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O princípio da ampla acessibilidade aos cargos públicos.

A exigência de três anos de atividade jurídica para os concursos à Magistratura e ao Ministério Público

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Os arts. 93, I, e 129, § 3º, da Constituição, são normas constitucionais de eficácia limitada, não podendo ser exigido o requisito de três anos de atividade jurídica antes da edição das respectivas leis reguladoras.

Sumário: 1. Introdução, 2. Problematização, 3. Princípio da Ampla Acessibilidade aos Cargos, Empregos e Funções Públicas, 4. Princípio da Razoabilidade e Proporcionalidade e a acepção da expressão "atividade jurídica", 5. A Lei nº 8.906/94 e a situação dos incompatibilizados com a advocacia, 6. Competência para regulamentar a EC nº 45/04, 7. "Sexto constitucional" ou inconstitucional?, 8. Conclusão, Bibliografia


1. INTRODUÇÃO

Dada a relevância das alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 45, de 08.12.2004, no ordenamento jurídico brasileiro, e a amplitude de suas repercussões, ainda uma vez sentimo-nos instados a deitar quaisquer considerações acerca de matérias tratadas pela mesma.

Desta feita, far-se-ão apontamentos acerca do requisito de três anos de atividade jurídica para o ingresso nas carreiras da magistratura e do Ministério Público.

Quanto à magistratura, referida Emenda passou a exigir tal requisito, alterando a redação do inciso I do art 93 da Constituição da República:

"Art. 93.

Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação;"

(Redação conferida pela EC n. 45, de 08.12.2004) [sem destaques no original]

Quanto ao Ministério Público, as alterações foram procedidas no § 3º do art. 129 da Carta Magna:

"Art. 129. ...

omissis...

[...]

3º O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação."

(Redação conferida pela EC n. 45, de 08.12.2004). [destaques ausentes do original]

Por fim, cabe sublinhar que a mesma Emenda Constitucional, em seu art. 7º, determinou a imediata instalação, no âmbito do Congresso Nacional, de comissão especial mista, com a incumbência de elaborar, no prazo de 180 dias, os projetos de lei necessários à regulamentação da matéria por ela tratada, inclusas, portanto, as alterações ora em comento.

A regulamentação das inovações da Emenda, portanto, deverá ser realizada através do devido processo legislativo, devendo ser observado, ainda, quanto ao Estatuto da Magistratura e do Ministério Público, a necessidade de edição de Lei complementar (CF, art. 93, caput, e art. 128, § 5º).


2. PROBLEMATIZAÇÃO

A Emenda Constitucional nº 45/04, com a inclusão expressa da exigência de três anos de atividade jurídica como requisito ao ingresso nas carreiras da magistratura e do Ministério Público, visou assegurar que os candidatos às mesmas encontrem-se imbuídos de um mínimo de experiência e maturidade profissional para o ingresso nelas, com evidente intuito de segurança jurídica, haja vista a relevância das funções exercidas pelos integrantes daquelas.

Com efeito, em princípio, não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade na Emenda Constitucional em comento, no particular [01], vez que assim como a lei pode exigir qualificações para o exercício, em princípio livre, de qualquer emprego, ofício ou profissão [02], tanto mais pode a Carta Política estabelecer requisitos à investidura em cargos, empregos ou funções públicas, especialmente de grande relevo e responsabilidade, e de caráter político, como os das mencionadas carreiras.

Pode-se traçar, até mesmo, um paralelo, afirmando-se que, assim como o estabelecimento de requisitos, pelo legislador, para o exercício profissional não fere, à primeira vista, o Princípio do Livre Exercício Profissional, o estabelecimento de requisitos, pelo legislador constituinte, para a investidura em cargos públicos não fere, a priori, o Princípio da ampla acessibilidade dos cargos, empregos e funções públicas [03], inserto no art. 37, inciso I, da Carta Magna.

Não obstante, a Constituição, na redação conferida pela retro-mencionada Emenda, não esclareceu – tampouco deveria tê-lo feito, eis que tal atribuição é do legislador infraconstitucional - o que deve ser considerado como "atividade jurídica", para tais fins.

