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A presença de animais em condomínios

Agenda 05/06/2019 às 15:25

STJ decide que a convenção de condomínio residencial não pode proibir, de forma genérica, a criação e a guarda de animais de qualquer espécie nas unidades autônomas quando o animal não apresentar riscos.

Segundo o site do STJ, em 14 de maio de 2019, a Terceira Turma decidiu que a convenção de condomínio residencial não pode proibir, de forma genérica, a criação e a guarda de animais de qualquer espécie nas unidades autônomas, quando o animal não apresentar risco à segurança, à higiene, à saúde e ao sossego dos demais moradores e dos frequentadores ocasionais do local.

A decisão reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) que havia entendido que as normas previstas na convenção e no regimento interno do condomínio incidem sobre todos os moradores, sendo que a proibição expressa da permanência de animais nas unidades autônomas se sobrepõe à vontade individual de cada condômino.

O recurso julgado no STJ teve origem em ação ajuizada por uma moradora de condomínio do Distrito Federal para ter o direito a criar sua gata de estimação no apartamento. Ela alegou que a gata, considerada um membro da família, não causa transtorno nas dependências do edifício.

No recurso especial, sustentou que a decisão do TJDF violou seu direito de propriedade, divergindo, inclusive, do entendimento externado por outros tribunais quando julgaram idêntica questão.

Alegou, ainda, ser descabida a proibição genérica de criação de animais, pois a vedação só se justifica nos casos em que for necessária para a preservação da saúde, da segurança e do sossego dos moradores.

A matéria foi objeto de discussão no REsp 1.783.076.

Segundo o relator, para determinar se a convenção condominial extrapolou os limites da propriedade privada, é importante observar três situações que podem surgir.

A primeira é o caso da convenção que não regula o tema. Nessa situação, o condômino pode criar animais em sua unidade autônoma, desde que não viole os deveres previstos nos artigos 1.336, IV, do CC/2002 e 19 da Lei 4.591/1964.

A segunda hipótese é a da convenção que proíbe a permanência de animais causadores de incômodos aos moradores, o que não apresenta nenhuma ilegalidade.

Por último, há a situação da convenção que veda a permanência de animais de qualquer espécie – circunstância que o ministro considera desarrazoada, visto que certos animais não trazem risco à incolumidade e à tranquilidade dos demais moradores e dos frequentadores ocasionais do condomínio.

O colegiado, por unanimidade, seguiu o voto do relator e deu provimento ao recurso especial da autora, destacando que a procedência de seu pedido não a exonera de preservar a incolumidade dos demais moradores do local, de manter as condições de salubridade do ambiente e de impedir quaisquer atos de perturbação.

Tem-se especificamente o artigo 19 da Lei de Condomínio e Incorporações:

Art. 19º Cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionados, umas e outros, às normas de boa vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos.

Art. 1277 do Código Civil: O proprietário, ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.

 Qualquer cláusula que proíba animais em condomínios, assim como, qualquer lei municipal ou estadual com o mesmo teor serão incompatíveis com a Lei 4591/64, com o Código Civil e com a Constituição Federal.

Só pode haver vedações em caso de animais que causem transtornos ao condomínio e aos condôminos (barulho, agressividade, ameaça à saúde pública).

As Convenções de Condomínio que proíbam a permanência de animais não podem ser aceitas, caso o animal não apresente nenhuma ameaça. 

Ensinou Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, § 1.383, pág. 421) que aos comunheiros é permitido, no ato constitutivo, ou em deliberação posterior, unânime, que deve ser registrada por atingir o conteúdo dos direitos reais, o estabelecimento de regras sobre vizinhança, mais rigorosas do que aquelas que constam na lei(artigos 554 – 588 do Código Civil de 1916, 1.336, IV, do CC/2002, Lei nº 4.591, artigos 10, 19-21). Os direitos de vizinhança e os deveres de vizinhança, que daí surgem, são irradiações do negócio jurídico plurilateral e não direito e deveres ex lege. A unanimidade pode distratar o negócio jurídico. As restrições ao uso do próprio apartamento e das demais partes divisas são permitidas na mesma extensão em que o seriam entre dois ou mais vizinhos da rua ou dos fundos, pelo fato de ser mais íntima a comunhão nos edifícios de apartamentos, podem ser previstas situações que não se apontariam entre vizinhos de rua, ou dos fundos.

