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Tutela jurisdicional adequada no mandado de injunção

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Agenda 19/09/2005 às 00:00

4. JURISDIÇÃO

4.1. Escopos da Jurisdição e Efetividade do processo

Noutro ponto de argumentação para confirmação da tese, é importante deixar colocado que o processo é o instrumento de atuação do comando contido na norma e versa logicamente sobre fatos que ensejaram a incidência daquela no plano material. Desta forma, o julgador para utilização do processo deve ter conhecimento pleno ou suficiente, de forma a substituir a vontade das partes e dizer o direito.

Com fundamento nos princípios da efetividade e da instrumentalidade do processo foram introduzidas as chamadas tutelas jurisdicionais diferenciadas, entendendo-se estas como meios técnicos procedimentais de aceleração implantados contras as causas diretas ou indiretas de enfraquecimento da tutela jurisdicional.

Destinaram-se, assim, estas técnicas a preservar o processo contra os desgastes previsíveis decorrentes da morosidade processual, propiciando célere acesso aos bens da vida.

Nesse sentido, José Rogério Cruz e Tucci, afirma que o tempo é um implacável inimigo do processo, contra o qual todos os que dele participam devem lutar de modo particularmente tenaz. O processo, deste modo, deve ser conduzido pelo juiz com a presteza necessária, e impulsionado de forma a atingir sua finalidade precípua: destinar o bem de vida almejado pelo jurisdicionado.

O professor José Rogério Cruz e Tucci, ao citar o processualista italiano Andrea Proto Pisani, afirma:

"... Descrevendo os males que determinam o retardamento da tutela jurisdicional, Proto Pisani mostra que a ideologia liberal-individualista dos fins do século passado e da primeira metade deste imaginava com a absoluta certeza que a técnica do procedimento ordinário resultava idônea a tutelar um rol infinito de direitos. Anota, assim, que o caráter mistificador decorrente do pressuposto teórico da igualdade formal das partes ensejou, de modo fecundo, o culto acrítico àquela forma de procedimento. Todavia, em época mais recente, dada a inequívoca evolução científica e tecnológica do processo civil, observa-se que o tradicional modelo do procedimento ordinário é completamente inadequado para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva a todas as situações de vantagem, ou seja, a todos os direitos que reclamam uma tutela de urgência... ".

Consoante o entendimento de Cândido Rangel Dinamarco e José Roberto dos Santos Bedaque, o enfoque instrumentalista do direito processual denota sua aptidão para o cumprimento de três propósitos básicos, quais sejam, a atenção aos escopos social, político e jurídico do processo.

Desta feita, a função social do processo se aperfeiçoaria mediante a solução de conflitos desagregadores no seio da sociedade; seu papel político residiria na garantia da liberdade do cidadão e de sua participação nas deliberações do Estado; e seu desígnio jurídico far-se-ia presente ao veicular a vontade concreta da lei.

Assim discorre Dinamarco (1987):

"... A jurisdição não tem um escopo, mas escopos ( plural); é muito pobre a fixação de um escopo exclusivamente jurídico, pois o que há de mais importante é a destinação social e política do exercício da jurisdição. Ela tem, na realidade, escopos sociais ( pacificação com justiça, educação), políticos ( liberdade, participação, afirmação da autoridade do Estado e do seu ordenamento) e jurídico ( atuação da vontade concreta da lei)..."

Na mesma linha, Bedaque (2001) leciona:

"... É preciso conciliar a técnica processual com seu escopo. Não se pretende nem o tecnicismo exagerado, nem o abandono total da técnica. Virtuoso é o processualista que consegue harmonizar esses dois aspectos, o que implicará a construção de um sistema processual apto a alcançar seus escopos, de maneira adequada... De qualquer modo, só se chega à tutela jurisdicional mediante o exercício do direito processual de ação. Tais afirmações objetivam conferir ao direito processual sua verdadeira dimensão: a de instrumento voltado para fora do sistema, pois tem o escopo de conferir eficácia a outro direito - o material ( jurídico), para, a final, atingir seus escopos últimos ( social e político)".

Dinamarco (1987) sobre o termo efetividade do processo afirma:

"... expressão resumida da idéia de que o Processo deve ser apto a cumprir integralmente toda a sua função sócio-político-jurídica, atingindo em toda a plenitude todos os seus escopos institucionais... ".