Sobre o particular, ANTÔNIO CLÁUDIO DA COSTA MACHADO tece considerações no sentido de

"criticar a generalidade da locução ‘atividade jurídica’, porque, na verdade, a melhor, para não dizer a única, preparação do bom magistrado está indubitavelmente no exercício da advocacia; nenhuma outra atividade jurídica, por mais rica que seja, se equipara a ela. E, finalmente, a terceira, no sentido de reconhecer que a exigência de ‘três anos’ de experiência profissional prévia parece razoável e adequada ao momento socioeconômico porque passa o País: com vinte e cinco anos (a idade mais baixa com a qual um homem ou uma mulher conseguirá, após o bacharelado, concluir sua preparação de três anos) a pessoa está mais madura para o cargo do que com vinte e dois ou vinte e três [04]." [05]

Como se percebe, o doutrinador critica a generalidade da expressão, e conclui que, em seu entendimento, deverá ser considerada atividade jurídica o exercício da advocacia. Mas tal entendimento encontra-se longe da unanimidade.

Muitos têm sido os questionamentos levantados, após o advento da Emenda nº 45, sobre qual seria a atividade jurídica referida pelo novo texto constitucional, apta a proporcionar a experiência técnica colimada ao candidato às carreiras mencionadas.

Posicionamentos doutrinários bem mais liberais do que o retro-exposto têm sido adotados, bem como entendimentos jurisprudenciais – ainda que precedentes ao advento da EC em comento, face a inserção de requisitos semelhantes nos editais de concursos públicos [06] -, têm mitigado o rigor da exigência de prática forense ou prática jurídica, para compreender em tal expressão uma vasta gama de atividades que, de uma forma ou de outra, mostrem-se aptas a fornecer ao candidato o mínimo de condições e conhecimentos para iniciar no exercício do cargo.

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Os pretórios chegaram mesmo a reconhecer a prática forense anterior à graduação, através de estágios, como apta ao preenchimento do dito requisito. [07] Nesta esteira, convém citar HUGO NIGRO MAZZILI, em recente estudo sobre o tema:

"O que interessa discutir é se alguma experiência jurídica anterior à obtenção do bacharelado poderia ser computada em seu favor. Durante o curso jurídico, muitas vezes, o acadêmico já se inscreve profissionalmente na OAB e faz o estágio profissional, em razão do qual pratica licitamente atos limitados de advocacia, nos termos do Estatuto da OAB. A nosso ver, isso será exercício de atividade jurídica de caráter profissional.
Da mesma forma, entendemos que o estagiário do Ministério Público ou o estagiário da Magistratura deverá poder contar esse tempo de experiência profissional jurídica, que não se confunde com a mera formação cultural acadêmica dos bancos escolares.Além dos casos óbvios dos advogados militantes, dos promotores e juizes em exercício, que, sem dúvida, exercem ‘atividade jurídica’, ainda há outras hipóteses, menos óbvias, porém. O estagiário profissional, assim reconhecido pela OAB, exerce atividade jurídica? Segundo cremos, e já o antecipamos, a resposta deve ser positiva. E o estagiário acadêmico ou do Ministério Público? Por que não também? E o delegado de Polícia? Estamos certos de que sim. E o escrivão de Polícia? E o escrevente judiciário ou o oficial de Promotoria do Ministério Público, por que não?" [08]

Como se vê, há doutrinadores de peso que esposam tese bem mais liberal, de modo a conciliar as exigências de segurança jurídica com o Princípio da ampla acessibilidade aos cargos, empregos e funções públicas, constitucionalmente consagrado.

Tal antagonismo nos posicionamentos, sejam doutrinários, sejam jurisprudenciais, acerca do tema, deve-se a um conflito entre bens jurídicos protegidos pelo ordenamento, a saber, de um lado, a segurança jurídica do jurisdicionado, de outro, a universalidade de acesso aos cargos públicos [09], inscrita no art. 37, I, da CF.

É sabido que se deve evitar o perecimento de um bem jurídico em detrimento de outro, sendo tarefa do intérprete e do aplicador do direito buscar a solução que melhor concilie os bens, interesses ou direitos em conflito (Princípio da concordância prática ou da harmonização). [10]

Assim sendo, resta-nos indagar sobre como conciliar tais valores de forma razoável e proporcional, de modo a evitar o ferimento de quaisquer dos princípios aludidos.


