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Controle de constitucionalidade em nível estadual e municipal

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Diante da autonomia constitucionalmente conferida aos entes políticos, não raro ocorrem relevantes conflitos de ordem constitucional. Analisam-se os diferentes parâmetros de aferição, ante diferentes espécies normativas e as constituições.

Resumo: Trata o presente trabalho do controle de constitucionalidade das normas estaduais e municipais, perpassando pelos diferentes parâmetros de aferição, ante diferentes espécies normativas. Isso porque, diante da autonomia política constitucionalmente conferida a cada um dos entes políticos – mormente no que concerne à sua competência legislativa –, tem-se que não raro ocorrem conflitos quando da aferição da constitucionalidade dessas normas, nos diferentes planos do ordenamento jurídico pátrio, nas três esferas da Federação. Destarte, busca-se uma análise sobre os principais questionamentos envolvendo a matéria, bem como sobre o atual entendimento do Poder Judiciário a respeito do tema, especialmente do Supremo Tribunal Federal.

Palavras-chave: controle de constitucionalidade; constituição estadual; lei orgânica municipal; autonomia municipal; federação.

SUMARIO:1. INTRODUÇÃO. 2.CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. 3.POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 650898. 4. CONCLUSÃO.


INTRODUÇÃO     

Inicialmente, é necessário esclarecer que a Constituição Brasileira utiliza o federalismo como um dos seus princípios basilares, determinando, assim, o funcionamento, em harmonia, de várias ordens: a União – a ordem total; os Estados – ordens regionais; os Municípios – ordens locais.[1] Dessa forma, existe uma repartição de poder entre os entes federados, uma vez que União, Estados, Distrito Federal e Municípios são todos autônomos e possuem suas competências constitucionalmente definidas.

Neste sentido, a Constituição expõe de forma clara o que é de competência da União, deixa o que é remanescente para os Estados e considera o que for de interesse local parte da competência do Município. Logo, é primordial compreender a própria noção de autonomia aplicada aos entes federados, bem como as competências conferidas pela Constituição.

Hely Lopes Meirelles define autonomia como uma prerrogativa política que a Constituição outorga às entidades estatais internas (Estados, Distrito Federal e Municípios) com o intuito de formar um governo de acordo com o ordenamento jurídico vigente.[2]

Os Municípios, assim como os Estados e o Distrito Federal, possuem a capacidade de auto-organização, autolegislação, autogoverno e autoadministração. No que se refere especificamente aos municípios, a Constituição, em seu art. 29, determina que serão regidos por Lei Orgânica elaborada pelas Câmaras Municipais.

Acerca da expressividade da autonomia municipal no nosso sistema federativo, assim aduz Paulo Bonavides:

Não conhecemos uma única forma de união federativa contemporânea onde o princípio da autonomia municipal tenha alcançado grau de caracterização política e jurídica tão alto e expressivo quanto aquele que consta da definição constitucional do novo modelo implantado no País com a Carta de 1988, a qual impõe aos aplicadores de princípios e regras constitucionais uma visão hermenêutica muito mais larga tocante à defesa e sustentação daquela garantia.[3]

De fato, pensou-se a autonomia municipal sob ideal altamente republicano, de representatividade política capaz de incrementar a liberdade de informação e a eficácia de fiscalização sobre os poderes constituídos, atuando também no sentido de conferir certa proximidade com a população[4], motivo pelo qual, com base na sua autonomia, conferiu-se aos entes municipais a competência de regular seus interesses, dentro do espaço reservado pela Constituição Federal, possuindo mesmo sua Lei dotada de supremacia dentro daquele sistema normativo de caráter local, que é a Lei Orgânica Municipal.

Porém, apesar do Município ser o exemplo maior do exercício de cidadania e ter o poder de elaborar sua Lei Orgânica, existem limitações nesta atuação. Decorre isso do fato de pertencer esta entidade, bem como os Estados-membros,a um contexto maior, destacando-se sua prerrogativa política de ser ente dotado de autonomia. Ou seja, é crucial compreender que a autonomia se difere da soberania, pois estasignifica o próprio poder político, o elemento de poder que permite a formação do próprio Estado[5], diferentemente da autonomia que não é, portanto, poder originário e, assim, deve ser bem delimitada, motivo pelo qual leciona José Afonso da Silva que a autonomia “significa capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de um círculo prefixado por entidade superior.