Embora seja tecnicamente um dos mais bem elaborados diplomas processuais existentes no mundo, não restou nosso Código de Processo Civil imune à severas críticas, sendo a mais relevante aquela que indica a existência de enorme descompasso entre o instrumento e a rápida e cabal prestação jurisdicional do Estado.

Para aqueles que manejam com o processo civil, para que sociedade civil brasileira se satisfaça com o processo, ou seja, tenha o direito efetivamente protegido, não basta a beleza técnica de um ou outro instituto, é necessário que haja aplicabilidade prática, sob pena de desvirtuamos a finalidade do direito que é a responder aos reclamos sociais.

Desta forma, vemos como indispensável à consciência de que o processo não é mero instrumento técnico a serviço da ordem jurídica, mas, acima disso, um poderoso instrumento ético destinado a servir a sociedade e ao Estado.

Assim, a finalidade é informar que falta para efetividade processual muitas vezes aos órgãos operadores do direito, como o Judiciário, o Ministério Público, e a Advocacia, seja pública ou privada, a concepção de que o processo civil não se perfaz num mero instrumento formalista, formado apenas de encadeamentos procedimentais e papel, porquanto o mesmo é também sentimentos e ansiedades sociais.

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Para estes sujeitos responsáveis pelo processo civil falta, de forma redundante, responsabilidade política e social no exercício de suas funções.

Desde há muito, Moreira (1988,21), já observou, de forma particularmente precisa, a dissociação das normas de processo em face da realidade forense, discorrendo acerca da enorme distância que se formava entre o real e o virtual:

"... tomava-se a consciência cada vez mais clara da função instrumental do processo e da necessidade de fazê-lo desempenhar de maneira efetiva o papel que lhe toca... Se o processo é instrumento de realização do direito material, o resultado de seu funcionamento deve situar-se a uma distância mínima daquele que produziria a atuação espontânea das normas substantivas, e já constitui uma desgraça a impossibilidade de fazer coincidir precisamente um e outro... ".

As reformas processuais no Brasil visaram após a identificação dos pontos críticos e de estrangulamento da prestação jurisdicional, o oferecimento de projetos de lei desburocratizantes, com base no trinômio: simplificação, agilização e efetividade do processo.

O agente motivador da reestruturação do processo deve ser a constante preocupação com o atendimento à sua efetividade, advertindo Dinamarco, no entanto, que esta deve ser sempre pensada a partir a partir do crivo dado pelo direito processual constitucional, uma vez que o processo deve ser a emanação dos preceitos constitucionais que visam salvaguardar as conquistas democráticas do cidadão.

Com isso, a tentativa de implantação de qualquer variante a matriz epistemológica da supremacia das normas constitucionais no processo, com o atendimento às garantias constitucionais da isonomia substancial, da inafastabilidade do controle jurisdicional e do devido processo legal, estaria fadada ao fracasso.

Marinoni entende que a ordinarização do processo faz com que constantemente o ônus do tempo recaia apenas sobre o autor, como se este fosse culpado pela demora existente na cognição dos direitos.

O tempo do processo deve ter seu devido valor, afirmando tal doutrinador que este:

"... terá uma maior capacidade de eliminar com justiça as situações de conflito, quanto mais prontamente tutelar o direito do autor que tem razão. De nada adianta a doutrina continuar afirmando, retoricamente, que a justiça atrasada é uma injustiça, se ela não tem a mínima sensibilidade para perceber que o processo sempre beneficia o réu que não tem razão... ".

Deste modo, é justo afirmar-se que o fator tempo tornou-se um elemento determinante para a garantia da efetividade da prestação jurisdicional.

Tanto é verdade a importância do fator tempo no processo que a Emenda Constitucional nº 45, implementou no artigo 5º, uma garantia constitucional por meio de emenda aglutinativa que prevê como fundamental o direito à uma razoável celeridade processual.

Não menos verdadeira é a noção de que a técnica da cognição sumária afigura-se de fundamental importância para a idéia de um processo que cumpra seus escopos jurídico, político e social.

