine com a própria noção de culpa ou dolo. Se o agente procede em termos contrários ao direito, desfere o primeiro impulso, no rumo do estabelecimento do dever de reparar, que poderá ser excepcionalmente ilidido, mas que, em princípio, constitui o primeiro momento da satisfação de perdas e interesses. Esse direito lesado, na perspectiva médico-legal, consiste no dano corporal (dano pessoal) que aponta para duas categorias jurídicas: O dano patrimonial ou econômico e dano extrapatrimonial ou não econômico.

O dano material fundamenta-se a gastos pecuniários incluindo despesas médicas ou sequelas que se resulte em incapacidade para o trabalho, pode ser caracterizado segundo a autora por injúrias que ofende a dignidade ou honra, reputação, sofrimento físico, etc.

No caso da violência obstétrica, também pode ocorrer em face de sofrimentos morais ligados a dor.

II. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO

O erro médico conforme o Código Civil enseja a reparação de danos quando causar danos ou prejuízo a paciente.

No Código Civil a responsabilidade ocorre por culpa, dano e nexo de causalidade, então para se caracterizar responsabilidade civil por erro médico precisa verificar tais pressupostos.

4.3 RESPONSABILIDADE ÉTICA

O Capítulo III do Código de Ética Médica dispõe sobre a responsabilidade profissional:

Art. 1 Causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência; 

Art. 2. Delegar a outros profissionais atos ou atribuições exclusivas da profissão médica;

Art. 8. Afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo temporariamente, sem deixar outro médico encarregado do atendimento de seus pacientes internados ou em estado grave;

Art. 9. Deixar de comparecer a plantão em horário pré-estabelecido ou abandoná-lo sem a presença de substituto, salvo por justo impedimento.

Tais artigos ensejam punição administrativa aos profissionais da medicina. No Código de Ética também consta a vedação ao médico desrespeitar o direito do paciente ou familiares de poderem escolher as práticas diagnosticadas ou terapêutica conforme seu artigo 31, e em seu artigo 33 consta o fato de que em situações emergenciais o médico não pode omitir cuidados.

Por fim, não podem ser violados tais artigos, caso contrário, estará passivo de punição.

5 CONCLUSÃO

Conforme visto no presente artigo, a violência obstétrica é algo muito constante no Brasil e no mundo no momento do parto, pré parto e pós-parto, mas é um assunto um tanto quando invisibilizado, considerando ser uma coisa ‘’comum’’ aos olhos de quem passa, e tendo em vista também a delicadeza deste momento para as mulheres, que por sua vez, optam por não levar isto adiante para evitar possíveis transtornos adicionais futuros.

Apesar de existir diversas ONG’s e organizações, a violência obstétrica é uma prática abrupta existente e que merece muito mais atenção e intervenção, e tal violência é difícil de ser compreendida por ser silenciosa e institucional, e vista como algo de procedimento comum e normal, não pode ser um assunto deixado de lado, por ser um atentado grave contra a mulher e sua vida, em uma situação extremamente delicada.

Observa- se que a violência obstétrica pode ser decorrente dentre várias formas, como erro médico, várias modalidades de ofensas, agressões verbais ou físicas, e também psicológicas, resumidamente, toda e qualquer ação ou até mesmo omissão que esteja sendo praticada diretamente á mulher durante o pré natal, parto, pós parto, puerpério, que chegue a causar dor, dano ou qualquer sofrimento que seja desnecessário á ela em dado momento, praticada muitas vezes também procedimentos brutos que podem lhe trazer sérias consequências das quais a mesma além de desconhecer, não tem o mínimo de conhecimento ou poder sobre o seu próprio corpo, sem qualquer autonomia, e os praticantes de tais atos, englobam-se em todos os prestadores de serviço de saúde além do médico em si..

Existem previsões para tal ato no Código Civil brasileiro e Código Penal, além do Código de Ética médica que também prevê punições no caso de desrespeito aos seus artigos.

Também fora estudado na presente pesquisa que o Código Civil prevê obrigação de reparar o dano desde que fundamentados a culpa, dano e nexo de causalidade.

A violência obstétrica praticada por médico, tem responsabilidade perante o Código Civil e Código de Ética Médica.