E é a Constituição Federal que se apresenta como poder distribuidor de competências exclusivas entre as três esferas de governo”[6].Útil mencionar neste ponto que não olvidamos respeitável doutrina que se posiciona contra a inclusão dos municípios no nosso sistema federativo, mediante respeitáveis argumentos, a exemplo do supramencionado Constitucionalista que, dentre outras fortes críticas a esse sistema, aduz em sua obra que:

Não é porque uma entidade territorial tenha autonomia político-constitucional que necessariamente integre o conceito de entidade federativa. Nem o Município é essencial ao conceito de federação brasileira. Não existe federação de Municípios. Existe federação de Estados. Estes é que são essenciais ao conceito de qualquer federação[7].

No entanto, percebe-se que mesmo diante de posicionamentos como o referido – deveras consistente, diga-se de passagem -, não se despreza o fato de que aos municípios foi conferida autonomia política, fato a partir do qual se inserem alguns questionamentos decorrentes dessa prerrogativa política, haja vista a existência de certas “lacunas” a serem trabalhadas com vistas à harmonização do ordenamento jurídico concebido na sua integralidade.

Desta forma, é indispensável que ocorra um exercício de poder simétrico e equilibrado. Não é, pois, por outro motivo que é fundamental tratar de controle de constitucionalidade em âmbito municipal, na medida em que no sistema normativo, em uma teoria kelseniana, toda norma deverá encontrar um fundamento para sua validade em outra norma hierarquicamente superior. Neste sentido, considerando a Constituição como o fundamento de validade, é imperativo que todas as outras normas estejam em consonância com suas regras. 

Nestes termos, o Poder Judiciário exerce o Controle de Constitucionalidade, fazendo uma fiscalização das normas e atos normativos que estejam em confronto com a Constituição Federal. Diante disso, aduz Paulo Bonavides com a habitual clareza, que:

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O órgão legislativo, ao derivar da Constituição sua competência, não pode obviamente introduzir no sistema jurídico leis contrárias às disposições constitucionais: essas leis se reputariam nulas, inaplicáveis, sem validade, inconsistentes com a ordem jurídica estabelecida. Até aqui há entendimento pacífico. As dificuldades principiam porém quando se trata de alcançar os meios com que expungir do sistema normativo as leis inconstitucionais[8].(Destacamos).

Indispensável, portanto, atentar para a atuação desses instrumentos de controle de constitucionalidade, bem como seus efeitos, com o devido respeito à autonomia política dos entes e à competência jurisdicional reservada a diferentes órgãos do Poder Judiciário, de forma a observar-se a harmonia do ordenamento jurídico nas diferentes esferas da Federação e a supremacia da Constituição Federal.


CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Partindo-se do pressuposto de que vivemos sob a égide de uma Constituição rígida, intimamente ligada à ideia de sua supremacia sobre todo o ordenamento jurídico pátrio, faz-se imprescindível que seja a todo o tempo buscada a observância dos preceitos constitucionais, sob pena de graves violações à ordem constitucionalmente posta.

Nessa senda, pode-se afirmar que o controle constitucionalidade exerce papel deveras importante no tocante à manutenção da rigidez da Carta Magna, sem a qual restaria possível ao legislador ordinário arvorar-se de poderes conferidos somente ao constituinte originário, que tem como uma das suas principais características a ilimitabilidade na sua atuação[9].

Assim, a Constituição Federal de 1988 conferiu ao Supremo Tribunal Federal, em sede de ação direta de inconstitucionalidade, o controle abstrato de constitucionalidade das normas e atos federais e estaduais (art. 102, I, a, da CF). Inobstante isso, no tocante às normas municipais, a Lei Maior não previu o controle dessas espécies normativas pela nossa Corte Maior, pela via concentrada, salvo no caso de exceção da arguição de descumprimento de preceito fundamental(ADPF). Por outro lado, o controle difuso é aquele exercido de forma incidental, nos casos concretos, de forma que pode ocorrer em todas as instâncias e órgãos judiciais, sendo assim mais abrangente em relação ao controle concentrado.

Diante disso, reputa-se inviável a proposição de ação direta de inconstitucionalidade em face de lei ou ato normativo do ente municipal que ofenda a Lei Maior, no Supremo Tribunal Federal.[10]Apesar disso, é possível, porém, a proposição de ação direta de inconstitucionalidade no âmbito do Tribunal de Justiça, contra lei municipal, alegando-se violação à Constituição Estadual, ou mediante controle concreto[11].