Com esse pensamento, Dinamarco (1987) afirma:

"... Fixar os escopos do processo eqüivale, ainda, a revelar o grau de sua utilidade. Trata-se de instituição humana, imposta pelo Estado, e sua legitimidade, há de estar apoiada não só na capacidade de realizar objetivos, mas igualmente no modo como estes são recebidos e sentidos pela sociedade. Daí o relevo de que é merecedora a problemática dos escopos do sistema processual e do exercício da jurisdição... A efetividade do processo mostra-se ainda particularmente sensível através da capacidade, que todo o sistema tenha, de produzir realmente as situações de justiça desejadas pela ordem social, política e jurídica. A tutela específica dos direitos, execução em espécie, obtenção de resultados mediante sentenças constitutivas e eliminação de óbices à plena satisfação dos direitos (v.g., mediante as medidas cautelares), são fatores para a efetividade do processo. A tendência do direito processual moderno é também no sentido de conferir maior utilidade aos provimentos jurisdicionais... ".

Em suma, a jurisdição, na qualidade de função estatal, utilizando-se de métodos e de técnicas efetivas, deve sempre buscar cumprir sua finalidade, qual seja, pacificar satisfatoriamente os conflitos sociais.

4.2. Tutela Jurisdicional

A noção de tutela jurisdicional deriva de uma base do tripé da Teoria Geral do Processo que é a jurisdição.

A jurisdição é a atividade estatal, fornecida pela Estado Juiz com o objetivo de pacificar os conflitos existentes, substituindo a vontade das partes. Pois bem, a jurisdição se realiza quando o Estado entrega ao jurisdicionado a chamada tutela jurisdicional. Em outras palavras, a função da jurisdição e preservar o direito material ameaçado, tutelando-o por meio de uma prestação ou tutela jurisdicional.

Munhoz (2000, 123), sobre o tema leciona:

"Tutelar é conferir proteção. A tutela jurisdicional é prestada por meio do processo. Do ponto de vista de quem postula, é o resultado de um provimento favorável. Se este atende exatamente à necessidade da parte e lhe é ofertado em tempo útil, diz-se que a tutela jurisdicional foi plena. Do ponto de vista do demandado e do ordenamento como um todo, há que se aferir a observância do devido processo lega e das garantias constitucionais do processo e regras processuais decorrentes".

A tutela jurisdicional então é a proteção que o Estado confere através do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, e da satisfação dos direitos debatidos, tanto ao demandante quanto ao demandado.

Entretanto, não basta tão somente que haja por parte Estado a garantia formal de uma tutela jurisdicional. É necessário que essa garantia seja eficiente e efetiva.

Nesse sentido, visando dar efetividade a tutela jurisdicional, duas vertentes vem sendo analisadas. A primeira é a da tutela jurisdicional adequada, que tem como corolário o amplo acesso à justiça, que será mais adiante estudada. A segunda é a tutela jurisdicional diferenciada que, apesar de também ter como fundamento constitucional o acesso à justiça, parte da problematização do distanciamento do direito material do direito processual.

Com base nesses esclarecimentos percebe-se que a tutela jurisdicional do mandado de injunção seria teoricamente a substituição da vontade das partes pelo Estado-juiz, no sentido de pacificar o conflito decorrente da inércia do Poder Público.

4.3. Tutela Jurisdicional Adequada

Seguindo a esteira constitucional do amplo acesso a Justiça, baseado no artigo 5°, XXXV, da Constituição Federal, com escol de vários processualistas brasileiros, restou criado o aprofundamento da tutela jurisdicional com a idéia de tutela adequada.

Marinoni (2000.21),

"A jurisdição deve realizar os fins do Estado e, inclusive, permitir a participação popular, através do processo, no poder. Por outro lado, o direito à adequada tutela jurisdicional e à efetividade da defesa são garantias de justiça do cidadão que descendem da Constituição"

Nery Júnior (2004, 132), a exemplo, leciona que:

"pelo princípio constitucional do direito de ação, todos tem o direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada. Não é suficiente o direito à tutela jurisdicional. É preciso que essa tutela seja adequada, sem o que estaria vazio o sentido do princípio".

"o fator cultural, principalmente nos países subdesenvolvidos, agrava de forma substancial o problema do acesso à Justiça, seja pelo fator de os cidadãos desconhecerem os seus direitos, seja, ainda, porque muitos não confiam nos advogados e no próprio Poder Judiciário. Além disso, a essa dificuldade pode somar-se a questão psicológica, inibindo, definitivamente, o acesso à Justiça"

A tutela jurisdicional adequada seria assim aquele que o Estado despende ao jurisdicionado, cumprindo adequadamente os objetivos pleiteados. É a entrega ao cidadão do provimento jurisdicional mais adequada a situação posta em conflito, com o intuito de resolver completamente a lide.