3. PRINCÍPIO DA AMPLA ACESSIBILIDADE AOS CARGOS, EMPREGOS E FUNÇÕES PÚBLICAS

O pluricitado Princípio da ampla acessibilidade aos cargos, empregos e funções públicas encontra guarida constitucional no art. 37, inciso I, da Constituição de 1988, tendo sido reforçado ainda pela Emenda Constitucional nº 19/98, que o estendeu até mesmo para estrangeiros:

Art. 37.

A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte:

I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; (Redação conferida pela EC n. 19, de 04.06.1998).

Com efeito, é princípio da Constituição que os cargos, empregos e funções públicas sejam acessíveis, aos brasileiros, assim como aos estrangeiros. Deste modo, é inconstitucional qualquer obstrução infundada ao acesso a cargo público.

Ressalva a Carta Política aqueles requisitos regularmente exigidos pela lei e, a jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal, é dominante no sentido de que, mesmo tais requisitos, devem guardar razoabilidade e proporcionalidade.

É neste sentido também a doutrina, conforme está apto a demonstrar o seguinte excerto, da lavra de ALEXANDRE DE MORAES:

"Os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros, natos ou naturalizados, e aos portugueses equiparados que preencham os requisitos estabelecidos em lei e, desde a promulgação da EC nº 19, em 4-6-1998, aos estrangeiros, na forma da lei, sendo vedada qualquer possibilidade de discriminação abusiva, que desrespeite o princípio da igualdade, por flagrante inconstitucionalidade." [11]

Sublinha-se a ressalva feita pelo doutrinador quanto a discriminações abusivas – leia-se, irrazoáveis ou desproporcionais -, a ferirem a ampla acessibilidade referida e, por conseguinte, a regra-mestra da isonomia.

Neste sentido, confira-se excerto da lavra de JOSÉ AFONSO DA SILVA:

"A Constituição estatui que os cargos, empregos e funções são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei (art. 37, I). Esta está limitada pela própria regra constitucional, de sorte que os requisitos nela fixados não poderão importar em discriminação de qualquer espécie ou impedir a correta observância do princípio da acessibilidade de todos ao exercício de função administrativa." (destaques constantes do original). [12]

O direito de acesso aos cargos públicos é direito público subjetivo, e até mesmo corolário do sistema político e do modelo de Estado preconizados pela Carta Magna. "Existe, assim, um verdadeiro direito de acesso aos cargos, empregos e funções públicas, sendo o cidadão e o estrangeiro, na forma da lei, verdadeiros agentes do poder, no sentidos de ampla possibilidade de participação da administração pública" (MORAES, p. 826) [13]. É uma faceta da democracia.

Evidentemente pode a lei, e, com mais razão, a Constituição, estabelecer requisitos e condições a tal acesso e ao exercício. No entanto, exigências desproporcionais, despropositadas, arbitrárias ou discriminatórias e, notadamente, aquelas cuja razão do discrímen não seja agasalhada pelo ordenamento, devem ser rechaçadas, por inconstitucionais.

Em princípio, como já deixamos entrever nas primeiras linhas deste texto, a Emenda Constitucional nº 45/04 não extrapolou as regras da razoabilidade e da proporcionalidade sendo, no particular, perfeitamente constitucional, a nosso juízo.

Explica-se: o prazo inicial, previsto pelo Projeto de Emenda Constitucional, era de cinco anos, tendo sido reduzido, posteriormente, por alteração procedida no Congresso Nacional, para os atuais três anos. Neste passo, nos parece que, no que diz respeito ao lapso temporal exigido, este acabou por ser fixado em um período perfeitamente razoável, nem excessivamente longo – como nos pareciam os iniciais 5 anos do projeto -, nem muito curto – o que acabaria por afetar a própria finalidade da exigência -.

Outrossim, no que respeita ao aspecto do requisito em si, utilizou o legislador Constituinte de elogiável comedimento, utilizando-se da expressão atividade jurídica em lugar de outras, muito mais restritivas, como, por exemplo, prática forense ou atividade privativa de bacharel em direito.

