Segundo o site do STJ, em 14 de maio de 2019, a Terceira Turma decidiu que a convenção de condomínio residencial não pode proibir, de forma genérica, a criação e a guarda de animais de qualquer espécie nas unidades autônomas, quando o animal não apresentar risco à segurança, à higiene, à saúde e ao sossego dos demais moradores e dos frequentadores ocasionais do local.
A decisão reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) que havia entendido que as normas previstas na convenção e no regimento interno do condomínio incidem sobre todos os moradores, sendo que a proibição expressa da permanência de animais nas unidades autônomas se sobrepõe à vontade individual de cada condômino.
O recurso julgado no STJ teve origem em ação ajuizada por uma moradora de condomínio do Distrito Federal para ter o direito a criar sua gata de estimação no apartamento. Ela alegou que a gata, considerada um membro da família, não causa transtorno nas dependências do edifício.
No recurso especial, sustentou que a decisão do TJDF violou seu direito de propriedade, divergindo, inclusive, do entendimento externado por outros tribunais quando julgaram idêntica questão.
Alegou, ainda, ser descabida a proibição genérica de criação de animais, pois a vedação só se justifica nos casos em que for necessária para a preservação da saúde, da segurança e do sossego dos moradores.
A matéria foi objeto de discussão no REsp 1.783.076.
Segundo o relator, para determinar se a convenção condominial extrapolou os limites da propriedade privada, é importante observar três situações que podem surgir.
A primeira é o caso da convenção que não regula o tema. Nessa situação, o condômino pode criar animais em sua unidade autônoma, desde que não viole os deveres previstos nos artigos 1.336, IV, do CC/2002 e 19 da Lei 4.591/1964.
A segunda hipótese é a da convenção que proíbe a permanência de animais causadores de incômodos aos moradores, o que não apresenta nenhuma ilegalidade.
Por último, há a situação da convenção que veda a permanência de animais de qualquer espécie – circunstância que o ministro considera desarrazoada, visto que certos animais não trazem risco à incolumidade e à tranquilidade dos demais moradores e dos frequentadores ocasionais do condomínio.
O colegiado, por unanimidade, seguiu o voto do relator e deu provimento ao recurso especial da autora, destacando que a procedência de seu pedido não a exonera de preservar a incolumidade dos demais moradores do local, de manter as condições de salubridade do ambiente e de impedir quaisquer atos de perturbação.
Tem-se especificamente o artigo 19 da Lei de Condomínio e Incorporações:
Art. 19º Cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionados, umas e outros, às normas de boa vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos.
Art. 1277 do Código Civil: O proprietário, ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.
Qualquer cláusula que proíba animais em condomínios, assim como, qualquer lei municipal ou estadual com o mesmo teor serão incompatíveis com a Lei 4591/64, com o Código Civil e com a Constituição Federal.
Só pode haver vedações em caso de animais que causem transtornos ao condomínio e aos condôminos (barulho, agressividade, ameaça à saúde pública).
As Convenções de Condomínio que proíbam a permanência de animais não podem ser aceitas, caso o animal não apresente nenhuma ameaça.
Ensinou Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, § 1.383, pág. 421) que aos comunheiros é permitido, no ato constitutivo, ou em deliberação posterior, unânime, que deve ser registrada por atingir o conteúdo dos direitos reais, o estabelecimento de regras sobre vizinhança, mais rigorosas do que aquelas que constam na lei(artigos 554 – 588 do Código Civil de 1916, 1.336, IV, do CC/2002, Lei nº 4.591, artigos 10, 19-21). Os direitos de vizinhança e os deveres de vizinhança, que daí surgem, são irradiações do negócio jurídico plurilateral e não direito e deveres ex lege. A unanimidade pode distratar o negócio jurídico. As restrições ao uso do próprio apartamento e das demais partes divisas são permitidas na mesma extensão em que o seriam entre dois ou mais vizinhos da rua ou dos fundos, pelo fato de ser mais íntima a comunhão nos edifícios de apartamentos, podem ser previstas situações que não se apontariam entre vizinhos de rua, ou dos fundos.