Elucidativa é a explicação do Ministro Paulo Brossard quando aduz que:

O nosso sistema constitucional não admite o controle concentrado de constitucionalidade de lei ou ato normativo municipal em face da Constituição Federal; nem mesmo perante o Supremo Tribunal Federal, que tem como competência precípua, a sua guarda, art. 102 da Carta Federal. O único controle de constitucionalidade de lei e de ato normativo municipal em face da Constituição Federal que se admite é o difuso, exercido incidentertantum, por todos os órgãos do Poder Judiciário, quando do julgamento de cada caso concreto[12].

Percebe-se, assim, que a autonomia conferida constitucionalmente aos municípios não faz com que as leis ou atos normativos municipais tenham sua constitucionalidade auferida perante a própria Carta Magna, como ocorre com as normas e atos federais e estaduais.

Este assunto já fora enfrentado em nossos tribunais, no RE 92.169/SP o Ministro Moreira Alves levou à Corte Suprema o questionamento sobre a possibilidade de controle de norma municipal utilizando como parâmetro a Constituição Federal. Na ocasião foi entendido que esta forma de controle se caracterizaria como impossível, pois – conforme palavras do Ministro – ocorrendo o trânsito em julgado esta decisão teria eficácia erga omnes; consequentemente - por se tratar de uma espécie de controle exercida em âmbito local - o Senado Federal não participaria do procedimento de declaração de inconstitucionalidade.

Como efeito prático, após o trânsito em julgado – em decorrência do efeito erga omnes– o Supremo Tribunal Federal estaria vinculado à decisão proferida pela Corte Estadual de Justiça; inclusive para casos futuros derivados de recurso extraordinário.

Nas palavras do Ministro Moreira Alves, no âmbito do referido RE: “O absurdo da consequência, que é da índole do instrumento, demonstra o absurdo da premissa”.

Percebe-se que se entendeu descabida tal possibilidade perante o nosso ordenamento jurídico, por força da completa desorganização dentro do sistema jurisdicional que a possibilidade da medida acarretaria. Em outras palavras, a Suprema Corte correria o risco de não ser a instância detentora da última palavra sobre a (in)constitucionalidade de lei ou ato normativo ante a Constituição Federal, o que não coaduna-se com o sistema constitucional vigente.

No mesmo sentido, o Ministro Cunha Peixoto no julgamento do RE 92.169-SP, reconheceu a omissão da Constituição Federal ao não mencionar o controle de constitucionalidade dos atos municipais. Para o Ministro: “Assim, o silêncio da Constituição relativamente às leis municipais obriga o STF a enfrentar o problema, preenchendo a lacuna pela interpretação integradora da plenitude do sistema. E este impõe que as normas constitucionais sejam controladas pelo mais alto Poder Judiciário do País, sejam elas federais, estaduais ou municipais”.

Diante disso, assim aduz autorizada doutrina:

Os Tribunais de Justiça dos Estados têm competência para verificar a inconstitucionalidade das leis estaduais e municipais, em face da Constituição Estadual. A Carta Magna prevê que os Estados-membros poderão instituir representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais, em face da Constituição Estadual, desde que não seja conferida a um único órgão a legitimação para impetrar as ações, como na Constituição de 1967/1969, em que a competência pertencia a um único órgão, o Procurador-Geral da República[13].

É necessário, portanto, que exista no Texto Constitucional Federal uma estruturação dos parâmetros de controle de constitucionalidade de forma harmoniosa e diferenciada, para permitir que as jurisdições constitucionais federal e estadual possam conviver de forma harmônica.

Nessa senda, uma questão já debatida pela Corte Constitucional diz respeito à possibilidade de controle em nível estadual, de norma municipal que colida com norma estadual de repetição obrigatória. Ilustrando melhor a situação, o Ministério Público do Estado de São Paulo propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça daquele Estado questionando a Lei Municipal que modificou a cobrança do IPTU na cidade de São Paulo. A demanda fora fundada na alegação de que a progressividade das alíquotas colidia com artigos da Constituição Estadual do Estado de São Paulo. Houve a concessão de uma liminar no sentido de suspender os dispositivos legais questionados, fato este que gerou a interposição de uma Reclamação Constitucional (Rcl 383), onde se questionou a legalidade da liminar concedida em âmbito local.

O reclamante alegou que em decorrência da autonomia política, administrativa e financeira do Município, fora deferida competência tributária plena em relação aos tributos municipais; desse modo, poderia o município instituir alíquotas diferenciadas em razão do valor do imóvel e – dessa forma – realizar a justiça social.