Alguns dos procedimentos desnecessários e equivocados provocados pelos médicos nesta situação, por vezes pode trazer sérias consequências para a vida sexual da mulher e seu sistema reprodutivo, exemplo disto é a episiotomia, procedimento do qual muitas vezes é praticado desnecessariamente, e com grandes chances de interferir na vida sexual da mulher por algum tempo, a famosa manobra de Kristeller (onde se faz uma pressão sobre a barriga da gestante para então possibilitar empurrar o bebê, gerando um parto mais rápido), e de modo cruel também existem casos em que há uma proibição e negligência para com as mulheres em trabalho de parto, que consiste em não permitir que a mesma possa se alimentar ou se hidratar durante o processo de parto, inclusive também obrigando-a a estar sempre deitada, impossibilitando-a com a autonomia de seu corpo, seu conforto para poder dar a luz de forma menos sofrida.

Para a nossa Constituição Federa, em seu principio da igualdade e o direito a plena assistência á saúde, e de forma original, o Estado tem o dever de coibir as violências para com as mulheres, o que também se inclui com certeza o dever de reparar o caso da violência obstétrica no Brasil, além de também prever que ‘’ninguém será submetido a tratamento desumano e degradante’’, ainda em nossa Constituição é defendido os direitos sociais, onde se é citado também o direito a saúde, mas na realidade, o que vemos é enquanto muitos países desenvolvidos as mortes maternas estão diminuindo e tornando-se mais difíceis de acontecer pela atenção e respeito que se é dado a este assunto, no Brasil os índices de morte materna são muito altos, e muito além, podendo muitas das vezes ser evitadas.

Para melhorarmos esta questão, temos que contar com boas práticas obstétricas, uma boa assistência pré natal, profissionais mais sérios e comprometidos, além de políticas públicas mais sérias, tendo em vista que no caso em questão também viola os direitos humanos, sexuais, dignidade da pessoa humana, entre outros aspectos seríssimos de nosso ordenamento jurídico.

É importante salientar, por fim, que neste momento delicado da vida de uma mulher, é preciso e merecido todo respeito e empatia, principalmente dos profissionais que escolheram esta área para dedicar anos de estudo e trabalho de suas vidas, é necessária uma melhor preparação dos mesmos e levar conhecimento para que estes casos diminuam. Com a evolução do direito e com a evolução social é esperado que a mulher não mais sofra qualquer tipo de constrangimento ou violência, e haja considerável mudança neste quadro.

 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

CIELLO, C. (s.d.). Fonte: CIELLO, Cariny. Violência obstétrica – “parirás com dor”. Disponível em: http://www.senado.gov.br/comissoes/documentos/SSCEPI/DOC%20VCM%20367.pd f. Acesso 11 nov. 2015.

MEROLA, S. (14 de 07 de 2017). Direitos da Mulher: A maternidade e os direitos que a protegem. Fonte: Jus Brasil: https://sergiomerola85.jusbrasil.com.br/noticias/440131742/direitos-da-mulher-a-maternidade-e-os-direitos-que-a-protegem

OLIVEIRA, D. U. (s.d.). Fonte: OLIVEIRA, Daniele Ulguim. A responsabilidade civil por erro médico. Disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=3580.

Online, C. (16 de 12 de 2016). Deputados catarinenses aprovam projeto que coíbe violência obstétrica. Fonte: Revista Crescer: https://revistacresc.erglobo.com/Voce-precisa-saber/noticia/2016/12/deputados-catarinenses-aprovam-projeto-que-coibe-violencia-obstetrica.html

SENA, L. M. (s.d.). Fonte: SENA, Ligia Moreira. Violência obstétrica é violência contra a mulher – avaliação das mulheres sobre os cuidados recebidos durante a internação para o parto e nascimento. Curitiba: BC, 2012.

SILVA, M. G. (s.d.). Fonte: SILVA, Michelle Gonçalves. Violência obstétrica na visão de enfermeiras obstetras. Revista Rene. N. 15 (4): 820-8. jul-ago, 2014.

VIEIRA, M. C. (31 de 08 de 2017). O que é violência obstétrica? Descubra se você já foi vítima. Fonte: Revista Crescer: https://revistacrescer.globo.com/Gravidez/Parto/noticia/2017/08/o-que-e-violencia-obstetrica-descubra-se-voce-ja-foi-vitima.html


[1] Bacharelando do Curso de Direito da Universidade de Mogi das Cruzes, SP - e-mail:d.oliveiragusto@hotmail.com

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Artigo apresentado à Universidade de Mogi das Cruzes - Curso de Direito como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.

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