Quis o legislador constituinte deixar a regulamentação mais minuciosa a cargo do legislador ordinário, o que é perfeitamente adequado. Quis ainda, parece-nos, evitar restringir exageradamente a gama de atividades abrangidas pela exigência, com vistas, exatamente, a evitar o ferimento ao Princípio da ampla acessibilidade.

Assim sendo, entendemos que a expressão atividade jurídica resulta de opção consciente do legislador constituinte, e não de equívoco ou imprecisão terminológica, de modo que a EC nº 45/04 contém um comando implícito ao legislador ordinário, qual seja, o de não restringir demasiadamente o rol de atividades aptas a capacitarem o candidato às carreiras da magistratura e do Ministério Público.

Caso o legislador incorra em tal erro, a Lei Complementar exigida pelo art. 7º da Emenda estará, irremediavelmente, inquinada de inconstitucionalidade, não por ferimento a tal comando implícito, mas por ferimento ao disposto no inciso I do art. 37.


4. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE E A ACEPÇÃO DA EXPRESSÃO "ATIVIDADE JURÍDICA".

O critério para a restrição de direitos, dentre os quais inserem-se os requisitos exigidos para acesso aos cargos públicos, será sempre o da razoabilidade, conforme ALEXANDRE DE MORAES:

"Note que, na regulamentação desse direito de acesso, há possibilidade e fixação de requisitos razoáveis, desde que compatíveis com o princípio da igualdade, para o provimento de cargos, empregos e funções públicas." [14]

Assim sendo, inobservada a regra da razoabilidade por parte do legislador infraconstitucional, ao regulamentar a Emenda 45, restará invariavelmente inquinada do vício da inconstitucionalidade, tanto em razão de ferimento ao princípio da ampla acessibilidade, já visto, quanto por violação à regra-mater da isonomia. [15]

Com tal assertiva se pretende defender que a atividade jurídica, expressão que entendemos adotada conscientemente pelo constituinte derivado, conforme já visto, deve abranger um rol relativamente amplo de atividades, de modo a permitir o acesso às carreiras do Ministério Público e da magistratura por indivíduos integrantes das mais diversas carreiras, profissões e atividades, desde que os cargos, empregos ou funções exercidos sejam aptos a proporcionar aquele mínimo de experiência jurídica pretendido pelo comando constitucional [16].

Isto significa que não será admissível, por exemplo, que o legislador infraconstitucional reconheça como atividade jurídica tão-somente o exercício de cargos privativos de bacharel em Direito, por exemplo, hipótese na qual incorrerá em inegável inconstitucionalidade, por ofensa aos princípios já referenciados, bem como à proporcionalidade e razoabilidade.

Entende-se que, se o legislador constituinte pretendesse que somente aqueles ocupantes de cargos privativos de bacharel em direito pudessem concorrer nos certames com vistas ao provimento de cargos na magistratura e no Ministério Público, o teria exigido expressamente. E não o fez, adotando, ao contrário, expressão ampla, que permite vislumbrar que o rol de tais atividades deverá ser relativamente amplo.

Ademais, mesmo em tempos anteriores à EC 45/04, já era dominante a jurisprudência no sentido de conferir amplitude à "prática forense" exigida por alguns editais de concursos públicos – ao largo de qualquer autorização legal ou constitucional, recordamos -, expressão aquela de amplitude equivalente à de "atividade jurídica". [17]

Convém recordar, inclusive, que dispositivo constante de Lei Complementar já foi objeto de ação direta de inconstitucionalidade, tendo inclusive havido voto de quatro Ministros, no sentido de sua inconstitucionalidade, em sede de pedido de medida cautelar.

Referimo-nos ao art. 187 da Lei Complementar nº 75/93 [18], Lei Orgânica do Ministério Público da União, que exige do candidato 2 anos de formado, o que foi rechaçado, em sede de cautelar, pelo voto, embora vencido, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, FRANCISCO REZEK, ILMAR GALVÃO, MARCO AURÉLIO e SEPÚLVEDA PERTENCE, com fundamento na isonomia e no Princípio da Razoabilidade, eis que o simples lapso temporal de 2 anos entre a graduação e o certame não se encontrava fundado em motivo razoável e proporcionado. (ADI MC nº 1.040).