O debate girou em torno do fato de que a liminar concedida desrespeitava os preceitos contidos na Constituição Federal, sendo assim, impossível o exercício do controle de constitucionalidade no âmbito estadual, uma vez que o conteúdo da norma municipal fora extraído das regras de competência determinados pela Constituição Federal.

Na reclamação se debatia sobre a possibilidade do Tribunal de Justiça Local apreciar a colisão entre uma lei municipal e uma norma constitucional federal, uma vez que apesar de a ação ser fundada em dispositivos constitucionais estaduais, trata-se de norma de repetição obrigatória.

Tal reclamação colidia com o conteúdo existente na Rcl n. 370, na qual o Supremo Tribunal Federal decidiu que os Tribunais de Justiça Locais não poderiam conhecer de demandas que levantassem inconstitucionalidade de lei municipal que tivesse como parâmetro de controle, normas constitucionais estaduais, que na sua substância integrassem a ordem constitucional federal.

Por sua vez, a Corte, ao analisar a Rcl nº 383, passou a entender de modo diverso, evoluindo – assim – o seu posicionamento. Na ocasião, fora decidido que ao se debater a constitucionalidade de uma lei municipal tendo como parâmetro norma constitucional estadual, está-se diante de um debate constitucional estadual.

Assim, consoante entendimento externado pelo Ministro Moreira Alves quando do seu voto no julgamento da reclamação n° 383, não se pode levantar que as normas constitucionais estaduais que reproduzam o conteúdo constitucional federal sejam inócuas; nem muito menos, afirmar que tais normas não são jurídicas, uma vez que jurídicas e – por isso – eficazes são as normas constitucionais federais reproduzidas. Para o Ministro, as normas estaduais – mesmo que tenham substância no Texto Constitucional Federal – são sim normas jurídicas dotadas de eficácia dentro do seu âmbito de atuação.

A diferenciação é tão latente que, na hipótese de revogação dos princípios reproduzidos, não haverá influência no âmbito municipal (ou estadual), posto serem diversos os âmbitos de atuação. Por isso, não se pode alegar que se tratam de normas secundárias, pois, mesmo que a norma constitucional inspiradora perca sua vigência, o dispositivo estadual continuará em vigor.

Nas palavras do Ministro:

“Os princípios reproduzidos, que, enquanto vigentes, se impunham obrigatoriamente por força apenas da Constituição Federal, quando revogados, permanecem, no âmbito de aplicação das leis ordinárias federais ou constitucionais estaduais, graças à eficácia delas resultante."[14]

Sendo assim, na Reclamação nº 383, a Corte Suprema evoluiu o seu posicionamento, no sentido de entender que os Tribunais de Justiça podem analisar em sede de controle de constitucionalidade leis municipais em face de normas constitucionais estaduais que tenham em seu conteúdo uma reprodução de norma da Constituição de observância obrigatória.

Pela importância da citada Reclamação, segue a ementa:

EMENTA: Reclamação com fundamento na preservação da competência do Supremo Tribunal Federal. Ação direta de inconstitucionalidade proposta perante Tribunal de Justiça na qual se impugna Lei municipal sob a alegação de ofensa a dispositivos constitucionais estaduais que reproduzem dispositivos constitucionais federais de observância obrigatória pelos Estados. Eficácia jurídica desses dispositivos constitucionais estaduais. Jurisdição constitucional dos Estados-membros. - Admissão da propositura da ação direta de inconstitucionalidade perante o Tribunal de Justiça local, com possibilidade de recurso extraordinário se a interpretação da norma constitucional estadual, que reproduz a norma constitucional federal de observância obrigatória pelos Estados, contrariar o sentido e o alcance desta. Reclamação conhecida, mas julgada improcedente.

Todavia, inobstante o entendimento externado na referida Reclamação, ainda não havia certeza jurídica quanto a um aspecto: a decisão proferida pelo tribunal de Justiça Local poderá ser analisada pelo Supremo Tribunal Federal? Na ADI-QO n° 1.529/MT, o Tribunal solidificou entendimento no sentido de que no caso de julgamento pela Corte Estadual de uma ação direta contra uma lei estadual (ou municipal) contrastada com a Constituição Estadual, em relação a normas de repetição obrigatória, caberá – pelo menos em tese – recurso extraordinário da decisão proferida.