A idéia de tutela jurisdicional adequada parte da máxima chioveniana de que o processo, através do Estado, deve dar tudo aquilo e exatamente que se pleiteia.

Com isso, não basta que haja apenas tutela jurisdicional, ou seja, não é suficiente que o Estado por meio da jurisdição estabeleça uma solução. É imprescindível que esta solução seja, de fato, adequada aos reclamos daquele que dela necessita.

O objetivo da chamada tutela jurisdicional adequada, diante desses argumentos, é o de fornecer aquela prestação jurisdicional que solucionará a lide no plano do direito material. Em outras palavras, dando essa conotação à tutela, o Estado pretende não só fornecer um caminho para solução, mas efetivamente solucionar o problema a ele colocado.

Para melhor se entender a concepção de tutela jurisdicional adequada, é necessário que primeiro se entender a tutela jurisdicional constitui um direito subjetivo público, nos moldes do artigo 5º, XXV, da CF.

Assim, tendo a concepção, segundo os ensinamentos de Nader (2004, 78) de que: "o direito subjetivo corresponde às possibilidades ou poderes de agir, que a ordem jurídica garante a alguém", percebe-se claramente que o problema passa também pela análise do direito subjetivo.

Pois bem, no caso da problemática da tutela jurisdicional adequada, é necessário dissecar-se os elementos essências do direito subjetivo, quais sejam: sujeito, objeto, interesse e garantia. O sujeito corresponde ao titular do direito, ou seja, aquele que utiliza ou defende o direito subjetivo, que o coloca em prática. O objeto é aquilo que está sendo defendido ou utilizado pelo sujeito. É, em outros termos, o bem de vida em questão. O interesse é o que se almeja com a utilização do direito subjetivo. O objetivo ou desejo do sujeito, amparado pelas normas jurídicas. Por fim, a garantia é o suporte que o ordenamento jurídico confere ao titular do direito subjetivo. São as possibilidades de agir garantidas pela norma em abstrato. São as ações garantidas.

Para idéia nuclear de tutela jurisdicional adequada, importa-nos especificar o último elemento do direito subjetivo, a garantia. A garantia dada à utilização do direito subjetivo pode ser concebida em três nuances de aplicação, isto é, o titular do direito subjetivo tem do Estado três formas de garantir o seu direito. A "ação em potencial", "ação de direito material" e "ação de direito processual".

A primeira delas, a "ação em potencial", nada mais é do que a garantia da norma abstrata em "potência". Com efeito, o titular do direito subjetivo sabe que pode a qualquer momento utilizar ações materiais e/ou processuais para colocar efetivamente no plano da realidade o seu direito.

A segunda delas, a "ação de direito material", é a possibilidade de agir conferida pelo ordenamento jurídico do indivíduo utilizar (defender, usufruir, enfim), os bens de vida, sem a necessidade de socorrer-se de ações judiciais para tanto.

A terceira, a "a ação de direito processual", constitui a exigência de agir utilizando-se os meios e aparatos disponibilizados pelo Estado. É, em termos, a ação que tem como intermediador o processo judicial. É a ação que tem como resultado final a tutela jurisdicional do Estado.

Trazendo tais conceitos para problemática adequação da tutela, temos que a tutela será tanto mais adequada quanto for a proximidade entre ação de direito material e ação de direito processual.

Em outros termos, o grau de adequação da tutela jurisdicional depende da similitude entre a ação de direito material e direito processual.

Havendo a aproximação entre a ação de direito material e direito processual, haverá necessariamente adequação da tutela jurisdicional, prestada pelo Estado.

A exemplo, do Mandado de injunção haverá adequação da tutela quando a ação de direito material, consistente na utilização da norma constitucional, coincidir com a ação de direito processual, determinação para que se utilize plenamente da norma constitucional.

Sobre o autor
João Paulo dos Santos Melo

advogado, professor da Universidade Potiguar, especialista em Direito Processual Civil

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, João Paulo Santos. Tutela jurisdicional adequada no mandado de injunção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 810, 19 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7280. Acesso em: 24 nov. 2024.

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