Não obstante a medida cautelar e, posteriormente, o julgamento de mérito da Ação Direta de Inconstitucionalidade tenham sido julgados improcedentes, por maioria, convém reportar-nos ao teor das razões dos votos dos quatro Ministros dissidentes, por pertinentes ao tema em comento.

Quando da fundamentação de seu voto, por ocasião do julgamento da medida cautelar no bojo da ADI retro-referenciada, o Ministro FRANCISCO REZEK assim se pronunciou:

"Nesse caso, a norma é exemplarmente desastrada, porque ela não diz aquilo que deveria dizer, e quer que o intérprete presuma em seu favor. Tudo que transparece aqui é um reclamo, que nem sequer ostenta a plausibilidade mínima do requisito etário. O que se pede é um intervalo entre a graduação e a inscrição, e não se diz como esse tempo há de ter sido preenchido de modo útil ao futuro exercício da função pública. Peço vênia para, com este sumário argumento, acolher o pedido de liminar e provisoriamente desativar a norma."

Entendimento ratificado, em todos os seus termos, pelo Ministro ILMAR GALVÃO. O Ministro MARCO AURÉLIO, sobre o particular, assim se pronunciou:

"Como lançada, penso que a norma tem extensão que conflita com a Carta, no que possibilita ao legislador criar condições, mas condições socialmente aceitáveis, para participação em um certame público. Acompanho S. Exª. e defiro a liminar."

As condições socialmente aceitáveis, referidas por Sua Excelência, nada mais são do que critérios racionais, baseados na razoabilidade e proporcionalidade. Vale conferir, ainda, as considerações do Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, quando do julgamento:

"Senhor Presidente, como o eminente Relator, entendo que restrições legais se submetem a um controle de sua razoabilidade, e, para tanto, nem é preciso importar o princípio da proporcionalidade de diversas Constituições modernas. Sobretudo, em se tratando de concurso público, que é um corolário do princípio maior da isonomia, basta-me este princípio para repelir restrições do acesso ao concurso público, quando desarrazoada, sem conexão com o objetivo do certame."

Portanto, a regulamentação da disposição constitucional em análise, pelo legislador ordinário, deverá ser pautada de comedimento e razoabilidade, sob pena de inconstitucionalidade, pelas diversas razões já referidas, que já demonstraram encontrar resposta em parcela considerável dos Ministros do Pretório Excelso, vez que não se pode restringir exageradamente o acesso aos certames públicos, e que tais restrições não podem deixar de basear-se em critérios razoáveis, sem afronta a princípios constitucionais de magnitude, como os mencionados.

Ainda uma vez, citamos o magistério de ALEXANDRE DE MORAES:

"Portanto, se a limitação ao acesso aos cargos, funções ou empregos públicos for baseada em critério razoável e legítimo, relacionado com as condições necessárias ao desempenho profissional, e existir expressa previsão legal, não haverá violação à Constituição. Ressaltamos, porém, novamente, que não existindo razoabilidade na fixação do limite etário ou de quaisquer outros requisitos, a norma deverá ser proclamada inconstitucional." [19]

Sobre os autores
Geziela Jensen

Mestre em Ciências Sociais Aplicadas pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Membro da Société de Législation Comparée (SLC), em Paris (França) e da Associazione Italiana di Diritto Comparato (AIDC), em Florença (Itália), seção italiana da Association Internationale des Sciences Juridiques (AISJ), em Paris (França). Especialista em Direito Constitucional. Professora de Graduação e Pós-graduação em Direito.

Luis Fernando Sgarbossa

Doutor e Mestre em Direito pela UFPR. Professor do Mestrado em Direito da UFMS. Professor da Graduação em Direito da UFMS/CPTL.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JENSEN, Geziela; SGARBOSSA, Luis Fernando. O princípio da ampla acessibilidade aos cargos públicos.: A exigência de três anos de atividade jurídica para os concursos à Magistratura e ao Ministério Público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 838, 19 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7427. Acesso em: 22 nov. 2024.

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