Sendo assim, na Reclamação nº 526, foi reconhecida a possibilidade de propositura de uma arguição de incidente de inconstitucionalidade em face da Constituição Federal no curso de ação direta proposta no Tribunal de Justiça local com a arguição de ofensa à Constituição Estadual. Com isso, a decisão proferida na arguição de inconstitucionalidade poderá ser atacada por recurso extraordinário, de modo que a colisão existente em face da Constituição da República possa ser analisada pelo Supremo Tribunal Federal.

Ou seja, por vezes as Constituições Estaduais repetem dispositivos da Constituição Federal, seja por vontade própria ou mesmo por imperativo dos princípios simétricos de repetição obrigatória, como a forma de governo, o regime democrático etc.[15]Diante disso, na hipótese de norma infraconstitucional afrontar dispositivo constante no Texto Federal e repetido na Carta Estadual, com a consequente proposição de duas ações diretas simultâneas, uma endereçada ao Tribunal de Justiça e a outra dirigida ao Pretório Excelso, deve-se suspender a ação sub judice perante a justiça estadual até a decisão final do Supremo Tribunal Federal.[16]

Portanto, tendo-se em vista que a decisão do Supremo Tribunal Federal tem efeitos erga omnes e extunc, a decisão que retira a normado ordenamento jurídico vincula a decisão do Tribunal de Justiça, culminando na extinção da ação direta proposta em âmbito estadual.

Apesar disso, existe a possibilidade de que a ação proposta no Tribunal de Justiça tenha fundamentos jurídicos (causa petendi) diversos. Em tal conjuntura, a decisão do Supremo Tribunal Federal apenasvinculará as decisões da justiça estadualcaso haja identidade nas ações diretas, da mesma causa petendi analisada. Isso significa que, inexistindo entre as ações fundamentos jurídicos coincidentes, terá regular prosseguimento a ação na justiça estadual, proferindo o Tribunal de Justiça a sua decisão sem nenhum tipo de vinculação.[17]

Sendo assim, a decisão proferida pelo tribunal estadual será dotada de eficácia erga omnes na esfera de sua competência, devendo-se observar, todavia, a limitação dos efeitos dessa decisão por força da amplitudedacausapetendi que fora pleiteada, coadunando-seassim com o parâmetro estabelecido pela Constituição Estadual.[18]

No tocante à possível ofensa de lei municipal à Lei Orgânica Municipal (LOM),fala-se emilegalidade e não em “inconstitucionalidade municipal”, a despeito do fato de que a LOM goza desupremacia em relação às demais normas do ordenamento jurídico municipal. Com efeito, ostatus da Lei Orgânica não é o mesmo de uma Constituição, poisseu espaço de autonomia não é tão amplo, uma vez que deveras reduzido pela Constituição Federal e Estadual, razão pela qual considera-se de melhor alvitre falar-se em ilegalidade. Não obstante, a Lei Orgânica por gozar de supremacia dentro daquele sistema normativo, representa a “Constituição Municipal”, sendo o processo para sua elaboração consubstanciado em dois turnos de votação, num prazo entre uma votação e outra de dez dias, com o quórum de dois terços dos membros da Câmara Municipal. Diante disso, percebe-se que a própria rigidez que caracteriza sua promulgação faz com que a LOM goze, efetivamente, de supremacia ante as demais leis municipais.

Consequentemente, na ocorrência de afronta de lei municipal à Lei Orgânica, tem-se por possível ocontrole de legalidade em qualquer instânciajudiciária, observando-se a terminologia – “ilegalidade” – todavia preservando a finalidade que é a mesma, ou seja, caso norma municipal afronte a LOM, deverá ser reconhecida sua ilegalidade. Ressalte-se, outrossim, que se a afronta ofender também a Constituição da República, o litígio pode mesmo chegar ao Supremo Tribunal federal mediante interposição de recurso extraordinário.

Sobre os autores
Luís Carlos Santos da Cruz Junior

Advogado Tributarista (OAB n° 49.627/PE), formado pela Faculdade Imaculada Conceição do Recife (FICR). Amante dos debates e temas relacionados aos ramos constitucional e tributário.

Pedro de Menezes Carvalho

Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Advogado e Parecerista. Professor Universitário da Faculdade Imaculada Conceição do Recife (FICR).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ JUNIOR, Luís Carlos Santos; CARVALHO, Pedro Menezes. Controle de constitucionalidade em nível estadual e municipal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5794, 13 mai. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73371. Acesso em: 22 nov. 2024.

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