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Pontes de Miranda (obra citada, pág. 422) continua por ensinar que a transformação de residência, ainda que parcialmente, em casa de tolerância, é vedada, ainda que não conste no ato constitutivo ou de deliberação unânime posterior e ainda que não altere a estrutura do prédio.

O que é por lei vedado aos vizinhos de prédios também o é aos comuneiros. O que ofenderia a unidade senhorial, estética, ou do destino do prédio de apartamentos é vedado. Vedado é, por exemplo, o ter pássaros e outros animais na varanda, ou estender roupas, de jeito que o aspecto exterior fique comprometido pelos detritos de comida que caem, ou por excrementos ou pela simples vista do edifício.

A questão da presença de animais no condomínio deve ser vista diante das regras de vizinhança, uma vez que o vizinho não pode trazer transtorno á saúde, sossego e segurança ao outro.

Tais direitos são reais, não isolados. Se porém, o que se proibia não se subsume nas vedações legais, não há pensar-se em limitação ao conteúdo do direito de propriedade, não ao conteúdo. Tudo se passaria no campo dos direitos das obrigações ou ainda diante de membro de uma comunhão, o que se explicitaria no que há de entender-se como abuso de direito.

Tudo deve se resolver o âmbito da razoabilidade.

Algumas convenções e regimentos internos proíbem a permanência de animais em condomínios, outras restringem o tamanho do animal estabelecendo permissibilidade apenas para animais de pequeno porte, e outras, de forma acertada, proíbem somente os animais que causem transtornos ao sossego, à saúde e segurança dos demais moradores do prédio.

Neste sentido, na Apelação 2385004800 (de 02/06/2009), julgada pela TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) na 1ª Câmera de Direito Privado, o relator Desembargador Paulo Eduardo Razuk entendeu que “Quando se trata de animais domésticos não prejudiciais, não se justifica a proibição constante do Regulamento ou da Convenção de condomínio, que não podem, nem devem, contrariar a tendência inata no homem de domesticar alguns animais e de com eles conviver.”

Trago, para tanto, as conclusões, na matéria da parte de Rodrigo Karpat (Animais em condomínios) quando conclui:

“A circulação de animais com focinheira no Estado de São Paulo é regulada pela Lei nº 11.531/03, restringindo-se as seguintes raças "pit bull", "rottweiller" e "mastim napolitano".

Assim, não é permissivo ao síndico ou a assembleia deliberar em detrimento ao direito de propriedade. Comparativamente seria o mesmo caso que a assembleia limitar o tamanho do automóvel que pode ser estacionado na garagem ou limitar a número de moradores em uma unidade. O direito de propriedade no primeiro caso permite que dentro dos limites de uma vaga seja estacionado qualquer automóvel, desde que respeitado a segurança e salubridade. Porém, poderia ser restringida a guarda de um mini automóvel que estive causando danos a saúde dos demais em face de problemas com emissão de poluente, por exemplo.”

A manutenção do animal no condomínio somente poderá questionada quando existir perigo à saúde, segurança e salubridade aos demais copossuidores.

Assim, é anulável a decisão de assembleia que vise proibir animais de pequeno e médio porte ou restrinja a circulação destes animais no colo ou com focinheira nas dependências do condomínio.  Exigir que o animal seja transportado apenas no colo, de focinheira, pode levar o condômino a situação vexatória o que é punido pelo Código Penal.

Aconselhava Caio Mário da Silva Pereira (Condomínio e Incorporações, 3ª edição, 1977, pág. 150) que os preceitos atinentes à boa vizinhança do direito comum, com a finalidade de resguardar cada consorte do que possa causar dano ao apartamento, perturbar-lhe o sossego ou causar incômodo aos habitantes, são totalmente aplicáveis ao condômino especial, e pelos mesmos fundamentos de sua existência genérica. Os autores consideram, mesmo essencial, como lembrou Caio Mário da Silva Pereira, a existência de um espírito de mútuo respeito e tolerância, que oriente o comportamento de cada um, para que se abstenha de tudo que incomode os demais, e faça o que seja conveniente a todos, como dizia Raluy.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. A presença de animais em condomínios. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5817, 5 jun. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73980. Acesso em: 22 nov. 2024.

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