Pontes de Miranda (obra citada, pág. 422) continua por ensinar que a transformação de residência, ainda que parcialmente, em casa de tolerância, é vedada, ainda que não conste no ato constitutivo ou de deliberação unânime posterior e ainda que não altere a estrutura do prédio.
O que é por lei vedado aos vizinhos de prédios também o é aos comuneiros. O que ofenderia a unidade senhorial, estética, ou do destino do prédio de apartamentos é vedado. Vedado é, por exemplo, o ter pássaros e outros animais na varanda, ou estender roupas, de jeito que o aspecto exterior fique comprometido pelos detritos de comida que caem, ou por excrementos ou pela simples vista do edifício.
A questão da presença de animais no condomínio deve ser vista diante das regras de vizinhança, uma vez que o vizinho não pode trazer transtorno á saúde, sossego e segurança ao outro.
Tais direitos são reais, não isolados. Se porém, o que se proibia não se subsume nas vedações legais, não há pensar-se em limitação ao conteúdo do direito de propriedade, não ao conteúdo. Tudo se passaria no campo dos direitos das obrigações ou ainda diante de membro de uma comunhão, o que se explicitaria no que há de entender-se como abuso de direito.
Tudo deve se resolver o âmbito da razoabilidade.
Algumas convenções e regimentos internos proíbem a permanência de animais em condomínios, outras restringem o tamanho do animal estabelecendo permissibilidade apenas para animais de pequeno porte, e outras, de forma acertada, proíbem somente os animais que causem transtornos ao sossego, à saúde e segurança dos demais moradores do prédio.
Neste sentido, na Apelação 2385004800 (de 02/06/2009), julgada pela TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) na 1ª Câmera de Direito Privado, o relator Desembargador Paulo Eduardo Razuk entendeu que “Quando se trata de animais domésticos não prejudiciais, não se justifica a proibição constante do Regulamento ou da Convenção de condomínio, que não podem, nem devem, contrariar a tendência inata no homem de domesticar alguns animais e de com eles conviver.”
Trago, para tanto, as conclusões, na matéria da parte de Rodrigo Karpat (Animais em condomínios) quando conclui:
“A circulação de animais com focinheira no Estado de São Paulo é regulada pela Lei nº 11.531/03, restringindo-se as seguintes raças "pit bull", "rottweiller" e "mastim napolitano".
Assim, não é permissivo ao síndico ou a assembleia deliberar em detrimento ao direito de propriedade. Comparativamente seria o mesmo caso que a assembleia limitar o tamanho do automóvel que pode ser estacionado na garagem ou limitar a número de moradores em uma unidade. O direito de propriedade no primeiro caso permite que dentro dos limites de uma vaga seja estacionado qualquer automóvel, desde que respeitado a segurança e salubridade. Porém, poderia ser restringida a guarda de um mini automóvel que estive causando danos a saúde dos demais em face de problemas com emissão de poluente, por exemplo.”
A manutenção do animal no condomínio somente poderá questionada quando existir perigo à saúde, segurança e salubridade aos demais copossuidores.
Assim, é anulável a decisão de assembleia que vise proibir animais de pequeno e médio porte ou restrinja a circulação destes animais no colo ou com focinheira nas dependências do condomínio. Exigir que o animal seja transportado apenas no colo, de focinheira, pode levar o condômino a situação vexatória o que é punido pelo Código Penal.
Aconselhava Caio Mário da Silva Pereira (Condomínio e Incorporações, 3ª edição, 1977, pág. 150) que os preceitos atinentes à boa vizinhança do direito comum, com a finalidade de resguardar cada consorte do que possa causar dano ao apartamento, perturbar-lhe o sossego ou causar incômodo aos habitantes, são totalmente aplicáveis ao condômino especial, e pelos mesmos fundamentos de sua existência genérica. Os autores consideram, mesmo essencial, como lembrou Caio Mário da Silva Pereira, a existência de um espírito de mútuo respeito e tolerância, que oriente o comportamento de cada um, para que se abstenha de tudo que incomode os demais, e faça o que seja conveniente a todos, como dizia Raluy.